Capítulo 13: O amor me dava as boas-vindas, mas minha alma se afastava
por Fator X - LegadoNossa ceia transcorreu em silêncio, pois estávamos concentradas em nossas próprias reflexões. Minha jovem escrava parecia tão pensativa como eu esta noite. Disse-lhe que tinha um pouco de trabalho e que podia fazer o que quisesse durante as próximas duas marcas. Dei-lhe um beijo no topo da cabeça e a mandei com seus pergaminhos. Quando se virou para olhar-me vi a decepção escrita em seu rosto.
Algum tempo depois estava sentada diante de minha mesa, dentro de meu silencioso escritório, rodeada de prateleiras abarrotadas até o teto de rolos e pergaminhos. Apertei minha melhor túnica de seda ao corpo, para proteger-me do frio e da umidade que sempre se apoderavam do castelo quando o sol desaparecia do céu. Minha intenção era escrever cartas, tarefa aparentemente interminável. Entretanto, tudo que podia fazer, era ponderar sobre o que havia descoberto graças ao pergaminho de Gabrielle.
Por minha cabeça passavam tantas idéias e emoções que apenas conseguia lembrar meu nome. Gabrielle sente algo parecido com o que sinto por ela? Sente algo, seu pergaminho deixa isso claro, mas e se não é nada além da amizade? Sim, sente prazer quando a toco, mas na realidade não estou lhe dando outra opção, não é? Pelos deuses, estou forçando-a a sentir essas coisas? É como treinar um falcão para que pouse em minha mão a fim de receber sua recompensa, quando não é o que a ave faria naturalmente? Dei voltas a todas essas dúvidas e autorecriminações até que a cabeça começou a doer.
Percebi um movimento à direita e vi uma hesitante cabeça loira assomar na sala. Gabrielle não deveria nunca me interromper em meu escritório se estivesse em uma reunião. Havia deixado a porta da sala aberta de propósito, com a esperança de que por fim viesse me buscar.
– Minha senhora? – perguntou do umbral.
– Passa pequena, estou só.
Gabrielle sorriu, veio até minha mesa e se deteve ao lado da grande cadeira onde meu longo corpo estava recostado. Envolvi seu quadril com um braço e com a mesma naturalidade, ela passou os dedos por meu cabelo, afastando a franja escura que se metia em meus olhos. Foi um movimento totalmente natural e reagi apertando-a.
– O que foi Gabrielle?
– Disse que queria me ensinar, minha senhora. O jogo… Os Homens do Rei. – lembrou-me.
– Aah, é verdade. Continua interessada? É um jogo complicado.
– Farei o melhor que puder minha senhora. – contestou.
Quando entrei na sala exterior tive uma agradável surpresa. Um cálido fogo ardia alegremente na lareira e havia várias velas e uma lâmpada acesa perto da mesa de jogo. Por último, uma taça de vinho doce esperava perto de minha poltrona preferida, que estava posicionada diante da mesa de mármore.
Gabrielle olhou-me, expectante e não pude resistir à tentação de inclinar-me para lhe dar um beijo na testa.
– Está maravilhoso, obrigada, Gabrielle.
Quase uma marca depois, estávamos debruçadas sobre a mesa, começando a primeira partida de verdade. Gabrielle havia memorizado os movimentos que podia realizar cada peça distinta e tornou-se evidente para mim porque era tão inteligente. A jovem possuía uma memória extraordinária e lembrava com facilidade as manobras às vezes complicadas que realizava cada peça durante uma jogada.
Fiz meu primeiro movimento e Gabrielle moveu rapidamente uma peça depois de mim. Olhei, mas ela não afastou os olhos do tabuleiro, à espreita, como se não pudesse esperar que eu fizesse minha próxima jogada. Depois de deliberar um momento, fiz um de meus guerreiros avançar novamente uma casa da primeira linha. Quando havia apenas afastado a mão da peça, Gabrielle disparou e moveu um de seus guerreiros do canto esquerdo. Um arco de minha sobrancelha era a única pista de que eu estava ficando perturbada, mas a jovem continuava concentrada completamente no tabuleiro do jogo. Em minha terceira jogada, enfiei outro guerreiro na refrega, antes de levar a taça de vinho aos lábios. Gabrielle moveu seu centauro para eliminar o guerreiro e franzi o semblante. Não gostava de ser a primeira a perder uma peça.
