Fanfics sobre Xena a Princesa Guerreira

    Capítulo 2

    Verônica abriu a porta e meteu a caixa, a areia, o poste para arranhar, e a bolsa de brinquedos dentro. “Tabitha, venha cá pequena bola de pêlos, trouxe brinquedos para você”. Sentou-se no chão e tirou os diversos artigos. O alaranjado e branco gatinho chegou e se jogou em cima da alta humana para ver o que esta estava lhe mostrando. Recostou-se e observou enquanto os pacotes foram abertos e os ratos falsos, bolsas para gatos morderem, e os diversos brinquedos foram lançados em uma pilha. “É tudo, veja?”, disse, esperando que o felino saltasse na pilha e brincasse. Tabitha fez o que qualquer gato faria, passou por trás da pilha de brinquedos para gatos e começou a brincar com os papéis vazios. “Hei, os brinquedos estão aqui”. Agarrou a pequena bola que tinha uma campainha escondida dentro e a sacudiu para conseguir a atenção do gato. “Viu? Brinquedos aqui, lixo ali”. Tabitha olhou para a pilha, olhou os papéis de embrulho, e voltou a brincar com o plástico transparente.

    “Bom, será dessa maneira, veja se me importo”, a desanimada mulher disse, metendo os papéis na bolsa de plástico. “Trouxe-lhe uma caixa, e areia também, acha que pode usar isso?”.

    “Mrrow?”.

    “Foi o que eu pensei”. Colocou-se de pé, metendo a bolsa de areia debaixo do braço, a caixa do gato debaixo do outro e se dirigiu à cozinha. “Setenta e cinco dólares nos brinquedos e a estúpida coisa quer brincar com os pacotes nos quais eles vieram”. Colocou a bolsa e a caixa na mesa. Em uma nota suspensa na geladeira com um imã, Maria lhe dizia que havia ido embora e junto a esta, havia instruções de quanto tempo deveria ficar no microondas, o jantar que ela havia preparado.

    O esgotamento lhe pedia para parar e descansar, mas havia ainda muitas coisas que deveriam ser feitas. Rapidamente encheu a caixa de areia e a colocou na área de serviço, deixando a porta entreaberta de modo que Tabitha pudesse ir e vir livremente. Após fazer essa tarefa, Verônica a passos largos se dirigiu até a sala, pegando o telefone sem fio pelo caminho e digitando o familiar número.

    “Seguros Cartwright, em que posso lhe ajudar?”. A suave voz feminina no outro lado da linha perguntou.

    “Susan Carwright, por favor”.

    “Ela está ocupada agora, posso perguntar quem está falando?”.

    “Verônica Cartwright. Interrompe-a, isto é importante”.

    “Um momento”. Ouviu um ‘clic’ seguido pelo aborrecido som musical de espera que jamais havia escutado. Jogando-se em seu sofá de suave pele marrom e tirando os sapatos, meteu seus pés debaixo de si mesma. Tabitha saiu da cozinha e subiu a seu lado.

    “Mrrow?”.

    “O que você quer?”. Perguntou esticando sua mão livre para esfregar atrás das orelhas do gato. “Vamos chegar a um franco acordo desde o principio, OK? Comprei um poste para você arranhar. Os dez mil dólares do sofá estão fora do limite para suas garras, entendeu?”.

    “Mrrow”. O alaranjado e branco felino colocou seu corpo em cima da coxa de Verônica e começou a ronronar.

    “Ronnie, como você está?”.

    “Bem. Irmã escuta, eu preciso que agregue nas listas de seguro um empregado”.

    “Normalmente recursos humanos envia os papéis deles quando alcançam o serviço apropriado marcado”. Verônica ouviu o som do teclado. “Qual é sua razão social?”.

    “Ela não está no computador ainda, Susan. Preciso que agregue e pressione para terminar os papéis”.

    “Ela tem que estar no sistema. Todos os empregados são agregados uma vez que tenham completado seu I-9’s e W-4’s”.

    “Ela não os completou ainda. É uma empregada nova”. Verônica ouviu o som parar e o barulho do movimento da cadeira de sua irmã.

    “Em que departamento ela trabalha?”.

    “Um… ela é uma auxiliar no escritório de contabilidade do centro”.

    “Uma novata? Ronnie, não sabe que eles têm que ter seis meses de serviço antes que lhes demos benefícios?”.

    “Não me dei conta disso”. Esfregou sua testa, tirando um protestante ronronante monte de pelúcia de sua perna.

    “O que foi isso?”.

    “Estou cuidando do gato de uma amiga por alguns dias. Olha, a contratei pessoalmente, e lhe prometi benefícios completos. Não pode pressionar para isso?”.

    “É raro que minha única irmã me peça um favor. Com certeza posso. Envia-me por fax seus dados e a agregarei as listas”.

    “Realmente Susan, preciso que você me envie por fax os papéis para que ela assine. Também preciso que dê a ela o melhor plano médico que temos e a coloque com data retroativa para o primeiro dia do mês. Pode fazer isso?”.

    “Vai lhe custar…”. A irmã mais jovem disse com uma voz melódica. “Jantar com mamãe na próxima sexta-feira?”.

    “Não posso só lhe comprar um carro novo ou algo assim?” A executiva gemeu.

    “Verônica Louise, nunca passa muito tempo com mamãe. Jack e eu jantamos com ela todas as sextas à noite e Tommy nos domingos. Ela sempre pergunta de você”.

    “Sabe meu número de telefone, Susan. Falo com ela”.

    “Eu sei. Ouvimos que você há duas semanas ligou para ela para lhe dar parabéns por seu aniversário. Raro, não? Isso foi há um mês”.

    “Está bem, está bem. Mande-me por fax todos os papéis e os devolverei mais tarde a noite”.

    “Então nos vemos na próxima semana com mamãe?”.

    “Certo. Estarei lá, mas não espere que eu fique depois do jantar enquanto ela passeia através do álbum de família e tenta voltar a viver nossa infância”.

    “Pelo menos estará lá. Isso a faz feliz”.

    “O que seja. Mande-me o fax. Vai fazer agora?”.

    “Estarão aí em alguns minutos. Gostaria de saber por que você empregou pessoalmente alguém para um trabalho, uma novata”.

    “Irmã, se eu pensasse que você precisava saber, eu lhe diria. Foi bom falar com você também, adeus”. Verônica apertou o botão de apagar o telefone e o deixou debaixo na mesinha de café. “Bem Tabitha, tudo está acertado. O que você acha de pular para baixo e brincar com alguns de seus brinquedos enquanto eu durmo um pouco, hem?”. Tentou acotovelar o felino, mas o ronronante monte de pêlos se negou a mover-se. “Bom será do seu jeito”. Ajustou o extremo da almofada e fechou os olhos. A princípio o rítmico ronronar lhe incomodou, mas em poucos minutos Verônica estava profundamente adormecida, como também estava uma muito satisfeita Tabitha.

    ********

    Rose, estava acordada, mas obviamente sentia muita dor quando Verônica voltou ao hospital. “Olá”.

    “Olá, Rose. Como você se sente?”. Deixou sua maleta no sofá e colocou a cadeira ao lado da cama.

    “Tudo dói, mas exceto por isso estou muito bem”, brincou.

    “O medicamento que eles estão lhe dando não está ajudando?”.

    “Eles me colocam para dormir, mas sim. É a única coisa que acalma a dor”, respondeu, alisando a manta que a cobria.

    “Trouxe alguns formulários que preciso que assine. Os preenchi da melhor maneira que pude, mas não sabia todas as respostas”. Tirou um folder cor manila¹ da maleta e o colocou sobre a cama. “Nunca imaginei quantos papéis teria que se preencher para contratar alguém”. Deu-lhe uma caneta e se surpreendeu ao ver Rose pegá-la com sua mão esquerda. “Você é canhota?”.

    “Sim”.

    “Eu também”, sorriu. “Só precisam de sua assinatura nas três primeiras. As outras têm alguns espaços em branco que você precisa preencher”.

    “Sabe, eu ainda não posso acreditar, que a senhorita esteja justamente me dando um trabalho, especialmente dadas às circunstâncias de que eu não posso trabalhar”, Rose disse, movendo sua cabeça. “Isto não tem nenhum sentido”.

    “Faço muitas coisas que não têm nenhum sentido, só tem que perguntar a minha mãe”.

    Rose assinou os formulários silenciosamente antes de devolver a caneta. “A senhorita é próxima de sua mãe?”.

    “Não exatamente. Temos algumas diferenças de opiniões sobre como devo viver”. Duvidou por um momento antes de decidir falar sobre o assunto que estava surgindo em sua mente. “E sobre sua família? Não se dá bem com eles ou algo assim? Quero dizer, me parece estranho que não quisesse que soubesse que estava no hospital”.

