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Warning Notes

"Utopia" é um conto que mescla momentos de alta tensão e ação com cenas de intimidade emocional, o que pode ser intenso para alguns leitores. Acompanha duas agentes secretas em uma missão perigosa, explorando não apenas as facetas de seu trabalho arriscado, mas também a complexidade de seu relacionamento amoroso. Indicado para quem aprecia histórias que combinam suspense, romance e adrenalina.

Saí do carro me sentindo um pouco estranha e idiota. Os óculos serviam como uma pequena fortaleza contra meu desconforto; cortinas onde eu podia me esconder, ou pelo menos assim conseguia deixar gravado em minha mente. Fechei a porta e acionei o alarme, já me encaminhando para a calçada pequena. A rua onde ficava o local, sempre lotada de veículos parados, me obrigou a estacionar na via principal. Bizarramente não liguei de desfilar até a porta do estabelecimento, apesar de ainda não estar confortável nos trajes que vestia: saia colada, salto e uma blusa séria, como eu definia. Realmente não era bem o que eu vestiria… Mas desde que entrara para aquela profissão, o dom do livre arbítrio me fora tirado. Eu tinha que agir conforme as normas e as ordens.

Já quase nem me lembrava mais como havia começado a trabalhar com ela – anos antes –, e que a bem da verdade fora quase um acaso. Duas adolescentes na faculdade que se olhavam estranho e não se gostavam, foram recrutadas para trabalharem num serviço secreto sul-americano. Juntas. Irônico como a vida deveria ser.

Mais que isso, seria que essas duas parceiras de trabalho seriam instruídas a simularem um romance adolescente que justificasse o tanto de tempo que passávamos juntas. Tudo bem que não demorou muito para gostos parecidos falarem mais alto e nos fizessem amigas, inclusive nosso peculiar apetite para seres femininos. E eu sequer teria direito de reclamar, mesmo se não tivéssemos nos dado bem: aquela era um exímio exemplar da espécie que não poderia negar que sempre me despertou algo mais. Linda morena de pele dourada e olhos verde-azulados, de cabelos curtos e arrepiados na nuca, filha de brasileiros nascida em Portugal; possuía o típico jeitinho e o sotaque cariocas, mas se prestasse atenção, era possível ver pequenos detalhes europeus em seu modo de falar. Hum… Aquelas formas diferentes vindas do português tradicional em determinadas situações que ela deixava escapar, além de povoarem minha mente, causavam um ligeiro arrepio imaginário. Minha grande curiosidade desde que a conheci sempre fora saber se sussurradas em meu ouvido, aquelas palavras ditas em tom de outro continente causariam esse mesmo arrepio em veias reais…

Cheguei à porta e parei, mandando uma mensagem para o celular dela: “Já estou na frente”. Retirei os óculos e o guardei na bolsa. O local era um curso de pré-vestibular localizado no bairro da Tijuca, zona norte do Rio de Janeiro, onde os andares superiores eram dormitórios; suítes com duas ou quatro camas para abrigar os alunos. Era ali que minha parceira vivia a vida que fingia ter para esconder seu verdadeiro ofício: monitorar passos suspeitos dos donos daquela rede de cursos, os mesmos acusados de gerenciarem uma máfia mundial de comércio ilegal de armas. E eu? Bem, meu papel nessa vida era de uma jovem já formada, que estagiava e dava pequenas aulas particulares para Luy – minha parceira – e que por conta disso nos apaixonamos. Ela era uma vestibulanda levemente atrasada e preguiçosa que estudava e trabalhava para pagar seus gastos. Mas isso era o que todos deveriam acreditar, pois a verdade por trás era bem diferente…

Ela desceu as escadas olhando fixamente para mim, aquele olhar enigmático que deveras vezes me fazia esquecer o mundo. Não conseguia ter conhecimento se ela fazia aquilo por estarmos em público, se gostava ou se tinha algo não dito escondido ali atrás. Acho que eu nunca saberia.

Sentia-me levemente encabulada pelos meus trajes e ela percebeu isso, sorrindo levemente.

