Fanfics sobre Xena a Princesa Guerreira

    Capítulo 6

    Redemoinhos de lembranças dos natais passaram dançando nos sonhos da rica mulher; presentes desejados e recebidos, risos e felicitações, papel de embrulhos rasgados afastados na expectativa dos tesouros ocultos que estavam dentro. O som de alguém chorando suavemente se rompeu atravessando a neblina, tirando Ronnie de sua infância e a regressando ao presente. Seus olhos se abriram na escuridão da noite e tomou um tempo para perceber onde estava e o que ela ouviu. “Rose”, sussurrou para si, sacudiu o peso do sono e se levantou.

    “Rose?” Chamou da porta.

    “Acordei você? Desculpe”, a jovem mulher engasgou, agradecida que a escuridão mantivesse suas lágrimas ocultas do olhar de sua amiga.

    “Sabia que as coisas que tinha não fariam nenhum bem”, Ronnie disse quando entrou no quarto e se sentou na cama. “Quer que eu saia agora? Estou completamente sóbria”.

    Rose sacudiu sua cabeça. “Não, não vá, por favor”. A dor era praticamente insuportável, mas o pensamento de atravessar este sofrimento sem Ronnie era ainda pior. “Por favor”. Esticou seu braço e agarrou a mão maior com a sua. “Pode… pode ficar aqui comigo?” Houve uma mudança no peso quando a mulher mais alta deslizou por baixo dos lençóis.

    “Estou justamente aqui”. Ronnie se atreveu a se mover o quanto pôde para mais perto, dizendo a si mesma que era para a comodidade de Rose e não para sua própria. Ficou surpresa quando sentiu a suave bochecha pressionar-se contra seu ombro.

    “Está tudo bem?” A jovem mulher sussurrou. Ronnie sentiu que as lágrimas começavam a encharcá-la atravessando o algodão e se deu conta de que Rose deveria ter chorado durante muito tempo antes que tivesse sido acordada.

    “Está tudo bem”, Ronnie respondeu, movendo-se para um pouco mais próxima.

    “Isto dói”, Rose admitiu, levantando sua cabeça para permitir que o braço de Ronnie deslizasse por baixo. Elas moveram seus corpos numa posição mais cômoda, o mais cômodo que puderam considerando que a mulher ferida não podia rodar sobre seu costado devido a suas pernas quebradas. Ronnie conseguiu enterrar seu rosto no suave cabelo dourado, respirando o delicado aroma. Rose se encontrou apoiada na curvatura do ombro da mulher mais velha, um lugar muito mais confortável do que o travesseiro mais suave poderia ser. Nos braços de Ronnie se sentia segura, protegida, cuidada. A palpitante dor ainda estava ali, mas já de alguma maneira esta parecia suportável agora. Em menos de alguns minutos ambas mulheres estavam profundamente adormecidas.

    *********

    Rose despertou por causa da palpitante dor em suas pernas e o som de Ronnie teclando no computador. “Bom dia”, bocejou, encolhendo-se novamente dentro do calor de seu travesseiro.

    “Bom dia. Suas pílulas estão bem ali na mesinha”. A executiva parou de digitar e voltou a ficar de frente para ela. Foi então que Rose notou que Ronnie estava vestida para trabalhar, um terno em saia e blazer cinza combinando com uma blusa de cor em acentuado creme.

    “Você já saiu?”. A jovem mulher se incorporou devagar, em clara surpresa.

    “Liguei para o hospital logo que acordei e lhes expliquei a situação”. Moveu sua cadeira para mais próximo e serviu-se de um copo de água da jarra. “A doutora Barnes estava lá e expediu uma outra receita para você imediatamente”, disse enquanto dava o copo a Rose. “Depois foi só questão de sair correndo e pegar esta”. Olhou a jovem mulher tomar as pílulas antes de se virar e pressionar algumas teclas. “Tenho que ir. Precisa de algo antes que eu me vá?”.

    “Não, estou certa de que Karen estará aqui logo. Maria já chegou?”.

    “Sim, chegou já faz meia hora. Vou lhe dizer que você já está acordada”. Ronnie se levantou e desligou o computador. “Tem certeza eu posso lhe conseguir algo?”.

    “Não, de verdade, estou bem. Tenha um bom dia no trabalho. Acha que Tommy vai estar lá?”.

    “Duvido. Ele disse algo a noite sobre não estar no escritório hoje”. Um brilho de cólera sobre os acontecimentos da noite nublou suas feições. “É melhor que ele também não apareça”. Esticou uma mão e deu um rápido carinho a Tabitha. “O número de meu escritório é dois na discagem rápida se quiser me ligar”.

    “Não, quero lhe incomodar ou algo assim”. Rose silenciosamente desejava que Ronnie lhe desse um abraço de despedida, mas não se atreveu a lhe pedir um.

    “Se quiser me ligar, só faça. Não se preocupe sobre me incomodar porque isso você não faz”. Vacilou por um momento. “Seria agradável ouvir uma voz amiga na metade do dia”.

    “Ok. Então eu ligo mais tarde”. Deixou o copo abaixo e olhou sua amiga. “Ronnie?”.

    “Hummm?”.

    “Obrigada por ter saído esta manhã. Eu lhe agradeço isso de verdade”.

    Ronnie sorriu. “De nada”. Esticou a mão e apertou a mão de Rose. “Agora de verdade tenho que ir trabalhar. Ligue-me mais tarde, Ok?”.

    “Ok”.

    ********

    Era tarde quando a porta do escritório de Ronnie se abriu e Susan entrou, levando uma pasta manila. “Eu tinha razão”, a ruiva disse triunfantemente quando lançou a pasta sobre a mesa.

    “Tinha razão sobre o que?” Ronnie perguntou com desinteresse, não se incomodando em desviar o olhar de seu computador.

    “Sua hóspede”. Recolheu a pasta e a abriu, repassando as informações que havia obtido. “Rose Grayson se formou no instituto de Albany. Não há registros que tivesse ido para alguma universidade ou que possua um cartão de crédito. Ela inclusive não tem carteira de motorista”.

    Ronnie se levantou rapidamente, enviando para trás sua cadeira que ficou balançando enquanto Ronnie arrebatava a pasta das mãos de Susan. “A investigou?”.

    “Tive que fazê-lo”, a irmã mais nova protestou. “Obviamente você acredita em tudo o que ela lhe diz”.

    “E o que lhe importa isso?”.

    “Ronnie, ela não tem obviamente nada e viu um bom ticket de comida”.

    “Você não sabe o que está falando”. Jogou a pasta sobre sua mesa a fechando em um golpe. “Rose não está me usando”.

    “Não? Sabe onde ela trabalhava antes que lhe desse um trabalho?”.

    “Em Money Slasher, eu sei. Ela era uma caixa lá”.

    “Uma caixa de meio período”, Susan corrigiu, “ganhando salário mínimo. Do que posso dizer antes atendia as mesas em um restaurante barato”.

    “Qual é o seu ponto?”.

    “Meu ponto é por que está fazendo isto? Por que deixa que um lixo pobre branco viva a suas custas?”.

    “Não… você… jamais volta a chamá-la assim!” Ronnie gritou. “Não sabe o que está falando, e quanto à ‘lixo branco’, já deu uma boa olhada em Tommy ultimamente?”.

    “Está tentando mudar de assunto”.

    “Estou? A está julgando porque ela não tem o dinheiro que você e eu temos. O quanto isso é justo?” Aproximou-se da janela e olhou para o triste céu cinza. “Tomou tempo para falar com ela e verificar que tipo de pessoa ela é? Não. Nem todo o mundo que não tem dinheiro é sujeira e nem todo o mundo que é rico é uma boa pessoa”.

    “Não estou dizendo isso”.

    “Não está? Averigua que não nasceu privilegiada e em seguida assume que ela é uma escavadora de ouro”.

    “Então, o que ela é, Ronnie? Ajude-me a entender porque agora mesmo não consigo”, Susan questionou. “Tente olhar do ponto de vista da família. Uma mulher da que nunca ouvimos falar de repente se muda para sua casa, completamente com um gato e óbvios problemas médicos e espera que só nos recostemos e não fiquemos preocupados?”.

    “Sim. É minha vida, Susan. Quem se aloja em minha casa é minha preocupação, não sua. Não fiz uma investigação sobre Jack quando você anunciou que ia se casar com ele”.

    “Está planejando se casar com ela?”.

    “Ainda não aceita que ela é só uma amiga, não?” Cruzou a sala e se deixou cair no sofá de couro negro. “Por que você se preocupa tanto?”.

    “Só não desejo lhe ver machucada… outra vez”.

    “Isto não é como Christine, já lhe disse isto antes”.

    “Pode não pensar assim, mas o que eu vi…”.

    “Então olhe melhor outra vez. Rose não quer nada de mim. Ela é só uma amiga. Pare de tentar fazer com que isto seja algo que não é”. Deu um pontapé em seus sapatos tirando-os e meteu seus pés debaixo de suas pernas. “Não a conhece, Susan. Não sabe como ela é. À noite seu frasco de Percocet foi roubado. Ofereci-me para conseguir outro, mas ela não quis que eu fosse. Isso soa como alguém que está só interessado em meu dinheiro? Ela não me pediu nem uma maldita vez que lhe comprasse alguma coisa. Tudo o que faço, faço porque quero fazer, não porque ela me peça”. Agitou sua mão descartando. “Entenda, esqueça isso”.