– Gabrielle, por que fez este movimento? Eliminou meu guerreiro, é verdade, mas colocou seu centauro em perigo. Vê? – apontei, tirando o centauro do tabuleiro e colocando meu castelo em seu lugar. – Deveria sacrificar uma peça apenas para conseguir uma peça de seu adversário que tenha mais valor.
– Sim, minha senhora, eu me lembro que disse isso, mas essa foi a minha intenção. – disse enquanto levantava habilmente seu místico de cor lavanda do canto do tabuleiro e o fazia andar pelos espaços liberados por dois dos meus guerreiros e um dela. Jogou de um lado meu castelo e colocou sua peça no quadrado. Calmamente recolheu minha peça caída e a deixou a seu lado do tabuleiro.
– Como fez…? – inclinei-me para frente na poltrona e examinei o tabuleiro.
– Fiz errado? – olhou-me Gabrielle seriamente.
Como poderia deixar meu temperamento aflorar quando me olhava dessa maneira? Certo, é que faz tempo que não jogo, isso é tudo.
– Não Gabrielle, não fez errado. Na realidade, fez tudo certo. – respondi, ainda que um pouco contrariada.
Recostei-me novamente na poltrona e voltamos à partida. Eu estudava o tabuleiro e as peças e então, com muito cuidado, fiz minha jogada. Para Gabrielle parecia dar no mesmo, pois a jovem me superou em três movimentos seguidos.
– Gabrielle – comecei tentando não deixar meu semblante mais feio – Não tem nenhuma pressa. Quero dizer, você pode levar o tempo que precisar para refletir sobre seus movimentos antes de fazê-los.
– Fiz mal? – Gabrielle parecia surpresa e ficou olhando o tabuleiro com ar confuso.
– Não, não. Referia-me apenas a que esse tipo de jogo se apoia no raciocínio, não na velocidade. Conheço grandes estrategistas militares que levaram dias para fazer apenas um movimento.
– Dias? – Gabrielle finalmente olhou-me.
De repente me senti uma completa idiota, principalmente porque minha jovem escrava olhava-me como se acabasse de dizer a maior idiotice que ouvira em sua vida.
– Bem, pode ser que dias não exatamente, mas sim, muito tempo. – dissimulei rapidamente.
– Sim, minha senhora. – contestou.
Bebi mais duas taças de vinho e então percebi que devia ser isso o que estava me roubando a concentração. Na realidade, era isso e o fato de que Gabrielle em nenhum momento desacelerara seu estilo de jogo. Estava me dando uma surra e eu estava ficando tão irritada quanto uma menina a quem os cachorros da família tivessem destroçado seu brinquedo favorito.
Gabrielle começou a perceber meu mau humor, e essa deve ter sido a razão para que propusesse que deixássemos o jogo por essa noite. Demorei um pouco, porque estava imersa em minha rabugice, mas por fim entendi que Gabrielle estava lentamente perdendo peças com movimentos que não tivera a estupidez de realizar no começo da partida. Gabrielle estendeu a mão para mover seu rei a um ponto que sequer um novato escolheria. A luz do entendimento iluminou finalmente minha cabeça dura. Deuses, nem sei por que as pessoas se preocupam comigo! Sou pior que uma criança malcriada.
Suspirei calmamente e estendi a mão, cobrindo a de Gabrielle, antes que tivesse a oportunidade de soltar a peça de jade.
– Gabrielle? Percebeu que odeio perder, não é? – perguntei.
– Sim, minha senhora. – respondeu suavemente.
– Sabe o que detesto ainda mais que perder seja o que for?
Gabrielle fez um gesto negativo com a cabeça e seu olhar solene se encontrou com o meu.
– Que alguém me deixe ganhar uma competição porque o intimidei ou obriguei. É algo que odeio em mim e agora me parece que fiz isso com você e não era essa minha intenção, absolutamente. Agora, percebe que quando soltar essa peça, o movimento será definitivo?
– Sim, minha senhora, eu sei. – Gabrielle assentiu com a cabeça.
– Então lhe pergunto… Continua querendo colocar seu rei aí? – olhei para a jovem e sorri, para dizer-lhe que descobri sua estratégia.
– Não, minha senhora? – disse em forma de pergunta, apenas para ter certeza.
Ri alto.
– Pois muito bem, continue, por favor.