– Oi gata. Você está linda vestida assim, não tem idéia de como – disse segurando o riso, deliciando-se com a situação. – Eu tenho só quatro horas para ficar aqui no curso antes de termos que sair – completou enigmaticamente. Mas aquele olhar felino me despindo não me escapou… Eu sabia que ela deveria estar pensando o mesmo que eu: uma loirinha vestida em roupas de atriz pornô. Previsível…

Eu sorri sem graça, encabulada. Ela voltou às suas feições imparciais e olhar enigmático. Maldita seja, por uma vez em minha vida eu gostaria de conversar telepaticamente com ela e saber o motivo que a levava a fazer tudo aquilo, ou o que realmente sentia ao fazê-lo.

Sem dizer mais nada, pegou minha mão e começou a me puxar escada acima. Mais nenhuma palavra foi dita no trajeto até o quarto, que a essa hora da tarde estava vazio. Abriu a porta e me deu passagem, entrando no cômodo logo em seguida e fechando a porta atrás de si, escorando-se na mesma. O quarto estava completamente bagunçado, como haveria de ser. Ela dividia esse cômodo com uma amiga, por isso tinha somente duas camas, uma em cada parede; a dela era a que ficava no canto mais escuro, mais longe da janela, mas mais perto do banheiro.

Virei-me para ela e me deparei com seu olhar enigmático me analisando da cabeça aos pés. Seu silêncio me incomodava, mas ao mesmo tempo me era prazeroso por ser o prelúdio de alguma ação que geralmente me agradava. Sem mais delongas, ela me empurrou até a cama me fazendo deitar de costas e deitando por cima de mim. Tomou mais alguns segundos para olhar em meus olhos e então me beijou com intensidade.

Então sim, aquela pequena compatibilidade em gostos adolescentes logo se tornou uma atração física. O que era para ser um mero teatro acabou se tornando algo real; éramos duas apaixonadas. Ninguém reclamava, só tornava nosso fingimento mais fácil e convincente. Não que os chefões soubessem. À bem da verdade acho que nada poderia ser escondido deles, mas também duvido que ligassem por algo assim só tornar a encenação melhor…

A intensidade naqueles lábios me contagiou, me fazendo passar as mãos por sua nuca e puxá-la mais para mim. Sentia suas mãos passeando por meu corpo, me explorando; minhas pernas, braços, costelas… Sentia minha necessidade de tê-la inflamar cada poro do meu corpo. Era algo que fugia do controle.

Instintivamente abri ligeiramente minhas pernas, permitindo que ela se encaixasse em mim e deitasse sobre meu corpo, e isso ela acatou como um convite. Não teve cerimônia para abrir os botões de minha blusa e tomar meus seios com as mãos como se fossem dela. Aquele sorriso sacana se delineando em minha boca, que ela sempre dava quando se deparava com meus sutiãs que abriam pela parte da frente, me arrepiavam… Sem parar de me beijar, ela os explorou delicadamente, me provocando. O contato de sua mão quente em tamanha área sensível me fez gemer dentro de sua boca e arquear levemente meu corpo já abandonado pela sanidade.

Parou de me beijar, descendo lentamente para meu pescoço, pronta para deixar ali sua marca. Suas mãos atrevidas já se entretinham no desafio de abrir minha saia e livrar-se dela. Não havia necessidade disso, mas eu sabia por que para ela isso era tão vital: queria-me totalmente entregue, sem barreiras de qualquer forma.

Mordeu meu pescoço, chupando-o e fazendo o caminho de volta com a ponta da língua até minha orelha, para tão logo descer para meu peito e então meus seios, tomando-os com a boca enquanto suas mãos se livravam definitivamente de minha saia inconveniente. Ali eu soube que ela queria me enlouquecer. Sua pressa por conta da saudade depois de tantas viagens separadas era implacável. Ela queria me tomar, e ali sem cerimônias. E quem era eu para impedir?

