Fanfics sobre Xena a Princesa Guerreira

 

“Quem é você para sequer pensar que sabe a diferença entre o bem e o mal?” – O mensageiro: A História de Joana D’Arc.

Fazem três dias que Ares me trouxe de volta à vida, e eu não vi Xena desde o primeiro dia. Esta noite está quente e clara, enquanto eu sento no acampamento, fingindo ler os pergaminhos que salvamos da taverna destruída, mas eu na verdade estou observando Gabrielle preparar o jantar. Ela parece tão concentrada nos vegetais que está cortando e ela está tão quieta. Ela parece tão triste, mas tão linda. O luz do fogo consegue destacá-la. Tudo consegue. Eu me encontro apenas olhando para os braços dela e imaginando o quão linda minha mãe deve achá-la.

“Você é linda” eu digo. Talvez com isso, eu consiga uma resposta.

“Ah, que é isso” ela diz, olhando pra mim. “Sua mãe é linda. Eu sou somente uma camponesa com músculos”.

“Não” eu insisto. “Xena é linda, porque ela É linda. Você é linda, porque você é você.”

Ela cora. “Eu não sou mais bonita por dentro do que os outros. Eu costumava deixar as pessoas pensarem que sim. Eu os deixava me convencer que eu era de alguma maneira pura, com minha moral inquestionável. Eu não sou perfeita. Eu tenho motivos que você não acreditaria.

Que sorte ter conseguido atingir esse ponto sensível tão fácil hoje a noite… Talvez eu consiga manter uma real conersa fluindo. Essa não é a barda falante dos contos. Ela me fascina.

“Eu sei que você não é perfeita, Gabrielle. Você apenas não é exageradamente perfeita.”

“Eu acho que você não pegou nenhum dos pergaminhos onde eu faço coisas terríveis, ainda, pegou?” Ela pausa e ri ironicamente, balançando a cabeça como se quisesse se livrar disso. “Então, você deve lembrar como eu te matei, há alguns dias atrás. Isso deve ser o suficiente pra você compreender que isso é mais que imperfeição.”

“Circunstâncias. Destinos. Coerção,” eu digo vagamente.

“Vamos beber por isso,” ela diz, colocando vinho e brindando.

“Às chances,” eu digo. É a primeira vez que eu brindo algo que não seja o Império.

Gabrielle levanta a cabeça em alerta, quase imperceptívelmente enquando coloca mais vegetais num ensopado.

“O que é isso?”

“Xena.”

“Como você sabe? Eu não ouvi nada.”

“Eu posso sentí-la. Acho que é o cheiro dela, não sei bem.”

“Sério? O que ela está fazendo?”

“Ás vezes quando ela fica realmente zangada, quando está se culpando por algo, ela gosta de ficar sozinha.”

“Ela tem estado próxima?”

“A maioria do tempo ela está perto o bastante pra escutar se nós gritarmos. Eu acho que é como se ela se trancasse num quarto e não quisesse abrir a porta. Como temos um único tipo de lar…”

“Por que você acha que ela quer ficar sozinha?” Eu sei que Gabrielle não quer falar sobre isso. Eu posso ver que ela está sendo paciente comigo, que ela está respondendo essas perguntas porque é a criança dela perguntando. Se eu fosse qualquer outra pessoa, eu acho que ela estaria arrancando minha cabeça. Que escolha infeliz de metáfora!

“Porque ela não quer que a vejamos daquele jeito. Ela está zangada demais pra se comunicar educadamente. Ela tem medo do que possa fazer.”

“Você acha que ela te machucaria?”

“Ela teme por isso, porque quando ela está desse jeito, não confia em si mesma. E ela está tentando descobrir o que está errado… Ela é orgulhosa.”

“Mas você é mais o tipo que gosta de resolver as coisas conversando.”

“É,” diz Gabrielle, sorrindo como se lembrasse de algo. Ela parece anos mais jovem. “Sim, eu sou a comunicativa.”

“Então, o que está havendo?” eu arrisco.

Gabrielle olha pra mim com um sorriso. “Ah, você não fez isso…” eu sorrio de volta.