    “Olha. Você é adulta. Toma suas próprias decisões. Investiguei tudo o que pude sobre ela hoje. Toda a informação está neste relatório. Faça com isto o que quiser”. Susan se dirigiu até a porta. “Ronnie, não se esqueça do jantar de amanhã com mamãe”.

    “Oh, estou ansiosa para que comece”, disse sarcasticamente. “Enviou a ela uma cópia por fax de seu precioso relatório? Ou só anunciou no Times Useless?”.

    “Isso não foi necessário, Ronnie. Estou só cuidando de você”.

    “A última vez que olhei, eu cuidava de mim mesma muito bem. Não me lembro de ter lhe pedido para ser minha babá”.

    “Bom. Faça o que quiser, você fará de qualquer maneira”. Susan se foi, não se incomodando em fechar a porta. Laura, que havia escutado as vozes altas, discretamente fechou a porta e voltou a sua mesa, sabendo que o interfone tocaria em alguns segundos.

    “Laura, segure minhas ligações”. Um segundo depois, duas linhas se acendiam e a jovem assistente administrativa teria apostado seu cheque completo de que ela sabia a quem sua chefa chamava.

    “Residência Cartwright”, Maria atendeu.

    “Oi Maria, posso falar com Rose, por favor?”. Ronnie ainda estava sentada em seu sofá no escritório, com várias linhas bloqueados no telefone que estava colocado no chão ao lado dela. Era nessas ocasiões que agradecia a longitude extra no fio telefônico cinza, mesmo que este conseguisse se enrolar em seus pés debaixo da mesa de vez em quando.

    “Oi?”.

    “Oi”. O som da voz de Rose, fez com que Ronnie sorrisse, a tensão de sua conversa com Susan desapareceu. “Como esteve a juíza Judy hoje?”.

    “Oh, não acreditaria nos casos que ela teve”.

    “Conte-me sobre eles”, pediu, acomodando-se novamente dentro de uma cômoda posição. Ronnie não podia explicar isto, mas o som da voz de Rose tinha um efeito calmante nela e, nestes momentos, precisava desse conforto.

    **********

    Alguns dias depois, Rose foi ao hospital para tirar os pontos e para fazer novas radiografias de suas pernas. Ronnie estava sentada na sala de espera, lendo uma velha revista de seis meses atrás.

    “Já estou quase terminando”, a doutora Barnes disse, tirando o último ponto da bochecha de Rose. Deu um passo atrás e jogou suas luvas no recipiente vermelho de lixo. “Bom aspecto. Acho que não ficará cicatriz. Lembre-se de mantê-la afastada do sol até que esteja completamente curada. Não acho que seja um problema nesta época do ano”. Fez uma anotação no registro de Rose. “A senhorita está se recuperando esplendidamente. Nesse ritmo que está indo, não vejo nenhuma razão para que a senhorita não esteja usando muletas até o final da primavera”.

    “Final da primavera?”.

    “Final da primavera”, a doutora repetiu. “Seu corpo sofreu um severo trauma. Seu tornozelo estava quebrado em sete partes. Vai levar tempo para curar. Entenda isso, Srta. Grayson, nós estamos falando de meses de terapia, não semanas”. O coração da jovem mulher se afundou nas palavras. Ela sabia que levaria tempo, só que não tanto tempo. Como ia reagir Ronnie? Certamente isso seria muito tempo para permanecer no lugar que estava rapidamente considerando como seu lar.

    Apesar dos medos de Rose, Ronnie aceitou as notícias bem, esta estava mais preocupada com o progresso da recuperação do que com o tempo. Embora tenha causado um pouco de incômodo, a jovem mulher insistiu que poderia viajar no assento traseiro da Cherokee e se sentando de lado, permitiu que as pernas se apoiassem sobre o intenso cinza do veludo. Ronnie fez o possível para evitar os baques, mas ainda assim algumas vezes nas quais olhava pelo espelho retrovisor via Rose fazer expressões de dor quando passavam sobre um ponto particularmente áspero da rua. “Sabe que poderia ficar em casa esta noite”, disse quando viraram dentro de Cartwright Drive.

    “Não, sua mãe e irmã estão contando com você. Estarei bem”.

    “Mas se precisar usar o assento ou algo assim? Se precisar de uma bebida?”. Atirou o jeep no caminho de entrada e desligou o motor.

    “Irei antes que você se vá. Se encher uma jarra na mesinha, tenho certeza que ficarei bem”.

    *********

    Ronnie foi a última a chegar no condomínio de sua mãe. Culpou o tráfego na hora de pico de sexta-feira, mas a verdade era que encontrou dificuldade em deixar Rose sozinha. Uma jarra cheia de água, latas de refrigerantes gelando na geladeira, várias porções de alimentos ao alcance da mão da mulher ferida… Não deixou nada improvisado, inclusive até anotou o número do telefone de sua mãe só para o caso de Rose precisar de algo.

    A pequena mesa redonda da sala de jantar era de tamanho suficiente para acomodar todos. Ronnie se encontrou sentada entre Elaine e Susan. Já era ruim ficar colada a uma pessoa na direita, mas pior que isso era o forte cheiro do perfume de sua tia, que ameaçava tirar o apetite de Ronnie. “Que cheiro maravilhoso”, disse Susan quando a tigela de carne foi colocada na mesa.

    “Obrigada, querida”, Beatrice respondeu como se tivesse sido ela quem havia passado horas preparando a comida ao invés de sua assistente de meio período. “Sabe que sua irmã sempre desfruta de um bom assado de porco”.

    “Sim, eu sei”, Ronnie concordou de boa vontade, esticando o braço até a tigela.

    “Hei, deixa algo para o resto de nós”.

    “Vamos Susan, não se preocupe com isso”, sua mãe a repreendeu. “Há suficiente para todos”. Virou-se para sua filha mais velha. “Pegue o quanto quiser, querida. Estou certa de que deve estar cansada desses jantares requentados que Maria faz para você”.

    Ronnie se serviu do fumegante caldo de porco. “Maria é uma maravilhosa cozinheira, mãe, você sabe”.

    “Sei que quando eu dirigia a casa ela trabalhava até as oito da noite. Nunca tive que me preocupar com os pratos sujos amontoados até a manhã seguinte”.

    “Tenho um lava-pratos”.

    “Humm, outro eletrodoméstico comprado para que ela trabalhe menos, sem duvida”. Beatrice se serviu com uma concha de um pouco de molho sobre seu prato. “Saiba que a acostuma mal”.

    “Eu sei”, Ronnie sorriu, tirando um sorriso de sua irmã e um cenho franzido de incômodo de sua mãe.

    “Primeiro foi cada final de semana livre, depois foram as horas encurtadas. Pelo menos, ela vai, está pagando para ela permanecer em casa como essas pessoas devem estar”.

    “Mãe, ela faz uma semana completa de trabalho, como qualquer outra pessoa”.

    “Tenho certeza de que ela está bem mais ocupada agora com sua amiga lá”, Susan concordou.

    “Sim, como está essa pobrezinha, querida?” Elaine perguntou. “Ela parece uma garota tão agradável. Qual era mesmo seu nome? Rachel, Ruth…”.

    “Rose”, Ronnie corrigiu.

    “Ah sim”, a parente que estava de visita disse, em absoluto interessada no nome correto. “Bem, de qualquer forma ela parece uma garota agradável. Passe-me o milho, por favor. Bea, viu o jornal onde fala da gentalha emocionada sobre os cuidados da saúde outra vez?”.

    “Acho que o presidente tem coisas melhores com que se preocupar”, a matriarca replicou. “Jack, conhece alguém sem seguro?”.

    “Claro que não, mamãe”, ele respondeu, aprendeu há muitos anos exatamente que respostas sua sogra queria ouvir.

    “Viu, esse é meu ponto exatamente. Eles precisam se preocupar com coisas mais importantes como reformar o código de impostos ou trazer novamente as orações às escolas”. Beatrice tomou um gole de vinho. “Estou lhes dizendo, aqui é onde o país está mal. Houve uma época em que os garotos respeitavam os mais velhos. Agora não posso conseguir que o garoto do jornal o entregue na porta quando está chovendo. E ele me perguntou por que não lhe dou gorjeta. Gorjetas que deveria ganhar, mas parece que hoje em dia pensam que as merecem só por fazer seu trabalho”.

    Durante o resto do jantar e depois de jantar, e das bebidas, Ronnie tentava prestar atenção a conversa, mas sua mente encontrava-se escapulindo de novo em pensamentos até uma mulher loira que a esperava em casa. Perguntava-se se ia dormir no sofá ou se Rose lhe deixaria dividir a cama outra vez. Esperava pelo último. A mente de Ronnie estava tão ausente que não ouviu quando sua mãe se dirigiu a ela e foi só quando Susan lhe cutucou por debaixo da mesa que regressou ao presente. “Desculpe, o que?”.

    Beatrice franziu o cenho irritada. “Perguntei se planeja vir aqui para o Natal. Honestamente, Ronnie”.

