Fanfics sobre Xena a Princesa Guerreira

Yaz virou-se, encarando o corpo da Doutora inerte e caiu de joelhos com a sensação de derrota lhe tomando. A havia perdido. A mulher que amava não existiria mais. Não com aquele rosto e com todas as pequenas características que faziam ela ser ela.

Xena fez menção de se aproximar do corpo da Doutora, mas Yaz a impediu.

“Fique longe. Não é seguro.”

“O que você quer dizer?” perguntou Gabrielle.

“Não sei quanto tempo leva. Ela nunca me contou. Mas pode começar a qualquer momento” Yaz suspirou tentando enxugar as lágrimas que caiam insistentemente.

O corpo da Doutora começou a dar pequenos solavancos, que em choque, as três perceberam serem risadas proferidas com dificuldade.

“Uau…” era a voz de Alti “Eu realmente subestimei a quantidade de…” sua voz de calou por interrompida por um crepitar que lembrava muito o som de um fio de energia desencapado se contorcendo perigosamente. “O que é…” ela foi silenciada novamente e um cintilar dourado começou a se formar nas extremidades do corpo da Doutora aumentando gradativamente até tomar toda a sua forma, o engolfando como se fossem chamas.

Era violento, caótico e parecia excruciante. A energia regenerativa brilhava tão forte a ponto de ofuscar a visão de Xena, Gabrielle e Yaz. Os segundos foram se passando e o clarão foi diminuindo pouco a pouco até apagar, fazendo com que Yaz olhasse perplexa para a figura à sua frente.

“Você?” perguntou incerta, com medo que fosse apenas uma miragem.

A Doutora, em sua mesmíssima forma anterior, levantou-se atordoada e um pouco cambaleante, bateu a poeira das roupas e estalou a própria coluna.

“Hm…Roupas. Que bom que elas não queimaram dessa vez. Seria embaraçoso. E…” levando à mão ao próprio estômago o sentiu por alguns momentos e soltou um sonoro arroto que chegou a ecoar. “Oh, mil perdões, isso foi extremamente rude e indelicado. É isso que eu sou agora? Rude? Preciso ajustar isso.  Yaz, o tom de loiro está certo? Tem algum fio ruivo perdido aqui?” disse abaixando a cabeça e mostrando-a a uma Yasmin Khan confusa, perplexa, mas sorrindo de orelha a orelha “É, eu acho que ela se foi” disse batendo com mão na própria orelha como se tentasse tirar água do ouvido.

“Você…é você mesma. Como…? Você me disse que a regeneração mudaria tudo, cada célula do seu corpo… Eu não estou reclamando, mas eu não entendo” disse Yaz sorrindo e segurando o rosto da Doutora como se precisasse se certificar que estava tudo no lugar. Quando seus olhos encontraram os dela, e viram ali aquele olhar tão conhecido, cheio de sabedoria, de histórias, de bondade e de amor, ela teve certeza. Era ela, a SUA Doutora. Não contendo-se, atirou-se em um abraço desesperado, pendurando-se no pescoço da Senhora do Tempo como se a sua vida dependesse tipo. Permaneceram assim por alguns minutos, sentindo o alívio lhes tomar e a adrenalina baixando pouco a pouco.

“Bom, parece que a energia que gastei para recriar um corpo pra Xena deixou a minha reserva meio baixa. Eu não sabia que seu corpo era tão denso e robusto” disse olhando para Xena. “As suas células devem ser uma loucura! Em todo caso, meu ciclo de regeneração estava um pouco abaixo da ‘tampa’ se pudermos colocar desse modo. Energia o suficiente para me curar, mas não o bastante para me mudar. Estou satisfeita, gosto desse corpo, preferia ser ruiva, mas tudo bem. Gosto mais dele sem o espírito de uma xamanesa chafurdando meus interiores. É, parece que ela se foi. Não aguentou a descarga.”

“É isso? Acabou?” perguntou Gabrielle “Estamos livres de Alti?”.

“Ela sempre acha um jeito de voltar, Gabrielle” disse Xena. “Mas acho que vai demorar um pouco depois do que aconteceu aqui. Precisamos nos apressar. Ouço cavalos troteando, deve ser o exército dela chegando”.

“Aye, aye! Todos a bordo da Tardis!” disse a Doutora apontando para a cabine “O que foi isso? Eu faço piadas de pirata? Eu realmente preciso ajustar algumas coisas nesse novo velho corpo”.

As quatro entraram na cabine telefônica.

“Para onde agora, minhas senhoras?” perguntou a Doutora, com seus ânimos renovados.

“A vila Amazona é o lugar mais seguro nesse momento, o que você acha Gabrielle? Se alguma tropa remanescente de Alti vier atrás de nós, podemos contar com a ajuda do exército delas. E será um lugar seguro para…os próximos meses”.

Gabrielle sorriu levemente e assentiu, pensando no que os próximos meses significariam.  Suas emoções estavam confusas, mas não podia negar que a principal delas era alegria, ainda que precisasse ter uma conversa muito séria com Afrodite.

“Tudo bem, mas seria uma pena perder essa oportunidade. Vocês já assistiram a Aurora Boreal?”

“Uma vez, quando fomos ao território Nórdico…”

“Do Espaço?”

“O que?”

A Doutora bateu no painel da Tardis acelerando a todo vapor. Em poucos minutos estavam assistindo de camarote da porta da Tardis o espetáculo de luzes coloridas advindas das explosões solares. Xena sorriu vendo os olhos de Gabrielle brilhar. Sabia o que a sua barda estava pensando.