“Barda falante…” eu digo.

“Eles costumavam me chamar de loirinha irritante.”

Nós rimos e o ensopado fica pronto. Está muito bom, especialmente nessas condições, e eu digo a ela. Esta é a primeira vez que posso lembrar de ouvi-la rir, mas eu não comento.

“Por que você acha que ela está assim?”

Gabrielle põe mais vinho e se encosta num tronco.

“Sabe quando você está agitando uma guerra? Você precisa estar concentrada na estratégia, na luta, no objetivo. Como você coloca tudo que que tem nesse objetivo, se espera ganhar?”

“Claro. Ares me ensinou isso. Você não pode deixar dúvidas no seu coração, deve estar feroz e inflexível. Se houver um único restante de incerteza, ou um momento em que se pensa duas vezes, você pode ser derrotada.”

“Exato. É assim que o último ano foi pra nós. Quero dizer, os últimos 25 anos atrás.”

“Você pode dizer o último ano. Eu vou lembrar,” eu sorrio. Ela vai conversar comigo. Eu posso ver que estou jogando as cartas bem e posso fazê-la falar por horas.

“O ano passado. Deuses. Por um lado isso parece realmente 25 anos atrás. Bem, aquele ano foi como uma guerra. FOI uma guerra. Contra inimigos tão mais fortes que nós éramos, que parecia verdadeiramente ridículo mesmo considerar tentar vencê-los. Mas Xena, não aceita a derrota, mesmo quando ela bate no traseiro, então nós estávamos em meio a uma guerra. Nós descobrimos enquanto a guerra acontecia, que havia um caminho pra escapar. Mas obviamente, nós não o tomamos. Eu não acho que Xena tomou alguma vez o caminho mais fácil na vida toda dela.”

“E qual era?”

“Nós fomos para China, e descobrimos não somente que a influência de deuses gregos aparentava não existir lá, mas de algum modo, na China, Xena era capaz de ter grandes poderes. Ela podia criar escudos em volta dela, e podia transformar coisas em pedra com a mente. Se ficássemos lá, você cresceria salva e os deuses provavelmente ainda estariam por aí.”

“E você e Xena provavelmente estariam mortas agora. Esqueceu disso…”

“Quer uma história, não quer? Deixe-me fazer meu ponto que é esse mesmo! Depois que a guerra acaba, você pensa. E as vezes, as coisas que aconteceram, as coisas que você teve que fazer, parecem diferentes agora que você não está no calor da batalha, não mais defendendo as pessoas que ama, de morte certa. Então, acho que ela está pensando sobre essas coisas. Eu mesma estou. Eu apenas não tenho que me isolar tanto, pra fazer isso.”

“Não TANTO. Mas me fale sobre a China,” eu reencho nossos copos.

“China. Havia uma mulher que sua mãe amou, elas se conheceram há muitos anos atrás, quando Xena era selvagem e louca, mas Xena acabou traindo-a. Ela era uma grande filósofa, e uma mulher muito poderosa. Elas não se viram por anos, e eventualmente ela morreu, fazendo Xena sua vingadora e herdeira espiritual. Eu acredito que o espírito dela é um tipo de guardião do reino da China, e as vezes, quando ele está ameaçado, ela chama Xena pra agir por ela e protegê-lo. Duas vezes, o espírito dela mandou mensageiros que acabaram mortos ao completar suas missões sobre alertar Xena sobre os problemas na China. Vamos resumir um pouco Eve, sem perguntas, você pode ler sobre isso nos pergaminhos chamados The Debt e em um chamado Forget me not. A segunda vez, ela estava grávida de você e um monge sem língua morreu em meus braços tentando dizer a Xena que o falcão e o pombo tinha que se tornar um com a sabedoria. Fosse como fosse, eu descobri, nós fazemos o que Lao Ma quer, mesmo quando ela está morta, então fomos pra China.

Gabrielle bebe o vinho e eu acho que ela realmente tem ciumes dessa Lao Ma. Eu faço uma anotação mental sobre o nome dos pergaminhos.