Sua mão escorregou para dentro de minha calcinha tão logo terminou de jogar longe minha saia, me tocando ao mesmo tempo em que usava sua língua para sentir cada forma de meus seios. E então eu não pude mais controlar meus gemidos: ela já me tinha. Puxei agoniada sua camisa, tirando-a e logo soltando o sutiã. Precisava sentir a pele quente dela na minha, ver aqueles lindos seios e tocá-los, e ela sabia disso. Leu minha mente de uma forma que eu só poderia concluir que se sentia da mesma forma. Minhas unhas que inconscientemente esfregavam suas costas a faziam suspirar. Então ela olhou para mim, para ter o deleite de me ver totalmente entregue aos seus toques, e se deparou com meu rosto contorcido e jogado para trás por tamanhas sensações. Pude ver que algum sentimento além de luxúria a tomou nessa hora, e ela subiu meu corpo, me beijando quase que carinhosamente; mas mesmo assim permitiu que seus seios roçassem nos meus – eterna vilã –, me fazendo desistir da luta e me entregar, permitindo que ela abrisse minhas pernas totalmente.

Tudo que ela queria: eu entregue aos seus caprichos, praticamente numa bandeja de prata. E quem disse que reclamava? Eu bem gostava mesmo desse jeito dela: implacável, abusada e sem cerimônias. E como havia de ser, ela não se fez de rogada, me penetrando com os dedos. Não sei bem se eu gritei ou se gemi alto, mas foi como jogar água no fogo; queimava, inflamava em sensações. Algo que parecia saciar e ao mesmo me deixar suplicante por muito mais. Sentia que poderia ficar ali, assim, durante o resto do dia e da noite – e eu gostaria.

Nesse momento ela parou de me beijar, mantendo seus lábios encostados nos meus e sentindo nossas respirações entrecortadas se baterem. Olhava para meus lábios, o desenho que eles tomavam a cada novo gemido, enquanto tudo que eu tinha capacidade de fazer era fechar os meus e sentir cada micro-segundo de tudo aquilo; o mesmo que ela fazia agora. Seu rosto estava levemente concentrado, e eu não poderia definir no que. Parecia que queria gravar cada detalhe de tudo. Eu a sentia dentro de mim acompanhada de um leve desespero de colocá-la ainda mais no meu interior – e não do jeito romântico. Inconformada a cada vez que seus dedos me deixavam, e então eu cruzei minhas pernas nas costas dela, na inconsciente necessidade de tê-la ainda mais dentro de mim. Era impossível estar mais aberta que aquilo. E ela riu, aquele sorriso safado de quem sabia que tinha uma fêmea totalmente sob seu controle. Então aumentou a força.

Eu não poderia descrever como é ter um ser tão absurdamente belo em cima de mim me fazendo ter a sensação mais intensa existente, seria pecado se houvesse uma maneira de definir, mas ela nunca estava satisfeita. Quando eu achava que estaria finalizando minha pequena “jornada”, ela deixou meu interior. Eu já ia gemer um protesto quando senti seus seios em minha pele, se arrastando, descendo através do meu ventre e em direção às minhas pernas… Meu coração acelerou em expectativa, já sabendo o que viria.

A língua entrou em contato com o ponto mais sensível em meu corpo, me fazendo realmente gritar. Minhas mãos correram diretamente para a cabeça dela, se embolando no cabelo negro e a puxando mais contra mim. Pelo meu estado de entrega, se ela tinha alguma dúvida a quem eu pertencia agora, isso já não existia mais – não havia como ser possível. Minha necessidade me fazia inconscientemente realizar qualquer movimento que aumentasse mais o atrito entre nossos corpos. Mas ela, a torturadora nata que era, interrompeu meu êxtase por segundos que para mim pareceram eternos. Eu me recusava a abrir os olhos para ver o que estava acontecendo, mas logo senti sua língua em meu interior, se movimentando e me buscando. Aí então nem mesmo eu ou meu pobre corpo pudemos aguentar; convulsões me tomaram, se alastrando por todos os cantos, anunciando a reação intensa. Mesmo quando cheguei ao pico, ela não parou; fechei minhas pernas em sua cabeça, mas ela me queria me contorcendo em agonia – e conseguiu.

Quando viu que eu já não podia mais suportar aquilo sem começar a querer mais, ela parou, e soltei minhas pernas. Não tínhamos tempo para continuar aquilo, queríamos também um pouco de paz e descanso que precisávamos e aquela vida não permitia. Então ela olhou pra mim e sorriu, escalando meu corpo de volta. Deu-me um selinho lento e carinhoso, sussurrando em meu ouvido, me fazendo sorrir também:

– Linda!