    “Desculpe, estava só pensando sobre algo”.

    “Ou alguém”, Susan disse tão baixo que só sua irmã pôde ouvi-la.

    “De verdade, acho que passarei o Natal em casa este ano”, respondeu, dando uma olhada furiosa a sua irmã mais nova.

    “Oh bem. Elaine me perguntou se a acompanhava em um cruzeiro, mas não queria que estivesse sem um lugar para ir”.

    “E sobre Tommy?” Susan perguntou.

    “Ele disse que tinha outros planos este ano, algo sobre ir até as montanhas, com alguns amigos seus. Você e Jack tem as crianças, assim a única que me preocupava era sua irmã”.

    “Estarei bem, mamãe”. Ronnie olhou seu relógio. “Não me dei conta da hora. Preciso voltar para meu escritório e verificar alguns relatórios antes que fique muito tarde”. Levantou-se e deixou seu guardanapo no agora prato vazio. “O jantar esteve maravilhoso, como sempre”.

    “Essa é minha filha, sempre trabalhando”, disse Beatrice. “Talvez algum dia encontre o tempo para assentar a cabeça e me dar alguns netos”.

    Ronnie ignorou o comentário e colocou seu casaco. “Realmente preciso ir”. Deu uma olhada para fora pela janela. “Está começando a nevar forte lá fora”.

    “Claro, claro. Vá, e trabalhe na fabricação de dinheiro. Acho que terei que depender de Jack e Susan para que me dêem um neto”.

    “Acho que sim”, A mulher de cabelo escuro disse quando alcançou a maçaneta da porta. “Jack, tenha cuidado no caminho de volta para casa, parece que há água sobre a neve. Boa noite a todos”.

    **********

    “Hei, ainda está acordada”, Ronnie disse quando entrou no que antes era considerado seu escritório e no que agora era o quarto de Rose.

    “Sim, são só dez horas”.

    “Está passando algo bom?”.

    “Não realmente”. Rose usou o controle para desligar a televisão antes de dar algumas palmadinhas no espaço na cama a seu lado. “Então como foi o jantar?”.

    “Exaustivo”, a mulher mais velha suspirou, tomando assento no lugar que havia sido oferecido na cama ajustável e se colocou em uma posição confortável. “Agora lembro porque odeio tanto os jantares familiares”.

    “Por que?”.

    “Todos falam acerca de nada. Dedicam-se a falar sobre coisas das quais não têm controle sobre impostos e gorjetas. Para não mencionar mamãe que começou outra vez a falar sobre que eu não lhe dou netos”.

    “Isso é bastante ruim. Ela faz muito isso?”.

    “Em cada oportunidade que tem”, Ronnie encolheu os ombros. “Vamos, vejamos se há algo na TV”.

    Recostaram-se e assistiram a um drama criminoso. Ambas adivinharam quem era o assassino muito antes que os policiais descobrissem. Quando este acabou Rose não pôde sufocar um bocejo. “Desculpe, devo estar mais cansada do que pensei”, se desculpou quando Ronnie pressionou o botão no controle para desligar a televisão.

    “Tudo bem. Já está ficando tarde. Acho que é melhor eu ir e lhe deixar dormir um pouco”. Fez um movimento de descer da cama unicamente para ser detida pela mão de Rose em seu braço.

    “Vai para cima?”.

    “Não, provavelmente dormirei no sofá, por que?”.

    “Sabe, esta é uma cama grande e tenho certeza de que é mais confortável do que o sofá. Poderia ficar aqui”. Rose mordeu seu lábio inferior. “Quero dizer, se você quiser, não me importaria”.

    Ronnie vacilou por só um segundo. “Bem, não quero lhe apertar ou algo assim”.

    “Você não vai fazer isso”.

    “É mais confortável do que o sofá… mas só se você estiver certa”. Se a verdade fosse dita, poderia dormir em qualquer lugar, mas um definitivamente era seu preferido sobre o outro.

    “Estou certa”. Rose tirou um dos dois travesseiros de detrás de sua cabeça. “Aqui, inclusive divido isso”.

    Ronnie sorriu com o gesto. “Deixa eu me trocar e apagar a luz”.

    Poucos minutos depois Ronnie estava trocada por seu suéter e uma camiseta de algodão. Apagou a luz e deslizou por debaixo das cobertas, conscientemente evitando que seu corpo pressionasse contra o de Rose não importando o quanto desejasse. Sua decisão durou só até o momento em que o sono a alcançou, quando seu corpo tomou o controle e fez o que desejava tão desesperadamente fazer quando estava acordada.

    Meio dormida, Rose acordou completamente quando sentiu o forte braço apoiado através de seu estômago. Ronnie deu um suave suspiro de satisfação em seu sono e se apoio mais perto, sua cálida respiração cariciava o ombro da mulher menor. Rose sorriu na escuridão e desceu sua mão esquerda para colocá-la sobre a mão maior. Isto teria que lhe parecer estranho, dormir junto a alguém depois de passar os primeiros vinte e seis anos de sua vida dormindo sozinha, mas não foi assim. Estar deitada junto a Ronnie lhe parecia natural, cômodo, correto. Acreditava que a mulher mais velha de verdade cuidava dela, algo que Rose nunca havia realmente sentido antes. Isto a encheu com um sentimento de bem-estar, o que seja, algo que não poderia nomear exatamente, mas igualmente era um sentimento maravilhoso. Outro suspiro e a mulher mais velha se moveu para mais próximo, seu queixo apoiado sobre o ombro de Rose e seu rosto enterrado em seu cabelo loiro.

    O tempo fazia tic tac enquanto a jovem mulher desfrutava das sensações, o calor da mão de Ronnie através da camisa de dormir de algodão, as suaves respirações fazendo cócegas em sua orelha. A sensação de segurança e confiança que a cobria como jamais uma manta poderia. Rose, teve amigos ao crescer, companheiros, garotas com quem compartilhava segredos, mas nunca sentiu por eles o que sentia por Ronnie. Seus sentimentos percorrendo-a eram mais profundos que algo que tivesse conhecido e se isso teria que lhe ter assustado, não o fez. Virou sua cabeça de lado e colocou um suave beijo na testa de Ronnie. “Doces sonhos”, sussurrou antes de fechar seus olhos e deixar que o sono a alcançasse.

    ********

    A oxidada Statión Wagon tamborilou seu caminho até subir a Morris Street. Delores Bickering observou o endereço que estava procurando e dobrou estacionando em frente a este. Havia planejado visitar sua irmã, mas decidiu que já que estava na área de qualquer modo não faria mal parar e ver Rose, especialmente desde que ainda não havia recebido uma resposta, ou um cheque, da jovem mulher. Através da manivela baixou a janela e esticou a mão até a maçaneta exterior, já que era única maneira de abrir a porta do carro, e saiu. Desceu as escadas que conduziam ao apartamento do sótão, franzindo o cenho quando viu um casal de hispânicos movendo-se lá dentro. Chamou na porta. “Rose Grayson mora aqui?”.

    “Não, nós acabamos de nos mudar. A senhora pode falar com Cecil. Ele mora no andar de cima”.

    “Que porra quer?”. Cecil perguntou quando abriu a porta.

    “Estou procurando Rose Grayson. Pensei que ela morava aqui”.

    “A expulsei”, grunhiu. “A maldita cadela também não me deu nenhum aviso”.

    “O senhor sabe para onde ela se mudou?”.

    “Quem fodida é você?” Olhava a Delores suspeitosamente.

    “Sou sua mãe”, mentiu.

    “Não sei e não dou a mínima merda. Se a senhora quer saber, deve perguntar a cadela que esteve aqui. Espere, tenho seu nome aqui em alguma parte. O anotei no caso de o cheque que me deu voltasse”. Regressou para dentro do apartamento, a deixando do lado de fora. Um minuto depois voltou com um Post it com uns ganchos de ferro e algumas anotações neste. “Aqui está, é o nome e o endereço da cadela que tirou suas coisas”.

    Delores tomou o papel e o olhou. V. Cartwright, One Cartwright Drive, Loudonville. “O senhor tem um número de telefone?”.

    “Pareço a puta cabine de informação?”. Grunhiu. “Isso é tudo o que sei. Agora, a menos que a senhora esteja interessada em alugar o terceiro apartamento, está me fazendo perder a merda do meu tempo”. Fechou a porta sem esperar uma resposta. Delores voltou a seu carro, desconcertada. Alguém que vivia em uma rua com o mesmo nome que o seu era sem dúvida rico, e o fato de que este fosse em Loudonville, onde ninguém que estivesse recebendo subsídio poderia viver era ainda mais intrigante. Decidiu que precisava averiguar mais. Ajustou a almofada no assento dianteiro, a única coisa que mantinha afastada as gastas molas de pressionar seu traseiro, e girou a chave várias vezes antes que o velho carro Station Wagon de vinte anos crepitasse a vida.