“É uma longa história, mas ela teve três filhos, uma que deve estar morta a essa altura, e dois que eram maus. Mas nada disso realmente importa. É sobre o pó negro, o poderoso explosivo. Uma vez ele foi inventado e então proibido. Ninguem poderia saber o segredo, mas a filha má de Lao Ma, sabia e estava usando. Xena descobriu que o pó negro daria grande vantagem pra qualquer exército que soubesse fabricá-lo, então decidiu se livrar dele, embora nós tenhamos descoberto que era fácil descobrir a receita, porque Joxer foi capaz de fazer isso em poucas horas. Então fomos em frente. China estava um caos, a filha boa de Lao Ma estava em perigo. Então Xena descobriu como usar os ensinamentos espirituais para conseguir incríveis feitos físicos. No fim, – e demorou pra que tivesse fim, então você tem sorte de estar ouvindo isso – foi nosso arranca rabo contra um exército de 100.000 homens liderados por duas crianças más que estavam mortas e num mesmo corpo.”

“Eu só acredito em você porque sei que coisas como essa aconteceram com você antes. E daí?”

“Xena parou o exército transformando os soldados em pedra.”

“Isso soa como mágica. Ela somente matou todos eles?”

“Sim, naquele momento pareceu a coisa certa a fazer.”

“Então você acha que agora Xena está pensando em como ela tomou a decisão de matar todas aquelas pessoas, e ela está imaginando que talvez não fosse a coisa certa a fazer?”

“Talvez,” disse Gabrielle, “Mas acho que a pergunta é ainda maior. A questão é, se Xena tinha ou não o direito de considerar uma decisão como a de se o pó negro deveria ser usado ou não. Cinco anos atrás, quando começamos a viajar juntas, as coisas eram claras. Os escravos eram pra ser libertados. Os sequestrados pra serem resgatados. Xena poderia fazer todas essas coisas pra ajudar os outros, e fez. Mas ela era tão poderosa, mais poderosa do que qualquer outro. Ela era mais esperta e rápida, brava e mais confiante. E ela se tornou bondosa. Ela tinha um forte código moral e tinha o meu amor inocente e meu claro senso de certo ou errado pra guiá-la. Ela não podia ser detida. Ela era tão linda, tão maior do que a vida, e tudo que ela fazia parecia tão perfeito, direito e sábio.

Era como se ela nunca pudesse falhar, como se nunca estivesse errada. Eu, no meu coração, embora eu soubesse que era manchada e magoada, eu achava que ela era como uma deusa. Cheia de amor e dor e uma insaciável sede por mais. Uma vez escutei uma música numa taverna sobre ela, que dizia “Afamada por façanhas com uma espada, temida e adorada…” Era assim que as pessoas a viam. Com o passar do tempo, parecia natural que nossa luta pelo Bem Supremo se ganhasse uma escala maior e maior.

“Como é estar apaixonada desse jeito?”

“O que?” Gabrielle pergunta, confusa.

“Eu nunca me apaixonei. Às vezes eu imagino como é isso.”

“Ah, bem, o que eu descrevi é mais como admiração. O jeito que a amo, bem, é mais complicado que isso. Há dias em que eu sinto que estou tão apaixonada por ela que meu coração vai explodir se eu não expressar isso, e há dias que eu acho que devo ser louca em sequer cogitar o pensamento de nós duas juntas desse jeito. Estar apaixonada é assim, enlouquecedor…”

A atenção de Gabrielle é mais uma vez chamada por algo que não consigo sentir. Ela olha no escuro da floresta que rodeia nosso acampamento.

“É Xena?”

“Sim. Acho que ela está perto o suficiente pra ouvir e eu não quero falar mais sobre isso, ok?”

“Sim. Ok. Quer dormir?”

Eu coloco meu cobertor perto do dela, mais perto do fogo. Ela é quem nos protegerá se precisarmos de proteção durante a noite. É estranho ser mais velha que essa mulher, que considero minha mãe, que me vê como uma criança repentinamente crescida. Como a lenda do nascimento de Athenas, a mulher que saio direto da cabeça de Zeus. E mais estranho ainda, é os modos pacíficos que parecem tão certos em mim agora, colocando ela em perigo, quando sei que sou pelo menos igual a ela em uma batalha. Eu acabo dormindo rápido.