Deitou a cabeça em peito escutando meu coração e fechou os olhos, aconchegando-se ali mesmo em cima de mim. A abracei e passei a acariciar sua cabeça, fechando meus olhos também. Era tão absurdamente mágica a sensação daquela pele quente e macia contra a minha; eu sabia que mesmo na noite mais fria de inverno, com o corpo dela ao lado do meu, jamais sentiria frio. Sentia-me tão completa só por tê-la ali comigo. No mundo, pra mim, não faltava mais nada. Eu gostaria de ter capacidade de descrever essa sensação.

“Eu te amo, gata linda”, sussurrei mentalmente para ela.

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Acordei primeiro, algumas horas depois nos braços dela. Minha perna estava por cima de seu corpo e estávamos abraçadas uma de frente para a outra, com os rostos praticamente colados. Estiquei-me delicadamente para pegar o celular e verificar a hora, com todo o cuidado para não acordá-la. Ainda estávamos dentro do prazo, podíamos tomar banho e nos arrumar com calma. Bendita soneca revigorante, recuperou todas as minhas forças desaparecidas no último mês.

Tornei minha atenção para a morena que dormia tranquilamente abraçada a mim. Ela era tão inexplicavelmente linda… Sabe aquelas modelos de beleza perfeita, que realmente não há um defeito para se mudar? Essa era bem ela.

Subi minha mão que repousava em suas costas e passei a acariciar delicadamente seu rosto, sentindo a pele sedosa de sua bochecha. Inconscientemente um sorriso tomou conta de mim; era o reconhecimento de minha própria felicidade completa. Beijei sua testa, a ponta do nariz e por fim seus lábios, todos delicadamente, e mesmo assim a dorminhoca não acordara. Eu ri; talvez tivessem puxado mais os trabalhos para ela do que para mim.

– Gata… Acorda, coisa linda. Tá na hora de levantar já.

Ter aqueles olhos de cor ímpar acordando e indo diretamente na sua direção é uma experiência que poucas mulheres experimentariam. Ela sorriu, me fazendo sorrir também e fechando-os momentaneamente para se espreguiçar.

– Oi, coisa linda. Já está na hora? – eu assenti com a cabeça, confirmando.

Ela suspirou, deixando escapar uma leve inconformação por não poder descansar decentemente e em paz. Olhou para o teto por alguns segundos, vagueando sua mente antes de levantar e se dirigir para o banheiro de uma vez. Antes de virar a esquina rumo ao banho quente, me olhou e me chamou com a mão, dando novamente aquele sorriso safado. Eu ri indo atrás. Quem eu era pra recusar aquele convite?

Tomamos banho entre alguns beijos e brincadeiras provocativas, tudo “devidamente” dentro do bom-senso para que a vontade de continuá-las não se tornasse impossível de suportar e nos jogasse de volta para a cama. Aqui as memórias ficam vagas, e não quero me arriscar a narrar algo que pode não ter se passado em meu sonho. Mas confesso que não sabia o que era mais quente: se era a água ou aquela pele sedosa e deliciosa.

Ela permitiu que eu lavasse todo seu corpo, para meu deleite de múltiplos orgasmos. Hum… A cada vez que eu tocava uma parte de sua pele, em qualquer parte do dia, minha vontade era de ficar ali eternamente. Não era brincadeira, era uma coisa extremamente irresistível: macia e sempre cheirosa. Malditos feromônios. Maldito demônio de olhos claros.

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Ela estava sentada na cama bagunçada terminando de calçar o tênis e eu finalizava meu cabelo com o secador quando Karen abriu a porta do cômodo, se apoiando na maçaneta e intercalando o olhar sério entre nós duas com aquela cara de “eu sei o que vocês fizeram no verão passado”. Desliguei o aparelho quando a vi entrar. Ali estava outra com olhar enigmático e pensamentos indecifráveis. Devia ser coisa da profissão que eu nunca consegui aprender; talvez fosse emocional demais para isso.