    Os olhos verdes se desviram se fixando nas persianas que cobriam a janela. “Era um bebê quando eles morreram. Um acidente automobilístico. Um motorista bêbedo passou um sinal vermelho e os atropelou. Isso é tudo o que sei”.

    “Sinto muito, não imaginei”. Sentia-se mal por ter tocado no assunto.

    “Tudo bem”, a jovem mulher disse descartando com um movimento de sua mão. “Não me lembro deles. Acho que não posso sentir falta do que nunca tive”. Rose tentou parecer indiferente sobre isso, mas Verônica suspeitou que era uma dissimulação para seu benefício.

    “Quem lhe criou?”.

    “O Estado. Algumas famílias adotivas, mas, sobretudo vivi em orfanatos dirigidos pelo Estado ou em lares. Logo que me formei no ensino médio consegui um emprego trabalhando como empacotadora. Estou só desde então”. Não desejando continuar com o assunto de seu passado, Rose mudou de assunto. “E como está Tabitha?”.

    “Está muito bem. Ela gosta de ronronar muito”.

    “Humm, isso indica que ela é feliz”, Rose respondeu. “A senhorita deve ser boa com os animais”.

    “Não sei. Esta é a primeira vez que tenho um”.

    “A senhorita nunca teve uma mascote quando era criança?”.

    “Não. Meu pai era alérgico aos gatos e minha mãe tinha medo de que um cachorro pudesse destroçar a casa. Como terminou com Tabitha?”.

    “Oh”. Esticou a mão para pegar um copo de água e obteve assim a ajuda de Verônica. Tomou um longo gole do fresco líquido antes de responder. “A encontrei, ou melhor, ela me encontrou. Estava caminhando para casa uma noite e ela apareceu saindo do nada. Só pele e ossos. Me seguiu até em casa. Desde então está comigo”. Uma temerosa olhada apareceu em seus olhos. “O senhorio não a viu, a viu? Ele acha que eu não tenho nenhuma mascote”.

    “Na verdade… ele veio até o andar debaixo enquanto eu estava lá”.

    “Oh, não”. Uma preocupada olhada cobriu a cara da jovem mulher. “Ele foi amável?”.

    “Em absoluto”, Verônica respondeu. “Ele parece pensar que a palavra ‘merda’ é um adjetivo e que deve ser usada cada vez que ele abre sua pequena asquerosa boca”.

    “O que ele disse a senhorita?” O temor era evidente em sua voz.

    “Nada que você agora precise se preocupar”.

    “Ele me chutou a ponta-pés, não foi?” Se para a executiva isso nunca seria considerado uma grande perda para a jovem mulher a notícia obviamente a estava deixando transtornada.

    “Rose não se preocupe com isso, por favor, prometo que tudo ficará bem”. Olhou seu relógio. “Vamos, acho que Jeopardy começará logo. Nos recostaremos e veremos quem consegue mais respostas corretas, OK?”.

    “Eu gosto de Jeopardy”, disse Rose, pressionando o botão para levantar um pouco a cabeceira da cama. “Há uma TV na sala dos empregados no trabalho e às vezes durante meu descanso na hora do jantar, as sete e meia, posso assistir. Sou bastante boa também, embora não sei se que consigo ficar acordada durante tanto tempo”.

    “Oh, quer que eu vá embora para que você possa dormir um pouco?”.

    “Não”. Alcançou a mão de Verônica. “Por favor, fique”.

    “Tem certeza? Só não fique triste se eu conseguir mais respostas corretas. Ninguém gosta de jogar comigo Trivial Pursit”.

    “Oh, a senhorita tem um desses? É um jogo tão divertido. O joguei uma vez no centro comunitário”.

    “Farei um trato. Vou trazê-lo amanhã para que joguemos e prometo não ganhar muitas vezes”.

    “Veremos quem vai ganhar de quem”, Rose contra atacou com um sorriso. A abertura musical atraiu sua atenção à televisão. “Ooh, está começando”. Colocou sua cabeça novamente em seu travesseiro para assistir ao programa, mas antes do primeiro intervalo já estava adormecida. A executiva de cabelo escuro arrumou suavemente a manta de Rose e desligou a televisão.

    Ficou sentada ali por vários minutos olhando o grande molde e os pontos que formavam uma linha na maçã do rosto da jovem mulher.

    “Sinto muito”, sussurrou antes de sair do quarto.

    ********

    Tabitha estava esperando nada paciente na porta quando Verônica voltou para casa.

    “Mrrow!”.

    “O que foi? Você tem comida”.

    “Mrrow!”.

    “Tem brinquedos e tem alimento. O que mais quer?”. Tabitha respondeu se esfregando contra a perna de Verônica, deixando pêlos alaranjados e brancos por toda a calça preta da executiva. Esta se abaixou e pegou o felino, e ao que parece girando o botão de ronronar ao mesmo tempo. Segurou o gato feliz com um braço e a maleta no outro. “Quer ver como a máquina do fax trabalha? Vamos”.

    O escritório de Verônica estava no primeiro andar próximo às escadas. Os formulários foram enviados pelo fax cinco minutos mais tarde e a mulher de cabelo escuro se dirigiu para o andar de cima para trocar-se por roupas ‘mais cômodas’, um jeans e um suéter esportivo largos. Deu uma olhada em seu relógio e gemeu. Teria uma reunião logo pela manhã e tinha ainda que repassar os relatórios mensais. “Acho que vai ser uma longa noite, Tabitha”. Arrastou-se até sua mesa e ligou seu computador, apavorada com a idéia de ter que passar as próximas horas flutuando sobre as folhas dos balanços e os relatórios. Certamente, os chefes de cada divisão, fariam a mesma coisa com ela amanhã de manhã, mas Verônica se orgulhava de saber exatamente como bem ou mal estava cada departamento antes de ouvir a versão lustrada de seus parentes. Um aperto no botão do power e o computador ascendeu à vida. O logotipo corporativo de Cartwright cobriu a tela de vinte polegadas. Digitou sua contrasenha e o logotipo desapareceu, revelando a tela principal.

    “Mrrow?”.

    “Não. Isto é uma coisa humana, não há nada aqui em cima para você ver”. Disse ao ansioso gato que estava parado sobre suas patas traseiras na expectativa de ser levantado. Tabitha estendeu suas garras dianteiras nas calças cinzas de Verônica. “Nem sequer pense em se aproximar disto”.

    “Mrrow?”.

    “Não. Vá brincar com seus brinquedos”. Girou sua atenção ao primeiro relatório, Cartwright Real Estate. Tommy o irmão mais novo de Verônica estava no comando dessa divisão. Vários terrenos haviam sido comprados ao longo da região antes da urbanização para a construção de várias casas, mas estas estavam seriamente atrasadas em seus crescentes projetos. O calendário pedia que cem lares fossem construídos e vendidos, só que até o fim do mês passado só haviam sido construídos vinte e somente a metade destas tinham ofertas para serem vendidas por menos da metade do valor. “O que vou fazer com ele?” Recostou-se na confortável pele de sua cadeira e esfregou os olhos. O movimento pareceu ser um aberto convite a Tabitha, quem rapidamente saltou sobre seu colo. “Vamos, não posso trabalhar se você ficar aqui”. Suavemente pegou o ronronante animal em seus braços e o deixou no chão. “Vá brincar”.

    O relógio abaixo no canto direito do computador marcava 2:53 AM no momento em que Verônica se levantou e desligou a máquina esta noite. Saiu do quarto principal para ligar o alarme da noite quando viu o talão de cheques de azul vinil marinho sobre a mesa da entrada ao lado dos livros da biblioteca. Sua consciência dizia para não olhar, os assuntos financeiros de Rose eram particulares, mas a curiosidade a venceu e logo se encontrou sentando-se sobre a suave pele do sofá marrom claro com o talão de cheques em sua mão.

    Não havia muitos depósitos. O registro era somente de quatro meses atrás, mas sentiu curiosidade de penetrar na vida da mulher que permanecia no hospital. A pequena escrita, ordenada detalhada de cada depósito, cada cheque. Nenhum depósito era maior do que cento e cinqüenta dólares. Quatro retiradas estavam enumeradas como sendo para o aluguel, todas abatidas do depósito anterior. Dois outros para a companhia de luz, e vários no nome de Money Slasher. Cada semana vários pequenos depósitos foram registrados seguidos pelos cheques da loja de comestíveis. O cheque mais alto era pouco mais de dez dólares e o mais baixo era de cinco dólares. O que Verônica encontrou mais interessante foram os cheques restantes, expedidos todos a alguém chamado Delores Bickeing. Esses cheques foram expedidos nas quantias de cinco a vinte dólares, cada um fazia com que restasse pouco na conta da jovem mulher depois de pagar seus gastos semanais. Essas retiradas apareciam juntas tão freqüentemente quanto os cheques a Money Slasher. O atual balanço mostrava uns cento e doze dólares de retiradas na conta da jovem mulher, muito menos do que o aluguel que ela estava devendo. Os olhos de Verônica foram novamente para a retirada do aluguel de novembro. Era nessa semana que Rose havia gastado cinco dólares com os utensílios comestíveis, o registro mostrava um saldo negativo de dois dólares e quinze centavos depois dessa retirada. Era a única vez que Rose havia deixado sua conta devedora e Verônica não podia imaginar o que a jovem mulher havia feito para tentar sobreviver essa semana.