Eu sonho com tempestades e mensageiros, gatos pretos, raios e árvores mortas. Todo tipo de sinais. Nenhum claro pra mim. Eu não os temo, mas acordo sem fôlego. A manhã está quente e eu posso ouvir os barulhos resmungados de Gabrielle trabalhando do outro lado da clareira. Quando eu leio os antigos pergaminhos, eu não posso acreditar que é a mesma pessoa. O amor que sinto por ela é tão forte, que as vezes parece forte demais. É como se a parte de mim que herdei de Xena fosse apaixonada por ela, assim como herdei a altura de minha mãe. Ou talvez, eu apenas veja o que aparentemente as pessoas sempre viram nela, bondade e pureza. Talvez eu seja a única que veja isso realmente como isso é: Força.

Nós damos um mergulho antes do café da manhã. “Pare de me olhar!” diz Gabrielle rindo enquanto tira a roupa. “Desculpa. É que seu corpo é tão bonito. Isso é tudo. Nada pessoal,” Prometo. “Deuses!” ela afunda na água e eu a sigo. Enquanto nos banhamos, casualmente pergunto, “Você sabe quem é a mulher que tocou a barriga de Xena e me fez?” “Você não sabe?” “Não, apenas sei que ela era dourada e magnífica, como um anjo.” “Como um anjo,” repete Gabrielle, balançando a cabeça. “Ela era um anjo, Eve, você está certa. Logo depois da limitação dela ao inferno. Eu te conto o resto enquanto tomamos o café.” “Obrigada, mãe,” Eu digo isso de propósito e levo uma espirrada de água por isso. Espero que Xena estivesse orgulhosa em ver como estou alegrando-a e fazendo ela compartilhar o que sente. Gabrielle apronta o café da manhã e começa a história. “Era uma vez uma jovem. Ela vivia numa vila. Um dia, um senhor da guerra veio e queimou a vila, matando a família da jovem e deixando ela sozinha. Ela jurou se vingar. Ela estudou por anos e se tornou uma grande lutadora. Mas sua concentração em vingança corrompeu seu coração e mente, até que ela ficasse louca. Finalmente, ela estava pronta pra achar o inimigo. Mas dessa vez, o inimigo havia se reformado, e não era mais cruel e sim uma heroína numa busca por redenção.” “Você está me dizendo que era Callisto?” pergunto incrédula. Gabrielle confirma. “A mulher Xena matou, que trabalhou pra Ares, Hera, e Dahak… ela era o anjo que me gerou?”

“Sim. Tome um pouco mais de chá”, ela diz. “Ares te falou sobre ela?”

“Sim, era parte de minha educação guerreira. Saber as forças e fraquezas de grandes guerreiros de antes de mim, e ser capaz de evitar as falhas.”

“E o que ele disse que as falhas eram?”

“Ela era obcecada demais, isso tornava fácil as pessoas usarem ela, porque todas as suas cartas estavam na mesa, eles sabiam o que ela queria e o que estava disposta a fazer. E era louca, mas de acordo com Ares, isso era menos que um problema.”

“O que ele disse sobre Xena?”

“Que você era a fraqueza dela. Você a fez suave e levou a concentração dela embora. Antes de você, ela era perfeita. Depois de você, ela sempre tinha fraquezas. Quer saber o que ele disse sobre você?”

“Não.”

“Ele disse que você era a melhor, porque você tinha controle. Ele disse que sua força em batalha era surpreendente, ninguém imaginava que você era nem metade do quanto era boa, então você se aproximava e — zang! Você percebeu que fraqueza era sua força e não havia melhor arma do que a menos esperada.”

“Você realmente prestou atenção nele.”

“Ele foi meu herói por muito tempo. Eu achava que não havia nada que ele não soubesse. Ele nunca me disse que Callisto se tornou uma deusa.”

Ela diz que me contará na estrada e nós desmontamos o acampamento. Callisto. Eu me contento com isso e espero pra ouvir mais. Nós estamos em estrada aberta, quando Gabrielle começa a história.

