Xena manteve o olhar fixo em Laura, a intensidade em seus olhos inabalável.

– Vamos lá, Laura. Como se mata um vampiro? – insistiu, a voz baixa e cortante.

Laura, engolindo em seco, sentiu o olhar de todos sobre si.

– Com uma estaca no coração… e cortando a cabeça – respondeu finalmente, a voz quase um sussurro. O ambiente pareceu ficar ainda mais denso após suas palavras.

Gabrielle, observando de longe, percebeu a tensão nos ombros de Xena aumentar. Carmilla desviou o olhar e seu corpo enrijeceu como se a revelação a tivesse ferido de alguma forma.

– Mas por que você quer saber disso? – Laura perguntou.

Xena sorriu de lado, um sorriso sem humor, e balançou a cabeça levemente.

– Porque acho que o nosso “amigo” aqui – disse Xena, virando-se para Malik – não é tão diferente de você, Carmilla.

Malik, ainda na sombra, ergueu uma sobrancelha, o sorriso sarcástico se alargando em seus lábios pálidos.

– Você está dizendo que… – começou Laura, mas Xena a interrompeu.

– Estou dizendo que acho que Malik é um vampiro – Xena afirmou. Ela então voltou seu olhar desdenhoso para o caçador, que os observava, ainda imerso em sua aura de arrogância – e, claro… – Xena deu um passo à frente, a espada em mãos – como é que você faz isso? – continuou ela, um tom de curiosidade sarcástica na voz – Como é que você consegue virar uma fumaça?

Malik riu baixinho, o som soando como um trovão distante na noite silenciosa.

– Ah, Xena… existem segredos que você jamais entenderia – ele respondeu, com um brilho malicioso nos olhos – a escuridão concede muitos presentes àqueles que a servem de bom grado.

Xena apertou a empunhadura da espada, seu sorriso desaparecendo, deixando apenas o olhar determinado. Ela sabia que estava diante de um inimigo mais perigoso do que imaginara, mas, como sempre, isso apenas a instigava mais.

 

****

 

Laura sentiu seu coração acelerar. Uma lembrança – algo que ela havia lido no livro de runas. Suas mãos tremeram levemente, e seus olhos se arregalaram enquanto sua mente fazia conexões.

– Espera… – ela murmurou, chamando a atenção de todos.

Xena olhou para ela, ainda segurando a espada firme. Gabrielle deu um passo à frente, enquanto Carmilla fixava seu olhar em Laura.

– Eu me lembro de algo, no livro de runas – Laura começou, sua voz ganhando força à medida que as palavras surgiam – existe um feitiço, algo que pode conter uma criatura como Malik. Eu não tinha certeza antes, mas agora… – ela olhou para todas, especialmente para Xena – nós quatro temos um vínculo. Um poder que vai além do físico.

– O que você está dizendo? – perguntou Gabrielle, seus olhos se estreitando enquanto tentava acompanhar a linha de raciocínio de Laura.

– Somos almas gêmeas, de diferentes formas. Eu e Carmilla, você e Xena – Laura continuou, sua voz ganhando mais confiança – esse vínculo, essa conexão, pode prendê-lo em uma forma física. Se fizermos isso juntas, com nosso poder, poderemos mantê-lo aqui tempo suficiente para matá-lo.

Xena arqueou uma sobrancelha, seus lábios curvando-se em um sorriso incrédulo.

– Você está sugerindo que o derrotemos… com amor? – Xena perguntou, mais uma afirmação do que uma dúvida.

– Sim – Laura assentiu – o feitiço exige essa força compartilhada, nossa ligação, para mantê-lo numa forma sólida, sem poder desaparecer como fumaça. E então, podemos matá-lo de uma vez por todas.

Carmilla trocou um olhar rápido com Xena e Gabrielle, a relutância evidente em seu rosto.

– E se não funcionar? – Carmilla perguntou, sua voz mais sombria.

Laura segurou a mão de Carmilla firmemente.

– Vai funcionar. Precisamos acreditar nisso. É a única chance que temos.

 

***

 

Os olhos de Malik brilhavam com uma mistura de ódio e descrença. A ideia de ser derrotado pelo poder do amor parecia absurda demais para ele. Quando Laura falou sobre o plano, a sugestão do poder compartilhado das quatro para prendê-lo em uma forma física, Malik soltou uma gargalhada amarga.