    Fechou o talão e o deixou sobre a mesa do café. Por que estava Rose, quem não tinha dois céntimos para esfregar juntos, constantemente expedindo cheques a alguém mais? Teria uma velha divida que estava tentando liquidar? Que outra explicação poderia ter? A jovem mulher disse que não havia ninguém para contatar, então essa pessoa Bickering não podia ser um parente. A hora tarde e o último pensamento cobraram dela quando o esgotamento finalmente saiu ganhando e o sofá uma vez mais se converteu na cama da rica mulher nesta noite, com Tabitha enroscada contra ela.

    ********

    Em alguma parte da sala um telefone estava tocando. Verônica se virou, perturbando o gato adormecido. Os toques se fizeram ainda mais fortes, penetrando no mundo de seus sonhos e tirando-a de seu profundo sono. Seu braço saiu e de maneira torpe o deixou cair sobre a mesa do café buscando o irritante telefone. “Mmm… Cartwright”.

    “Ronnie?”.

    “Yeah?” Veio à adormecida e incompreensível resposta.

    “Ronnie, você tem idéia de que horas são?”. O som da voz de sua irmã ajudou a desobstruir todo o turvamento em sua mente enquanto lentamente rodava movendo-se para se sentar. “São quatro para as dez”.

    “Oh, merda!”. Os olhos azuis disparam se abrindo quando se deu conta do propósito da chamada. “Maldição, acabei dormindo no sofá. Estarei aí logo que possa”. Dirigia-se as escadas, com o telefone sem fio na mão. “Susan, nem uma palavra. Estou com um pneu vazio, entendeu?”.

    “Não posso acreditar que não acordou”, a irmã mais nova ria suavemente. “Pensava que você tinha um despertador construído dentro de você. Espera só quando mamãe souber disso”.

    “Susan…”, grunhiu, chegando a parte superior das escadas e correndo para dentro de seu dormitório. “Estarei aí logo, retenha-os ou algo assim”. Apertou o botão e desligou o telefone e a lançou na cama quando se dirigiu ao banheiro. Quinze minutos mais tarde estava em seu Jeep Cherokee e a caminho para Albany, os limites de velocidade eram amaldiçoados.

    As dez e trinta, as portas duplas de carvalho se abriram juntas quando Verônica rapidamente entrou na sala de reunião. “Desculpem um pneu vazio”. Disse enquanto tomava seu assento ao final da longa mesa retangular. “Vamos começar?”. O silêncio que recebeu a fez se voltar. Ao que parece não era a única que teve problemas para chegar a tempo para a reunião. “Onde está Tommy?”.

    “Não sei. Estive ligando para ele desde que falei com você e não consigo resposta em nenhum de seus números”. Susan respondeu. Sentada a direita de sua irmã mais velha. A chefa de seguros Cartwright nunca poderia ser confundida com Verônica. Susan tinha, graças às horas com uma estilista, o chamativo cabelo vermelho em um permanente muito crespo que era como um enxame sobre sua cabeça até seus ombros. Mesmo casada há treze anos com um bem-sucedido advogado se negou a deixar de levar o nome da família, decidindo que o status que este lhe proporcionava era muito melhor que o comum nome de Smith. Diferente de Verônica, que fora o suave esmalte nas unhas e uma rara permissão em usar uma pequena quantidade de maquiagem, Susan acreditava sinceramente que a maquiagem lhe realçava suas feições e assim dedicava duas horas todos os dias aplicando tudo desde a base para o rubor até o rimel.

    “Tentou seu bip?” Era uma pergunta estúpida, mas Ronnie, todavia teve que fazê-la. Durante os últimos meses, seu irmão caçula estava cada vez mais difícil de se encontrar e não dava mais muita atenção às reuniões. Olhando seu relógio, decidiu não esperar mais tempo o irmão rebelde. “Bem, estamos administrando bastante tarde, vamos somente começar”. Abriu sua pasta e tirou o primeiro relatório. Um por um foi percorrendo a sala, dez diferentes Cartwrights ou parentes dos Cartwrights explicavam o que suas divisões em particular estavam fazendo e quais eram seus planos para o seguinte mês. A maior parte das palavras passavam navegando por Verônica, que prestando apenas alguma atenção, assentia de vez em quando. Sua mente estava a vários quilômetros, perguntava-se o que estaria fazendo Rose, como estava se sentindo e como Delores Bickering entrava na vida da jovem mulher.

    Eram quatro para as doze quando as portas se abriram para revelar um homem de cabelo loiro escuro, que estava despenteado e amassado. “Desculpe”, ele resmungou e saiu às escondidas até sua cadeira. “Coloquei o despertador, mas o alarme não tocou”.

    “Acredito que não tinha uma roupa limpa também?” Verônica disse de maneira desaprovadora. Os vários primos e parentes que rodeavam a mesa olhavam da mulher de cabelo escuro a Tommy e de volta a ela outra vez, esperando uma batalha. O homem jovem, no entanto, fingiu não notar o comentário de sua irmã mais velha.

    “Perdi algo importante?”.

    “Não, certamente não”, seu tom demonstrou apenas sua irritação para com ele. “Estava justamente dispondo-me a repassar as cifras para seu último projeto”.

    “Eu diria que estamos muito bem, considerando todas as coisas”, respondeu. Dez pares de olhos voaram de novo a Verônica.

    “E somente que coisas você gostaria que eu considerasse nas claras cifras que estou olhando?” Tirou o relatório feito no computador e procurou através das páginas até que encontrou o que procurava. “As vendas diminuíram quase trinta por cento em relação ao ano passado e os custos chegam ao teto”.

    “Não posso evitar isto se os empreiteiros aumentaram seus preços. Inflação, você sabe”, se lançou para trás irritado. Verônica não deixou passar os olhos avermelhados ou a maneira em que Tommy mantinha seu olhar em seu relógio.

    “A inflação não tem nada a ver com isto. Segundo estas cifras, mais de cinqüenta unidades habitacionais deveriam estar terminadas. Mas a semana passada, só vinte estavam terminadas. Que diabos está acontecendo, Tommy?”.

    “Estou sobre isso, está bem?”. Afastou-se de maneira irada, seu punho golpeou a superfície da mesa de mármore com bastante força agitando o copo de água diante dele. O silêncio encheu a sala enquanto todos esperavam a reação de Verônica. Ao invés disso ela virou sua atenção a Frank.

    “Ouvi dizer que você conseguiu a transação que queria. Quando vai quebrar o chão?”. Até o final da reunião, a mulher de cabelo escuro se negou a olhar para seu irritado irmão e vice-versa. Tommy saiu quando a reunião terminou, o que só acrescentou mais as especulações e os comentários dos parentes.

    “Ronnie, o que está acontecendo com ele?”. Susan havia levado a executiva para um canto ao lado, com a preocupação escrita claramente em seu rosto. “Ele tem estado estranho ultimamente, tão irritado. Não acha que ele está tomando drogas, não é?”.

    “Não sei o que pensar, irmã, eu só sei que algo está mal”. Deu uma olhada em seu relógio. “Preciso passar em outro lugar”.

    “Hei, o que está acontecendo com você? E essa pessoa chamada Grayson?”. A curiosidade natural para mexericos de sua irmã mais nova, particularmente saía à tona, cada vez que isto dizia respeito a alguém da família.

    “Nada, só é alguém que conheci e que decidi empregar. Você se ocupou desse seguro?” Enquanto falava Verônica se dirigia até a porta.

    “Certamente. Está em minha lista de coisas para fazer hoje”. Susan respondeu despreocupadamente.

    “Não. Tem que ser feito imediatamente. E não se esqueça de retroceder a data para o início do mês. É muito importante”. Segurou o braço de sua irmã mais nova para enfatizar o ponto.

    “Farei isso assim que voltar a meu escritório. Realmente, Ronnie, parece que essa situação é algo de vida ou morte”.

