Quarta Parte

-Anda Gabby é simples, só tem que mover os braços assim vê? – O branco corpo de José se deslizava ao largo da piscina fazendo exagerados movimentos como os braços.

-Não posso, me dá medo, não penso entrar aí. – Gabriela observava o jovem sentada na beira da piscina.

-Eu lhe ensino. Quer que eu vá lhe buscar? – Um sorriso travesso cruzou o rosto do rapaz.

-Não se atreva a se aproximar. – A loira o advertiu e se preparou para sair no instante que viu que José se aproximava.

-Anda Gabby, é super fácil, confie em mim. – José tentava persuadi-la.

-Todos somos bons em algo, e eu não sou em nadar, entende? Me dá pavor.

-Jamais pensei que diria isto, mas você é uma covarde, estou lhe oferecendo para lhe ensinar, e grátis, deveria aproveitar, eu lhe seguro forte e lhe prometo que não solto por nada nesse mundo.

-Eu vi pratos, copos e bandejas terminarem no chão depois de escorregar por esses fracos braços seu, não quero terminar como eles no fundo da piscina, assim não tente. – Gabriela cruzou os braços enquanto fazia círculos com um pé na água. José riu por fim e continuou nadando sozinho.

-Ai José que tonto você é, ninguém se atreveria a aprender a nadar se alguém como você lhe oferecesse ajuda, tem que fazer assim captas?

Gabriela ouviu a voz de Carla e no mesmo segundo começou a engolir água e se sentiu desesperada, tempos depois conseguiu emitir algum som que não parecia ser uma palavra, enquanto ouvia uma gargalhada de zombaria. O pânico começou a invadi-la, e rapidamente se encontrou rodeada por uns firmes braços, começou a respirar de novo normalmente, enquanto tentava enfocar seu olhar.

-José?

Ouviu a voz do rapaz chamando-a de longe, tentou ver a pessoa que a estava segurando e quando por fim conseguiu abrir os olhos se encontrou com um cabelo negro e úmido flutuando na água, o rosto estava confuso, e pouco a pouco foi se tornando nítido até que foi capaz de ver seus contornos bem definidos, e logo aí estavam esses olhos azuis, pareciam ainda mais azuis que antes com o olhar cravado nela. Conseguiu perceber a preocupação neles, e logo ouviu a voz da dona desse olhar.

-Você está bem? – Sua voz soava doce, grave, suave, era uma mistura de diferentes adjetivos. Gabriela quis sorrir, mas não conseguiu que se rosto obedecesse a esse mandato, tentou responder a pergunta, mas sua voz tampouco obedeceu, em vez disso começou a sentir uma sensação de proteção envolvida, e teve o desejo de que esse momento não terminasse nunca. – Você está bem? – Ouviu novamente e esta vez reuniu forças suficientes para responder.

-Sim, estou bem agora. – Xênia a tomou firmemente entre seus braços e a conduziu a beira da piscina, não soube como se encontrou fora da água. Logo uma desagradável voz chegou a seus ouvidos.

-Ui sinto muito, não sabia que Gabita não sabia nadar, de verdade que sinto muito.

Logo o doce olhar da que estava sendo objeto, mudou para uma fúria que conseguiu arrepiar os cabelos, temeu com toda sua alma, sentiu uma dor crescendo em seu interior ao ver-se alvo daqueles furiosos olhos, mas então se deu conta que não era ela quem estava provocando esse olhar. Sentiu como os braços que a estavam sustentando perdiam a firmeza, e em vez do calor destes sentiu o frio cimento fazer contato com sua pele.

-Você! Maldita. – Nesse segundo Xênia estava agarrando Carla fortemente enquanto esta fazia esforços em vão para se soltar.

-Aiii, help help. Xênia está me matando!

-Já estou farta. – Os olhos azuis estavam cravados nos castanhos de Carla.

-Xênia, deixe-a, estou bem, foi só um susto. – A morena ouviu a voz de Gabriela e logo depois de uns segundos soltou sua presa.

-Você está bem? – Uma voz vinha sabe se lá de onde, só se ouviu. – Eram os produtores que certamente já estavam prontos para fazerem sua aparição se as coisas começassem a se pôr pior.

-Sim, estamos todos bem. – Gabriela fez um sinal com a mão.

Carla estava sentada no chão esfregando os braços enquanto olhava Xênia com uma cara que em vez de dor parecia de fascinação. Xênia não tirava os olhos furiosos de cima dela. Apenas se distinguia a cor neles já que estavam convertidos praticamente em uma linha.