Meu humor melhorou consideravelmente depois disso, ainda que durasse pouco. Pensei que tinha um plano, mas quatro jogadas depois, Gabrielle voltou a mover seu rei e me olhou. Estou certa de que seu sorriso hesitante se devia a minha expressão pasma, e não a uma alegria real que pudesse sentir. Mas podia estar equivocada.
– Ao que parece, minha senhora, está encurralada.
– Não, Gabrielle, eu estou morta. – levantei o olhar do tabuleiro com um sorriso irônico. – Pelos deuses, menina, como fez isso? – continuava observando o tabuleiro, tentando descobrir onde me equivoquei.
Fiquei escutando enquanto Gabrielle explicava o método de suas jogadas. Sempre me ensinaram a pensar várias jogadas à frente, mas essa jovem me deixou assombrada. Durante todo o jogo Gabrielle esteve pelo menos seis movimentos à minha frente. Sabia que havia gente que possuía esta capacidade, mas que minha jovem escrava a tivesse me deixou atônita.
– Você, venha cá. – peguei sua mão e a sentei em meu colo, apertando-a com força e depositando uma chuva de beijos provocativos em seu colo que, para meu prazer, fizeram-na rir em meus braços.
– Lembre-me de fazer uma coisa, Gabrielle. – lhe disse.
– O que minha senhora? – respondeu.
Inclinei-me para trás e adotei a expressão mais séria que pude.
– Que da próxima vez que entrar em uma batalha, a leve comigo. É a melhor estrategista que jamais conheci.
A jovem começou a rir como eu esperava, mas nas profundezas de meu cérebro, essa voz minúscula voltou a me dizer que finalmente conheci a forma de meu sapato. Boadicea, César, Alexandre, Antípatro… Todos me desafiaram e, no fim, todos perderam. Poderia alguém imaginar, inclusive os deuses, que uma pequena e amorosa escrava seria quem me baixaria o orgulho?
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Desta vez foi diferente e não sei por que. Gabrielle estava deitada colada a mim em nossa cama, na realidade em cima de mim, com os seios firmemente colados aos meus, nossas pernas entrelaçadas, enquanto empurrávamos nossos corpos um contra o outro, cada vez um pouco mais. Os beijos não eram tão carnais como os da noite passada. Esta noite parecia tratar-se de ternura, carícias lentas e suave excitação. Esta noite o fogo não ardia sem controle, mas aumentava lentamente, com a necessidade de queimar a noite toda. Gabrielle me tocava, então eu a tocava, e aos poucos estávamos simplesmente trocando carícias, acendendo trilhas de fogo uma na pele da outra.
Senti que o corpo de Gabrielle se deslizava pelo meu, para colocar-se melhor em cima de mim. Quando se inclinou sobre meu rosto, para me beijar, deixei os olhos abertos para ver enquanto brincava primeiro com a ponta de sua língua. Continuei olhando enquanto passava sua pequena língua rosa por meu lábio inferior, puxando suavemente com os dentes. Continuando, passou a ponta da língua pelo lábio superior, acariciando-me a fenda com um movimento sutil que ecoou em regiões muito mais baixas de meu corpo, que logo sentiriam as carícias dessa mesma língua. Não pude suportar mais este excitante tormento e passei os braços por sua cintura, esmagando-a contra meu corpo. Meti essa língua na minha boca e começamos a movimentr o quadril, em resposta à exploração oral.
Em todos os lugares… Queria simplesmente tocá-la em todos os lugares ao mesmo tempo e bem sabem os deuses que tentei. A suavidade sedosa de sua pele, seu jeito de colar seu quadril aos meus, seu odor, tudo isso combinado preencheram meus sentidos ao ponto de sobrecarga. Beijei seu ombro e passei a língua pelo músculo tenso de seu pescoço. Eu aspirei seu aroma e suspirei. O odor de Gabrielle era do delicado sabão de seu banho, do ligeiro óleo de rosas que me lembrava as flores de um vermelho escuro de meu jardim, tudo misturado com o buquê de nosso desejo misturado, que subia e ameaçava me esmagar.
Enfiei as mãos entre nossos corpos, querendo tocar essa umidade e sentir a jovem tremendo sobre mim com cada carícia nessa carne sensível. Gabrielle interceptou minhas mãos, agarrou meus pulsos com força e colocou minhas mãos por cima da cabeça. Poderia ter impedido à força, mas estava curiosa para ver onde minha escrava queria chegar com isso. Fez-me segurar a cabeceira de madeira com os dedos, sem afastar os olhos dos meus.
