Fanfics sobre Xena a Princesa Guerreira

Algumas horas se passam desde que Eve me deixou. Avanço um pouco para dentro da floresta para sondar o território. Visualizo vestígios de um acampamento recente em uma clareira no meio dela. Isso quer dizer que os caçadores estiveram vasculhando o território atrás de nós. Me pergunto em que área estariam agora, mas não demora muito para que eu descubra. Uma nuvem de fumaça densa brota no horizonte e ouço vários bandos de pássaros fugindo aos gritos. Droga. Eu sabia o que isso significava, não era a primeira vez que me encontro nessa situação, mas dessa vez Xena não estava ali para me catapultar para a segurança. Eu sei que a estratégia deles consiste em incendiar o outro extremo da floresta e nos prender entre dois paredões de fogo. Só posso rezar aos deuses que Eve esteja em segurança, já perto do acampamento amazona. 

Minha melhor chance é segui reto à oeste da floresta, tentando me locomover por uma linha reta de árvores e evitar ficar presa entre duas muralhas de fogo. 

 Meus ouvidos se sobressaltam. Ouço estalos vindos do outro lado, de trás de onde a caverna onde me abriguei fica. O segundo foco de incêndio começou. Tento me apressar, sendo cuidadosa para saltar de galho em galho, mas o vento começa a inundar a floresta de fumaça, dificultando a visão. Estou um pouco acima da faixa de fumaça, mesmo assim, o cheio de madeira verde queimando faz minha garganta e meus olhos arderem. 

Avanço arduamente por várias léguas. Sei que estou chegando perto da campina que separa a floresta do território das Amazonas. Precisarei descer e sair dali. Infelizmente parece que não tenho escolha, meu exílio terminará mais cedo. 

Uma confusão com vários animais selvagens ocorre lá embaixo. Inúmeros cervos, porcos selvagens e animais menores empreenderam fuga para se salvarem, levantando uma nuvem de poeira que se mistura à densidade da fumaça. Sinto dificuldade em respirar, o que me deixa cada vez mais tonta e tornar minha navegação aérea perigosa. Decido saltar da última árvore para a relva, quando algo prende minha atenção. Pensei estar alucinando pela fumaça, mas não. 

-EVE! – grito lá de cima. Ela está na entrada da floresta, tentando tapar o rosto com um pedaço do sari no meio daquela confusão generalizada de fumaça, poeira e animais em fuga. 

-VARIA, CUIDADO. 

Instintivamente salto para o chão, antes que duas flechas incendiárias me acertem. Um grupo de três homens imediatamente nos rodeia, seus rostos cobertos por tecido. Jogo a faca de Eve para ela, retornando sua arma e puxo minha pedra de obsidiana. Eve aplica seu famoso golpe em um dos homens e o manda pelos ares. Eu consigo imobilizar um segundo, lhe aplicando uma chave de braço até que desmaie, mas quando me levanto, o terceiro se joga em cima de mim, e me desequilibro no declive que separa a floresta da campina. Acabamos rolando por alguns metros para o meio das árvores em meio a uma luta corporal frenética. Eve grita meu nome e tenta chegar até nós, mas a fumaça está densa demais atrapalhando a visão. O caçador tenta encostar uma lâmina em minha garganta, mas seguro seu braço, tentando desviá-lo. 

-VARIA, onde você está???? – Percebo que Eve tenta tatear o chão para chegar até mim, sem visão alguma, mas não consigo gritar. A fuligem e fumaça queimam minha garganta. Uma ideia surge. Com o braço livre começo a puxar o pano que cobre o rosto do caçador a ponto de quase enforcá-lo. Cubro meu próprio nariz com ele, tampando um pouco da fumaça, o suficiente para tomar fôlego para impulsionar meu corpo e tirar aquele homem de cima de mim. O empurro com força o suficiente para mandá-lo cambaleante para frente, mas ele acaba perto de Eve que está sem visão e desorientada pela fumaça que respirou.  

-EVE, à sua direita! – consigo puxar o fôlego para gritar. Apenas a vejo golpear às cegas e acertar o estômago do homem com a faca. Ele cai de quatro, se agarrando ao braço dela e a levando para o chão. Mesmo sangrando muito ele encontra força para fechar as mãos ao redor do pescoço dela. 

-Eu posso morrer, mas cairei sendo quem matou a Vadia de Roma.  

Eu voo. Tudo é um borrão. A última coisa que vejo é minha lâmina de obsidiana rasgando a garganta dele. 

-Mostre respeito, seu bastardo – eu sibilo jogando o corpo sem vida dele para o lado. 

 O corpo de Eve está caído inerte. 

 Gabrielle iria me matar, mas na realidade eu já morri por dentro. 

 

 

Entardecer do dia 12. 

Faço um esforço mental descomunal para não ceder à exaustão. A cada respiração, ouço um chiado agudo saindo de mim e meu coração bate como um tambor de guerra. Tento lutar contra a confusão mental e me concentrar na minha tarefa.  