-Se algo assim voltar a se repetir, eu juro que lhe mato. – Ninguém pareceu duvidar da veracidade dessas palavras.

-Mate-me Xênia se quiser, estarei ansiosa lhe esperando no inferno.

-Maldita louca. – Xênia deu meia volta e se dirigiu a Gabriela que estava recuperada.

-Sério Xênia estou bem, foi só um susto.

A morena levantou a mão para tocar a bochecha de Gabriela, mas em vez disso, parou na metade do caminho e voltou até seu colo.

-Obrigada. Quantas vezes veio me resgatar? Três? Você é incrível. – A jovem de olhos verdes segurou a mão de Xênia e lhe dedicou um doce olhar.

-De nada. – Xênia soltou a mão da mão de Gabriela com um gesto de incomodidade no rosto.

-Ah sim, sinto muito, o contato físico não lhe agrada, esqueci.

-Não é isso, é que vou lhe dar espaço para que possa respirar.

-Estou bem, Xênia, apenas bebi um pouco de água.

José observava a cena, com o desejo de que tivesse sido ele quem tivesse tirado Gabriela da piscina.

-Como raios você chegou tão rápido, se nem se quer lhe vi aparecer Xênia, eu estava apenas a três metros.

-Eu sou rápida, suponho.

-Se não necessitam de mim eu vou embora daqui, que exagerados são. – Carla se afastou do lugar sem se quer se desculpar com Gabriela.

-Eu já não a agüento. – Os olhos de Xênia olharam com fúria a ruiva enquanto esta se dirigia ao interior da casa.

-Está meio louca, mas já sei que se lhe vier algo incomum e me tentar matar, você virá em meu socorro. – Um sorriso se formou não rosto de Gabriela, Xênia não pode censurar um também em seu próprio.

Você é incrível Xênia…

Gabriela ouviu estranhos sons e se aproximou de onde provinham estes sons. Abriu a porta de golpe e aí estava Isabel ajoelhada no chão com a cabeça metida no vaso sanitário.

-O que está fazendo? – A jovem se assustou ao sentir a pressão no braço.

-Nnnada, eu… É que me sentia mal, alguma coisa me fez mal ao estômago, esqueci de trancar a porta.- Isabel a olhava assustada.

-Estava provocando vômitos? Você tinha os dedos na garganta Isabel. Meu deus, desde quando está fazendo isso? – Gabriela a olhava com uma expressão de preocupação imensa no rosto.

-Não estava provocando nada. – Isabel tentava sorrir. –Já lhe disse, comi algo que me fez mal, isso é tudo. – A jovem tentou sair do banheiro.

-Isso não está certo Isabel e você sabe disso, venha aqui, vamos conversar sobre isto. –Gabriela pegou seu braço e tentou levá-la até a sala.

-Solte-me, eu não tenho nada que conversar com você. Será que você nunca vomitou na vida quando algo lhe fez mal?

-Sim, por isso sei que não estava devolvendo a comida naturalmente, por favor, Isabel, confia em mim.

-Pára, não é o que você está pensando. – Isabel tentava de todas as formas escapar.

-Pára você, olhe-me. – Gabriela levantou o rosto da jovem, o qual estava pálido e com olheiras.

-Por favor, Gabby não diga nada a ninguém, eu lhe suplico, é a primeira vez que faço isso. – Os olhos exagerados da jovem a olharam com horror.

-Sei que não é a primeira vez, venha comigo até meu quarto e conversaremos.

-Todos estão nos vendo, por favor, não me pergunte nada, não é o que você está pensando.

-Então o que é? – Gabriela estava tentando manter a calma e falar com a jovem.

-É só que comi demais hoje e…

-E se sentiu culpada e o devolveu para não engordar, não é?

-Não! Não é isso, não é porque não queria engordar, engordar não é o problema, é que não é correto comer muito. A comida é só para sobreviver não para comer em excesso.

-Quê? Do que está falando Isabel, explique-me porque eu não entendi.

-Isso, a gula é um pecado capital, você sabia? Eu estou cometendo isso aqui, sobretudo hoje, tinha que remedia-lo de alguma forma, só foi hoje eu juro, não fazia isto há cinco meses, lhe juro por Deus, e sabe que não juraria em vão. – Isabel falava em um sussurro.

-Está me dizendo que provocou o vômito porque comeu mais da conta e isso é pecado? – Gabriela tomava a cabeça sem dar crédito às palavras que ouvia.

-Em resumo é isso.

