Helena e Pérdicas estavam voltando para Tróia após dois anos.

Haviam ficado amigos.

Ele admirava aquela mulher forte que mesmo sendo filha de Zeus era simples e amava seus povos. Rainha de dois povos! Assim era cantada pelos bardos.

-Não me canso de pensar o que elas estariam fazendo em dias chuvosos como hoje.

Disse Helena ao seu companheiro de viagem.

Pérdicas sorriu.

-Gabrielle com certeza estaria contando histórias, escrevendo-as em seus pergaminhos ou cozinhando. Ela adorava cozinhar desde pequena.

-Xena deve estar afiando sua espada ou cuidando de sua montaria.

-Xena é uma grande guerreira.

-É sim. Sabias que o nome Argo vem dos Argonautas?

-Imaginei. Gabrielle adorava falar sobre eles.

-Quando ela esteve em Esparta uma vez, eu sugeri este nome para um cavalo. Fiquei feliz quando soube que ela adotou.

   Era comum eles falarem de suas amigas.

   Pérdicas contava de sua juventude com Gabrielle e Helena falava de Xena, a grande mulher guerreira que conhecera em Esparta e ficara sua amiga.

   Jantavam juntos no salão da pousada e passavam por um casal . Era mais seguro assim.

   Helena quis dividir a cama com ele , mas Pérdicas insistiu em dormir junto à porta para aumentar a segurança. Estava acostumado a dormir no chão.

   Ele era um soldado e como rainha de Esparta, sabia que ele não mentia. Ela entendia bem.

   Após algumas semanas, parou de convidar.

   Ele nunca tentou forçá-la. Ela nunca tentou seduzi-lo.

   Tinham uma boa amizade.

   Repentinamente, sem alterar o sorriso em seu rosto, Pérdicas falou com Helena em tom mais sério.

-Repare discretamente no homem sentado próximo da janela perto da entrada. Ele sempre que acha que não percebemos, fixa os olhos em você.

   A filha do Tonante assim fez e reconheceu de imediato a figura sentada na mesa em questão.

-O que ele faz aqui?

-Sabe quem é?

-Sim, mas acreditava que ele estivesse bem mais longe.

-É grego?

-A guerra acabou faz dois anos. Lutou contra Tróia. O que faz aqui?

-Não tenho ideia. Diga-me quem é para que eu possa montar uma estratégia.

-Não há estratégia que nos livre dele. É o mais ardiloso dos homens. É Odisseu, rei de Ítaca.

-Ainda não agiu. Podemos subir e sair pela manhã.

-Não, Pérdicas. Ele deve apenas estar pensando a melhor maneira de nos abordar. Vamos nos antecipar e descobrir suas intenções.

   Antes que Pérdicas pudesse argumentar, Helena chamou a atendente e pediu que convidasse Odisseu para ir ter com eles.

   Pérdicas não se ofendeu.

   Compreendera há muito tempo que tomar decisões era parte dela. Era algo que fazia Helena ser quem era e não seria ele que ditaria como Helena de Esparta viveria sua vida.

Com zero surpresa Odisseu aceitou o convite.

-Boa noite. Obrigada pelo convite.

   Disse ele estendendo o braço em cumprimento, que foi aceito por Pérdicas que se levantara em toda sua altura para recebê-lo.

-Por favor, sente-se. Pérdicas apontou para o banco vazio à sua direita e sentou-se, sendo imitado por seu convidado.

-Você está linda.

-Obrigada. Você continua atrevido.

-Imagino que agora use outro nome. Quem é seu companheiro?

-Eu sou Pérdicas. Sim, ela não está usando o nome pelo qual é conhecida em todo o mundo.

-Gostaríamos que continuasse assim. É mais seguro.

   Completou Helena.

-Com certeza. Por mim ninguém saberá.

-Onde estão seus homens?

   Perguntou Pérdicas repentinamente.

-Perdi-os por uns dias. Os encontrarei no porto. Há reparos no navio que precisam ser feitos. Onde estão os seus?

-Por aí.

   Respondeu Pérdicas de forma displicente enquanto cortava mais um pedaço de cordeiro.

-Você é muito corajoso rapaz. Cuide bem dele.

   Odisseu abriu um sorriso que atingia os olhos. Ele e Helena sempre se entenderam sem muitas palavras.

-Ele sabe se cuidar sozinho. Como está Penélope?

-Acredito que esteja bem. Não vejo a hora de voltar e estar com ela e meu filho.

-Imaginei que você estaria em casa num dia como este. Faz tempo que a guerra acabou.

-Eu também, mas Posseidon, o Sacudidor da Terra, tem outros planos. Sempre algo nos atrasa.

   Os olhos de Odisseu brilhavam de paixão.

   Como todos os reis Aqueus, ele também havia sido pretendente da mulher mais bela do mundo e juntos haviam jurado defendê-la se um dia ela precisasse.

   Devota fervorosa de Afrodite, Helena conhecia aquele olhar e reconhecia bem o desejo dos homens, pois sendo quem era, havia sido objeto dele durante toda sua vida, desde que havia se tornado mulher.

   A memória de suas conversas com Odisseu em seu palácio estavam bem vivas e sua alma reacendeu a chama que ela propositalmente amainara ao escolher Menelau de Esparta.    Resolveu então atender ao chamado de seu corpo e aos anseios dele.

-Pérdicas.

-Sim.

-Eu e Odisseu precisamos acertar alguns assuntos inacabados em Esparta. Podes, por gentileza, guardar o corredor?

-Claro, sem problemas.

-Após o jantar eu gostaria que subisse comigo Odisseu. Há algo que precisamos resolver.

   O rei de Ítaca terminou seu vinho e solicitou outro, antevendo a longa “conversa” que teriam.

   O carro de Apolo encontrou Pérdicas batendo à porta, sendo atendido prontamente por um Odisseu alerta.

-O que foi rapaz?- Hora de partirmos. A pousada está enchendo de gregos.

   Helena já estava pronta para seguir viagem e saindo ao corredor, declarou sem olhar para trás:

-Saiamos pelos fundos. Odisseu nos dará cobertura.

Abriu um sorriso quando a voz forte e vacilante do ardiloso criador do cavalo deixado aos portões de Tróia concordou rapidamente.

-Claro. Sem problemas.

Odisseu desceu as escadas e após eles que saírem pelas cozinhas entrou no salão com o melhor dos seus sorrisos usando sua voz de tombadilho no meio do salão:

-Então homens, vamos falar de um cavalo de madeira? Bebida para todos!   Todos caíram na risada…

   Helena e Pérdicas ganharam o mundo rumo à Tróia onde ela queria saber de seu povo.