    “Só se assegure que isto seja feito hoje, Susan. Envie-me por fax as confirmações para casa”. Verônica saiu até o elegante vestíbulo e pressionou o botão do elevador. Entrou neste e ao mesmo instante sua irmã mais nova lhe segurou pelo braço evitando que as portas se fechassem.

    “Hei, quase me esqueci de perguntar. O que vai comprar para mamãe no Natal?”.

    “Tenho que ir, Susan”. Pressionou o botão e ficou na expectativa.

    “Quer dizer que no comprou nada ainda? O Natal será daqui a vinte dias”.

    “Vou escolher algo nestes vinte dias que tenho. Não se preocupe com isso. Mamãe terá um presente apropriado de mim. Vamos, Susan. Preciso sair daqui”. Empurrou o braço de sua irmã o afastando das portas.

    “Só não se esqueça do jantar sexta-feira com mamãe. Você prometeu”.

    **********

    O Jeep subia sobre a avenida de Madison justo quando uma suave nevada começou a cair. Verônica lembrou de sua promessa de trazer um jogo de Trivial Pursuit, mas às escuras nuvens e a hora avançada fizeram com que renunciasse a uma viagem pelo shooping para escolher um, preferindo chegar ao hospital antes que ficasse muito tarde.

    Caminhou através da porta aberta do quarto de Rose só para encontrar-se com a cama vazia, um faxineiro trocava os lençóis. “Onde está a Srta. Grayson?”.

    “No Raio X. A trarão de volta em alguns minutos”, o corpulento homem respondeu, colocando a última ponta do lençol para dentro. Verônica foi até a cadeira do canto e se sentou para esperar a volta da jovem mulher.

    Quinze minutos mais tarde Rose foi empurrada novamente para dentro do quarto. A primeira coisa que Verônica notou eram as frescas lágrimas que deslizavam pelo rosto da lesionada mulher. Os dois zeladores tiveram o maior cuidado com sua paciente, mas Rose ainda assim gritou de dor quando a trocaram da maca para novamente sua cama.

    “Hei, como você se sente?”. A alta mulher perguntou suavemente, puxando a dura cadeira de plástico para mais próximo da cama.

    Rose forçou um sorriso diante da presença da mulher de cabelo escuro. Depois de uma longa noite de agonia e de uma ainda mais agonizante manhã quando os médicos e residentes entraram em seu quarto para examiná-la e espetá-la, a presença da mulher que fazia sua recuperação possível foi muito bem-vinda. “Fizeram novas radiografias de minhas pernas para se assegurarem de que tudo está evoluindo corretamente”. Seu rosto traiu sua dor quando se moveu e esfregou o quadril. “Estão me dando Hepa algo para afinar meu sangue. O doutor Barnes está preocupado com a coagulação”.

    “Ele disse algo sobre como você está evoluindo? Quero dizer, não está prevendo nenhum problema em longo prazo, está?”. Verônica esticou seu braço e ajudou a acomodar um dos travesseiros atrás da cabeça da mulher loira.

    “Ela disse que não saberemos isso por semanas”, Rose respondeu.

    “Ela? Bem, o que pensa dela? Parece competente? Se você não gostar dela, Rose, só me diga. Trarei outro médico”. As palavras saíram rapidamente e Verônica estava tão surpresa quanto a lesionada mulher. “Quero dizer, se não estiver contente com a forma em que ela está lhe tratando, tem o direito de pedir outro médico”. Esperava que sua explicação não soasse tão pobre para Rose como soava para si mesma.

    “Não, ela está bem, de verdade. Quero dizer, não pode me ajudar com a dor. Disse que estou recebendo a maioria dos medicamentos para dor que ela se sente cômoda em me dar”.

    “Se precisar de mais…”.

    “Não. Não acho que eles façam algo bastante forte para acalmar a dor. É só que dói tanto durante todo o tempo. Inclusive quando estou dormindo, me movo e a dor é tão forte que me acorda”. Baixou o olhar desanimada a suas fraturadas pernas e tornozelos. “Parece que a dor nunca terminará”, disse com tristeza.

    “Rose, isto pode não parecer assim agora, mas você vai melhorar. Isto só levará tempo”. Verônica tentou manter sua voz o mais tranqüila possível. “Tabitha é uma figura”, disse, esperando que a mudança de tema pudesse ajudar a tirar a mente de Rose de suas lesões.

    “Ela é a melhor coisa que me aconteceu”, a jovem mulher disse honestamente. “Sempre que preciso, ela está justo ali. Tudo o que pede sempre é alimento e atenção”.

    “E tenho certeza que você lhe dá um monte de ambos”, Verônica respondeu.

    “O amor e atenção pode ser que sempre dê”. Os olhos verdes adquiriram um olhar triste. “O alimento nem sempre é tão fácil”. Levantou o olhar as feições esculpidas de sua generosa benfeitora. “Estou certa de que ela está muito feliz com a senhorita”.

    “Rose, não levei Tabitha para longe de você, acredite. Só estou cuidando dela enquanto você estiver aqui. Uma vez que você esteja de novo sobre seus pés, a trarei para você, eu prometo”.

    “Não sei o que vou fazer”, disse suavemente, lágrimas, tanto pela persistente dor quanto pelo medo de perder sua querida mascote nublaram seus olhos e ameaçavam a transbordar. “Não posso nem me ocupar de mim mesma quanto mais dela. Inclusive nem tenho um lugar para viver”.

    “Nem uma ratazana podia viver dentro daquele lugar. Quando você sair daqui…”.

    “Quando eu sair daqui nem poderei andar, não tenho dinheiro, e eu inclusive não tenho um lugar para viver”, Rose disse. “A senhorita deveria ter me deixado ali naquela rua”.

    “NÃO!” Verônica se levantou e se inclinou até que esteve só a algumas polegadas do rosto de Rose e olhando profundamente nos olhos verdes. “Escuta-me. Você vai andar outra vez e não tem que se preocupar em encontrar um lugar para viver. Rose, não vou deixar que você se renda assim, você não vai se render assim. Sei que você é uma sobrevivente. Não deixarei que isso lhe seja tirado”.

    “O que acha que farei quando me derem alta? Já faz cinco dias. Cecil com certeza já terá trocado as fechaduras. Ele me avisou para nunca atrasar o aluguel”.

    “Esse grande explorador não se incomodará em trocar as fechaduras”.

    “Ele me chutou, não foi?…”.

    “Sim”, Verônica admitiu. “Mas eu não ia mesmo permitir que você continuasse vivendo ali de qualquer maneira. Não é lugar para um ser humano viver e muito menos você. Quando lhe derem alta daqui provavelmente vão lhe enviar a um centro de reabilitação até que você possa andar outra vez. Depois disso vou me assegurar de que você consiga um lugar decente para viver”. Respirou fundo antes de continuar. “Rose, ambas sabemos que precisa de ajuda e que eu desejo lhe ajudar. Sei que você se virou sozinha durante muito tempo, mas agora precisa de alguém para cuidar de você. Por favor, me deixe ser esse alguém”.

    O quarto ficou silencioso durante um minuto Rose baixou seu olhar a seu colo, mordendo seu lábio inferior. “Não dependi de ninguém durante muito tempo. Acho que agora não tenho muita escolha”. Seu rosto traiu suas sensações de fracasso e o desespero de sua situação. “Isto é difícil para mim. Prefiro passar privações que receber caridade”.

    Verônica achou muito duro de acreditar que fosse tão difícil para Rose aceitar a ajuda que lhe era oferecida quando as alternativas eram tão claras, mas quando fez uma pausa para considerar a história que o talão de cheques dizia, compreendeu. Havia um profundo caráter na jovem mulher que ela não havia acreditado que ainda existisse atualmente onde tanta gente parecia estar pronta para aceitar qualquer coisa que o estado ou o governo oferecesse, merecendo ou não. “Rose, não pense nisto como sendo caridade. Não”.

    “Como parece para você?”. Perguntou com curiosidade. Antes que Verônica pudesse responder, outra explosão de intensa dor disparou através da jovem mulher, causando que seu rosto se enrugasse com a agonia. “Oh Deus, isto dói”, assoviou. “Isto dói tanto”. As lágrimas começaram a transbordar por seu rosto e alcançando seus ofendidos membros. “Faça parar, por favor, faça que esta dor pare”, suplicou.

    Incapaz de eliminar a dor, Verônica fez a única coisa que podia lhe ocorrer. Sentou-se na beira da cama e deu um abraço apertado em Rose, sem se preocupar que as lágrimas encharcassem sua blusa de seda. Não importava. Nada importava exceto tentar ajudar a incrível valente jovem mulher a conseguir atravessar isto. “Tudo bem, Rose. Tudo vai ficar bem”, murmurou no dourado cabelo enquanto que sua mão suavemente esfregava de cima a baixo as costas nuas expostas pela bata do hospital.

