Capítulo 3
por Officer KirammanEla não sabia se o tempo havia passado de uma maneira mística que estivesse relacionada ao encanto de Afrodite ou se era a sua própria percepção de tempo que estava alterada. Sabia através das luas que havia algumas semanas que haviam partido da Bretanha, após entregar Esperança ao cavaleiro, mas talvez sua própria apatia não a fizesse sentir o tempo passando normalmente. Dormir era uma tarefa difícil, mas eventualmente era vencida pela exaustão e apagava, geralmente como resultado de algum chá de alguma erva milagrosa que Xena lhe preparava.
Mas nessa ocasião, foi diferente. Quando acordou, com a cabeça pesada e os olhos nublados após outra noite mal dormida, percebeu que algo estava diferente. Xena não estava ali, o cenário havia mudado e tudo começou a ficar estranho novamente. Muitas cabanas estavam abandonadas, colheitas haviam sido queimadas e tudo que restava era uma terra arrasada. Parou em frente aos portões de um local que lhe era familiar, estava na vila amazona.
-Afrodite? – chamou Gabrielle.
A deusa apareceu com um semblante triste.
-O que está acontecendo? – inquiriu Gabrielle um pouco receosa.
-Oh, minha pequena, você realmente não se lembra?
-Lembrar? Eu não sei…está tudo confuso. O que eu preciso lembrar?
-Ela se chamava de nêmesis. Estava obliterando tudo que encontra, mortal ou divino.
-A sua família?
-Não, eles fugiram. Entraram num vórtex e foram parar em uma realidade alternativa. Ares resmungou por dias que não fugiria como um rato, mas no fim das contas foi vencido pelo próprio medo. Eu fiquei… por sua causa.
-Você me mandou ler os pergaminhos para eu encontrar Xena, e eu voltei para o passado…Eu estava com Xena, mas de algum modo a perdi novamente. Afrodite, minha cabeça dói… Eu não estou entendendo mais nada.
Afrodite saiu da frente de Gabrielle e os portões da vila Amazona se abriram. Uma das amazonas conduziu Gabrielle até a cabana funerária da vila. Lá, o corpo de Xena repousava. Os olhos de Gabrielle arderam enchendo-se de lágrimas.
-Não…não pode ser. O que aconteceu? Por que eu não me lembro? Xena…
-Ela precisou lutar contra nêmesis… Ela se sacrificou para…te salvar Gabrielle.
-Quem é nêmesis? É uma deusa? Um titã?
-Ela é sua filha, Gabrielle.
Nesse momento a porta da cabana explodiu, revelando uma figura completamente monstruosa, o rosto desfigurado era carregado do mais puro ódio, deixando apenas uma pequena lembrança da aparência que um dia poderia ter.
-Olá mamãe.
-E-Esperança? Você é nêmesis?
A entidade soltou uma risada monstruosa como se verdadeiramente deleitasse com a confusão presente nos olhos de Gabrielle.
-O que achou que aconteceria? Você me abandonou para ser morta por um estranho quando eu era apenas um bebê indefeso, mas meu pai nunca permitiria que isso acontecesse. Poderíamos ter ficado juntas mamãe, mas agora eu sei que seus instintos maternos nunca existiram. Sua lealdade sempre seria para com a vadia guerreira.
Esperança ergueu as mãos prestes a lançar uma bola de fogo em direção à Gabrielle, mas antes que ela pudesse acertá-la, Afrodite a transportou para outra cabana.
-Os pergaminhos, Gabrielle, use os pergaminhos.
Gabrielle virou sua sacola de viagem em cima de uma mesa, buscando um pergaminho qualquer que pudesse tirá-la dali.
-Rápido, ela está vindo – suplicou Afrodite. – Use qualquer um deles.
Gabrielle pegou o primeiro rolo de couro em sua frente e começou a ler as linhas de maneira apressada, com os olhos borrados pela própria adrenalina.
Em poucos segundos seu corpo foi arrebatado para uma nova realidade. Estava na aldeia dos Centauros, numa cabana, abraçando uma menina de cabelos e olhos claros, que ela reconhecia ser Esperança com aproximadamente 11 ou 12 anos.
Gabrielle suspirou com exaustão e frustração, tentando se livrar do sentimento nublado que pairava em sua cabeça agora. Entendeu que apesar de estar transitando em diferentes linhas temporais já vividas, os pergaminhos eram a constante daquela viagem. Eles não eram alterados pelas decisões que tomava, Afrodite havia se certificado disso.
Lembrou-se de como abraçou aquela criança no passado, cheia de pesar e culpa diante da história de abandono que a menina lhe contara, mas agora seu sentimento era outro.
Não podia dizer que o pesar ainda não estava ali, mas diante da memória anterior e de todo conhecimento que detinha agora, sabia o que precisava fazer. Não doeria menos dar o veneno para a pequena Esperança, mas a percepção do que ela se tornaria fazia sua determinação ser menos frágil que no passado. Talvez algo bom pudesse sair disso afinal, Solan ainda estaria vivo, Callisto ainda seria derrotada e Xena estaria bem.