“Eu canto a versão curta da história de como a rainha guerreira, Callisto, virou deusa. Três anos atrás… ou vinte e oito, e lendária Xena morreu. E como ela era Xena e tudo mais, lhe foi dada a oportunidade de voltar á vida, o que ela fez. A oportunidade era uma busca que levava à Ambrosia, com uma amazona renegada e determinada à nossa caça. Obviamente, nós levamos a melhor, mas de algum modo ela acabou conseguindo Ambrosia e se tornando uma deusa.”

“Qual era o nome dela, e por que ela estava atrás de você?”

“Velaska. Ela queria ser a rainha das Amazonas, minhas Amazonas, e ela não era a mulher certa pro cargo.”

“Suas amazonas?”

“Leia Hooves and Harlots e The Quest. Essa é a versão curta, lembra? O tamanho perfeito pra viajantes cansadas”, ela diz, parando pra massagear seu pé.

“Perdão. Continue por favor.”

“Okey… Velaska era uma deusa e queria me matar porque eu escolhi reinar. Xena estava viva novamente, mas não podíamos com os poderes dela. Xena decidiu que precisávamos de ajuda de uma imortal e Callisto era imortal, estava presa perto dali, então Xena fez um trato com ela e nós derrotamos Velaska, e Callisto conseguiu comer Ambrosia. Nós prendemos as duas na lava. Callisto saiu de lá mais tarde, mas essa é outra história.”

“Vocês criaram deusas…” Gabrielle tropeça numa raiz e diz que acha que sim.

“E então, vocês as destruíram.”

“Bem, foi o que nós achamos.”

“Então, você está dizendo que para salvar suas vidas, vocês tiveram a chance de fazer duas deusas malvadas e vocês perderam.”

“Bem, nós estamos vivas. E se Callisto não tivesse se tornado deusa, provavelmente nunca teríamos tido você.”

“Gabrielle, eu matei milhares de pessoas. Eu sei que você se importa comigo, mas a morte de tantos inocentes nunca é justificável.”

Houve silêncio por um momento.

“Ela matou até mesmo os cavalos,” sussurrou Gabrielle.

“O que?” “Ela imaginou que todos que tivessem o símbolo do dragão verde se tornaria pedra. Os soldados estavam em cavalos, que vestiam a bandeira do Império morto.”

“Por que vocês não deixaram os outros deuses lidarem com Callisto e Velaska?”

“Eu não acho que isso nos ocorreu. Xena era a heroína, a forte, aquela que consertava as coisas para todos. Ela iria consertar isso também. A Xena que você conhece, que chora e reza? Essa não é a Xena que eu conheci. A Xena que conheci não pediria nem para passarem a água se o cabelo dela estivesse pegando fogo.” Eu rio.

“Podemos parar e pescar para o almoço?” eu peço. Ela me olha, e parece mais calma do que esteve nesses dias. Ela mexe a cabeça para o lado e concorda, sorrindo.

“Claro.” Eu não teria sugerido isso se não estivéssemos perto de um rio, então descemos pela beirada improvisando algumas varas de pescar. Agora posso ver pelos sinais de Gabrielle que Xena está por perto, mas eu não digo nada.

“Nós estávamos viajando perto da Tessália,” ela começa, do nada, “e acabamos perto de uma guerra terrível que se tornou uma matança. E com uma sorte tão incrível, nós encontramos nossa amiga Ephiny, sozinha na floresta, prestes à dar a luz. O marido dela foi morto por esporte por soldados. Nós paramos ali na floresta, ultrajadas pelas casuais crueldades do mundo, e então ela disse, ‘Eu vou encontrar um lugar seguro pra Ephiny dar a luz e então vou parar essa guerra.'” Gabrielle para pra dar efeito, e então recontinua. As vezes eu acho que há tantas histórias sobre minha mãe que será impossível eu ouvir todas.

“O que aconteceu?” “Ela encontrou um lugar seguro pra fazer o parto de Ephiny e parou a guerra.”

“Incrível.”

“E me trouxe de volta da morte.”