Em meus braços, carrego Eve, desacordada. Sua pulsação é extremamente fraca, então sei que cada segundo é precioso para chegar ao acampamento amazona. Minhas pernas parecem querer ceder a cada minuto, mas eu continuo os passos cambaleante pela relva da campina. 

No passado, tudo que eu queria era ver aquela que eu considerava minha inimiga morta. Agora, a ideia de perdê-la parecia arrancar um pedaço de mim. 

Minha visão vacila, se borrando e querendo escurecer. Tento fazer um esforço maior para me manter acordada, me concentrando nos altos estalos de árvores engolfadas pelas chamas que deixei para trás. De repente visualizo um fio de esperança no horizonte meus ouvidos captam o som de um trotear furioso. 

Emergindo à frente está um pelotão amazona liderado por Gabrielle. Elas cavalgam furiosamente e minha direção. Quando se aproximam o suficiente, meus joelhos cedem e eu me ajoelho na relva ainda segurando Eve em meus braços. Gabrielle desmonta, com aflição no seu olhar e corre até mim. 

-Me perdoe – digo baixo antes que ela diga qualquer palavra – Me perdoe, minha rainha. 

Não consigo conter as lágrimas. Meu choro é desesperado enquanto abraço o corpo inerte de Eve. Gabrielle rapidamente coloca os dedos no pescoço dela tentando sentir a pulsação e solta o ar com um pouco de alívio quando capta um pulsar fraco, mas ainda perceptível. Ela fecha os olhos com uma expressão de conflito interno por alguns minutos. Quando os abre, vira-se para mim com uma profunda seriedade. 

-Não temos tempo a perder. Varia, você consegue montar? – Balanço a cabeça acenando que sim.  – Você e Rani levam Eve de volta ao acampamento. Eris e eu nos dividiremos cada uma com um pelotão ao redor da área da floresta para encontrar os criminosos. 

-Como você sabia? – eu sussurro fraca. 

-Eu sei de tudo que acontece no território amazona, Varia. É meu papel enquanto rainha. 

Gabrielle ajoelhou-se perto de mim e tomou a mão de Eve entre as suas. 

-Fique bem, minha filha. – disse beijando a mão de Eve e em seguida se retirando para montar e sair em galope com as demais Amazonas. 

Rani me ajuda a colocar Eve em cima de um cavalo no qual ela mesma monta e seguimos para o acampamento amazona. 

 

Amanhecer do dia 13. 

Acordo em sobressalto e instintivamente puxo o fôlego. Minha garganta arde como se o ar lhe agulhasse. Tusso um pouco antes de conseguir me recompor e percebo que em algum momento do trajeto até o acampamento, devo ter perdido a consciência. Olho ao redor e percebo que estou na enfermaria amazona, o mesmo lugar que eu havia estado há mais de um mês antes. 

Olho ao redor e Eve não está ali. Sinto meu interior se retorcer, temendo o pior. Escuto uma algazarra vindo de fora e com dificuldade me levanto para olhar. Várias amazonas feridas estão sendo conduzidas até a enfermaria onde estou. Vejo Eris na parte central do acampamento, supervisionando uma pira funerária que está sendo construída. Meu coração para por um momento e percebo que Gabrielle não está ali.  

-Eris!!! – tento gritar, mas minha voz sai como um chiado fraco. Ela olha para mim com um semblante triste e acena com a cabeça indicando a cabana da rainha. Me dirijo cambaleante, com desespero crescente e adentro o recinto. 

A primeira visão que tenho é de Gabrielle, de costas para mim, sentada ao lado de um catre improvisado. Chego mais perto com dificuldade para conseguir visualizar. Eve está ali, inconsciente. Caio de joelhos no lugar onde estou sem conter um choro desesperado, de dor, de alívio, de muitas emoções que sinto agora. Uma de minhas irmãs amazonas estava morta, eu não sabia quem era, e isso deveria me enlutar, mas seria um pecado tão grande eu ser tomada de um alívio tão arrebatador por aquela pira não ser para Eve ou para Gabrielle? 

Gabrielle olha para trás e me enxerga ali, completamente desfeita numa mistura de sangue, fuligem e lágrimas. Ela caminha até mim, me ajuda a levantar e me abraça. Eu não esperava isso. 

-Obrigada – ela sussurra. 

Eu choro em seu ombro por alguns minutos até que meu corpo consiga parar de soluçar. 

-Minha rainha…. – Falo fracamente. 

-Varia, descanse. Vamos conversar quando todas estiverem recuperadas. 

-Eve…ela… 

-Ela ficará bem. Estamos cuidando disso. 

——– 

Dormi por dois dias seguidos, meu corpo cedeu ao cansaço e aos ferimentos me enviando para um sono profundo. Acordei apenas duas vezes para me alimentar e para tomar a medicação que a curandeira me forneceu. 

Tive sonhos estranhos, misturando as figuras de Marga e de Xena, tentando me dizer palavras que eu não entendia, mas pareciam tranquilas, com o semblante leve. 

