Xena pensou que a ideia de uma peça Ateniense fosse melhorar seu ânimo, mas conforme a noite caia, ela se vi cada vez mais angustiada. Aquela sensação era nova em partes, isso porque não era a primeira vez que sentia algo errado em sua relação com Cesar, mas ultimamente, era como se o mundo estivesse de ponta cabeça e tudo fora do lugar.

Talvez seja cansaço. – Falou Xena para si mesma e saiu da banheira.

A morena foi até seu guarda roupa e viu ali um vestido lilás em contraste com suas outras roupas escuras. Fazia muito tempo que não usava aquela veste, então pegou sem delongas e observou por alguns segundos. Depois, afastou a toalha de seu corpo e colocou o vestido na frente do corpo enquanto se mirava no espelho.

-Lilás? – Uma voz tão fria quanto a sua veio de trás e Xena assustou. A morena olhou para frente e encontrou Alti escorada no batente da porta.

Xena sentiu uma fúria inexplicável e socou a penteadeira do seu lado.

-Já disse para não entrar assim no meu aposento, Alti.- Com os dentes serrados, Xena vociferou.

-Você nunca precisou de tanta privacidade como agora, Xena! É tão estranho quanto você escolher uma cor inocente como lilás. – Alti falou no seu famoso sarcasmo e o sangue de Xena ferveu.

-E você nunca foi tão intrometida como ultimamente. – A morena falou ainda irritada.

-Estou inquieta. – Alti começou e se aproximou um pouco de Xena.

-Problema é seu. Vá perturbar outra pessoa. – Xena tentou ignorar a mulher e começou a colocar o vestido.

-Essa manhã eu acordei e senti uma energia estranha no ar.- Alti ignorou completamente Xena e a imperatriz parou em frente ao espelho e ficou encarando o reflexo da feiticeira. –Senti como se hoje algum evento épico estivesse para acontecer, então esperei ansiosamente. Esperei e esperei e absolutamente nada ocorreu. Foi a mesma vida pacata e chata de sempre. -Alti tomou um ar de mistério e Xena compreendeu o que ela quis dizer, apesar de não admitir.

-Se tem estado entediada, recomendo que faça uma caminhada. Não quero ser rude, mas estou me lixando se você acordou de manhã e não conseguiu evacuar como de costume. Agora se não se importa, tenho que me arrumar. – Xena estava calma em um momento e agressiva em outro, sua bipolaridade não era novidade para ninguém, mas algo nas palavras de Alti causaram um desiquilíbrio nela.

-Eu me concentrei muito durante a tarde e no momento em que você entrou no portão eu senti que algo vinha de você, imperatriz. – A voz de Alti ficou áspera e ainda ignorando Xena, a feiticeira se aproximou mais do que devia. – Vamos lá, Xena! Você sempre me contou tudo e foi eu quem profetizei seu futuro como imperatriz. Me diga o que está acontecendo logo. –

-Sai de perto de mim. – Xena empurrou Alti e sentiu muita vontade de matá-la, mas Alti era outra coisa que Xena não conseguia se desfazer. Era uma parasita que encostou em sua vida e sugava dia após dia a sua energia. – Não tem merda nenhuma acontecendo. Acho que você precisa foder um pouco, quem sabe não alivia seu tédio. –

Alti deu uma risada zombeteira e sem desviar dos olhos azuis de Xena, a feiticeira saiu do aposento. Xena arrepiou logo em seguida e encostou na penteadeira. Pelo jeito ela não era a única que vinha sentindo algo diferente no ar.

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Xena e César se dirigiram até o teatro da cidade na companhia de inúmeros soldados. A noite estava animada e gente de todos os lugares da cidade vieram assistir. Haviam nobres, políticos, ricos, pobres e até mendigos, mas o importante, era que a atmosfera estava melhor.

A imperatriz deu uma olhadela para trás e viu que Alti a observava com cuidado e logo ao lado dela, estava Brutus, tão absorto pela energia do teatro quanto as outras pessoas.

-Aqui. – Disse César ao se instalar num dos camarotes mais altos do teatro romano. –Teremos uma boa visão.