“Você quer dizer que ela te matou?!”

“Não, eu acabei sendo morta. Ela me trouxe de volta.”

“Você está errada!” a voz de Xena ecoa de algum lugar entre as árvores. “Eu te matei, e você mesma voltou!”

“Saia daí e diga isso na minha cara!” Gabrielle grita para a floresta. Nossas varas de pescar agora estão esquecidas na água.

“Admita que estou certa!” gritou Xena.

“Nunca!”

“Não significa o fato que você parou a guerra?!” eu grito.

“Gabrielle MORREU, Eve,” ela grita da floresta. Eu posso perceber que ela está se movimentando em volta. “Eu arrisquei a vida dela, a de Ephiny e a de Xenan. Foi INSOLÊNCIA minha! Você não entende? Gabrielle não gostava da guerra, então eu tinha que parar ela. Eu sabia que podia parar. Foi tudo em que pensei. Não pensei sobre os riscos. E eu não aprendi a lição! Meu enorme orgulho tem sido minha desgraça. Não escute as mentiras da Gabrielle, eu não sou uma heroína!” eu posso ouvir ela deixando as árvores e saindo tão rapidamente que ela sabe que nunca a alcançaremos.

“Acho que você estava certa,” eu digo, sorrindo pra Gabrielle e pegando nossas varas de pescar. Partes de mim estão tremendo. Eu nunca ouvi Xena falar daquele jeito antes, com tanta dor.

“Eu não estou mais com fome, Eve. Podemos ir em frente?”

“Claro. Onde estamos indo?” eu tratei de evitar perguntar a ela isso tão cedo, porque ela ainda não havia mencionado e eu temia que ela não tivesse uma resposta.

“Estamos indo em direção à Trácia, para ver quem está vivo.”

As famílias delas. Minhas famílias. Elas dizem que eu conheci minha avó, mas eu não me lembro. O tom da voz dela é tão triste. Eu acho que ela pensa que eles estão mortos. Eu não tenho certeza se ela realmente quer saber.

Nós caminhamos em silêncio por horas. O sol mancha o céu de laranja e rosa enquanto montamos acampamento, e achamos lenha, e fazemos todas as coisas que ela usualmente faz com Xena. Eu caço um coelho e ela faz um ensopado. As estrelas estão no céu, quando começamos comer.

“Sabe o que fizemos nesse ano? Quer dizer, naquele ano?”

“O que?” parece ser a resposta mais segura.

“Aquele não parecia o caminho dessa vez. Quer dizer, Eve, era como se tudo estivesse desconectado. Nós não pensávamos sobre o que estávamos fazendo, mas a extensão de nossa influência se tornou realmente imensa. Nós decidimos, de um jeito ou de outro, quem iria ou não governar a China, o Egito, Roma, a Nação Amazona, e os próprios Céus. Eu fico chocada quando paro pra pensar nisso, nós tivemos a oportunidade de governar metade do mundo naquele ano. Nós continuamente nos deparávamos com situações nas quais éramos requisitadas ou nos sentíamos compelidas ou de algum modo, destinadas a ajudar. Nós fizemos escolhas que não não cabiam a nós. E ainda, de algum jeito, éramos capazes de fazê-las e elas funcionavam.”

“Uau”, eu digo.

“Sim, uau”, ela diz.

“O que você acha que foi isso?” Posso sentir que Xena está perto. Gabrielle está tensa, mas continua.

“Muito aconteceu desde então. Nós ganhamos cada batalha em que entramos por anos, embora às vezes com enorme custo. Quando eu a conheci, eu achei que ela era invencível, e nada parecia mudar meu pensamento.” O olhar nos olhos dela quando ela olha para o fogo, me diz que ela ainda acredita profundamente nisso.

“Ela é como mágica para você, não é?” Gabrielle me olha curiosamente e franze o nariz.