-Deus meu esse seu fanatismo há está levando muito longe. Isto tem que acabar. Sei que no fundo seu coração sabe que não está bem, que não é essa a verdade, vi o brilho em seus olhos quando falamos de diferentes assuntos que são tabus para você. – Gabriela tomava uma mão da jovem que começava a soluçar amargamente.

-Foi assim que me criaram.

-Liberte-se, por favor, faça algo antes que destrua sua vida, você é uma jovem linda, e sei que é inteligente, busque a verdade dentro do seu coração não em livros nem em lugares, busque aqui.- Gabriela indicava com um dedo no peito.

-Não diga a ninguém, por favor.

-Não vou dizer, mas se eu voltar a lhe surpreender fazendo isso novamente eu juro que eu mesmo lhe tiro daqui, ouviu? Além disso, isto sairá em todo o Chile, e você sabe. Sei que não vai mudar a sua mente de um dia para o outro, e não é minha intenção pregar nada, só que tome consciência da estupidez que você acaba de fazer.

-Promete que não dirá nada a ninguém.

-Eu prometo, e vou estar lhe vigiando.

Meu Deus, esta gente gravando tudo e não são capazes de tirar essa menina daqui, isto é imoral.

-Olhem nos deixaram alguns filmes aqui. O que acha se assistirmos agora mesmo? – José fechou a porta e mostrou vários dvds.

-Quais? – Andrés perguntou da mesa onde estavam todos reunidos comendo.

-O senhor dos anéis…

-Já vi. Será que não tem algo mais recente? – O jovem levou a colher de arroz a boca.

-Eu gosto dos filmes românticos, desde jovem. – Gabriela limpou os lábios com o guardanapo e se levantou da mesa.

-Olha você tem sorte Gabby. – José mostrou o dvd de “Um Anjo Apaixonado” e “A Lagoa Azul”.

-Eu gosto muito! Vamos lê-los, por favor.- Gabriela dizia emocionada.

-Só trouxeram relíquias? Que filmes mais maçantes.

– “A Lagoa Azul” é um clássico, e é lindo. Como pode dizer que é maçante? E “Um Anjo Apaixonado”, por favor, é um dos meus favoritos, não sejam blasfemos. – Gabriela se arrepiou de ter dito a última palavra ao sentir o olhar de Isabel sobre ela.

-Eu prefiro ir dar um mergulho na piscina, e você bebê?

-Eu também, não vou ficar vendo essas porcarias com esta gentinha. – Andrés e Carla saíram ao jardim.

-Mas que dor me dá eles nos deixarem. – Xênia estava terminando seu prato.

-E vocês, que me dizem?

-Eu prefiro ir dormir, estou um pouco cansada. – Isabel se levantou da mesa e fez um gesto a todos, e foi para seu quarto.

Gabriela estava terrivelmente preocupada com ela, havia estado vigiando-a, mas não havia nada que pudesse fazer por ela, confiava que em alguma hora seus pais a viessem pela televisão e viesse eles mesmos buscá-la.

-Se vão ver esses de amor, eu passo, outro dia vejo o do “Senhor dos Anéis” – Sebastián lhes deu boa noite e foi atrás de Isabel.

-Eu fico. Eu também gosto dos romances como você Gabby.- José olhava a loira com um grande sorriso no rosto.

-E você o que diz Xênia? Nos acompanha? – Xênia viu os olhinhos entusiasmados de Gabriela e foi incapaz de lhe dizer não, e mesmo que a jovem não lhe tivesse pedido ela ficaria com ela de todo modo, ainda que detestasse filmes românticos.

-Ok.

-Ui com esse entusiasmo. Minha mãe!

-Os filmes românticos não são os meus prediletos. Eu gosto de terror.

-Olha Xênia você tem sorte, também há um de terror aqui. – José mostrou o dvd de “Pesadelo na Rua M”.

-Não esse tipo de terror, o terror psicológico é o que eu gosto, embora esse não esteja tão mal, eu gosto de Freddy. – Gabriela e José se olharam incrédulos.

-Quê? – Xênia encolheu os ombros. – Não neguem que o tipo é divertido.

-Xênia, o tipo mata adolescentes sem piedade. Como poderia ser divertido?

-Pois é. E nós vamos ficar toda a noite discutindo se Freddy é ou não divertido? Eu escolho esse do anjo.

-Ah sim, agora mesmo, espera um pouquinho, vou e volto. – Gabriela saiu correndo e quase escorrega ao entrar na cozinha. Em alguns minutos saiu carregada de bebidas, e sanduíches.