Xena sentou-se calada ao lado dele e se lembrou por um breve momento o que Alti disse no aposento. Realmente, algo estava fora do lugar. Mas o que?

Xena olhou para César e ele parecia estar tão calmo que fez a morena refletir se estava exagerando. Então, o imperador olhou para sua esposa e sorriu, em seguida, colocou a mão em sua perna o que acabou acalmando a mulher. Se César estava normal, então não podia ter nada errado.

Palmas vieram de baixo e os dois imperadores viram uma pessoa entrar no palco. Era um homem com roupas elegantes e uma presença de palco incrível.

-Senhoras e senhores…- Começou o homem com voz forte o suficiente para inundar o teatro. – Tenho o prazer de contar-lhes essa noite uma história. Uma história fantástica e cheia de emoção. Uma história que nos faz pensar que às vezes, a vida parece um fardo, mas que se torna leve ao ser compartilhado por uma alma gêmea…- César soltou uma risada discreta, mas com tom de deboche e Xena achou que fosse idiota por ter se interessado logo de imediato por aquilo. -…eu só peço que tomem cuidado, olhem bem para cima, pois essa noite está para cair algo que mudará nossas vidas. Um anjo caído. – O homem se curvou e aplausos tomaram o teatro mais uma vez.

César se ajeitou na cadeira num movimento tedioso e Alti suspirou logo atrás, mostrando mais desinteresse do que os soldados que faziam a escolta no camarim. Xena também se mexeu com desconforto, mas era pelo fato de ter se interessado pelo tema. Um tema que aparentemente, era motivo de zombaria.

A peça começou e a atriz jovem que Xena viu ensaiando mais cedo apareceu. A moça era delicada e transmitia paixão pela vida como uma jovem normal. O primeiro ato aconteceu e a imperatriz sentiu que seus olhos não podiam sair do palco.

O segundo ato tomou início e a história começou a se desenrolar num sentimento de desejo entre os dois jovens. Era algo bonito de se ver e ambos os atores transmitiam o amor surreal das personagens. Ato após ato, o teatro suspirava com a ideia de ter um amor tão puro e genuíno como aquele, era bom demais para ser verdade que duas pessoas poderiam se amar com tanta profundidade, ao ponto de preferirem a morte do que se separarem.

Xena não notava sua própria expressão enquanto assistia, mas César e Alti sim. Eles captaram o movimento de sua ansiedade quando os atores se beijaram e fizeram declaração de amor. Eles ainda notaram quando a imperatriz sorriu involuntariamente diante de uma promessa de se encontrarem nas outras vidas.

Alti achou aquilo curioso, já César, achou preocupante. Xena nunca pareceu sentir falta daquele sentimento, mas hoje em particular ela estava estranha e antissocial.

-O amor que temos é mais forte do que os Campos Elíseos ou o Tártaro. – Dizia o ator no palco.

-Ficaremos juntos por toda eternidade. – Respondeu a atriz parecendo tão apaixonada quanto seu parceiro.

-E eu não gostaria que fosse de outra forma. – O jovem rapaz abraçou sua dama e eles se apertaram como se o último suspiro dependesse daquilo.

O público se levantou num impulso frenético e Xena não conseguiu se comportar diferente. Suas palmas bateram rápido e um olhar de satisfação diante da obra foi genuíno. Ao lado, César também batia palma, mas era de alegria por aquela melação ter acabado. Alti bocejou e do palco, os atores se levantaram e cumprimentaram a plateia.

Nesse meio tempo, Xena cessou suas palmas e relembrou sua cena preferida, onde os jovens prometiam procurar um pelo outro na próxima vida. Ela teve um breve devaneio que foi quebrado logo em seguida quando o ator começou se pronunciar.

-Deixem eu apresentar a escritora de “Anjo Caído”. – Disse ele num romano cheio de sotaque. Os olhos de Xena saltaram e a curiosidade consumiu seu peito. Quem poderia ter o coração tão puro ao ponto de escrever aquela história linda? –Da Grécia… Gabrielle, a voz visionária de Atenas. – O jovem estendeu o braço e uma chuva de palmas acompanharam a entrada de uma figura cativante e bela.