Me levanto me sentindo um pouco melhor. Minha garganta ainda arranha, mas minha respiração está menos pesada. Saio da enfermaria e observo o movimento lá fora. Tudo parece ter voltado à normalidade. As amazonas mais novas fofocam a respeito da batalha entre a tribo e os caçadores, sobre como aniquilaram com sucesso o grupo e como uma de nossas irmãs, Anira, havia caído honrosamente em batalha para salvar nossa Rainha de uma lança. Contavam sobre como Gabrielle entrou na luta, com uma fúria implacável e como as liderou para vitória. 

Meus olhos procuram a cabana real, para onde me dirijo na esperança de encontrar Gabrielle e Eve, mas quando a adentro, apenas a rainha se encontra lá. 

-Rainha Gabrielle… 

Ela ergue os olhos do pergaminho que estudava em sua mesa e me dirige o olhar. 

-Fico feliz em te ver melhor, Varia. 

Seu semblante é leve. Não parece a Gabrielle amarga e enlutada de algumas luas atrás. Desvio o olhar e olho para o chão, um pouco envergonhada. 

-Mas eu falhei em cumprir minha pena. 

-Eu sei. E falhou em passar pelos seus dias de exílio por conta própria também. 

Eu pisco algumas vezes, percebendo que tais palavras significam que ela sabia onde Eve esteve. 

-Imploro seu perdão. Por favor, não culpe Eve por nada. 

-Veja, eu te disse que saberia se você trapaceasse. Eu sei TUDO que acontece no território amazona, quando estou governando-o. – a voz dela era baixa e mortalmente séria. 

-Eu sei que nada que eu diga vai me dar credibilidade… Meus erros passados testemunham contra mim, mas… 

-Varia, você tem razão. Eu não poderia acreditar nas suas palavras novamente. Não sem que elas fossem provadas pelas suas ações. 

-No entanto falhei também com elas.  – suspiro triste e envergonhada. 

-Você falhou em cumprir a pena. Mas não falhou no propósito que eu tinha para você. 

-Não entendo. – digo confusa. Vejo que Gabrielle está com o olhar perdido enquanto fala, olhando para algum ponto atrás de mim, medindo suas palavras. 

-Quando Xena e eu te conhecemos, você era uma amazona forte, impetuosa, cheia de orgulho e com o ego do tamanho do Olimpo.  Marga tinha muita fé em você, e eu consigo ver o motivo. Mas você recebeu a missão de ser uma líder antes do tempo. Sua maturidade, obstinação e obsessão por vingança te cegaram a tal ponto que seu foco não era mais a nação amazona. Sua obsessão é se vingar de Eve, desde que a encontrou. 

-Eu não quero mais isso. 

-Eu sei. Mas ninguém conseguiria fazer você desistir disso senão você mesma.  – Gabrielle sorriu. – Para isso a Varia orgulhosa precisou dar lugar a uma Varia que precisou aceitar ser ajudada por quem menos queria. 

-Como você sabia? 

-Eu aparento ser apenas um pouco mais velha que você, mas na prática, eu nasci em outra época e aprendi muito com outras pessoas. 

-Então foi um plano desde o começo? – ela olha para o lado e ri um pouco do meu tom de voz que saiu u m pouco ultrajado. 

-Eve está se encontrando em sua missão como pacifista. Existe muito a se ajustar no modo como ela age ainda, e isso virá com o tempo. Eu já estive nesse caminho. Mas eu sabia que ela jamais me deixaria te colocar em risco de morte, sozinha, numa floresta sem proteção alguma, principalmente se ela indiretamente fosse a razão disso. Condenar uma pessoa inocente a morte não está nos princípios dela. Digamos que eu tive que trabalhar em uma expressão muito crédula quando ela me disse que partiria em uma missão para cuidar de alguns enfermos em Termópolis. 

Eu soltei um sorriso leve. Havia alguma graça em tudo isso. 

-Então sua tática foi a de confinar nós duas no mesmo espaço até que passássemos a nos entender. Sem… armas, para evitar que eu fizesse alguma bobagem. 

-Acredito ter funcionado, não? Sei que foram dias difíceis. Sinto muito por isso, mas Xena me ensinou que os melhores remédios são amargos mesmo.  

-Como soube dos caçadores e do incêndio? Eve partiu para te avisar, mas não conseguiu chegar a tempo. 

Gabrielle olhou para o nada por alguns segundos e sorriu. 

-Intuição.  – respondeu, virando-se para mim novamente. – De todo modo, bem-vinda de volta à Nação Amazona. Agora acredito que você está pronta para ser a Varia que preciso que seja nesse lugar. 

-Eu não… 

-Shh. A gente fala sobre isso depois. Vá atrás da sua garota. Ela está meditando perto do córrego. 

Olho para Gabrielle incrédula, sinto meu rosto corar furiosamente e faço menção de dizer algo, mas Gabrielle apenas revira os olhos tediosamente como se tivesse afirmado algo terrivelmente óbvio e acena com a cabeça em direção à porta. 

-E me desculpe pela surra. Espero que não tenha perdido nenhum dente. 

Nota