Nossa vergonha foi zero, nem nos sentimos como duas crianças pegas no flagra. Karen era quem dividia o quarto com Luy e que devia fingir que eram melhores amigas. A verdade é que Karen era uma informante nossa e que acabou se tornando mesmo melhor amiga da bruxa de olhos verdes, como eu a chamava. Também morena e de olhos castanhos, seu biótipo era perfeito para não chamar a atenção em operações de infiltrações arriscadas, como eu. Ao contrário de Luy, ela não possuía aquele cabelo negro como a noite: era de um tom chocolate.

Olhou para Luy e eu vi a brincadeira entre os olhares delas, de cumplicidade entre amigas fofocando. Maldição! Eu ia acabar ficando complexada, só eu não sabia entrar nessas coisas.

– Eles já estão aí embaixo esperando. Vocês têm duas horas – Luy assentiu com a cabeça, retomando a seriedade do trabalho e olhando pra mim. Eram as informações necessárias para a missão.
– Vamos Ren – nada respondi, deixando o secador em cima da pia e pegando minha bolsa, me concentrando.

Descemos a escada do curso e entramos na parte de trás de um carro de vidros muito escurecidos, onde havia dois homens de terno, óculos escuros e fones em um ouvido sentados nos bancos da frente.

– Relatório? – pediu Luy, que entrou antes de mim.
– Eles estão com dois barcos escondidos não muito longe da entrada do esgoto da estação de tratamento – respondeu o homem que estava sentado no banco do carona, entregando duas pistolas prata para ela. Luy me entregou uma e verificou a munição da que estava com ela.
– Mas só entrar e sair? E eu achando que a diversão seria maior… – suspirei, desapontada. Essas missões de reconhecimento eram um barato cortado pela metade: sem tiroteios, sem invasão…

Luy riu, colocando a arma num suporte que carregava no tornozelo embaixo da calça jeans, me dando uma leve cutucada. O motorista nos olhou pelo retrovisor enquanto dirigia, tomando a palavra:

– Meninas, não se esqueçam que eles têm poder suficiente para apagar vocês e sumirem com seus corpos sem serem incriminados. Não brinquem.

Eu me limitei a rir.

– E como se isso não fosse ameaça constante em todas as nossas missões, né Rafael?

Dessa vez o homem não respondeu.

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Andava por uma plataforma meio escura, e não tinha idéia de onde eu ou Luy poderíamos estar. Já fazia meia hora desde a última vez que nos vimos, na entrada dos esgotos. Ela havia agarrado minha nuca com força e beijou minha testa longamente, sussurrando em seguida: “Boa sorte e cuidado. Vemo-nos aqui fora mais tarde”. Ela ficava tão tensa quanto eu quando as missões exigiam que nos separássemos.

Nossa tarefa era entrar nos barcos e confirmar com fotos se os líderes da máfia eram quem suspeitávamos, que estavam ali para uma reunião secreta com mandantes mundiais. Por serem dois barcos, não havia outra maneira a não ser nos separarmos.

Desci a escada pela parte mais escura possível, me aproximando do cais. Já era de conhecimento que apesar de poderosos e perigosos, aquele grupo preferia não andar com muitos seguranças para não chamar atenção ou levantar suspeitas, e que eles eram um tanto quanto convencidos sobre o total e “seguro” sigilo de suas ações.

Os barcos se encontravam ancorados no cais daquele túnel enorme. Eram dois grandes iates de metal fabricados na Itália, com mais de 100 pés; talvez uns 150 ou mais.

Consegui embarcar facilmente após escalar o cabo que prendia o barco no cais, pulando para dentro de um bote salva-vidas içado na lateral. Olhei para ambos os lados do convés, verificando minha própria segurança. Ninguém à vista; poderia procurar a reunião pelas escotilhas.

Comecei a verificar cada uma daquelas janelas, procurando por pessoas naquele barco que parecia estar vazio. Quando começava a achar que Luy havia ganhado o troféu, o barulho de vozes vindo da última escotilha chamou minha atenção. Esgueirei-me pelos cantos para confirmar, para então dar de cara com homens e mulheres finamente vestidos no que parecia um jantar. Bingo, ali estavam todos os nossos suspeitos. Saquei uma pequena câmera silenciosa que estava no bolso da calça e tirei umas três ou cinco fotos, guardando o aparelho novamente.