Xena se levantou ao ouvir o nome da escritora e se colocou a aplaudir junto, por outro lado, César sentiu o sangue descer da cabeça e instintivamente olhou para Xena. Não era possível que mesmo tendo mudado todo o passado, aquela intrometida barda resolveu aparecer. O imperador forçou a visão e confirmou que a figura elegante loira que foi para o meio do palco, era de fato quem ele temia e Xena aplaudia a escritora com o maior prazer.

Alti, por sua vez, desprezou tanto a pessoa do palco que podia sair dali imediatamente sem pensar duas vezes. No entanto, o deboche ficou estampado no rosto, quando a plateia começou a jogar flores no palco na direção da escritora. Um enorme buque foi posto aos seus pés e Alti se perguntou quem era a pessoa de mau gosto que daria flores para uma história chata como aquela.

Xena começou a olhar em volta e encontrou uma rosa perto de si, ela não postergou e atirou a rosa para a escritora que notou a flor ao lado e saudou os imperadores no camarote com muita simpatia e ternura. Foi nesse exato momento que César notou o semblante de Xena mudar drasticamente.

Assim que a escritora se virou, Xena reconheceu de imediato. Era a mulher que ficou observando na praça naquele fim de tarde. Foi ela quem prendeu seu olhar e que prendia agora mesmo. Algo vinha daquela pessoa, mas sem saber o que fazer e como lidar, Xena voltou a aplaudir.

O olhar da imperatriz e da escritora se fundiram e criaram uma força que não podia ser vista a olho nu, mas Alti não possuía qualquer olho e percebeu que a fonte da sua inquietação advinha em uma pequena parcela daqueles olhares conectados.

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Era costume que uma festa acompanhasse os convidados de honra do palácio e naquela noite não foi diferente. César havia planejado aquela noite com alguns dias de antecedência e no convite à escritora da peça, estava incluso apresentar duas peças em Roma e permanecer no palácio real durante esse período. O imperador achou que seria bom para Xena conviver nesse meio tempo com pessoas de sua própria cultura, mas o que ele não esperava é que sua postura de marido dedicado fosse retribuí-lo com tamanha ingratidão.

Depois que a peça terminou, os principais atores da companhia de Atenas foram para o salão de festa do palácio e sem sombra de dúvidas que a escritora também os acompanhou.

Xena nunca foi tão rápido para uma festa como aquela e Cesar observava calado cada movimento de sua imperatriz. Antes que ele pudesse intervir, um grupo de políticos o cercou e dentre eles estava Pilatos, o organizador da oposição monárquica, sendo assim, o imperador não pode ignorar.

Enquanto isso, da mesa de buffet, Xena pegava vinho sem tirar os olhos da escritora. Ela estava ansiosa para ir até ela e parabenizar a peça, mas não sabia exatamente como fazer isso. Na realidade, Xena não sabia como se comportar na frente de uma pessoa culta como Gabrielle.

Você está com problemasXena pode! – Xena pensou e em seguida notou que os olhos da escritora estavam nela. –Certo! Vamos lá. –

Xena pegou outro cálice na mesa e foi de encontro com a mulher. Como se não bastasse os acontecimentos estranhos daquele dia, Xena sentiu que Gabrielle já esperava por ela, pois a loira estava cercada de gente, mas seu olhar caia sobre a morena alta.

-Não acredito que ninguém veio servi-la ainda! – Disse Xena enquanto dava o cálice de vinho para sua convidada.

-Levando em conta que acabamos de entrar, confesso que eu ficaria muito surpresa se os servos já tivessem enchido todos os cálices. – Com muito humor, Gabrielle aceitou o cálice da imperatriz, mas não conseguiu tirar os olhos dela para saborear o vinho.