    Parou na loja mais próxima do bairro para abastecer o carro, não se preocupando em parar na bomba de gasolina mais afastada. Deixe-os esperar, pensou para si mesma enquanto colocava o injetor no tanque. Colocou exatamente cinco dólares de gasolina no tanque antes de entrar na loja. Uma vez dentro, pegou um mapa das ruas do condado de Albany e se dirigiu até o fundo onde os refrigerantes na geladeira estavam alinhados. Enquanto abria a caixa com uma mão, Delores utilizou a outra para meter o mapa das ruas em seu bolso. Aproximou-se do gordo atendente ficando frente a este com uma garrafa de pepsi em sua mão. “Setenta e cinco centavos pelo refrigerante e cinco pela gasolina”, o atendente disse. Delores tirou uma gasta nota do bolso de sua jaqueta junto com um selo de comida de um dólar. O atendente assentiu e lhe devolveu vinte e cinco centavos, ignorando por completo o roubo na loja. Como sempre fazia, Delores não pôde deixar de sorrir quando saiu da loja, conseguindo uma vez mais ir embora com algo grátis.

    O Station Wagon gaguejou e atravessou o congestionado tráfego de Albany entrando na área residencial mais tranqüila de Loudonville. No povoado onde a receita prometida estava também dentro das seis cifras, o oxidado Ford com falsos painéis de madeira ressaltava em um marcado contraste com os veículos mais novos da vizinhança de Ronnie. Delores fez duas equivocadas voltas antes de encontrar Cartwright Drive, culpando o mapa das ruas e não a si mesma. Decidindo que a grande mansão no princípio da rua tinha que ser o número um, jogou seu carro sem inspecionar e sem se assegurar no longo caminho de entrada, parando justo atrás de um jeep Cherokee azul brilhante. Tirou a chave da ignição e esperou um momento enquanto o carro continuava funcionando antes que este finalmente desse um moribundo grito e ficasse silencioso. Gotas de óleo mancharam a entrada principal enquanto Delores baixava a janela rodando a manivela para alcançar a maçaneta da porta. Sem dúvida sobre isto, pensou para si. Esta tem que ser o número um de Cartwright Drive. Se Rose conhecia a pessoa que possuía esta casa, por certo isto valia a investigação, Delores raciocinou. Seguindo o caminho de entrada, notou as telhas de louça que rodeavam a varanda e conduziam a grande porta dupla da entrada.

    *********

    Ronnie trabalhava em seu computador quando ouviu o barulho do som de um carro que era jogado no caminho de sua entrada. Uma rápida olhada na cama confirmou que Rose estava ainda profundamente adormecida. Levantou-se e se aproximou da janela, olhos azuis se ampliaram na visão do Station Wagon de cor café, branco e oxidado situado no caminho de sua entrada. “Mais que inferno…?”. A janela desceu rodando e um braço esticado apareceu para alcançar a maçaneta. Viu quando uma mulher redonda, mal vestida, saía do carro e olhava a casa. O primeiro pensamento de Ronnie foi que era um viajante perdido ou um desses irritantes vendedores de porta em porta. Deu outra olhada na mulher pacificamente dormindo e decidiu interceptar a inesperada chegada antes que o som da campainha pudesse acordar Rose.

    Ronnie abriu a porta e se deu conta de esta não era nenhum vendedor ambulante. Um negro gorro tecido com uma bola na ponta cobria a cabeça de uma mulher que parecia estar na metade de seus anos quarenta enquanto uma suja jaqueta amarela com várias manchas espalhadas cobria a parte superior de seu corpo. Ela segurava uma bolsa de grande tamanho nas mãos que não levavam luvas e seus pés estavam cobertos com um par de tênis que haviam deixado de serem considerados brancos há muito tempo. A executiva de cabelo escuro desceu o olhar na mulher mais baixa e franziu o cenho. “Posso ajudá-la?”.

    “Humm, sim”, Delores disse, levantando o olhar com surpresa. “Como soube…”.

    “Eu ouvi…”. Ronnie fez uma pausa quando tentou pensar em um termo discreto para a sucata, “seu… carro… estacionar em minha entrada. O que quer?”.

    “Estou procurando alguém que me disseram que a senhorita poderia saber onde ela está. Seu nome é Rose Grayson”.

    “Quem lhe disse que eu poderia saber onde ela está?” Ronnie agora sabia quem era a mulher que estava parada diante dela e não estava absolutamente feliz com a revelação. Havia prometido levar o talão de cheques de Rose ao hospital, mas com a inesperada alta e tudo o que havia acontecido desde então, não haviam mais mencionado o assunto. Pelo que Ronnie sabia, Rose não havia enviado nada desde que estava em sua casa. Assim como esta sanguessuga a encontrou?

    “Parei em seu anterior apartamento e me disseram que a senhorita lhe havia pagado o aluguel”. Delores tremeu e olhou sutilmente a porta. “Posso entrar? A senhorita sabe que está bastante frio aqui fora”.

    Ronnie maldisse mentalmente a quem quer que a lhe tenha dado educação e deu um passo atrás, mantendo a porta aberta. “Entre, senhora…?”.

    “Bickering, Delores Bickering”, a mulher redonda disse, passando pela executiva e tirando seu gorro tecido para revelar o liso cabelo castanho que parecia precisar de uma boa limpeza. “De modo que a senhorita é V. Cartwright?”.

    “Sim”, Ronnie disse sem se incomodar nos detalhes adicionais. Agora estava frente a um dilema moral. Poderia fingir que Rose não estava ali e despachar Delores empacotada, mas esse risco transtornaria a jovem mulher. Então outra vez, não estava certa que desejasse deixar ao abutre próximo de sua companheira. Aceitou de maneira renuente que a decisão não era realmente sua. “Espere aqui”.

    Ronnie cruzou a sala e entrou em seu escritório, se assegurando de fechar a porta atrás dela. Ajoelhou-se sobre a cama e colocou sua mão no ombro da mulher adormecida. “Rose… Rose querida, acorda”.

    “Hummm?”. Olhos verdes se abriram e piscaram pesadamente.

    “Temos companhia, tem que se levantar”.

    “Companhia?” Deu um são bocejo e esfregou seus olhos. “Quem?”.

    “Delores”. Ronnie fez o possível para não deixar mostrar sua irritação.

    “Delores? Bickering? Aqui?” Os olhos de Rose se dilataram.

    “Hei, se não deseja vê-la…”.

    “Não, se se incomodou a me procurar então eu lhe devo pelo menos isso”.

    “Rose”. Tomou o queixo da mulher mais jovem em sua mão. “Você não lhe deve nada. O que ela fez por você no passado você já lhe devolveu em todo, tenho certeza”. Suavizou seu tom, percebendo que isto não ajudava. “Desculpe, sei que sente que lhe deve e não deveria estar lhe dizendo como pensar ou sentir”. Retirou a mão e se recostou. “Só não gostaria de ver que está sendo usada e temo que é exatamente por isso que Delores está aqui”. Pegou a escova e começou a escovar o desordenado cabelo de Rose.

    “Ronnie?”.

    “Humm?”.

    “Seria muito perguntar se poderia pedir emprestada a blusa que você usou ontem? Posso cobrir o resto de meu corpo com uma manta”.

    “Será um pouco grande para você, mas não há problema para mim”. Inclinou-se e usou seu longo braço para puxar a blusa cinza colocada no respaldo da cadeira. Rose tirou a camisa de dormir ao mesmo tempo e quando Ronnie se endireitou sua visão foi cumprimentada pelos firmes seios da jovem. Com renuncia tentou manter seu olhar fixo para se concentrar em ajudar Rose a colocar os braços nas mangas. “Deixarei que você a abotoe enquanto eu trago a cadeira”. Disse repentinamente, deixando a cama e recuperando a dobrada cadeira de rodas no canto. Poucos minutos depois Rose estava confortavelmente colocada em sua cadeira, a manta colocada cuidadosamente ao redor de suas pernas e quadris. “Está pronta?”, Ronnie perguntou.

    “Sim”, veio a indiferente resposta. A última pessoa que queria ver era Delores. Não havia respondido a última carta e em sua mente não duvidava de que a antiga mãe adotiva mencionaria o assunto do dinheiro, especialmente depois de descobrir onde ela estava vivendo. “Ronnie?”.

    “Sim?”.

    “Poderia… quero dizer, se você não se importar, poderia… ficar comigo?”. Esperava que a presença de Ronnie pudesse evitar que Delores perguntasse pelo dinheiro, mas mais que isso, desejava o apoio emocional que sabia que sua amiga lhe daria. Sorriu quando sentiu a cálida mão apertar seu ombro.

    “Tudo sairá bem, não se preocupe”, disse Ronnie.

    Delores voltou de sua inspeção aos vários enfeites que ainda estavam pendurados e ofegou quando viu Rose em uma cadeira de rodas. “O que lhe aconteceu?”.

    “Fui atropelado por um carro”, a jovem mulher respondeu. “Como soube onde eu estava?”.

    “Seu senhorio me disse”, disse com insuficiência. “Você demandou a pessoa que lhe atropelou?”.

    “A polícia não sabe quem foi. Ele fugiu depois do acidente”.