– Se soltar… Paro. – sussurrou em meu ouvido e então passou a língua pela borda externa, puxando com os dentes a carne de minha orelha. Nesse mesmo tempo ouvi um gemido grave que brotava de minha garganta.
– Gabrielle… – disse devagar como advertência. As tentativas passadas de dominação por parte de Gabrielle aconteceram quando eu não podia pensar, mas isto era lento e calculado e não sabia se estava preparada para tomar esta decisão consciente.
Continuava segurando a barra inferior de madeira entalhada quando Gabrielle se afastou e me olhou nos olhos. Tocou minha face com os dedos que pareciam queimar minha pele com sua carícia ardente.
– Por favor, Xena… Deixa?
Deuses, que homem ou mulher com vida poderia ter ignorado essa súplica apaixonada? Bem, certamente que eu não, e rodeei a madeira com os nós brancos dos meus dedos, concentrada em manter o controle.
Tudo o que pude dizer mais tarde foi que a língua de Gabrielle se alimentou de mim. Sabia que estava em apuros quando comecei a tremer literalmente, com os músculos saltando em pequenas convulsões, antes mesmo dos lábios de Gabrielle rodearem um mamilo duro como uma pedra. Quando lambeu os lábios e cobriu essa carne dolorida, de meus lábios brotou um sonoro gemido e arqueei espontaneamente as costas pela prazenteira sensação.
Lutando para respirar normalmente, senti que sua língua deslizava por meu abdômen, lambendo repetidamente os músculos de meu ventre, que se estremeciam e vibravam com os pequenos tremores de desejo que me atravessavam.
– Gabrie… Oh, deuses!
Gritei enquanto suplicava à jovem. Gabrielle deslizou seu corpo pelo meu para posicionar-se entre minhas coxas. Momentos antes sua língua traçara desenhos provocativos por minha pele, mas quando chegou à espessa mata de cachos escuros, senti o frescor de sua pele sobre meu centro acalorado. Quando exclamei seu nome, senti que acariciava todo meu sexo com um mamilo duro e apertava a rígida protuberância contra meu âmago sensível.
– Sim, Xena? – respondeu descaradamente.
– Você é uma mulher má. – arfei, levantando o quadril para sentir novamente essa deliciosa sensação. – Por favor, criança… Oohhh… – não me vi frustrada, pois Gabrielle esfregou a dura ponta de carne contra meu clitóris inchado.
Gabrielle pareceu demorar uma eternidade para usar os lábios, os dentes e a língua para percorrer com ardor a parte interna de minhas coxas. Provocava-me e depois me dava prazer, mantendo-me à beira mais tempo do que achava que meu controle poderia aguentar. Estava tão a ponto que pensei que da próxima vez que apenas soprasse sobre meu sexo hipersensível, explodiria em êxtase.
Sua língua finalmente fez movimentos sutis sobre meus lábios inferiores e abri ainda mais as pernas, com os músculos tensos e trêmulos de expectação. Essa primeira carícia lenta, quando sua língua separou com delicadeza as pregas inchadas e senti essa umidade quente que se metia em meu interior, me fez colar a cabeça no travesseiro e de minha garganta saiu um longo e abafado gemido.
– Oh, sim! – exclamei como resposta.
Gabrielle parecia deleitar-se enormemente com esta lenta tortura. Comecei a me perguntar seriamente quanto tempo poderia me deixar à beira do orgasmo sem me provocar a descarga. O tempo parecia passar tão devagar! Todos os meus sentidos gritavam de necessidade, enquanto Gabrielle, lenta e inexoravelmente usava a língua para explorar, provar e saborear todo o meu ser.
– Criança… Por favor… Preciso… – gemi novamente.
Gabrielle se deteve para falar, mas não sem antes dar uma longa carícia com a língua de encontro a minha carne em chamas.
– O que Xena… Do que você precisa? – perguntou, e voltou rapidamente a me acariciar devagar com a língua.
– Oh, deuses… Preciso… Preciso… – me sentia como se estivessem me virando do avesso – Preciso de você! – finalmente consegui soltar.
Foi como se Gabrielle soubesse que havia chegado ao limite, por assim dizer. Talvez, de certo modo, isso fosse o que estivesse esperando ouvir, ou talvez percebesse que não diria o que ela queria ouvir. Fosse o que fosse ela entrou em ação e depois do que me pareceu marcas inteiras a me devorar tão amorosamente, por fim estava prestes a conseguir minha libertação.