“Ótimo material para suas histórias, não é?” disse beijando a cabeça de Gabrielle e deixando que ela se aninhasse em seu abraço.

“Eu não sei nem por onde começar o próximo pergaminho”.

Xena afastou-se um pouco, deixando Gabrielle e Yaz sentadas na porta da Tardis com seus pés balançando para fora no Espaço, como duas crianças encantadas pelo espetáculo. Ela caminhou devagar até o console central, para onde a Doutora havia retornado há poucos minutos.

“Obrigada por nos ajudar.” Disse pigarreando um pouco “Eu passei os últimos anos da minha vida tentando fazer tudo para ajudar as pessoas e com isso expiar meus erros do passado. Algumas vezes esqueci que é necessário aceitar ajuda também. Vocês vieram na hora certa”

“É o meu trabalho. Eu entendo um pouco sobre horas…” brincou a Doutora “Mas eu entendo a sensação.”.

“Não, não acho que entenda. Você acharia a Xena antiga detestável. Eu fiz coisas que… Não são reparáveis. Eu agradeço por ter me trazido de volta para que eu possa cuidar de Gabrielle, mas não sei se sou realmente digna de estar viva. Acho que nunca saberei”.

“Há alguns séculos, em um confronto, quando eu tinha um corpo diferente e um rosto diferente, me disseram que não precisavam me temer, porque homens bons tem regras demais. Sim, eu já fui homem. Por várias vidas na verdade, preciso rever minhas escolhas” disse fazendo uma careta engraçada “De todo modo, minha resposta foi que homens bons não precisam de regras, e não era sábio quererem saber por que eu tinha tantas. Quando você olha esse rosto que eu tenho agora, você não consegue entender o olhar cansado e sem esperança que ele já teve. Xena, a conquistadora de nações…pirata…saqueadora…causadora do incêndio em Higuchi…”

“Então você sabe…”

“Eu demorei um pouco para me lembrar. Essa cabeça está tão cheia de números, fórmulas, fatos, histórias, códigos…São…mais de mil anos de acúmulo… Mas eventualmente me lembrei. Você não se acha digna…porque cometeu erros. Por causa de Cirra e de Higuchi principalmente. Sim, os pergaminhos de Gabrielle chegaram longe, as histórias foram contadas.” A guerreira baixou os olhos, sentindo a vergonha lhe tomar, mas não disse nada, deixando que a Doutora continuasse “Xena… eu reduzi o meu planeta natal e a minha própria espécie às cinzas para exterminar os meus inimigos. Um planeta inteiro, de seres como eu e com toda a minha família. E eu fugi. Fugi por anos luz, até que fugir não foi mais uma opção. Eu tentei apagar da minha memória até perceber que qualquer rosto que eu viesse a ter, ainda carregaria o pesar das escolhas que eu tive que fazer na Guerra do Tempo.”

“Qual o segredo? Como você vive com esse tipo de escuridão? Tão grande a ponto de atordoar até mesmo o espírito de Alti… Eu queria saber, porque às vezes se torna tão difícil e ela…” disse acenando para Gabrielle com a cabeça “É o único motivo de eu continuar, a minha luz… mas ainda assim eu sinto medo todos os dias de ser… demais para ela.”.

“Eu não tenho nenhuma outra escolha a não ser seguir em frente me certificando de que ninguém mais precise fazer escolhas como as minhas.  Alti estava certa: não há descanso para os maus, então tudo que resta é fazer o bem exaustivamente. Sem atalhos que levem a um caminho mais fácil”.

“Morrer não é exatamente fácil. Eu passei por isso algumas vezes” disse ela rindo com amargura.

“Não tive esse privilégio.” riu a Doutora.  “Sabe, sem a sua escuridão você não seria você e tampouco conheceria luz. Se você tivesse tomado um caminho diferente lá atrás, a Xena que fez todas as coisas incríveis e que salvou tantas pessoas sobre a qual Gabrielle escreveu não existiria hoje”.

“Gabrielle é a razão de eu ter feito todas essas coisas. Não é meu mérito”.

“Às vezes tudo que a gente precisa é disso, de uma razão para não desistir de continuar consertando as coisas. Eu nunca terei uma…alma gêmea? É disso que vocês humanos chamam? Ao meu lado…  Mas eu tive várias ‘razões’ para continuar. Nem sempre foi fácil vê-los partir, ou ter de deixá-los…muitas cicatrizes…  Mas cicatrizes te fazem lembrar de porque você as ganhou em primeiro lugar. Se for por um motivo que faça eles terem esperança, então é válido.”

“E ela?” disse Xena, acenando com a cabeça para onde Yaz estava, rindo ao lado de Gabrielle enquanto trocavam histórias.

“É tão óbvio assim?”

“Absurdamente. Você devia prestar atenção ao rosto dela, quando ela olha para você”.

“Não seria justo. Ela…não precisa de uma cicatriz. Eu tenho todo o tempo do mundo. Ela, apenas algumas décadas. Não é justo que as passe ao meu lado.”.

“Você está tentando preservar ela, ou se autopreservar?” Perguntou Xena, mas a Doutora se calou. “Não a subestime. Foi o meu maior erro com Gabrielle. E no fim do dia, você tem dois corações. Para que propósito serviriam sem poder amar?” A Doutora sorriu triste, e resignada, sem ter o que responder.

“Enzimas digestivas” disse por fim.

“O que?”

“Uma das funções dos corações.”

“Cala a boca” disse Xena rindo. “Você sabe que eu não faço ideia do que isso significa”.

Nota