    “Não puderam encontrá-lo? Isso é uma vergonha. Se o encontrassem, você poderia tê-lo demandado. Conheço um bom advogado que lhe ajudaria se fosse necessário. Ele me representou quando escorreguei em um pouco de água no supermercado. Conseguiu uma indenização de quatro mil dólares”. Delores entrou na parte do desnível da sala de estar e afundou no sofá de pele, tirando uma olhada de desaprovação de Ronnie. “Então, conte-me, o que tem feito. Não tenho notícias suas há quase dois meses”. Alcançou sua grande bolsa e tirou um desgastado estojo de cigarros de vinil e um isqueiro, acendendo um cigarro sem pensar.

    “Não permito fumar em minha casa”, disse Ronnie.

    “Oh, me desculpe, tenho meu próprio cinzeiro”, Delores respondeu enquanto tirava um pequeno moedeiro cor de café.

    “Não, eu não permito fumar em minha casa”, a mulher de cabelo escuro enfatizou, não se preocupando em nada com o brilho que recebeu da grande visitante, mas preocupando-se muito que Rose não fizesse um som de objeção.

    “Oh, certo”. Delores tomou uma longa tragada antes de apagar o toco de cigarro. “Então Rose…”. Exalou, enchendo o ar ao redor com a translúcida fumaça. “Quanto tempo ficará com a Srta Cartwright, ou agora você mora aqui?”.

    Rose piscou surpresa e olhou para sua benfeitora, fazendo a mesma pergunta com seus olhos. Ronnie engoliu, insegura de como responder. O que deseja, Rose? Em sua mente não havia dúvidas de que desejava a mulher de cabelo loiro em sua vida, e em seu lar. Deixando a decisão para mim, significa que também deseja isso? Investigando nos olhos de Rose, Ronnie inspirou profundamente e correu o risco, deixando seu coração dirigir sua resposta. “Ela mora aqui”.

    Rose abriu sua boca, depois a fechou, impressionada sua capacidade de falar desapareceu por um momento. “S… sim, é isso”. Sua voz se quebrou e lutou para manter um sorriso afastado de seu rosto. “Pois então, o que lhe fez vir para esta área? Visitando Isabel outra vez?”. Perguntou, referindo-se a irmã de Delores.

    A mulher grande assentiu. “O Tupperware chegou. Sabe que ela nunca consegue tempo para entregá-lo. Se eu não venho e não os pego acabará usando-os ela mesmo ou os vendendo a alguém por um preço justo como fez com o episódio dos biscoitos. Lembra disso, não foi, Rose?”.

    “Isabel recolheu todo o dinheiro pelos biscoitos das meninas exploradoras, mas não o tinha quando chegou à hora de pagar por eles”, Rose explicou a Ronnie.

    “Soa exatamente como uma família”, a executiva disse secamente.

    “Isso sem mencionar o que seus filhos fizeram antes que fossem repartidos”, Delores acrescentou, sempre pronta a aproveitar a oportunidade de maltratar o resto de sua família, inclusive se ela era culpada das mesmas coisas. “De modo que…” Virou sua atenção a sua antiga filha adotiva. “E o que diz os médicos? Espero que você tenha ido a um hospital de verdade e não apenas a uma clínica. Sabe que eles não sabem de nada ali. Lutei com eles por cinco anos sobre Jimmy e nunca encontraram algo mal nele”, disse Delores. Rose assentiu educadamente pensando para si que a razão pela qual nunca haviam encontrado algo em seu irmão adotivo era que nunca houve nada de mal com ele. Jimmy era a imagem da saúde durante o tempo que ela permaneceu com eles, no entanto Delores o arrastava de médico a médico, insistindo que uma rara e terrível doença afetava seu filho mais novo. “Sabe, ele está no colégio agora”.

    “De verdade?”. Rose não havia pensando que ele pudesse fazer o secundário. “O que ele está estudando?”.

    “Atuação. Algum dia conseguirá sua própria série justo como Seinfield. Inclusive conseguiu uma oferta para atuar no centro” presumiu, como se o centro Cobleskill fosse algo para presumir. “Estão fazendo Joseph e o Amazing Technicolor Dreamcoat. Andy Gibb dirige a obra na Broadway, você sabe”.

    “Agora há alguém para visitar”, Ronnie disse arrastando as palavras, ganhando uma sobrancelha levemente levantada da jovem mulher. Deu a Rose uma suave careta, mas rapidamente voltou a sua normal expressão irritada à medida que Delores continuava divagando e enchendo a jovem mulher com todos os acontecimentos triviais que haviam acontecido em sua família recentemente. Finalmente, como Ronnie suspeitava, a conversa virou ao dinheiro.

    “Sabe que o estado deixou de me pagar por Jimmy quando ele completou dezoito anos. Não lhes ocorreu que preciso desse dinheiro extra cada mês para os outros meninos. Um no colégio e os outros quatro meninos ainda no primário”.

    “Jimmy não está lhe ajudando?” Rose perguntou.

    “Ele trabalha só nos finais de semana no posto de gasolina do Fred. Precisa desse dinheiro para a gasolina para ir e vir da escola”.

    “Parece que Jimmy precisa conseguir outro trabalho e ajudar”, Ronnie brincou, ganhando outra desaprovação, se bem que breve, no olhar de Rose. Delores se moveu, centrando sua atenção na jovem mulher e desejando que a mulher de cabelo escuro se fosse. Para seu prazer, foi nesse momento que o telefone tocou e Ronnie se desculpou por um momento. A maquinadora mulher se inclinou para frente em seu assento.

    “O estado não se importa. O idiota do assistente social também não se importa”. Fez uma pausa, suspirando para o efeito. “É tão difícil quando se está sozinha, entende isso, não é, Rose?”.

    “Sim”.

    Delores sorriu por dentro. “Sabe foi difícil quando você estava lá, todos os sacrifícios que tive que fazer para manter você e os outros fora do orfanato do estado e dos lares de grupo”. Olhou, satisfeita, quando Rose assentiu. O anzol está colocado, agora o encaixe, a gorducha mulher pensou. “Conseguiu algum dinheiro por incapacidade, não é?”.

    “Na verdade, não. Eu não obtive nenhum benéfico em Money Slasher e não solicitei nada”. A cabeça de Rose se inclinou, em uma expressão visível de seu conhecimento sobre em quanto e aonde ia a conversa e sua incapacidade de falar forte e parar esta.

    “Mas está vivendo aqui. Não pode me dizer que alguém como ela lhe permite viver aqui sem renda. Deve lhe pagar algo”.

    “Acho que isso é um assunto entre Rose e eu”, disse Ronnie quando voltou à sala, com seu tom enérgico finalizando o assunto. Não deixou de perceber a olhada de alívio que passou pela agradecida mulher. Também não pôde deixar de perceber a maneira em que os ombros de Rose caíram.

    “Bem não vejo qual seja o grande reparto. Só pedi uma simples resposta”. Delores tentou parecer magoada, mas ninguém acreditou nisso.

    “E esta foi respondida”, Ronnie disse firmemente quando se sentou. Cruzou os braços, deixando claro que não sairia da sala outra vez. Não tinha dúvidas de que se não tivesse voltado a sanguessuga teria colocado culpa em Rose para que ela lhe desse dinheiro. Ronnie estaria se maldizendo se permitisse que isso acontecesse.

    “Acho que Rose é bem crescidinha para falar por si mesma, não acha?”, Delores não tentou ocultar sua raiva. Tinha somente um tiro. “Rose acho que deveria vir e ficar comigo até que você se recupere. Sempre cuidei tão bem de você quando era uma criança”.

    Aí está. A ameaça estava sobre a mesa. Delores estava fazendo com que Rose escolhesse entre ela e Ronnie e a mulher gorducha estava certa que a tranqüila menina que uma vez conheceu e controlou viria adiante e a escolheria.

    “Eu… eu…”. Rose sentia a pressão fechando-se em torno dela. Teria sido tão automático fazer o que Delores tentou por tanto tempo. Agora tinha realmente uma alternativa, uma opção para decidir. Submeter-se ao status estabelecido há muitos anos ou saltar adiante no desconhecido com Ronnie. Levantou a cabeça e olhou na cor azul intensa, vendo somente a calidez e a preocupação. “Eu… eu não desejo ir-me”. Disse isto tanto a Ronnie como a Delores. Observou a executiva soltar uma respiração e lhe dar um pequeno sorriso. Por outra parte, a antiga mãe adotiva parecia furiosa.

    “Rose quero falar com você a sós, ou ela toma todas as decisões por você?” Delores se deslumbrou em Ronnie.

    “Rose é sua própria dona”, a mulher de cabelo escuro disse. “Não a controlo, ou a manipulo”, insistiu. Seu próprio mau humor estava saindo rápido e os pensamentos de Ronnie estavam centrando-se em pegar a mulher gorda por uma orelha e tirá-la da vida de Rose.

    “Então, por que não a deixa decidir isso por si mesma?”, Delores grunhiu, visivelmente desgostosa por seus planos estarem desmoronando. “A senhorita não sabe como trabalhei duro para manter um teto sobre sua cabeça quando ninguém mais pôde”.