Envolveu minhas coxas com seus braços fortes, abrindo-as bem e apertando-as contra a cama ao mesmo tempo, e não pude fazer nada a não ser me render. De repente, estava acontecendo – sua língua, esses dentes e seus lábios… Em toda parte ao mesmo tempo, deslizando primeiro pelas pregas inchadas de meu sexo, subindo para acariciar o clitóris inflamado e penetrando-me por fim com profundas estocadas. Não conseguia me concentrar em uma só área de prazer, porque estava em toda parte, lambendo, sugando e penetrando. Sentia como se meu orgasmo tivesse começado no instante em que afundou o rosto em mim e estivesse demorando todo este tempo para brotar desde as profundidades ocultas e engolir-me inteira. Senti que meu corpo se agitava e estremecia enquanto esperava que o clímax me devorasse. Quando enfim senti esse calor penetrante e o começo dos espasmos em minha virilha, dei-me conta de que era demais, emoção demais, sentimento demais, tudo de uma só vez. Tentei fechar as pernas, mas os braços de Gabrielle enganosamente fortes me mantiveram aberta enquanto o prazer caía sobre mim em ondas, ameaçando sepultar-me e afogar-me.
O rugido que ouvia era sem dúvida o açoite das ondas que tentavam me afundar. Somente quando o orgasmo seguinte me levou ainda mais alto, compreendi que o som saía de minha garganta. Não me restavam forças para lutar e por fim deixei que as ondas me levassem até o fundo. Deixei que a escuridão pousasse sobre mim e senti uma agradável satisfação que era nova e desconhecida para mim, enquanto me deixava flutuar, convencidade de que Gabrielle me levaria de volta à superfície.
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– Tudo bem… Estou com você.
Senti que alguém sussurrava essas palavras ao meu ouvido e enquanto sentia que voltava à minha pele, disse a mim mesma que disso eu já sabia. Sabia que Gabrielle não deixaria que me afogasse. E aqui estava sussurrando-me com tom reconfortante e passando os dedos por meu cabelo.
– Pelos deuses, mulher… Que coisas faz comigo.
Foi a primeira coisa que saiu de minha boca e Gabrielle sorriu.
– Você me assustou. Está bem, Xena?
– Não queria assustá-la, mas… Por Hades, não posso nem explicar o que senti. Venha cá. – a coloquei entre meus braços e de repente nossas posições se inverteram.
Sentia uma estranha força quando segurava Gabrielle em meus braços. O que escrevera em seu pergaminho não era apenas perspicaz, senão que a verdade. Faria qualquer coisa por essa pequena mulher. Chegaria a qualquer extremo para mantê-la aquecida, bem alimentada e a salvo. Queria que soubesse e olhei em seu rosto, mas o medo congelou minha língua. O que se diz quando quer expressar o que se leva no coração… Como faço? Para uma guerreira como eu havia apenas um recurso, que era a ação, não as palavras.
Estendi a mão para tocar seu rosto e acariciei levemente sua bochecha, deixando que meus dedos deslizassem pelos lábios generosos e macios. Inclinei a cabeça e quando venci a curta distância que nos separava, inclinei-me ligeiramente para trás, apenas roçando seus lábios com os meus. Queria fazer o que minhas palavras não conseguiam – deixar que meu corpo lhe dissesse o que sentia em meu coração.
Dei prazer a seu corpo com toda a ternura que me era possível, alimentando delicadamente um fogo dentro da pequena mulher até que ela não pode conter o gemido que subiu por sua garganta. Peguei um seio com a mão e friccionei levemente o mamilo ereto com o polegar. Mais uma vez ouvi o delicioso som que se originava de Gabrielle. Aquilo se converteu agora em minha meta, extrair mais desses sons do corpo da jovem.
Foi aí que eu congelei.
Detive literalmente todos os meus movimentos e quase deixei de respirar. Que sons? Gabrielle jamais faz ruído algum quando a toco. Inclusive durante o orgasmo, se não estivesse tão absolutamente sintonizada com seu corpo, jamais saberia quando o alcançava.
Afastei-me um pouco, o suficiente para olhar Gabrielle no rosto. Aí estava – a jovem seria capaz de ocultar-me muitas coisas, mas não isto. Olhei-a nos olhos, na esperança de que fosse minha imaginação e que me sorrisse como se não passasse nada. Os olhos de Gabrielle se encheram de lágrimas e afastou o olhar.