    “Isto dói… isto não parará de doer… Oh Deus, por favor, faça parar, faça parar, dói tanto”, Rose soluçava, seu agarre ao redor do pescoço de Verônica se intensificou. Os fortes braços se envolveram ao seu redor oferecendo consolo, algo que quase nunca havia sido oferecido a jovem mulher antes, e Rose o aceitou agradecida.

    “Desculpe, Rose, eu sinto tanto”. Verônica sussurrou uma e outra vez, sentindo que suas próprias emoções vacilavam ameaçando sair por causa da dor da jovem mulher, dor causada por suas ações naquela fatídica noite. “Tudo vai ficar bem. Shriii… tudo bem, agora tudo ficará bem”. Continuou fazendo tranqüilizadores ruídos e sustentando Rose, enquanto os soluços continuavam. Por sorte, a enfermeira chegou poucos minutos mais tarde e deu a lesionada mulher uma injeção que a levou a um inquieto sono. Verônica permaneceu por bastante tempo olhando Rose dormir e desejando que tivesse algo, qualquer coisa que pudesse fazer para tirar a dor que havia causado a valente jovem mulher.

    ********

    Rose acordou várias horas mais tarde encontrando-se sozinha. Pressionou o botão de chamada para a enfermeira.

    “Precisa que alguma coisa, querida?”. A mulher de pele escura disse quando entrou.

    “Na verdade, nada”, Rose respondeu, envergonhada por ter pressionado o botão só para ver outra cara. Haviam se passado quatro dias desde que internou e as únicas pessoas que sempre via era o pessoal do hospital e Ronnie.

    “Bem, fico feliz que a senhorita esteja acordada”, a enfermeira disse. “É hora de verificar seus sinais vitais”.

    “A senhorita sabe há quanto tempo a Srta. Cartwright se foi?” A mulher loira perguntou antes que o termômetro se encontrasse a caminho de sua boca.

    “Seria sua amiga a que esteve aqui cedo?”. Rose assentiu. “Foi embora justo depois que eu continuasse com meus deveres assim eu diria que a mais ou menos uma hora. Deixou-lhe uma nota”.

    Isso foi então o que Rose viu, um papel creme dobrado pela metade colocado em sua bandeja da cama. Rose quis alcançá-lo, mas seu braço não era suficientemente longo. A enfermeira lhe entregou o papel antes de envolver o puno negro da pressão arterial ao redor de seu antebraço. Rose deixou a nota sobre seu peito até que a enfermeira terminasse, preferindo lê-la sozinha. Gemeu quando o punho se apertou mais e mais ao redor de seu pequeno braço. Quando ela pensou que não poderia estar possivelmente mais apertado ouviu o assobio do ar que era liberado. “Bom. Sua pressão é boa e sua temperatura normal. Neste ritmo a senhorita estará fora daqui logo”. A enfermeira tirou o apertado punho de velcro e fez uma anotação em sua prancheta. “Seu jantar estará aqui logo e voltarei mais tarde para revisá-la”.

    “Obrigada”, Rose sorriu, haviam lhe dado alimento sólido no dia anterior e seu apetite havia voltado mais forte do que nunca.

    Uma vez que a enfermeira saiu, Rose pegou a nota e a desdobrou. Ali no papel timbrado Cartwright estava uma mensagem de Verônica.

    Rose,

    Tive que voltar ao escritório para cuidar de algumas coisas. Voltarei a tempo de assistir Jeopardy. Tente descansar e não tenha medo de pedir mais medicamento se precisar. Deixe espaço depois do jantar. Espero que goste de comida chinesa.

    Ronnie.

    Os dedos da jovem mulher deslizaram sobre a textura do papel. Enquanto que sua própria caligrafia era pequena e ordenada, a de Verônica estava cheia de desenhos e estilo. Sorriu ao lembrar do comentário de deixar espaço depois do jantar. Quando chegasse a comida, Rose sabia que poderia sempre comer tudo diante dela e depois algo mais. Pressionou o controle remoto da televisão, uma vez mais silenciosamente agradeceu sua benfeitora, observou que estava passando as notícias locais. Isso significava menos de uma hora para que Verônica voltasse. Rose pegou o pente de plástico da mesa e o passou pelo cabelo dourado, tentando se mostrar um pouco mais apresentável para sua nova amiga.

    “Minha amiga”, disse em voz alta, sorrindo com o pensamento. Pensou sobre a maneira em que havia chorado tão duro antes e o bem que se sentiu ao ser sustentada por Verônica. Em seus braços, se sentia segura, cuidada, confortada. De maneira estranha, Rose se encontrou desejando essa sensação outra vez, ser sustentado nesses fortes braços, para sentir a suave fragrância do perfume no pescoço bronzeado da alta mulher, para sentir a compaixão e a ternura dentro de seu tato e voz. Rose ainda não entendia por que Verônica a havia escolhido para ser sua amiga, mas estava agradecida que o tivesse feito.

    A roda da fortuna estava na metade quando Rose foi presenteado ao ver Verônica entrando no quarto, com uma bolsa pequena cheia de comida que cheirava deliciosamente em uma mão e a sempre presente maleta na outra. “Olá, aí”.

    “Olá”, respondeu a jovem mulher, sentindo alegremente o cheiro no ar quando Verônica deixou a bolsa na bandeja da cama e, depois de deixar sua jaqueta de pele no respaldo da cadeira e a maleta no chão, tomou seu costumeiro assento junto à cama. “Maravilhoso aroma”.

    “Guardou espaço? Trouxe camarão chow mein e costeletas assadas na chapa sem ossos”, Ronnie dizia enquanto tirava as caixas brancas da bolsa junto com dois jogos de utensílios de plástico.

    “Quando chega a comida, sempre tenho espaço”, Rose respondeu, pegando o garfo de plástico que lhe era oferecido. Suas pernas palpitavam, mas a dor de alguma maneira parecia estar diminuindo na presença de sua nova amiga.

    “Não me deram nenhuma vasilha ou prato assim teremos que compartilhar”, Verônica disse quando abriu as caixas para revelar o vapor da comida quente. “Não sabia o que você gostava, mas imaginei que não poderia me enganar com as costeletas”.

    “Nunca provei camarão chow mein, mas sim, as costeletas não duraram muito”. Seu garfo já estava se dirigindo a caixa.

    “Oh, vai ter que prová-lo. É realmente bom”. Retirou uma garfada de chow mein e o colocou em sua boca, atraindo o ar para dentro ao mesmo tempo para provar e contra-arrestar a ardente temperatura quente da comida. Rose estava encarregando-se das costeletas de porco, empurrava vários pequenos pedaços de carne em sua boca e cantarolava com deleite.

    “Oh, isto está tãao delicioso”, murmurou ao redor do bocado de porco. “Obrigada”.

    “De nada. Inclusive consegui os biscoitos da sorte para a sobremesa”. Visto que para Rose não ocorreu nada para falar com o alimento na boca, Verônica relaxou e fez o mesmo. “Não tive tempo para parar em alguma parte e jantar assim pensei em escolher algo e trazer aqui”.

    “Oh, me alegro que tivesse feito. Isto está delicioso”, Rose disse. “Obrigada”. Puxou a caixa de chow mein para mais próxima de sua boca e extraiu uma garfada de vegetais e camarão. “Oh, isto está bom”.

    “Eu lhe disse”, Verônica sorriu, contente que sua escolha fosse tão bem recebida. “Então me diga descansou bem? Sinto muito ter ido embora, mas tinha alguns assuntos que cuidar no escritório”.

    “Está tudo bem? Estar me ajudando não está lhe causando nenhum problema, não é?”. Rose perguntou com preocupação, não desejando fazer algo que causasse stress a sua nova amiga.

    “Não Rose, meus problemas são com uma das divisões”. Deixou seu garfo e deu um educado arroto. “Oh, está bom. Havia me esquecido o quanto era saborosa a comida chinesa”. O tema musical para Jeopardy começou na televisão seguida pelo anfitrião que apresentava os participantes. “Você não me respondeu. Teve um bom descanso?”.

    “Sim, dormi muito bem, obrigada”. Girou para capturar os profundos olhos azuis da mulher mais velha. “Obrigada por permanecer até que eu dormisse”.

    A enfermeira voltou interrompendo seu piquenique. Deu uma olhada nas duas caixas vazias e nas olhadas culpadas nas caras das mulheres e franziu o cenho. “A senhorita realmente não deve trazer comida ao hospital”, resmungou. “Srta. Grayson, a senhorita não está em uma dieta especial, não é?”.

    “Não. Desculpe. Eu pedi a ela que trouxesse isto”, Rose disse, tentando assumir a culpa.