    “A senhora recebeu o devido dinheiro extra do estado. Isso é tudo o que aí está”. Ronnie se levantou e começou a andar. “Perguntou a ela alguma vez se havia algo que a senhora pudesse fazer para ajudá-la? Não. Perguntou a ela o que aconteceu e depois entrou em seu próprio pequeno mundo de problemas, a metade dos quais seriam solucionados se a senhora tirasse seu preguiçoso traseiro e conseguisse um trabalho em vez de viver as custas de alguém mais”. Deliberadamente evitou olhar para Rose, certa de que veria desaprovação em seus olhos. Sabia que devia parar, deixar sua amiga lutar suas próprias batalhas, mas ia se maldizer se deixasse Rose desse um centavo mais a abusada Delores Beckering.

    “Não tenho que escutar isto”, a mulher grandalhona disse furiosamente, se colocando de pé e recuperando sua bolsa. “Rose, você está deixando que esta cadela lhe controle. Vai me dar as costas? A única família que tem?”. Subiu sobre o nível principal e se dirigiu a porta. “Depois de tudo o que fiz por você”.

    Rose deixou uma solitária lágrima deslizar por seu rosto. “Espera”. Levantou o olhar a Ronnie. “Por favor?”.

    “Rose”, a mulher de cabelo escuro protestou. “Não tem que fazer isto”.

    “Por favor, só alguns minutos. Estarei bem”. Fez uma expressão de dor internamente ao ver o doloroso olhar no rosto de Ronnie, mas sabia que precisava fazer isto.

    Apesar de não estar completamente convencida finalmente Ronnie assentiu. “Estarei no andar de baixo”. Deu uma olhada assassina em Delores antes de sair da sala.

    *********

    “Hummmf”, Delores grunhiu quando voltou a seu assento. “Não sei, Rose. Essa gente rica pensa que podem controlar todo o mundo só porque tem dinheiro”.

    “Ronnie não é assim”, a jovem mulher protestou.

    “Ela não lhe deixou falar por si mesma. Você é crescida. O que faz com seu dinheiro é assunto seu, não dela”. Alcançou sua bolsa e tirou sua caixa de cigarros. “Poderia se pensar que você é uma criança pela maneira que ela lhe trata”.

    “Delores, por favor, não”. Rose apontou para a caixa de cigarros.

    “Obviamente ela também não sabe tratar as visitas”, a mulher grande se queixou, empurrando a caixa novamente dentro de sua bolsa. “Bem, não posso ficar muito tempo. Tenho que recolher o Tupperware e espero ter suficiente gasolina para chegar em casa”.

    “Delores, você entende que não estou trabalhando? Não tenho nenhum dinheiro”.

    “Rose, você mora aqui. Não pode me dizer que se precisar de algo ela não lhe ajudaria”. A mulher grande apontou o óbvio. “Você não morrerá de fome… ou ficará sem gasolina em algum lugar deserto na estrada a caminho de casa…” Delores fez uma pausa para o efeito. “Lembra daquela vez que estava nevando e tive que lhe levar ao médico… O que foi aquela vez?”.

    “Dor de garganta”, Rose respondeu mal-humorada, sabendo bem que o que a mulher mais velha queria lembrar.

    “Isso. Tive que pedir receitas para ambos para você e Jimmy porque ele ainda não a havia tido. Não pude ir ao bingo essa semana devido a isso, você sabe”.

    “Sei”.

    “Sabe, os cartões valiam duzentos e cinqüenta dólares e eu tinha a oportunidade de ganhar como qualquer um daquele lugar”.

    “Eu sei”, Rose repetiu, afundando-se mais e mais no papel que já sabia bem.

    “Sabe o quanto estaria assustada a pequena Jéssica se eu não chegasse em casa?’.

    Qualquer força e reserva de Rose havia se desmoronada com a última ameaça. Jéssica tinha nove anos e estava muito apegada a sua mãe. De quanto precisa?”.

    Delores relaxou contra o sofá, se sentindo triunfante. “De pelo menos trinta dólares”.

    “Não tenho tanto”, a jovem mulher mentiu.

    “Quanto tem?”.

    Rose pensou rapidamente. “Só pude economizar quinze dólares”.

    “Bem, se isso é tudo o que pode fazer então acho que é o que será”.

    “Trarei meu talão de cheques”. Agachando sua cabeça em derrota, virou sua cadeira e empurrou-a até o escritório, voltando poucos minutos depois com o cheque em seu colo. Delores já tinha colocado sua jaqueta.

    “Obrigada, Rose. Espero ouvir sobre você no Natal”. Delores esticou a mão para o cheque só para tê-lo sendo tirado pela jovem mulher de seu alcance.

    “Espera…”, convocou sua coragem e respirou profundamente. “Eu… eu realmente não posso lhe dar mais dinheiro depois disto”.

    O sorriso de Delores mudou para um irritado grunhido. “Bem, vou lembrar se terminar sem comida ou algo para não ligar por ajuda”. Inclinou-se e arrebatou o cheque da mão de Rose. Agora, tendo o que ela havia vindo buscar, Delores estava pronta para ir, mas faria o possível para reforçar seu agarre sobre a jovem mulher. Sua voz se voltou estridente, acusadora. “Só lembre-se disto enquanto está sentada aqui em tudo isto…” estendeu os braços abarcando a sala. “Que lutei e sofri para cuidar de você por tanto tempo”. Delores abriu a porta, deixando entrar o ar frio. “Espero que você volte a andar logo, Rose. Talvez algum dia pare de ser tão egoísta e perceba o quanto me custou manter um teto sobre sua cabeça”. A porta se fechou e logo Rose ouviu o som de um motor esforçando-se para ligar. Depois de algumas falsas saídas e um pertadeo¹ acompanhado por uma nuvem de fumaça preta que saia do oxidado tubo de escape, o Station Wagon se retirou da entrada e se dirigiu a rua.

    A porta do sótão se abriu e Ronnie apareceu, olhando ao redor por a procura de sua incômoda convidada.

    “Ela se foi”, Rose disse em resposta a uma sobrancelha levantada. Preocupada que sua benfeitora pudesse não gostar sobre o cheque, escondeu o talão de cheques em baixo da manta do afegão. “Ronnie, desculpe sobre…”.

    “Não, não se preocupe com isto”, a mulher mais velha respondeu, cortando a desculpa. “Não tinha como saber de nenhuma maneira que ela poderia aparecer aqui”. Aproximou-se se colocando atrás da cadeira de rodas. “Tem fome?”. Perguntou. “Não importa, pergunta tola”.

    “O que eu posso dizer? Maria é uma maravilhosa cozinheira”, Rose respondeu. Seu sorriso de orelha a orelha ganhou um rápido despenteado de cabelo de sua companheira.

    “Ok, você se dirige até lá dentro e encontre algo na tv enquanto vejo que delícias Maria nos deixou”.

    Enquanto o dia avançava nada mais foi dito sobre Delores Becking, ambas mulheres estavam mais interessadas em estar deitadas uma ao lado da outra na cama e assistir televisão juntas. Foi só depois que a noite caiu e quando ambas já estavam instaladas para dormir que Rose tocou no assunto.

    “Ronnie?”.

    “Hummm?”.

    “Você ficaria aborrecida comigo se eu lhe dissesse que acabei dando dinheiro a Delores?”.

    “Acho que não poderia nunca ficar aborrecida com você”, Ronnie admitiu, rodando sobre seu costado e apoiando a cabeça em sua mão.

    “Decepcionada?”.

    “Não”, ela suspirou. “Rose, se pareci cortante ou aborrecida ou…”.

    “Hostil?”. A mulher mais jovem ofereceu. Ronnie olhou nas sombras formadas na fraca luz da lua e arqueou uma sobrancelha.

    “Não acho que fui hostil, Rose. Acho que fiz um grande esforço sendo cortês com a bruxa, especialmente considerando que o que realmente desejava fazer era jogá-la no banco de neve”.

    Rose esticou sua mão na escuridão e percorreu seus nódulos para cima e para baixo do antebraço de Ronnie. “Sei o que você fez… e agradeço isso”.

    “Não gosto de ver ninguém usando você, Rose”, sussurrou. “Você merece mais que isso”. Ronnie vacilou por um momento antes de continuar. “Então quanto lhe deu?”.

    “Quinze dólares”, foi a resposta. “Só que lhe disse que esta era a ultima vez”, Rose acrescentou rapidamente.

    “Alguma vez lhe falou isso antes?”.

    “Não”.

    “Bem, então, isso é um começo, de qualquer maneira”. Estendeu sua mão livre e suavemente acariciou a bochecha de Rose. “Hei, entendo, de verdade. É difícil dizer não depois de dizer sim por tanto tempo. Fixe-se em mim e minha família”.

    “Então você realmente não está aborrecida comigo?”.

    Ronnie se inclinou e deu a jovem amiga um abraço. “Nunca poderia estar aborrecido com você”.

    “Não sei o que fiz para merecer uma amiga tão boa como você”, a jovem mulher se engasgou quando se apertou mais forte. Ronnie lhe devolveu o abraço, sorrindo a princípio com a sensação de ter Rose. Então as lembranças vieram sem convite a sua mente… Um brilho azul voando sobre o capuz e o pára-brisa, sangue juntando-se ao chão, e uma série de mentiras desenhadas para cobrir a verdade. O sorriso se desbotou, substituído por um olhar de tristeza.

    “Eu sou quem não lhe merece”. Ronnie sussurrou. Aferrou-se por um longo momento antes de rodar de novo a seu lado da cama. “É hora de nós dormimos um pouco”.