-Pois saiba que já deveriam estar cheios. – Xena disse igualmente humorada e bebericou seu vinho. –É uma afronta os convidados chegarem e não ter nada para matar a sede. –

-Saiba que eu perdoo essa afronta então, uma vez que a própria imperatriz me serviu. – Gabrielle também bebeu um pouco do vinho e Xena sorriu no canto dos lábios. Ela apreciou muito o bom humor da escritora e sentiu que agora sim, seria difícil tirar os olhos dela.

-Eu quero muito parabenizar você pela peça de hoje, mas faz tanto tempo que não vejo uma obra de arte como essa que acabei perdendo as palavras. – Xena começou com os elogios e pareceu muito mais galanteadora do que pretendia.

-Bom, agora eu estou realmente lisonjeada, pois me disseram que os imperadores eram tão difíceis de agradar, que fiquei me perguntando o que faria se não gostassem. – Gabrielle falou com um sorriso.

-Achei sua obra muito comovente…- Disse Xena com muita sinceridade.

Do outro lado da sala, César continuava encarando sua esposa e não notou quando Alti se aproximou.

-O que supõe que a Imperatriz e a escritora estejam conversando? – Com sua natural astucia, a feiticeira perguntou. –Cavalos? Espadas? – A mulher começou a colocar caraminholas na cabeça de César e só não foi tão bem-sucedida, pois Brutus finalmente apareceu.

-Imperador, preciso falar com o senhor imediatamente. – Brutus disse com pressa, mas tentando ser o mais discreto possível.

-Sério, Brutus? Agora não é o melhor momento. – Respondeu Cesar mostrando sua pouca vontade.

-Falar a respeito de Chin e seus emissários. – Brutus respondeu tenso e César suspirou.

-Ah sim, claro! – Com cara de nojo, o imperador finalmente aceitou. –Com licença. – Disse ele para Alti e se retirou com Brutus. Enquanto isso, quem não perdeu a chance de manter os olhos em Xena, foi a feiticeira. Aparentemente, qualquer um naquele salão podia perceber como a guarda da imperatriz tinha sido abaixada diante da escritora.

-O que te inspira? – Perguntou Xena para Gabrielle.

-É como se as palavras viessem de algum lugar. Eu só as escrevo. – Disse Gabrielle com tom pensativo e Xena parecia disposta a ouvir cada palavra daquela pessoa. –Mas e você, imperatriz? Toda Roma fala de você. O país prospera. As pessoas te adoram. – Continuou Gabrielle e Xena mostrou leve desconforto. –Dizem que o exército te seguiria até as portas de Hades.

-Bom, tudo tem seu preço, Gabrielle. Mas me explique algo, no terceiro ato, o herói se lança no precipício sem medo de morrer… tudo isso por causa dela! – Os olhos das duas continuavam conectados. –Acha que esse tipo de amor existe realmente? – Xena procurou nos olhos da escritora uma afirmação.

-Não é isso o que todos sonham? Alguém que penetre tão profundamente em nossas almas que possa encontrar ali algo que faça valer a pena morrer. – Gabrielle terminou de falar e assim como Xena, procurou naqueles olhos azuis uma correspondência de que aquele desejo não era algo exclusivo de um bardo.

Xena e Gabrielle estavam impressionadas demais uma com a outra. Elas entravam em um assunto e saiam dele sem perceber e a conversa foi rendendo. Enquanto Xena fazia perguntas sobre a escritora e queria saber mais e mais sobre a peça, Gabrielle só conseguia prestar atenção na guerreira em sua frente e se interessava pelos feitos do campo de batalha. Elas estavam se comunicando muito mais do que com palavras, mas ainda não podiam notar.

Do outro lado da sala, Brutus disfarçava sua ansiedade enquanto perguntava porque César havia matado os emissários de Chin e alertava de que assassinos estavam a caminho. O imperador estava incomodado aquela noite, mas não era com os assassinos de Lao Ma, mas sim com a loirinha que não tirava os olhos da imperatriz.

-Eu sei muito bem lidar com assassinos, Brutus. – César terminou por fim e andou sutilmente até Xena. Ele já não suportava mais aquele falatório. –Com licença. – Disse ele entrando na conversa das duas. –Sua obra foi…intrigante. Bem-feita, muito obrigado. – Seu tom poderia convencer qualquer um ali de que ele gostará da obra, mas Xena sabia que seu único propósito era tirá-la dali.