– O quê? – ele zombou – vocês acham que esse papo de “poder do amor” vai me deter? – ele balançou a cabeça, incrédulo – vocês, criaturas patéticas, acham que podem me conter? Eu, Malik, que servi ao próprio Lúcifer, que rasguei o véu entre o mundo dos vivos e o inferno com minhas próprias mãos?

Xena o encarou com um sorriso cínico, sua espada ainda firmemente em suas mãos, como se a zombaria de Malik não fosse nada além de ruído. Laura, por outro lado, ficou imóvel por um instante, os olhos presos nos de Malik, como se buscasse um resquício de dúvida no vampiro. E encontrou.

– Você ri porque está com medo – Laura disse, sua voz baixa e firme – você ri porque, no fundo, sabe que há algo que não entende aqui. Que há uma força que você, com toda a sua arrogância, não consegue compreender.

Malik arregalou os olhos, surpreso com a confiança repentina de Laura. Seu sorriso insolente vacilou por um segundo, mas logo foi substituído por mais desprezo.

– Você acha que, por amar uma vampira, encontrou algum tipo de força especial? – ele disse, seus olhos escurecendo com a ameaça de um novo ataque – o que o amor de vocês pode contra mim? Vocês são apenas brinquedos, peças frágeis no tabuleiro de Lúcifer. Eu já vivi séculos e vi almas como as suas serem destruídas por muito menos.

Xena riu em resposta, uma risada fria, enquanto olhava de Malik para Gabrielle, que agora estava ao seu lado, ombro a ombro.

– Você realmente acha que nunca enfrentamos algo assim antes? – Gabrielle perguntou, sua voz cheia de confiança – o amor, Malik, é algo que você nunca vai entender. E é por isso que ele pode te destruir – ela virou-se para Laura – faça isso, agora.

Laura, ainda segurando a mão de Carmilla, começou a murmurar as palavras que se lembrava do livro de runas, tentando manter a concentração. Gabrielle e Xena se juntaram a elas, formando um círculo ao redor de Malik, enquanto o ar ao redor parecia ficar pesado, quase palpável. Malik tentou avançar, mas, com cada palavra dita, parecia mais preso ao chão, como se forças invisíveis estivessem se enredando nele, puxando-o para baixo.

– Vocês… estão brincando com o impossível! – Malik gritou, tentando se desfazer em fumaça, mas a transformação falhou. Ele olhou para seu corpo, os olhos arregalados – não pode ser…

– Pode sim – disse Gabrielle, com voz exultante – porque você subestimou o que não entende.

O poder compartilhado entre as quatro começou a se manifestar fisicamente. Uma luz fraca brilhou em torno delas, e Malik, antes zombeteiro, agora se contorcia, tentando escapar, mas sem sucesso.

– Está vendo, Malik? – Xena provocou, a satisfação se espalhando em sua voz – o sentimento que você despreza está te prendendo aqui, em carne e osso. 

Malik lançou um último olhar de ódio, mas também de incredulidade, percebendo tarde demais o erro que havia cometido.

– Vocês vão… se arrepender… – ele balbuciou, enquanto seu corpo era finalmente imobilizado, as sombras em torno dele desaparecendo.

Xena apertou o punho da espada e olhou para Laura.

– Agora, sabemos o que fazer, não é? – ela perguntou, com um olhar afiado.

Laura assentiu lentamente, o medo ainda presente. Malik, antes intangível, agora estava preso, vulnerável. Laura, Carmilla e Gabrielle recuaram quando Xena, num movimento rápido e preciso, levantou a espada. A lâmina cortou o ar e atingiu o pescoço do vampiro, decapitando-o em um único golpe. A cabeça rolou pela varanda enquanto o corpo de Malik cambaleava e caía ao chão, ainda contorcendo-se em espasmos, sangue jorrando do seu pescoço. Um grito gutural escapou de seus lábios decapitados, ecoando pela noite como um aviso do inferno.

– Ele ainda está vivo! – gritou Laura, os olhos arregalados de horror.

Gabrielle, alarmada, olhou ao redor em busca de algo para terminar o que Xena havia começado. Então, seu olhar caiu sobre a bota de Malik, onde a silhueta de uma estaca se desenhava. Sem pensar duas vezes, ela correu até o corpo do vampiro e pegou a arma de madeira.