-Acabamos de comer. – Xênia a olhou levantando uma sombracelha enquanto a jovem lhe entregava uma coca cola e um sanduíche de queijo e presunto.

-Não pode ver filmes sem comer algo, toma pelo menos pegue e depois simplesmente o deixe, não vai me deixar com as mãos esticadas, mal-educada.

-Eu não pedi nada. – Xênia encolheu os ombros. – Além disso, estou bem só como o meu cigarro, muito obrigada.

-Mal-agradecida. – Gabriela lhe fez uma expressão de despeito e entregou as coisas a José.

-Claro, se ela não quer o resto é meu, não?

-Sabem, não vou dar nada a ninguém e vou comer tudo sozinha. – Gabriela se deixou cair no sofá entre Xênia e José com toda a comida no colo. – Vamos José coloque o filme.

-Sim, como quiser minha rainha. – José colocou o dvd dentro do reprodutor e deu o play.

-Xênia! Xênia! Acorda, vem a melhor parte quando ele volta a ser humano. – Xênia ouviu a emocionada voz de Gabriela, mas o peso de suas pálpebras eram maiores, recordava ter visto Meg Ryan lamentando-se por alguém que havia morrido na sala de cirurgia e dali tudo apagou.- Não posse acreditar que você dormiu Xênia.

-M? – A morena começou a abrir os olhos pouco a pouco, e um aroma invadiu seu olfato.

Logo se deu conta que estava apoiando a cabeça no ombro de Gabriela, se assustou, mas a loira estava tão concentrada no que estava passando na tela, que Xênia ficou mais um instante nessa posição, observando o rosto de Gabriela a essa distância. Estava linda com a luz do televisor iluminando sua pele branca, seus olhos fixos a frente, não piscava, e suas mãos estavam no ar em suspense.

Que linda Gabby, você é tão linda, por acaso tem idéia do que está me provocando?

Era a primeira vez que Xênia conseguia tão proximidade física com Gabriela, e se sentia muito bem para romper o contato, não ainda.

Que cheiro gostoso, que perfume usará? De repente recordou das câmeras. Ai merda estão me enfocando e eu a olhando com essa cara de estúpida. Fechou os olhos rapidamente e voltou a ouvir a voz de Gabriela.

-Vamos, Xênia, por favor, olha, já chegou na casa da jovem, vão se ver pela primeira vez agora que ele é humano.

Sentiu a mão de Gabriela tocando seu rosto, e um tremor percorreu todo seu corpo. Abriu lentamente os olhos novamente e aí estavam esses olhos verdes, apenas via sua cor devido à escuridão da sala, mas de toda maneira sentia o olhar cravado nos seus próprios. Sentiu uma eletricidade percorrer seu corpo, por um segundo pensou que ainda estava dormindo e que se encontrava sonhando, mas então ela falou novamente e soube que não estava em um sonho, mas em sonho real.

-Está acordada? – Sua voz soou suave, mais suave que nunca.

-Não entendo. – A voz de José arruinou o momento, Gabriela afastou rapidamente o olhar e o dirigiu novamente à frente. – Como é que esse homem se lança dessa altura e fica vivo?

-José, não era um homem, era um anjo, e se lançou porque era a única forma de se converter em humano. Você estava dormindo como Xênia?

-Ah sim, sim, acho que estive dormindo um momento. – Se as luzes estivessem acessas o rubor de José teria sido evidente.

Xênia se endireitou e voltou sua atenção para a tela, imediatamente sentiu frio por não sentir o cálido corpo de Gabriela junto ao seu.

-Me matam os amores difíceis. – Gabriela disse suspirando enquanto seguia pendente o filme.

Eu poderia oferece-lhe um desses se você quisesse Gabby…Eu disse isso?

-A verdade é que eu não vejo graça deixar toda sua vida por uma pessoa.

-Xênia não seja insensível. Por acaso não sonha com um amor assim? Alguém que dê tudo por você, até sua vida. Além disso, Nicholas Cage é tão lindo…

-Lindo? – A morena a olhou levantando uma sombracelha. – Em que planeta? O tipo é um excelente ator, mas daí a ser lindo, é outra história diferente. Ah e não, não quero que ninguém ande dando sua vida por mim. Não quero dever tanto a alguém.

-Insensível.

-Romanticoma. Hey! Não me empurre, e não me mostra a língua tampouco. – Xênia levantou a sombracelha ameaçadoramente.