    “No futuro a senhorita deve apegar-se a comida que servimos. Nossos nutricionistas trabalham duramente para desenhar um menu…”.

    “Esse é Abraham Lincoln”, Rose deixou escapar, sua atenção no programa e não no discurso que ela estava recebendo.

    “Não, foi Johnson”.

    “Não. Ele não tomou o escritório em fevereiro, ele o tomou em abril”. O anfitrião confirmou que a resposta de Rose era correta com as datas em que ocorreu a sucessão presidencial. A enfermeira olhou as duas mulheres concentradas na televisão e cessou seu intento de explicar porque a comida chinesa não era tão boa para um paciente como a comida do hospital. Saiu do quarto tendo a certeza de onde ia durante seu intervalo para jantar.

    Justo quando o tema musical estava finalizando o aviso dos alto-falantes avisava que a hora da vista havia acabado. “Acho que é meu sinal para ir”, Verônica disse contrariada. “Vejo você amanhã”. Levantou-se e pegou sua jaqueta. “Oh, quase me esqueço”. Meteu a mão no bolso e tirou um cartão de visita e uma caneta. “Vou lhe deixar meu número no caso de você querer ligar ou se quiser que lhe traga algo”. Escreveu o número de seu telefone particular embaixo do reverso do cartão e o deixou na bandeja da cama depois recolheu as caixas vazias da comida e a bolsa. “De verdade, se desejar ou precisar de algo, só me ligue. Estou normalmente acordada até as onze”. Alisou uma ruga imaginária na manta antes de colocar a jaqueta. “Descanse bem, Rose. Vejo você amanhã”.

    “Não quero atrapalhar seu trabalho”.

    “Acredite em mim, prefiro mais estar aqui que lá. Estarei aqui logo após o desjejum. Lembre-se do que lhe disse. Ligue-me sempre que desejar, inclusive se for só para conversar”. Só para estar segura, Verônica empurrou o telefone um pouco mais próximo à mesa lateral.

    “Obrigada. Boa noite, Verônica”.

    “Hei, chame-me de Ronnie. Todos meus amigos me chamam assim”, disse com um sorriso.

    “Ronnie. Boa noite. Dirija com cuidado”. Rose não notou o olhar que lampejou através da cara da mulher mais velha antes de ser coberto com um sorriso fingido.

    “Boa noite, Rose”.

    *********

    Ronnie estava encolhida na cama com Tabitha a seu lado, quando o telefone tocou. Uma rápida olhada ao relógio lhe disse que eram quase onze horas. “Alô?”.

    “Humm… alô, sou eu Rose. Espero que não tenha ligado muito tarde”.

    “Não, não, não em absoluto, não é muito tarde”. Incorporou-se, muito para descontentamento de Tabitha. “Você está bem?”.

    “Sim, eu um… suponho que só queria… saber como está Tabitha”, veio a pobre desculpa. Ronnie sorriu, apoiando um travesseiro atrás das costas e reclinando-se contra a cabeceira do carvalho.

    “A máquina ronronante está bem. Quer cumprimentá-la? Ela parece pensar que onde quer que eu esteja é um bom lugar para ela estar”. Sem esperar uma resposta colocou o telefone próximo ao gato. “Diga olá a mamãe, Tabitha”. O susteve ali por alguns segundos antes de colocar o receptor novamente em seu ouvido. “Ouviu o ronrono?”.

    “Sim”. Ronnie podia sentir o sorriso através do telefone e em resposta sorriu também. “Há algo que quer que eu lhe leve amanhã? Estarei aí provavelmente as dez”.

    “Hum… se não fosse muito problema, acha que poderia verificar a correspondência para mim?”.

    “Droga, me esqueci completamente disso. Tenho que parar no correio e colocar outro endereço para que reexpedem a correspondência para você antes que esse idiota do Cecil comece a sabotar sua correspondência”.

    “Oh… Eu não sei para onde você poderia reexpedi-la”.

    “Me ocuparei disso, não se preocupe. Mas sim, darei uma volta por lá amanhã e verei se tem algo”.

    “Realmente apreciaria isso”. Houve um momento de silêncio antes que Rose continuasse. “Ronnie?”.

    “Sim?”.

    “Hum… durma bem, OK?”. Isso fez com que a executiva sorrisse outra vez.

    “Você também, Rose. Vejo você amanhã”.

    “Boa noite”.

    “Boa noite”. Esperou alguns segundos antes de pressionar o botão de apagar no telefone e colocá-lo novamente no carregador sobre seu criado-mudo. Tabitha avançou lentamente sobre seu peito e começou a tentar imprimir marcas com suas patas nos órgãos internos de Ronnie. “Oof, acho que não, srta”, disse, suavemente empurrando o gato novamente para a cama e recebendo um desanimado ‘meow’ em resposta. “Vamos, tenho muita coisa para fazer amanhã. É uma cama enorme. Há muito espaço sem que tenha que estar justamente em cima de mim”. Apesar disso, a beleza de cabelo escuro terminou resultando adormecida com o felino ronronante enroscado contra ela.

    O alarme tocou as seis como de costume, anunciando que o dia de Ronnie começava.

    “Mrrow?”.

    “Em um minuto”, respondeu a sonolenta mulher, tirando as mantas e metendo os pés nas suaves pantufas azuis junto à cama. Com os olhos meio fechados, caminhou de maneira cansada até o banheiro. Voltando poucos minutos mais tarde com os dentes escovados e a bexiga vazia. Tirou seu suéter e colocou sua roupa de treino cinza claro antes de se dirigir ao sótão.

    O ginásio particular de Ronnie seria a inveja de qualquer esportista em busca de uma boa forma. Com exceção de que o lugar continha aquecedor de água e sistema de aquecimento, o resto do sótão estava dedicado a centenas de banquinhos, de máquinas e colchonetes. Crescendo na casa que agora era só sua, Ronnie havia freqüentemente sonhado com a reforma do úmido sótão em um lugar onde pudesse só ela estar, o bombear do ferro e o aquecimento a fizeram suar saudavelmente. Seu objetivo foi consumado com o ginásio particular. O ambiente estava decorado com luzes brilhantes e fosforescentes no alto que realçavam as paredes de espelhos. Agarrou uma toalha fresca da estante, ligou o estéreo, e se dirigiu ao escalador para se aquecer.

    Duran Duran ressonou através dos alto-falantes colocados em torno do grande lugar enquanto Ronnie empurrava suas panturrilhas e coxas aos limites no escalador. Em seu próprio refúgio particular, ninguém podia ouvi-la cantar a música, ver o suor se formar na sua testa, pescoço e peito, ou notar a maneira em que se empurrava. Orgulhava-se da forma e força de seu próprio corpo, mas ambos requeriam constante conservação. Escalou vinte minutos, isto nunca vai a nenhuma parte e avançou para a parte seguinte do equipamento, tomando tempo para prender seu cabelo para mantê-lo fora de seu rosto e nuca. Verificou a quantidade de pesos na barra antes de se acomodar embaixo no banco, tirou a barra de seu apoio, e a trouxe para baixo a seu peito. Mexeu os dedos para se assegurar de que suas mãos estavam na posição apropriada e começou suas cansativas repetições, subindo a barra à máxima altura antes de baixá-la de novo sobre seu peito. A máquina rangia com seus abdominais, o antebraço se apertava contra as pernas que eram pressionadas, então a máquina se encaminhou para uma geral boa sessão de exercícios. Quando o CD estava acabando, os músculos de Ronnie pediam um merecido descanso pelo enorme suor. Lançou a encharcada toalha no cesto próximo da porta e se dirigiu de volta a seu dormitório onde se despiu da roupa coberta de suor e entrou no banho. A ducha sobre sua cabeça enviava a forte água quente contra seu corpo, massageando enquanto limpava. Dez minutos com o secador de cabelo e Ronnie estava fresca e pronta para fazer frente ao que quer que seja que o dia lhe ofereceria.

    A neve havia caído durante a noite, cobrindo a cidade com uma capa suave de branco. A cherokee azul brilhante percorreu as estreitas ruas de Albany, lutando com o resto do tráfego da manhã de sexta-feira. Encontrou um espaço para estacionar em Morris Street e cuidadosamente se dirigiu às escadas para recuperar a correspondência de Rose. A recolheu, planejando deixar a propaganda postal para que Cecil a pegasse quando um pequeno envelope atraiu sua atenção. O meteu no bolso interior de seu casaco e voltou ao calor de seu veículo esportivo. Só então o tirou e examinou o remetente. D. Bickering, RR 3 Box 4120, Cobleskill. Cobleskill, conhecido mais por sua universidade agrícola que por algo mais, era um pequeno povoado à uma hora de Albany. Embora fosse terra de lavouras, havia um certo número de residentes na área. A grande maioria eram fazendeiros ou gente que estava disposta a viajar quarenta minutos ou mais para chegar a seus trabalhos todos os dias, distância que estava o povoado de uma verdadeira cidade. Ronnie empurrou o envelope novamente para dentro de seu bolso e colocou o Jeep em movimento, determinada a chegar ao hospital e entregar a carta a Rose antes que o impulso de ir até em casa a vencesse e com o vapor abrisse o envelope. Queria saber desesperadamente como o mistério Delores Bickening entrava na vida de Rose e porque a jovem mulher sem dinheiro estava expedindo cheques a esta pessoa.