Gabrielle sorriu timidamente diante do elogio do imperador e olhou mais uma vez para imperatriz, que sorriu para ela com simpatia.

-O exército nos espera ao amanhecer…- Cesar finalmente falou para Xena e Gabrielle sentiu-se chateada por ter que terminar a conversa com a imperatriz, afinal, estava sendo agradável a companhia de uma guerreira interessada no assunto “amor”.

-Muito obrigada por honrar Roma com sua obra, Gabrielle. Espero que as acomodações do palácio te agradem. Muito obrigada! – E depois de receber um aceno da escritora, Xena se retirou com Cesar a contragosto.

Enquanto a imperatriz saia, Gabrielle ficou observando no meio do salão a melhor companhia que teve em verões se distanciar. Em um momento ela se sentiu viva e imersa numa conversa e na outra, parecia vazia como sempre.

-Apreciou a convidada? – Cesar questionou Xena sem demonstrar desconforto.

-Sim, ela é realmente talentosa. – A imperatriz não conseguiu dizer mais nada que aquilo.

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-Me diga! – Cesar se aproximou de Xena já com roupas mais confortáveis no aposento. –Sobre o que conversou com a escritora? – Ele parecia despretensioso.

Xena que estava novamente na frente da penteadeira desfazendo o cabelo, não sentiu um pingo de vontade de dizer o que realmente conversou, mas seu marido era inteligente demais para que ela contasse uma mentira qualquer.

-De seu trabalho, sua vida. Ela me interessa. – A imperatriz respondeu enquanto era abraçada por seu marido.

-Realmente? – Ele continuou depois de beijar o pescoço de Xena. A única coisa que queria ter certeza é que ela continuava sendo sua. No entanto, Xena estava presente naquele aposento somente fisicamente, mas sua mente viajava pela conversa com Gabrielle. –Faz um bom tempo que não fazemos amor. – Disse Cesar em seu ouvido e Xena ficou desconfortável por não poder corresponder seu marido mais uma vez.

-Foi um longo dia.- Ela acariciou a mão dele e se afastou mais rápido do que tinha intenção. – Hey, onde vai? – Ela questionou após vê-lo sair do aposento.

-Bom, já que não precisa de mim. – Ele mostrou pergaminhos para ela. –Há um pequeno assunto que tenho que discutir com Brutus.- Em seguida ele saiu e deixou Xena completamente sozinha. A imperatriz não queria ter descartado ele daquela maneira, mas era cada vez mais difícil fingir que desejava Cesar depois de verões.

A imperatriz deitou em sua cama, mas era óbvio que não conseguiria dormir, em vez disso, ela se levantou e foi até a sacada. O vento estava fresco aquela noite e as estrelas brilhavam muito.

Mais uma vez, Xena se pegou lembrando de Gabrielle e como a escritora conseguiu expor tão bem o desejo de amar alguém além de outras vidas. Será que era possível mesmo amar alguém assim? Xena não conseguiu se lembrar de ninguém que havia tido aquilo na vida real, nem mesmo ela com César, o que era estranho, pois por muito tempo, eles se acharam perfeitos um para o outro. Será que Gabrielle já tinha amado alguém daquele jeito e por isso sabia transmitir aquele sentimento? As indagações não paravam de crescer e sem poder responde-las, Xena começou a pensar na escritora e como era bonita.

Gabrielle era de fato muito bonita e tinha olhos doces que combinava com os cabelos dourados. Xena não tinha tempo de admirar ninguém, mas aquela escritora era dona de uma beleza além do normal, então não foi muito difícil não apreciá-la.

Depois de um suspiro longo, Xena viu as luzes do aposento da frente acender e um movimento por detrás das cortinas. A imperatriz se assustou e se escondeu no escuro de sua sacada. Como ela era estúpida, é claro que aquele quarto era o do convidado de honra. César dava sua hospitalidade para os convidados, mas gostava de manter um olho neles por isso, sempre oferecia a suíte do pátio da frente.