    Apesar de suas intenções quando fechou os olhos, o corpo de Ronnie a traiu quando este fez o que fazia a cada noite. Justo quando Rose estava divagando sentiu o cálido peso do braço da mulher mais velha deixado cair através de seu estômago e a cálida respiração acariciando seu ombro. Sorriu e permitiu que o sono a reclamasse. Profundo na terra dos sonhos, elas deixaram que o calor de cada corpo sorteasse o frio da noite entre elas e um meio século da velha casa não pudesse o manter encurralado.

    ********

    “Ronnie, tem um segundo?” Susan perguntou quando entrou no escritório. “Há uma demanda aqui que não tem nenhum sentido”.

    “Desde quando vem a mim com algo assim?” Perguntou, não se incomodando em levantar o olhar da tela do computador.

    “Desde que implique em materiais e equipamentos totalmente perdidos de mais de cem mil dólares”.

    “O que?”. Ronnie se virou do computador e indicou para que sua irmã se sentasse na cadeira do outro lado da mesa.

    “Orbison Contractors apresentou uma demanda por equipamentos e materiais perdidos do lugar de remodelação desse mini-shopping. Dizem que toda a madeira e ferramentas de um caminhão marca New Work foi roubado”. Deu a Ronnie uma cópia das múltiplas páginas da demanda. “Visto que eles têm completo amparo conosco, também estão demandando pelos salários perdidos devido a falta de equipamento”.

    “Tem certeza de que isto é legítimo? Talvez eles só estejam tentando colocar uma demanda para o dinheiro do seguro”. Ronnie folheou as páginas, franzindo o cenho em cada cifra. “Eles apresentaram uma denúncia à polícia?”.

    “Claro que sim. Encontraram o caminhão, depenado do material em Arbor Hill”.

    Ronnie leu a denúncia cuidadosamente, procurando alguma pista de que isto fosse uma fraude. “Tommy sabe sobre isto?”.

    “Não. Não consegui localizá-lo. Deixei mensagens por todas as partes para ele”.

    “Ele está provavelmente ainda drogado com todo o Percocet que roubou da minha casa durante a festa de Natal”, a executiva murmurou.

    “O que?”.

    “Nada, não importa”. Os dentes de Ronnie se afundaram na suave madeira de seu lápis enquanto continuava estudando atentamente a demanda. “Não há sinais de arrombamento, não que fosse preciso para conseguir passar por uma simples cerca com cadeados, que cercava o lugar do trabalho. O caminhão foi uma perda total e não há sinais de exagero nas cifras aqui, irmã. Com exceção do custo, o que lhe preocupa?”.

    “Realizei uma comprovação nos relatórios que temos no arquivo e pelo que pude ver, este projeto teria que ter sido terminado ou quase isso. Mas segundo o relatório das perdas, eles apenas haviam começado. Liguei para Mike Orbison e ele disse que estavam pelo menos a seis semanas de terminarem”.

    “Se estavam até agora longe de terminarem…”. Ronnie olhou o papel outra vez. “Então por que havia tanto material ali? Olha isto… todas as folhas de grandes vidros, pintura, tábua rock, inclusive tapetes. Pensei que essas eram as últimas coisas que seriam entregues”.

    “Isso foi o que pensei. Talvez eles esperassem estar terminando antes disso”.

    “Não, Mike está neste negócio há bastante tempo para saber exatamente o que precisa e quando precisa. Não posso imaginar que ele tenha mandado que o material fosse encurralado no lugar sem que este fosse utilizado em seguida. Ele sabe como as coisas são facilmente roubadas das obras em construção”. A testa de Ronnie se sulcou enquanto tentava dar forma ao quebra-cabeça. “E tem certeza que estas coisas estavam no lugar?”.

    “Não posso imaginar que ele tenha nos mentido depois de tanto tempo. Sua família trabalha para nós desde os anos sessenta e esta é só a quinta vez que apresentam uma demanda”.

    “Estou certa que é a primeira vez que chegou a seis cifras”. Ronnie pegou o telefone. “Laura, localize Mike Orbison para mim”. Um minuto depois o timbre e a luz que brilhava anunciavam que a tarefa fora cumprida. “Mike? Verônica Cartwright… bem e você? Bem. Mike quero falar com você sobre essa demanda que vocês apresentaram contra Cartwright Insurance. Certo, entendo isso… sim, isso parece estranho a mim também, é por isso que liguei para você… não, não tem problema com isso… sim… absolutamente… uh huh… sim… não, eu não sabia disso… uh huh… Quando foi isso?”.

    “O que está acontecendo?” Susan perguntou, obtendo um cenho franzido de sua irmã.

    “Sim Mike, estou ainda aqui, continue… uh huh… Quando falou com ele ultimamente? Certo entendo… Mike deixe-me lhe perguntar algo, com exceção de seu pessoal, quem mais tinha as chaves do edifício? O que? Bem quando isso aconteceu? Perguntou a ele sobre isso? Quando? E essa foi à última vez que falou com ele? OK Mike… não, entendo perfeitamente… claro… para você também… sim, cumprimente a Sarah… Ok Mike, adeus”. Ronnie desligou o telefone e suspirou.

    “O que ele lhe disse?”.

    “Disse que tudo foi ordenado com semanas de antecedência, mas Tommy esteve empurrando as data para trás, é por isso que tudo estava no lugar quando aconteceu o roubo. O relatório da polícia disse se o caminhão foi preso com arame ou não?”.

    “Acho que não. Não prestei muita atenção a isso, por que?”.

    “Mike disse que Tommy passou por lá a semana passada e depois que ele foi embora um jogo de chaves desapareceu”.

    “Chaves para que?”.

    “O edifício, o caminhão, as caixas de equipamento, tudo. Mike disse que estavam em sua mesa quando Tommy passou, mas não pôde mais encontrá-las esse dia”.

    “Ronnie, você não está pensando…”.

    “Isso é exatamente o que estou pensando”. A mulher de cabelo escuro levantou-se e foi até a janela, o brilhante sol refletindo-se nos bancos de neve abaixo. “Susan, quero que entre em contato com todos os outros empreiteiros e que lhes diga que tratem diretamente comigo de agora em diante, ao invés de Tommy. Se ele se apresentar em alguma parte, quero saber sobre isso”.

    “Por que ele ia querer roubar? Não precisa de dinheiro”.

    “Ele me roubou!”. Ronnie grunhiu furiosamente. “Por que o está defendendo? A verdade está diante de você”. O timbre do telefone interrompeu seu ataque. “O que?”.

    “John Means de Means Auditing na linha um”, Laura respondeu.

    “Ótimo”. Desabou-se em sua cadeira e tomou o telefone. “Espero que isto sejam melhores notícias”, disse antes de pressionar o botão. “Verônica Cartwright”.

    Dez minutos depois uma furiosa Verônica e uma Susan boquiaberta se olhavam fixamente uma para a outra.

    “Agora acredita em mim?”.

    “Não posso acreditar que ele pudesse roubar sua própria família”, a ruiva respondeu reservadamente.

    “Pois ele o fez. Algumas semanas mais e teria arrasado a divisão Real Estate, para não mencionar o que teria feito a companhia em sua totalidade. Teremos sorte se apresentarmos um beneficio este quarto trimestre”.

    “Por que ele precisou de todo esse dinheiro?”.

    “O que você acha, Susan? Não você mesma quem mencionou drogas a semana passada”.

    “Sei o que disse, mas realmente não acreditava nisso”.

    “Teria que ter acreditado”. Ronnie pegou o telefone e ligou pelo interfone para sua secretária. “Laura, quero que ligue para a companhia de segurança e para o chaveiro. Quero que todas as fechaduras sejam trocadas e os códigos das chaves de Tommy sejam bloqueados antes que o dia termine. Ligue para o andar de baixo e se assegure de que ninguém permita que ele entre. Depois ligue para todos os diretores para uma reunião. Não importa a que horas, só se assegure de que todos estejam lá”.

    “Só não posso acreditar nisso”, a irmã mais jovem repetiu.

    “Acredite. Nosso irmão caçula é um ladrão e um mentiroso e que o diabo me leve se ele vai conseguir sair com este”.

    No final do dia todas as fechaduras haviam sido trocadas e as notícias comunicadas ao resto da família. Ronnie parou cada projeto de construção até novo aviso e anunciou que John o irmão de Frank dirigia a divisão Real Estate até que um substituto apropriado fosse encontrado. Como precaução adicional, ligou para o banco e refreou o cartão de crédito empresarial de Tommy como roubado só para se interar que grandes quantidades adiantadas haviam sido tomadas no cartão durante as últimas duas semanas e que este havia alcançado seu limite. Outra parte da informação para acrescentar a palpitante dor de cabeça de Ronnie causada pelos problemas.

    ********

    “O que acha de um lindo cachecol de lã?”.

    “Ela odiará isso”.

    “Hummm… O que acha que um vidro do seu perfume preferido?”.

    “Ugh, odeio seu perfume”.