– Sinto muito, Gabrielle… Acho que deve me achar uma velha estúpida. – disse com tristeza, controlando minha dor com um sorriso amargo.
– Não, nunca, minha senhora. – contestou suavemente, enquanto suas lágrimas escapavam pelo canto dos olhos. – É que… Parecia ser tão importante para vós. Meu silêncio a incomodava e queria apenas agradá-la.
Subi a mão e pousei os dedos sobre seus lábios, dando-me conta agora de que provavelmente não sentira nada enquanto a beijava. Que estúpida fui ao pensar que uma jovem, sobretudo uma escrava, poderia chegar a sentir algo por mim. Claro que sente algo por mim, sou a primeira ama que já teve em sua vida que se mostrou decente com ela. Está agradecida e confusa e é muito jovem. É minha escrava e me deixei levar tolamente até pensar que havia mais… Sentimentos… Emoções… Amor.
Acho que se soubesse chorar, choraria. Gabrielle era uma escrava e não sentia nada por mim, salvo o afã de me servir bem. Por que não consegui ver isso antes? Sou sua ama… Xena a Conquistadora… Sou a Conquistadora e isso é tudo o que serei por toda a minha vida.
Afastei-me de Gabrielle e sentei na beira da cama. A pequena loira segurou meu antebraço com a mão.
– Por favor, perdoe-me, minha senhora. – implorou Gabrielle.
Não tinha coragem de aborrecer-me com a jovem. Apenas fizera o que sabia fazer melhor, servir intuitivamente sua ama. Não era sua culpa que sua ama fosse uma velha tola apaixonada e atormentada.
– Está tudo bem, Gabrielle. – respondi, afastando delicadamente sua mão de meu braço. – Você não fez nada errado.
Levantei-me e vesti a túnica, atravessei o quarto e entrei na câmara exterior. Fui à janela e afastei a tapeçaria, amarrando-a com uma guita. Virei-me e me acomodei na poltrona que estava sempre de frente para a janela. Contemplei as estrelas que cintilavam na escuridão e uma vez mais desejei poder chorar. Não pude evitar sorrir ao pensar. Passei toda a minha vida aprendendo a ignorar minhas emoções. Lembro-me de ter chorado no dia em que renunciei ao meu filho, mas desde então, nem uma só vez permiti o que me parecia ser uma debilidade feminina. Oh, uma ou outra gota quando dominada pela emoção, mas em raras ocasiões e se podia contar com os dedos de ambas as mãos as estações que passavam entre cada ocasião.
Até Gabrielle chegar.
Derramei lágrimas autênticas em mais de uma ocasião desde que estava comigo. Engraçado, mas agora, quando penso que uma boa choradeira poderia me aliviar, sou incapaz.
Percebi a presença de Gabrielle, me virei e a vi, envolta em sua túnica, com os olhos cheios de medo ou de pena, não estava certa. Aproximou-se e caiu de joelhos nessa conhecida postura de subserviência.
– Perdoe-me, minha senhora. Não pretendia aborrecê-la.
Acariciei sua bochecha com as costas da mão, sorrindo com toda a ternura de que fui capaz. Agarrou-me os dedos gentilmente e beijou os nós cheios de cicatrizes. Soltei a mão e me afastei devagar. Dava-me demasiado prazer e bem sabe a deusa que já me sentia suficientemente tola.
– Não estou aborrecida com você, Gabrielle. Já lhe disse que não fez nada errado. Vá, vá dormir um pouco. – me virei para olhar de novo pela janela. – Esta noite pode dormir em seus aposentos, pequena. Deixe-me agora. – acrescentei.
Virei-me uma última vez antes que saísse da sala e pensei ver uma inacreditável tristeza no rosto de Gabrielle. Sabia que era minha imaginação, de modo que descansei o queixo na palma da mão, preparada para passar uma noite sem dormir.
*****
O céu começava a ter essa suave cor gris antes que a luz de Apolo se apagasse. Estive sentada praticamente do mesmo jeito a noite toda, pensando em minha vida e na terrível confusão que armei, perguntando-me o que faria agora com minha pequena escrava. Seguimos adiante, ela dando e eu tomando? Continuo com nossas noites de mútuo prazer ou deixo simplesmente que me satisfaça e mantenho uma distância respeitosa?