A imagem de Gabrielle surgiu na sacada tão bela quanto de noite. Pelo jeito a escritora também estava tendo dificuldades para dormir e resolveu tomar um ar. Talvez ela só estivesse observando a cidade e aproveitando o luxo do palácio, mas então, Xena preferiu escolher a primeira opção, pois Gabrielle estava em uma túnica fina que se prendia somente no ombro, sendo assim, já havia se deitado, mas Morpheu se afastou dela.

-Será que ela está pensando a mesma coisa que eu? – Xena pensou. –Será que está se perguntando se o amor de almas gêmeas existe?

Xena por puro impulso deixou a sacada e saiu de seu aposento. Porque ela precisava ficar se perguntando? Agora que sabia qual era o aposento de Gabrielle, podia ir até lá e questionar. Isso mesmo, ela ia até a escritora e perguntaria se.…perguntar o que?

Quando a imperatriz se deu conta, ela estava parada na frente da porta do aposento de hospedes e se quer sabia o que perguntar. Xena se sentiu tão idiota e impulsiva, que o frio na sua barriga ficou insuportável.

-Melhor voltar. – Pensou ela finalmente, mas era tarde demais. Gabrielle abriu a porta tão rápido, como se quisesse ir a algum lugar desesperadamente e as duas assustaram.

-Imperatriz. – Disse a escritora enquanto curvava levemente a cabeça.

-Gabrielle!- Falou Xena e as duas ficaram paradas.

-Precisa de algo? – A loira estava nervosa e nem se deu conta que sua roupa era inapropriada para estar na frente da imperatriz.

-Não…quer dizer sim…- Xena nunca tinha gaguejado tanto e passava a mão nervosamente na túnica de dormir. –Queria te perguntar uma coisa…- Ela de fato queria, mas não sabia o que, então um silêncio constrangedor acometeu elas até que Gabi se manifestou.

-Pode perguntar…

-Bem… é que…- Merda, Xena. Pensou a imperatriz. –Por que “anjo caído”? – Ela finalmente perguntou.

-Bem, é que… O que? – Gabrielle estava tão nervosa que não entendeu a pergunta.

-Por que sua peça se chama “anjo caído” ?- Xena queria se jogar da janela naquele momento.

Que pergunta mais idiota.

-É que… eu não sei, dei esse nome com pressa. – A loira riu com nervosismo e Xena também.

-Tá bom. – Xena deu um passo para trás. –Está bem, então. Boa noite. – A morena ergueu a mão para se despedir e com paços lentos foi se retirando.

Gabrielle achou a pergunta muito idiota e aquela atitude estranha, mas quando Xena se afastou, ela simplesmente não quis ficar sozinha.

-Imperatriz! – Gabrielle chamou e Xena virou muito rápido na direção dela. –É que…- A loira não sabia o que falar também. –Era você quem eu vi na praça mais cedo, né? – Foi vez de Gabrielle esfregar as mãos na túnica de dormir e Xena não conseguiu ignorar nas curvas da barda. A túnica era aberta nas laterais e deixava o quadril de fora.

-Era sim! – Xena respondeu com poucas palavras.

-Por que estava lá? – A loira perguntou enquanto já pensava no próximo assunto.

-Não sei. Eu senti vontade de ir até lá e fui. – Xena olhou para o rosto de Gabi e depois os quadris novamente.

-Está bem! – Gabi falou.

-Tá. – Xena deu mais um passo para trás, mas não queria ir embora.

-Até amanhã! – Gabi voltou a falar.

-Até! – Xena respondeu e Gabrielle parou na porta e olhou para ela de novo. –Cuidado com os pernilongos. Tem muito nessa época do ano. – Na mesma hora, Xena sentiu vontade de se esfaquear.

-Pode deixar. – Gabi sorriu e entrou no quarto quando a imperatriz virou de costas e saiu andando.

-Cuidado com os pernilongos? Que merda foi essa? – Xena se perguntou e continuou com vontade de morrer.

Do outro lado do corredor, estava Alti observando tudo com o sorriso mais largo de Roma.