-Então aceite que o amor é a coisa mais linda da vida, é difícil de encontrar, mas vale a pena esperar. – Gabriela agitava um dedo próximo do rosto da morena.

-Está bem, eu aceito, é lindo, só que não é para todos.

-Como que não é para todos?

-Você mesma disse há alguns dias que talvez sua alma gêmea não estivesse encarnada nesta vida, talvez a minha também não esteja.

-Ah! Ou seja, aceita, só que tem medo de falar, mas que sim, poderia apaixonar-se se a encontrar.

-Sabem, meninas? Eu também estou aqui se vocês não notaram, mas como ninguém me dá bola, vou dormir será melhor. – José saiu da sala fastidiado.

-Oops havia me esquecido de José. – Ambas começaram a rir.

-Suponho que isso seja uma piada depois de tudo. – Xênia encolheu os ombros.

-Então? Gostaria de encontrar alguém que lhe amasse assim? – A voz de Gabriela se suavizou ao fazer a pergunta, e dirigiu seu olhar a morena.

-Sim, gostaria. – Xênia dirigiu seu olhar a sua mão na qual segurava um cigarro.

Sabe Xênia se você fosse homem talvez me apaixonasse por você, e ainda lhe tiraria esse maldito hábito de fumar de qualquer forma. Gabriela se assustou com seu próprio pensamento. E isso de onde saiu?

-Que foi? De repente você ficou calada. – Xênia levantou uma sombracelha inquisitivamente.

-Não é nada, estou um pouco cansada somente.

-Lhe cansou a conversa de almas gêmeas?

-Que nada. Sabe Xênia? Quero que você deixe de fumar.

-Sim e eu quero ter um milhão de dólares, e isso tampouco vai acontecer.

-Poderia acontecer se você se propusesse, é coisa de mentalizar-se e tudo se pode conseguir, sabia?

-Bruxaria?

-Outra que me chama de bruxa. – Gabriela olhou a morena com fastidio. – Disse mentalizar-se, fazer realidade algo com a mente, é coisa de desejar algo com toda sua alma, imaginar que se faz realidade e consegue, eu não faço bruxarias.

-A fé move montanhas diz você?

-Algo assim…

-Não sei…

-Os pensamentos têm conseqüências, se imagina uma situação essa imagem em sua cabeça terá uma conseqüência.

-Sim, terá a conseqüência de se tornar uma sonhadora patética que vive nas nuvens e não consegue nada real na vida.

-Por que tem que ser sempre assim?

-Porque é assim que sou.

-Lhe odeio.

-Não, não me odeia.

-E como pode estar tão segura?

-Porque estou imaginando que você me ama, e de acordo com seu código isso quer dizer que já deveria estar sentindo isso por mim. – Xênia dirigiu seus olhos azuis a loira, esta lhe devolveu o olhar. Não disseram nada.

Que me ama? Disse que me ama? Estou corando? Era brincadeira Gabby, entenda?

-Bem, acho que já é hora de dormir, você vem? – Gabriela seguiu Xênia em silêncio.

-Xênia?

-Sim?

-Diga-me o que você faz.

-Até amanhã Gabby. – A morena se dirigiu a seu quarto o qual estava compartilhando com Isabel, e abriu a porta.

-Até amanhã. – Gabriela se dirigiu a seu quarto com um ar de decepção em seu rosto, antes de se perder dentro dele ouviu a voz da morena.

-Tatuo – E Xênia se perdeu detrás da porta.

Tatuo? Como que tatuo? Verdade? Mas se não tem nenhuma tatuagem. Ainda que talvez possa ter alguma escondida por aí. Um pequeno sorriso cruzou o rosto da loira. Hum tatuadora, que interessante, isto é um avanço… Na realidade imaginou que a amo? Chega Gabby! Foi uma brincadeira…

-É verdade então?

-O quê? – Xênia estava secando o negro cabelo.

-Você é tatuadora? Como é que não vi nenhuma tatuagem então?

-Acaso é regra que todos que tatuam tenham o corpo cheio de tatuagens? Não pensei que as regras e estereótipos fossem para você. – Os olhos azuis se pousaram fugazmente na loira.

-Tem razão, não são, mas pensei na possibilidade de que tivesse alguma escondida por aí, talvez? – Um sorriso travesso cruzou o rosto da loira de olhos verdes enquanto aproximava as mãos do corpo de Xênia perigosamente.

-Hey! Tira a mão daí. – Xênia colocou um palmo de distância de suas mãos.

Se me tocar não respondo por mim.

-Então?