    Ronnie chegou ao hospital justamente quando a enfermeira terminava de verificar os sinais vitais de Rose. Como esperava, a cara da jovem mulher mostrava a dor que as drogas não podiam apagar completamente. “Hei, você”, disse suavemente, atraindo a atenção de Rose e da enfermeira.

    “Olá”, a mulher loira sorriu. “Parece que a neve lhe pegou”.

    “Só um pouco”, Ronnie respondeu, tirando os derretidos flocos de neve de seu cabelo escuro e dos ombros de seu suave casaco café. “Devo voltar mais tarde?”.

    “Já estou terminando”, a enfermeira disse sem levantar o olhar de sua tarefa. Incorporou-se e fez várias anotações na prancheta de Rose. “Pronto. Tudo terminado por hora”. Tirou as luvas de látex deixando-as no recipiente vermelho para resíduos. “A doutora Barnes virá lhe visitar daqui a pouco”, disse antes de deixar as duas mulheres sozinhas.

    A curiosidade ganhou no instante em que ficaram sozinhas. Ronnie tirou o envelope de seu bolso e o deu a Rose. “Aqui está sua correspondência”.

    O sorriso que havia estado no rosto da jovem mulher desapareceu diante da escrita do envelope. O abriu e leu as palavras escritas que ressaltavam no papel enquanto Ronnie deixou sua maleta no chão e pendurou seu casaco no respaldo da cadeira antes de tomar seu costumeiro assento junto à cama. Rose estava calada quando acabou de ler a carta e a colocou novamente dentro do envelope. “Poderia me fazer o favor de me trazer meu talão de cheques amanhã?”.

    “Aconteceu algo? Algo com o que eu possa ajudar?”.

    “Não, é só algo que tenho que me ocupar”. Não pôde evitar se encontrar com os penetrantes olhos azuis que a olhavam. “Odeio fazer isto, mas poderia trazer um envelope e um selo postal também?”.

    “Claro, Rose”. Ronnie respondeu, ainda morrendo de curiosidade por saber do conteúdo da carta. “Olha… se você tem uma divida que precisa de ajuda para pagar…” Lamentou as palavras imediatamente, pensando que ofenderia sua nova amiga.

    “Não, não é isso. É de alguém com que vivi”. A cabeça de Rose não se levantou e sua atitude mudou totalmente, se fechando dentro de si mesma.

    “Um namorado?”.

    “Uma mãe adotiva. Vivi com ela cerca de dois anos. Cuidou de mim quando ninguém mais pôde”. Os ombros da mulher loira se encolheram e deixou um suspiro de derrota sair. “Tem vivido um tempo difícil desde que o Estado lhe tirou todas as crianças que cuidava. Você não vai querer ouvir sobre isto”. Disse, dando a sua nova amiga uma saída se a quisesse.

    “Claro que quero”, disse Ronnie, estendendo sua mão para envolver a pequena mão dentro da sua. “Essa carta pareceu que realmente lhe preocupou. Importar-se-ia de compartilhar?”. Esperou que Rose desse detalhes sobre Delores, mas foi surpreendida ao encontrar a carta sendo empurrada a sua mão.

    “Acho que isto lhe explicará tudo”.

    Ronnie olhou para Rose antes de abrir o envelope e ler a carta.

    Rose,

    Não tenho notícias suas há muito tempo. As coisas são de verdade duras aqui. Só posso manter mais ou menos um telhado sobre minha cabeça. Os idiotas dos serviços sociais não entenderam nada do eu lhes disse. Sei que está ocupada com sua vida e não tem tempo para uma velha senhora como eu, mas tem que lembrar que cuidei de você quando ninguém mais pôde. Abri meu lar para você, lhe dei de comer e me assegurei de que fosse a escola. Você tem sido boa ao tentar me ajudar, mas realmente preciso bem mais do que você está me enviando. Você sabe que custa muito alimentar uma criança a mais. Sem mim você teria passado fome. Estive aqui quando você precisou que alguém cuidasse de você. Estarei esperando qualquer mis… Miséria… Qualquer pequena quantia que possa me enviar.

    Sua tia Delores

    Ronnie dobrou a carta e a meteu no envelope, tentando manter seu mau humor sob controle, mas isso estava rapidamente sendo difícil de acontecer. Deixando o envelope embaixo da bandeja da cama, agarrou o suporte lateral da cama tão firmemente que seus nós dos dedos ficaram brancos. Inspirou várias vezes tentando se acalmar antes de sentir os olhos verdes a olhando na expectativa. “Você não deve nada a ela, Rose”, disse através dos apertados dentes, incapaz de levantar a cabeça para se encontrar com o olhar da loira.

    “Tenho que fazer”, a jovem mulher disse tristemente. “Quando estava vivendo com ela, havia quatro de nós. Ela sempre deixou claro que o Estado não lhe dava bastante para cuidar de nós”.

    “A merda com isso”. Ronnie xingou levantando-se de seu assento e se aproximando da janela, olhando a suave neve que caía do lado de fora. “Não tenho nenhum direito de lhe dizer o que fazer com seu dinheiro Rose, mas ela só está lhe usando, jogando com sua compaixão. Tanto tempo lhe dando dinheiro, dinheiro que ela não lhe permite repor, ela só voltará por mais.” Voltou a olhar para a jovem mulher. “Ela lhe agradeceu alguma vez pelo dinheiro que você enviou até agora? Não, ela só diz que você tem que enviar mais. Está lhe culpando de lhe dar seu dinheiro. Qualquer divida que você pensa que tem com ela, você já pagou há muito tempo. Ela está agora só lhe chupando até que você se seque.” Não querendo perturbar Rose mais do que estava, Ronnie voltou a seu assento e baixou a voz. “Nem uma vez ela perguntou como você estava vivendo, nem sequer uma palavra amável. Essa carta era nada mais do que ‘envia-me dinheiro’. Você não merece que ela se aproveite de sua bondade assim, Rose. Você é uma pessoa muito boa para ser tratada assim”.

    “Ela é a coisa mais próxima que eu tenho de uma família”, a jovem mulher protestou, apesar de fracamente. Nunca havia compartido este problema com alguém antes e estava surpresa de ver a reação de sua amiga. Rose havia ouvido por tanto tempo sobre como devia a Delores por ter cuidado dela que acreditava que era uma divida que nunca poderia ser paga, sem ter em conta seus sentimentos pessoais sobre isto. Ter a alguém para expressar os sentimentos que haviam estado enterrados profundamente dentre dela era algo que não esperava.

    “Não precisa de uma família assim. Merece melhor”, Ronnie disse. Deu um resignado suspiro. “Disse-lhe que lhe traria seu talão de cheques e o farei. Também lhe trarei o selo postal e o envelope, mas realmente quero que você pense melhor sobre isto antes que lhe envie mais dinheiro”. Esticou sua mão e tomou a mão de Rose entre as suas. “Prometa-me que pensará primeiro, OK?”.

    “OK”, a jovem mulher respondeu, tirando um sorriso de Ronnie. “Vamos mudar de assunto, OK?”.

    “Certamente, vamos falar de que?”.

    “Por que não me conta sobre sua família? Gostaria de saber sobre eles”.

    “Não é tão interessante como pensa que é”. Ronnie ia tentar mudar de assunto, mas o olhar expectante na cara de Rose a fez mudar de opinião. “De acordo, mas vou lhe avisar, que é bastante chato”. Moveu-se em seu assento, desejando estar usando jeans ao invés desta calça. “Sou a mais velha dos três. Somos Susan, Tommy e eu. Susan é completamente oposta a mim. Ela dirige os seguros Cartwright. Está casada com Jack; ele é um advogado”. Sorriu como se dividisse algum grande segredo. “Susan usa mais maquiagem que Tammy Faye Baker e pensa que é maravilhoso. Mas pode somar números em sua cabeça mais rápido que uma calculadora e traz a divisão de seguros acima do prometido de ganhos fazendo com que seja um de nossos principais negócios. No entanto tenho que lhe prevenir, não permita que ela lhe pegue em uma festa. Minha irmã é a melhor em arrecadar fofocas e informação no estado. Uma vez que consiga lhe prender não lhe deixa ir até que saiba tudo sobre você até o seu tipo sanguíneo”.