Quando levantei a cabeça ao terminar de guardar a câmera, dei de cara com Luy parada como pedra no convés de frente para mim, obviamente me assustando.

– Caralho, Luy! Que susto! O que tá fazendo aqui? – sussurrei, arfando.
– Quando percebi que meu barco não era o certo, vim pra cá.

Ela me olhava séria e de uma maneira estranha como eu nunca tinha visto, quase como se fosse outra pessoa; parecia um espírito sinistro naquela escuridão. Olhei para ela um pouco assustada:

– Luy? O que houve, por que tá me olhando assim? – estranhamente ela nada respondeu, apenas pegou meu braço e começou a me puxar em direção à proa.

Eu estava com uma sensação nada boa com relação aquilo, mas era normal naquele ofício. Em situações como essa você não pode sequer parar para pensar em contestar, pois isso pode lhe custar a vida. Você precisa confiar plenamente em seu parceiro, e nela eu confiava mais que a existência.

Nesse momento, homens vestidos de terno vieram correndo pela popa do iate, gritando. Eu só tive tempo de virar para trás e ver suas armas em punho, começando a apontar para nós. Foi quando meu instinto de proteção falou mais alto.

– CORRE! – Luy gritou, mas era tarde demais. Antes de ela disparar em direção à proa, eu a empurrei contra a grade de proteção do barco, fazendo-a cair na água. Corri com toda a força que eu podia na esperança de fazê-los virem atrás de mim.

Não tinha como saber se dera certo e se estavam na minha direção, mas os tiros eu podia ouvir. Fui até a proa e me joguei na água, nadando para debaixo do barco, fugindo das balas.

Pude ouvir o pesado motor dando partida, e tudo que passou pela minha mente nesse momento foi “fodeu!”. Nadei em direção ao fundo, até tocar o solo, e em direção à popa dos barcos. Como pensei, os tiros se concentraram pelas laterais; não achavam que eu iria justo em direção à parte mais perigosa.

Ambos os iates passaram por cima de mim, e tive que me agarrar ao solo de lodo para não entrar no turbilhão que as hélices faziam. Mas ao menos dera certo, eu estava viva.

***************

Deixei passar algumas horas para garantir que não ficassem para me procurar. Passei esse tempo nadando calmamente até a praia para economizar minhas energias, mas só queria encontrar Luy e me garantir que ela estava bem.

Nadei até a areia e comecei a procurá-la; eu não sei, meus instintos diziam que ela estaria ali. Procurei de um lado para o outro, para ao longe avistar uma figura cambaleante. Era ela, eu sabia. Corri com todas as forças que ainda me restavam e a abracei com força, aliviada. Ela correspondeu por alguns segundos, para logo me empurrar com um protesto:

– Ai! – reclamou, segurando a lateral do braço. Havia tomado um tiro de raspão.
– Vem cá – tirei minha blusa e enrolei delicadamente em seu braço, me posicionando do outro lado e passando o outro braço dela sobre meus ombros, para apoiá-la. Ela me olhou com interesse.
– Hum… Já vai ficar sem roupa aqui pra mim? – eu ri de seu humor espirituoso.
– Será que você não pensa em outra coisa? – ela riu também.
– Não.

Suspirei, balançando a cabeça e me encaminhando para o ponto de encontro combinado com os outros agentes.

– Você também nadou para baixo do casco fugindo dos tiros? Quer dizer, eles chegaram a parar para atirar em você? – ela consentiu.
– Sim, e por isso tomei esse de raspão, não deu tempo. Aliás… – me deu um soco de leve no ombro. – Nunca mais faça isso, tá bom? Eu fiquei mega preocupada com você.

Limitei-me a rir.

– Ah tá, como se eu não soubesse que você brotou no meu barco porque sabia que eu ficaria desapontada se não rolasse uma adrenalina – dessa vez rimos juntas.
– Mas tudo bem – disse ela, enlaçando os dedos de sua mão na minha e virando seu olhar pra mim. – Acho que agora podemos cobrar aquelas férias do patrão.

Eu sorri, sonhando com essa possibilidade.

Teríamos um descanso, juntas…

Fim