Com uma determinação feroz, Gabrielle posicionou a estaca sobre o coração de Malik, que ainda se contorcia no chão. Com um grito de força, ela a enfiou profundamente em seu peito. O corpo de Malik parou de se debater imediatamente, seus olhos se apagando, a sombra da vida – ou do que restava dela – deixando-o de uma vez por todas.

O silêncio caiu sobre a varanda. Malik estava morto.

Xena abaixou a espada, respirando pesadamente, enquanto Gabrielle, largando a estaca ensanguentada, caía para trás, exausta. Carmilla e Laura observavam em choque, absorvendo o que acabara de acontecer.

– Isso foi… – murmurou Laura, sem conseguir completar a frase.

– Foi necessário – Xena respondeu friamente – não havia outra maneira.

 

***

 

Xena voltou-se para Carmilla, sua expressão intensa e cheia de indignação. A raiva pulsava em seu olhar.

– O que você estava pensando? – disse Xena, a voz dura como aço – não seja tão leniente com a segunda chance que recebeu. Você não pode simplesmente se entregar assim. 

Carmilla, ainda atordoada, tentou falar, mas Xena a interrompeu.

– Você não pode deixar a pessoa amada para trás achando que está fazendo o certo. Nós passamos por tanta coisa para chegar até aqui, e você realmente iria jogar tudo isso fora na primeira oportunidade?

Carmilla encolheu-se perante a interpelação de Xena. A guerreira continuou, a emoção se intensificando.

– Você merece mais do que isso, Carmilla. Não pode jogar sua vida fora assim, não após tudo que Laura suportou para trazê-la de volta.

Carmilla sentiu o coração apertar.

– Eu não queria mais que vocês se machucassem – Carmilla finalmente conseguiu murmurar, a vulnerabilidade exposta em seu tom.

– E você acha que se sacrificar resolveria isso? – Xena respondeu, mantendo a firmeza, mas suavizando um pouco o tom – você precisa lutar por você mesma, Carmilla.

Laura se aproximou, colocando a mão gentilmente no ombro de Carmilla, como se quisesse ancorá-la em meio ao turbilhão emocional.

– Nós estamos aqui, juntas – Laura disse, sua voz suave – não precisa fazer isso sozinha. Você não está sozinha.

Carmilla ergueu os olhos para Laura e assentiu. Xena olhou para as duas, sentindo a conexão intensa entre elas, um sentimento que ela reconhecia, pois também estava presente em sua vida.

– Lute por sua vida, Carmilla – disse a guerreira – e por aqueles que você ama. Essa é a verdadeira batalha – voltou os olhos para Gabrielle e encontrou um sorriso de compreensão.

 

***

 

Gabrielle estava sentada na varanda. As páginas estavam cheias de palavras escritas de forma apressada. O cheiro do papel era reconfortante, e ela sorria enquanto ela revisava o que havia escrito.

Xena apareceu, uma expressão curiosa no rosto. 

– O que você está escrevendo? Uma história sobre vampiros? – perguntou, com um tom de brincadeira.

Gabrielle olhou para cima, um sorriso brincando em seus lábios.

– Vampiros? Já tive vampiros demais por uma vida inteira – respondeu, balançando a cabeça – desta vez, resolvi escrever sobre algo completamente diferente. Estou contando a história de um jardineiro que descobre um antigo pomar abandonado e decide restaurá-lo. É sobre como ele encontra beleza e esperança nas coisas simples da vida.

Xena ergueu uma sobrancelha, intrigada. 

– Um jardineiro? E o que mais acontece?

Gabrielle se iluminou, sua paixão pela história evidente em seus olhos.

– Bem, enquanto ele cuida do pomar, ele também começa a se conectar com a comunidade local, ajudando a unir as pessoas em torno da natureza. Ele descobre que a verdadeira beleza não está apenas nas flores que ele planta, mas nas relações que forma e nas histórias que elas trazem. É uma reflexão sobre como a natureza pode curar e inspirar. 

Xena sorriu, apreciando a mudança de tom. 

– Parece uma história cheia de vida, diferente do que costumamos enfrentar. Estou ansiosa para ler. 

Gabrielle olhou para o caderno, um brilho de determinação em seus olhos.

– Às vezes, precisamos nos afastar do sobrenatural e encontrar a magia nas coisas cotidianas, não é?

 

FIM

Nota