    “Bem, do que ela gosta?”. Rose passava as páginas do catálogo do Macy’s. “Tem uma bonita joalheria aqui”. Elas haviam passado as últimas duas horas repassando os diferentes catálogos e panfletos, em vão. Tudo o que havia sido sugerido havia sido descartado tão rapidamente e as idéias de Rose para ajudar sua amiga estavam se acabando.

    “Não. Mamãe tem muitas jóias das quais nem sabe o que fazer”. Ronnie lançou o catálogo de Bloomingdale sobre a mesa, pegou outro, e suspirou. “Odeio o Natal”.

    “Oh, não será uma queixa agora, prometo lhe ajudar a encontrar algo para ela”. Rose deu a sua amiga um sorriso. “Não pode ser tão difícil encontrar um presente para sua mãe”.

    “Beatrice Phoebe Cartwright é sem nenhuma dúvida uma das mulheres mais difíceis para se comprar um presente”. Ronnie tomou um gole do vinho e colocou a taça sobre a mesa. “Talvez devesse só enviá-la a um cruzeiro”. Olhos azuis brilhavam com malícia ao pensar. “Talvez um longo agradável, cruzeiro”.

    “Você gostaria disso?”.

    “Eu poderia”, a executiva respondeu com um sorriso diabólico. “Talvez uma dessas viagens ao redor do mundo. Você sabe, talvez seis, oito… meses”.

    “Oh, você. Pare”, Rose de maneira brincalhona a repreendeu, estendendo uma mão para dar um tapinha de leve no antebraço de Ronnie. “Sua mãe não é tão má, é só um pouco… um pouco…”. Colocou seu dedo em seus lábios, tentando encontrar uma ou duas palavras que pudessem com precisão descrever a mãe de sua amiga. “Antiquada”.

    “Minha mãe é uma snob, querida”. Ronnie disse quando tomou outro gole do vinho rosado. “Ela não recebe um não como resposta, espera perfeição todo o tempo, e se preocupa mais com a imagem da família do que com o que sentimos”. Outro gole. “Talvez devesse só lhe dar um ‘vale presente’ e deixá-la selecionar o que ela quer”.

    “Tem certeza?”, Rose procurou uma página no catálogo e a estendeu para que a mulher mais velha a visse. “Aqui tem um número gratuito ao qual pode ligar para ordenar um, se isso é o que realmente deseja fazer”, disse, seu tom deixando claro que não acreditava que seria o caso. Apesar de só conhecê-la há três semanas, Rose estava começando a entender algumas de suas pequenas expressões faciais e atitudes que traiam os verdadeiros sentimentos de Ronnie. Roer lápis significavam frustração, as unhas batendo suavemente mostravam o aborrecimento, e o firme, mas terno abraço que a sustentava cada noite falava de algo que nenhuma delas se atrevia a colocar em palavras.

    Os olhos azuis levantaram o olhar do líquido por um momento, então baixaram outra vez. “Não”, Ronnie admitiu contrariada. “Só odeio sentir-me pressionada. Sinto como se tivesse que conseguir um presente perfeito”.

    Ela abriu a boca para protestar, depois a fechou, percebendo que na família de sua amiga, isso não estava longe de ser a verdade. A festa de Natal mostrou isso. A coisa inteira não foi somente empurrada sobre os ombros de Ronnie, mas também não houve nenhum sentimento de agradecimento de Susan e Beatrice por todo esforço. Rose decidiu que talvez uma tática diferente era pedida a gritos. “Ok. Então, qual é o presente perfeito?”.

    As sobrancelhas de Ronnie se levantaram, não contando com essa reação da mulher de cabelo loiro. “Humm… não sei, algo… algo…”. Movia suas mãos, provocando que o vinho umedecesse dentro da taça. “Acho que nunca realmente pensei sobre isso”.

    “Pois então, vamos pensar sobre isso. Venha aqui”. Rose levantou o nível da cabeceira da cama até que quase esteve em uma posição sentada e acariciou o espaço a seu lado, tirando Tabitha no processo. “Vejamos, se a única coisa que pode lhe dar é um presente perfeito, então vamos encontrar um”. Virou a página. “Talvez o truque seja conseguir os presentes perfeitos, você sabe, uma coleção de coisas que lhe agradem ao invés de um presente grande. Traga uma caneta, marcarei as coisas que encontrarmos”.

    Ronnie tentou pegar algo para escreve, mas todos seus lápis estavam ruídos e não havia uma caneta a vista. Levantou uma pequena pilha de papéis que estavam desordenados sobre sua mesa, mas nenhuma caneta apareceu. Abriu a gaveta e viu clips, grampos, inclusive um monte de Post-it, mas nada com que escrever. “Presidente de uma multimilionária corporação e não posso encontrar uma caneta quando preciso”. Continuou sua busca inconsciente da página que Rose estava olhando.

    Isso! Rose pensou de maneira emocionada. Ali diante de seus olhos estavam uns jogos de canetas e lápis em uma variedade de preços e desenhos. A coleção de Mont Blanc era lindíssima, mas completamente além de seu escasso nível de gasto. Virou a página e a viu. No centro da página estava um bonito jogo, um desenho em jaspe em uma tonalidade azul que lembrava a Rose o resplendor dos olhos de sua melhor amiga. Com indecisão se enfocou no preço escrito em uma letra menor abaixo e engoliu em seco. Isto poderia levar a maior parte de seus restantes fundos. Levantou o olhar para ver Ronnie ainda caçando a evasiva caneta, então voltou a olhar o catálogo. O problema de encontrar um presente para Beatrice não havia sido resolvido senão que havia surgido outro problema. Rose discretamente dobrou a ponta inferior da página, então as virou novamente para a joalheria justo quando Ronnie encontrou a desaparecida caneta e veio para a cama. Rose, pegou a caneta que lhe era oferecida e virou o catálogo de modo que a mulher mais velha pudesse ver. “Agora, vamos resolver esta coisa. Qual é o lugar preferido de sua mãe para visitar?”.

    “Europa. Ela viajou duas vezes de país por país e se entusiasmou nas duas”. Ronnie sorriu e, a tensão e preocupação dos últimos dias se foram do rosto desta. “É isso! Ela vai amar. Uma viagem a Europa. Não posso acreditar que não pensei nisso antes”. Pegou o catálogo de Rose e começou a passar as páginas.

    “Wow… isso… é um presente maravilhoso”. Tentou dificilmente não parecer muito impressionada, mas não obstante isto se mostrou em sua expressão.

    “Acha que é suficiente?”. Ronnie perguntou quando olhava no glossário de fotografias, inconsciente de que Rose, usava o pensamento em termos de penique², e estava agora tentando compreender os milhares de dólares que uma viagem assim poderia custar. “Estava pensando talvez em um guarda-roupa ou…”. Levantou o olhar e se encontrou com uma beleza que a olhava fixamente. Estudaram-se uma a outra durante vários segundos antes que Rose lhe desse um tímido sorriso e afastasse o olhar.

    “Então um…”. Recolheu um pedaço inexistente de pêlo da manta quando um suave rubor subiu por seu rosto. “Você disse algo sobre roupa?”.

    “Humm… sim, roupa”. Ronnie fechou o catálogo, já não tendo o menor interesse na escolha de presentes. O que desejava fazer era apagar as luzes e se enroscar contra a jovem mulher. “Sabe está ficando tarde”.

    “Sim, acho que sim”. Do lado de fora na sala de estar, o relógio do avô anunciou dez horas, mas ambas mulheres escolheram fingir não ouvir este. Rose reclinou a cama numa posição para dormir enquanto Ronnie percorria ao redor apagando luzes e comprovando as fechaduras nas portas. Em poucos minutos a casa estava escura e elas estavam deitadas na cama juntas.

    Olhando fixamente para cima na escuridão, Rose pensava sobre o que havia acontecido antes. Por esse breve momento ali havia acontecido algo… Especial entre elas. Ouviu o som de um punho batendo em um travesseiro e desejando que Ronnie só se virasse e a sustentasse, mas isso normalmente não acontecia até que ela estivesse quase adormecida.

    Ronnie dava voltas suficientes por ambas. Uma volta em particular atingiu a lesionada perna e a jovem mulher deu um repentino assovio de dor. “Desculpe-me, Rose. Ao que parece eu não consigo ficar a vontade esta noite”.

    “Não se preocupe. Isto só doeu por um segundo, isso é tudo”. Estava alegre que estivesse escuro quando uma lágrima lhe escapou.

    “Vou para o sofá”. Ronnie moveu-se para levantar-se só que foi detida pela mão da jovem mulher tocando-lhe no ombro.

    “Por que você não só coloca seu braço ao redor de mim como normalmente faz? Parece dormir bem depois de fazer isso”. Deu um suave puxão na camiseta da mulher mais velha. “Vamos Ronnie, sabe que terminará voltando para cá depois que eu dormir e vai me sustentar de qualquer maneira”. Isso havia acontecido há algumas noites. Lentamente, de maneira renuente o peso a seu lado mudou e sentiu o familiar calor do corpo de Ronnie contra o seu. Um segundo depois e seu desejo se tornou realidade quando um forte braço cobriu seu ventre. Rose deixou um suspiro de satisfação sair e fechou seus olhos. Quando Tabitha determinou onde estavam, mudou de lugar e saltou novamente na cama, ambas mulheres já estavam profundamente adormecidas.

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