“Sim, como mágica. Nós nos acostumamos com a adoração das pessoas, o olhar com que elas nos olham quando nos veem lutar ou fazer algum feito incrível. É quase como ser uma deusa. E mesmo quando nós morremos, nós voltamos. De novo, e de novo. Eu lembro do dia em que parei numa doca e Afrodite apareceu quando eu assobiei para ela. Tudo que Xena tinha que fazer era sussurrar o nome dele, e o deus da guerra estaria ao lado dela. Essas se tornaram os fatos de nossas vidas, então quando Xena engravidou sem razão aparente, e então descobriu que ela estava prestes a trazer uma criança que traria o fim dos deuses, bem, isso não pareceu tão estranho ou suspeito quando deveria parecer. Era quase normal que as regras fossem diferentes pra nós. Qualquer lugar em que fôssemos, parecíamos atrair a atenção dos mais poderosos inimigos.”

Neste ponto, é quase como se ela estivesse falando para Xena através de mim. Essas coisas, elas deveriam estar dizendo uma pra outra, são coisas secretas, que você mantém no fundo de sua mente, e não se atreve a dizer a ninguém.

“Então, você entende que quando ouvimos que o bebê traria o fim dos deuses, nós entendemos que de alguma maneira, aquilo fazia sentido, que nossa criança tivesse aquele poder. Mas não tínhamos tempo pra pensar, e de repente estávamos numa guerra. Havia um bebê pra se proteger, nosso bebê. Tudo que fizemos, fizemos pra proteger você. Esquecemos as outras coisas. Esquecemos tudo, pra proteger a você a todo custo. Esquecemos sobre o Bem Supremo, esquecemos uma da outra. Tudo que víamos era o perigo.

“Nós fomos usadas!” a voz de Xena vem das árvores acima de nós.

“Me diga!” eu grito pra ela.

“Aquele deus nos manipulou por não sei quanto tempo, talvez desde a Índia. Ele sabia que eu faria qualquer coisa pra proteger meu bebê, e eu caí nessa. Eu acreditei que meu bebê era a coisa mais importante no mundo. Eu achei que era SAGRADO. Escutou isso, Gabrielle! Xena, a Destruidora de Nações, SAGRADA! Eu engoli a coisa toda. Pelos deuses. Como você consegue aguentar mesmo ouvir minha voz?”

“Saia daí e sente-se perto do fogo!”

“Não!”

“Não significa que você não é mais heróica, Xena!” eu digo. “Só porque cometeu erros.”

“Cometi ERROS?!!?!” ela grita.

Gabrielle põe a cabeça nas mãos e olha para o chão. Agora Xena está pondo tudo pra fora.

“Eu conscientemente decidi fazer um homem se apaixonar por mim, sabendo que provavelmente o mataria, era a estratégia. Eu escolhi, tendo mais de uma opção. Eu não sei se você pode chamar isso de erro. Você sabe o que é um herói, Eve? Um herói é alguém que ajuda os outros. Alguém que está disposto a se pôr em risco pra ajudar estranhos, simplesmente porque é a coisa certa a fazer. Alguém que segue esse código SEMPRE. Não alguém que lute quando as pessoas que se ama estão em perigo, mas que lute por qualquer um que precise de ajuda. Esse deus me tirou isso, me induzindo a lutar por ele! E eu nem percebi! Todo o ano eu lutei pela minha família e meus amigos — você estava lá Gabrielle, diga a ela — que estranhos nós ajudamos?”

“Somente Daphne”, Gabrielle sussurra.

“O que?!” Xena repete.

“SOMENTE DAPHNE!!!”

“Como eu disse, eu não sou uma heroína. E sabe o que, depois de tudo que fizemos, ainda assim perdemos a guerra! Afrodite e Ares são os heróis! Eles foram capazes de passar sobre os laços de sangue para fazer a coisa certa. Vocês duas estariam mortas se não fosse por eles. Tudo que sou, é a pessoa que fez vocês morrerem!”

É agora ou nunca, então eu faço meu movimento. Eu a localizo e subo na árvore próxima a ela em segundos eu a agarro e a derrubo da árvore, caindo com ela no chão de modo que eu receba o impacto. Eu a seguro e ela me olha.

“Eu vou te largar se você ficar conosco por um momento.”

“Eu não faço tratos.”

“Mas considera pedidos? Poderia ficar, por favor?”