    “E sobre seu irmão?”, Rose perguntou, olhando como o sorriso abandonava o rosto de Ronnie.

    “Tommy é uma alma perdida. Ele tem vinte e cinco anos, mas ainda age como um adolescente. Levou seis anos e três universidades para obter um diploma, porque não pôde se aplicar a isso. A família insistiu que o pusesse a cargo de algo, então lhe deu a Divisão de Bens Imóveis”. Suspirou. “Imaginei que estava bem, que ele não poderia fazer algo para estragar isto. Agora estamos passando pelo pior crescimento desde a recessão e age como se não se importasse. Por isso tive que voltar ao escritório ontem. Odeio a irresponsabilidade”.

    Sua conversa foi interrompida pela chegada da doutora Barnes. “Como você está hoje, Srta. Grayson?”.

    “Igual à ontem, suponho”, Rose respondeu. “Oh doutora Barnes, ela é minha amiga Ronnie. Ronnie, ela é a doutora Barnes”. Não viu o sorriso que se formou no rosto de Verônica pelo título dado.

    “Olá”, disse a médica. Olhou a prancheta de Rose por um momento e fez uma anotação. “Bem, Srta. Grayson parece que tudo está cicatrizando corretamente bem”. Deixou a prancheta e foi até a cabeceira da cama para verificar os pontos na bochecha de Rose. “Os ossos estão fixando-se apropriadamente e não vejo razão para que a senhorita não possa ir para casa”.

    “Casa? Mas…”. Olhou temerosa para Ronnie pedindo ajuda.

    “Como à senhora pode enviá-la para casa? Ela não pode andar ainda”, a mulher de cabelo escuro disse, caindo no rol de protetora facilmente. Parecia uma coisa natural de se fazer quando dizia respeito a Rose.

    “Olha Srta…”.

    “Cartwright, Verônica Cartwright”.

    “Srta. Cartwright”, a doutora corrigiu, sem se impressionar com o nome da alta mulher. “Não há nada mais que possamos fazer por ela agora. Seu corpo está reagindo bem ao tratamento. Não há nada que fazer, exceto esperar que os ossos cicratizem”.

    “Mas não pode andar ainda”, Ronnie protestou.

    “Ela não poderá andar durante um ano”, a doutora respondeu. “Não há sinais de infecção, os escassos agentes evitaram a formação de qualquer coagulo e a inchação está baixando a um nível aceitável. Neste ponto não há mais nada que o hospital possa fazer, exceto lhe proporcionar uma cama. Farei a prescrição para a dor e deve voltar na próxima sexta para retirar os pontos do rosto. Ao mesmo tempo examinarei suas pernas e o tornozelo, então veremos para onde vamos a partir daí”.

    A respiração de Rose estava acelerada e parecia pronta para chorar. Ronnie se inclinou rapidamente sobre a cama, bloqueando a visão da jovem mulher da portadora de más notícias. “Rose”, sussurrou. “Deixa que eu cuide disso. Prometo que tudo ficará bem”.

    “Eu não posso… Eu não…”.

    “Shhrii. Deixe que eu cuido disto. Confie em mim”. Falou suavemente, como se acalmasse a uma criança. “Confia em mim?” Recebeu um trêmulo sim com a cabeça. “Prometo que tudo ficará bem”.

    “Mas…”.

    “Confia em mim, Rose”. Mantendo seu olhar, deixando que o intenso azul buscasse e acalmasse ao verde, tentando silenciosamente lhe transmitir que tudo ficaria bem.

    Finalmente a jovem mulher deixou sair uma pesada respiração e assentiu, colocando sua vida nas mãos da mulher que parecia tão disposta a ajudá-la. Tão assustada como a perspectiva parecia, havia um conforto em saber que Ronnie estava ali com ela.

    “O que preciso saber para cuidar dela?” Verônica perguntou, dando sua atenção à doutora.

    “Enviar-lhe-ei a enfermeira para que lhe indique como banhá-la adequadamente para prevenir infecções. Sugiro que consiga para sua casa um assistente de saúde ou uma enfermeira particular se puder pagar”. Esse comentário ganhou um levantamento de sobrancelhas da mulher que havia doado seis cifras ao hospital no ano passado. “A coisa mais importante é se assegurar de que as feridas se mantenham limpas”. Fez outra anotação na prancheta. “Mandarei uma folha de instruções preparada para lhe explicar exatamente o que precisa ser feito a cada dia”.

    “Bem”, disse Ronnie, sua mente já pensava em que quarto seria preparado um espaço para a recuperação. Era um inesperado giro nos acontecimentos, mas um que poderia conduzir. Confusa observou que não era a culpa que lhe fazia abrir seu santuário a Rose, era algo mais forte, preocupação e afeto. Em alguma parte no curso de tentar compensar seu erro, Verônica Cartwright havia começado a se importar. “O que quer que seja para que ela fique melhor”.

    “Direi à enfermeira que lhe dê todos os detalhes. Assinarei os papéis da alta antes que comece o resto de minhas rondas”. Virou o olhar a sua paciente. “Desculpe, Srta. Grayson ouvi dizer que gostou muito de nossa comida”. Sua intenção era de brincar, mas isso não foi tão bem recebido como esperava, ganhando somente um sorriso fraco da loira. “Bem, se houvesse alguma maneira que justificasse mantê-la aqui, eu o faria”.

    “Eu sei”, Rose respondeu. “Obrigada”.

    “Não esqueça de marcar uma consulta com nossa clínica para paciente externos para retirar esses pontos na próxima sexta. Assegure-se de marcarem comigo e não com o médico assistente. Quero dar uma olhada nessas pernas também”.

    “O farei”.

    “Vou cuidar disso”, Ronnie disse firmemente, não deixando dúvida na mente da jovem doutora que sua paciente seria bem cuidada.

    *********

    A tarde foi muito ocupada para Verônica. Seu telefone celular esteve constantemente em uso, esgotando a bateria fazendo com que a executiva tivesse que usar o telefone do quarto de Rose para terminar seus preparativos. Ligou para uma empresa de suprimentos cirúrgicos para comprar uma cama de hospital, uma cadeira de rodas, e várias outras coisas que a enfermeira insistiu que eram necessárias para adequar a recuperação de Rose. Embora Ronnie tivesse tentado insistentemente lhe disseram que não conseguiriam lhe entregar a cama neste dia. Para sua frustração lhes disseram que só poderiam lhe entregar os outros artigos, então ligou para várias mobiliárias até que encontrou uma que vendia camas ajustáveis. Inclusive teve que ligar para Maria para lhe contar o que estava ocorrendo. Explicou a governanta de sua confiança que quarto iam ocupar e que artigos precisavam ser movidos para dar espaço ao mobiliário novo. A ligação seguinte havia sido a um serviço particular de ambulâncias para arrumar a transferência de Rose do hospital a sua casa. As ligações restantes haviam sido a várias agências com a intenção de conseguir uma enfermeira particular para contratar por longo período, em tempo integral, depois ligou novamente para Maria para colocá-la a par dos últimos acontecimentos.

    “Ronnie?”. Rose chamou suavemente, atraindo a atenção da alta mulher.

    “Tenho que desligar, Maria. Ligue para o telefone do Jeep se surgir algum problema”. Desligou o telefone e se sentou na beira da cama. “Acho que tudo já está pronto. Agora só temos que esperar que a ambulância chegue”.

    “Não sei como lhe agradecer”, Rose sussurrou, sua voz estava quebrada pela emoção.

    “Shhrii… não precisa com coisas assim”.

    “Nunca ninguém… eu quero dizer que isto é tão…”. Seus olhos emergiram com o sincero sentimento.

    “Hei, não é problema, lembra? Prometi que cuidaria de você”. Ronnie estendeu sua mão e pegou a lágrima antes que esta pudesse deslizar pelo rosto de Rose. “Hei, nada disso. Tabitha sente falta de você e esta é a maneira perfeita de me assegurar que ela tenha alguém mais para conseguir sua atenção de modo que eu possa conseguir trabalhar um pouco”. Recebeu o mais desnudo dos sorrisos. “Além disso, estive sozinha durante muito tempo. Será agradável ter companhia”.

    (¹) Manilha é uma tonalidade em verde.

    0 Comentário

    Digite seus detalhes ou entre com:
    Aviso! Seu comentário ficará invisível para outros convidados e assinantes (exceto para respostas), inclusive para você, após um período de tolerância. Mas se você enviar um endereço de e-mail e ativar o ícone de sino, receberá respostas até que as cancele.
    Nota