Percebi um movimento pelo rabo do olho e quando me virei, Gabrielle estava no umbral, entre as duas salas. Vestia uma pequena camisa de seda que havia lhe dado, mas não usava túnica.
– Gabrielle, está doente? – perguntei, ao perceber seus olhos inchados e vermelhos. Era evidente que passara toda a noite chorando e seu aspecto esfaqueou meu coração.
Correu até prostrar-se no chão diante de mim, com o corpo agitado pelos soluços.
– Gabrielle – levantei a jovem e a sentei em meu colo. – Está gelada… Vai acabar doente.
Levantei-me com a menina nos braços, e sentei-me no grande sofá, peguei uma grossa manta do encosto e envolvi o corpo da jovem com ela. Olhou-me e seu pranto se intensificou.
– Gabrielle, alguém lhe fez mal? – perguntei, mas ela fez um gesto negativo com a cabeça. – Eu lhe fiz mal? – perguntei de novo, pensando que devia ser isso.
– N-não, eu lhe fiz mal. – balbuciou.
– Gabrielle, você não me fez mal. – desci a mão e sequei as lágrimas de seus olhos, abraçando-a até que passasse um pouco os tremores e o pranto. Pareceu-me estranho que estivesse tão alterada pela mera idéia de causar-me dor.
Minha jovem escrava rodeou meu pescoço com os braços e afundou o rosto no calor de minha pele. Apertei-a em meus braços, sabendo que merecia alguma explicação, por mais imbecil que me fizesse parecer. Servia-me bem e a estava traumatizando com minha incapacidade de expressar minha estupidez com respeito a ela.
– Sou eu, Gabrielle… Você não fez nada que me desagradasse. Eu… Achava… Deuses, que estupidez!
Gabrielle se afastou de mim, com os olhos verdes ainda reluzentes de lágrimas, mas tinha uma expressão tão compassiva que me deu forças para continuar.
– Achava… Que talvez… Sentisse… Mais. – balbuciei.
– Mais, minha senhora?
– Que sentisse mais… Por mim, quero dizer. É… Oh, era uma idéia tola que tinha… Não queria causar-lhe dor com minha fragilidade. – afastei o olhar. Senti que meu rosto se aquecia. Fazia muito tempo que não sentia esse tipo de constrangimento.
Senti uns dedos suaves que viravam meu queixo para ela.
– Você… Sente algo… Algo mais… Por mim?
Devia mentir? Devia tirar a importância sorrindo? Devia lembrar que os amos não se apaixonam por seus escravos? Sabia que nenhuma destas opções seria justa.
– Sim, Gabrielle. – respondi, dizendo a verdade.
– O que? – perguntou. – O que sente?
– Não sei… Apenas… Mais. – respondi vagamente, perguntando-me ainda se era possível que tivesse me apaixonado pela jovem.
– Achei que você soubesse – disse ela e contemplei seu sério rosto. – Pensei que poderia me dizer o que é, porque eu também sinto isso.
– Você? – perguntei confusa. – Por mim?
Gabrielle balançou a cabeça e a expressão de seus olhos me disse que era verdade e que estava tão confusa quanto eu.
– O que acha que sente? – lhe perguntei, sem atrever-me sequer a esperar uma resposta em um sentido ou outro.
– Não… Não sei… Apenas… Mais.
Inclinei-me para lhe dar um beijo na testa e ela sorriu surpresa.
– Isso… Isso a desagrada, minha senhora, que eu tenha esse sentimento?
Envolvi-a de novo entre meus braços, apoiando o queixo em sua cabeça loira.
– Devo reconhecer Gabrielle, que me assusta um pouco, mas lhe asseguro que não me incomoda. E a você… Isto não lhe dá medo?
Senti que aqueles pequenos braços me apertavam com força a cintura enquanto Gabrielle movia a cabeça para trás e para frente. Pela primeira vez desde muitas marcas, me deu vontade de rir pelo absurdo da situação. Ri alto e apertei a loirinha que tinha em meus braços.
– Sentiria se tivesse algum sentido, acredite.
Senti-me muito melhor ao ver que os lábios de Gabrielle se curvavam em um sorriso sobre minha pele. Nenhuma das duas disse mais uma palavra até que o sol saiu e então voltamos a nos meter na cama e adormecemos, abraçadas firmemente uma à outra, sem saber como descrever o que sentíamos uma pela outra, apenas que era mais.