“Certo”, ela diz, se soltando. Ela senta diretamente perto do fogo e olha para as chamas. Gabrielle enche um copo de vinho e o alcança a Xena, então senta-se ao lado dela, no chão. Todo comportamento dela está diferente agora que Xena está aqui. Ela está mais gentil, e completamente concentrada em Xena. Eu observo ela acariciar a mão de Xena, enquanto lhe dá o vinho, e então senta mais perto dela, tão perto que elas encostam-se.

“Lembra quando costumávamos lutar contra gigantes?” Xena pergunta, bebendo. Gabrielle sorri e coloca a cabeça no ombro de Xena.

“Sim, eu lembro. Com espelhos e coisas voadoras.”

“E eu tive a audácia de tentar trazer o poder de Zeus à terra.”

“Funcionou, eu lembro.”

Elas sorriem uma pra outra e posso perceber a tensão deixando seus corpos.

“Xena, lembra a primeira vez que achamos a ambrosia?”

“Claro, o tesouro sumério.” “E lembra como falamos sobre isso, o que você disse quando perguntei por que você não ficava com ela?”

“Sim, eu disse que não queria ser uma deusa, queria somente ser humana.”

“E não é o que nós provamos esse ano? Que depois de tudo, cada feito heróico, cada batalha, cada reviravolta, nós somos somente humanas? Eu sei que você gosta de se concentrar em seus dias de guerra, reparar as coisas que fez as pessoas. Mas antes disso Xena, antes de tudo, você foi uma heroína. Você nem correu, nem desistiu ou se acovardou por medo. Você lutou pelo que acreditou. É isso que ainda vejo quando olho pra você, aquela garota jovem que tentou salvar todo mundo. Mas Xena, ninguém pode salvar a todos.”

“Eu estou cansada,” sussurrou Xena, sua voz é um mundo de tristeza.

“Me perdoe Gabrielle. Por não ser sua heroína, e por te magoar. Você está certa. Tudo que eu via era Eve. E mesmo agora, eu sou egoísta, porque eu me arrependo mais de magoar a desapontar você, do que por todos os meus pecados juntos. Há tantas coisas que eu quero ser por sua causa, e para você.”

“Eu sei.” “Eu quero que nós tenhamos uma vida mais simples Gabrielle, com escolhas menores. Uma vida na qual no final do dia, eu sei que vou estar viva.”

“É uma ideia maravilhosa Xena. Vamos dormir,” diz Gabrielle ternamente. Elas deitam em seus cobertores, e o fato de que estou aqui é completamente esquecido, como de fato, deve ser. Eu me retiro pra mais longe. Escuto os sons dos corpos delas se acomodando juntos, o couro rangendo, suspiros de ambas que me dizem que elas estão se abraçando agora. E foi por minha causa! Elas estão deitadas nos braços uma da outra por minha causa! Minha primeira boa ação!

“Você tem que me levar com você,” eu ouço Gabrielle sussurrar, “me ensinar tudo que sabe. Você não pode me deixar aqui em Potédia. Eu quero ir com você, eu estudei as estrelas, falei com filósofos, e a cada ano, meu dom da profecia melhora — eu posso ser muito útil para você. Me leve contigo. Eu quero tanto ser igual a você.”

“E eu quero ser igual a você,” Xena sussurra, com sua voz rouca de emoção. Cinco, ou vinte e cinco anos mais tarde, eu ainda poderei ouvir o que elas estão dizendo…

“Depois de tudo que passamos, meu amor, eu sinto por você exatamente o que senti no dia em que nos conhecemos.”

Eu ouço mais um sussurro e então um inconfundível som de um beijo. Beijo, uau! Pontos a mais pra Evie! Gabrielle geme e eu viro de costas e enrolo um xale em minha cabeça pra bloquear minha audição. Eu não acho que sei a diferença entre o bem e o mau, mas eu aprendi que o amor pode curar, e vi isso sendo provado hoje. A jornada de Cirra para o Inferno foi destino para mim? Eu nunca saberei. Xena e Gabrielle estão juntas, e isso me basta essa noite.

Nota