-Não gosto de tatuagens, não tenho nenhuma. – Xênia disse finalmente.

-Quê? Disse que tatua e não gosta de tatuagens?

-Isso parece que foi eu quem disse.

-Isso é bastante diferente me deixe dizer.

-Olha você é tarotista e não anda fazendo conjuro nem coisas diferentes. – Xênia fez uma divertida expressão.

-Sou tarotista não bruxa, e tem razão quanto aos estereótipos, geralmente às pessoas tendem a pensar que em meu quarto tenho altares e que vivo todo o dia queimando incenso, quando na verdade estes me dão alergia. No entanto gosto muito do que faço, as pessoas terminam me vendo como uma amiga, colocam toda sua confiança em mim, é uma grande responsabilidade, não é que acho que isso seja tudo, mas consigo me conectar com as pessoas e elas se abrirem comigo é algo que sempre gostei.

-Você é assim, e acredito que você seja incapaz de fazer algo que não ame fazer, me engano?

-Sabe Xênia você me tomou duas semanas para finalmente me dizer o que faz, isso me fazia sentir mal, mas agora me diz que sou incapaz de me dedicar a algo na vida que não goste, e isso é certo. Sinto que valeu a pena o tempo, porque de toda maneira sinto que me conhece em certa medida.

-Mais do que você pensa. – Xênia terminou de secar o cabelo, o sacudiu para trás e o aroma que se desprendeu chegou até Gabriela.

-Que cheiro bom. Posso? – A jovem loira se aproximou da morena e inspirou o aroma de seu negro cabelo.

-O seu cheira também muito gostoso. – Xênia viu Gabriela corar levemente.

-Essa é a sua cor natural, verdade? É assim negro? Bem suponho, porque logo depois de quatorze dias creio que se notaria alguma raiz ou pelo menos haveria visto você tingi-lo.

-Sim, é minha cor natural, a herdei de meu pai. – Xênia se arrepiou em seguida ao ter dito essa última palavra.

-E seus olhos? – Gabriela os olhou com detenção.

-De minha mãe. – Xênia evitava o olhar de Gabriela.

-É aqui onde não devo seguir perguntando, verdade?

-Sim, aqui. – Finalmente a morena alçou a vista.

-Existe a possibilidade que me fale da sua família algum dia?

-Tudo é possível, eu mesma lhe disse a noite.

-Sim, é certo até a possibilidade de que deixe de fumar? Você tentaria?

-Me dê uma boa razão para tentar.

-Não serve que eu lhe peça? Ou seja, não que só quero que faça por mim, mas é por você mesma, só que gostaria de lhe ajudar. – Gabriela estava desenhando imagens com o contorno de seus dedos, sobre a cama.

-Sim, serve.

Se me pede com essa ilusão na sua carinha…

-De verdade? Quantos cigarros fuma por dia?

-Uns trinta, não sei, às vezes mais, às vezes menos. –Xênia se sentiu repentinamente envergonhada, mas seu rosto se manteve inexpressivo.

-Ok, nos ficaremos seis semanas aqui. – Gabriela começou a fazer contas. – se você for diminuindo um cigarro por dia, poderá deixá-lo por completo.

-É fácil dizer, mas não fazer.

-Eu posso lhe ajudar, posso fazer coisinhas para você comer, assim compensa uma coisa com a outra. – Gabriela esfregou as mãos com entusiasmo.

-Sim, e assim terminarei engordando, uma coisa por outra. – Xênia sorriu ao ver os gesto da loira.

-Bem, então cada vez que levar um cigarro na boca eu lhe dou uma palmada nas mãos, embora pensando bem, talvez isso lhe enfureça e termine me golpeando, tem que me dizer Xênia como é que tem tanta força?

-Na realidade não tenho tanta força, é algo mental, se sente força então golpeará forte, você que sabe dessas coisas de mente, deveria saber. Nunca me sinto fraca diante de nenhum oponente tenha o tamanho que tenha, é assim simples.

-Ah já vi, mas é fácil para você dizer, tendo a estatura que tem, eu ao contrário baixinha como sou, me vejo fraca ao lado de qualquer pessoa, é mais complicado.

-Se você quiser posso lhe ensinar alguns movimentos de defesa pessoal, para que possa se defender, algo básico. Você gostaria?

-Sim! – Gabriela disse com entusiasmo.

-Está bem não é para tanto, só sei uns poucos. – Xênia sorria ao ver as reações de Gabriela tão freqüentes.

-E quem lhe ensinou?

-Sou autodidata.

-Devo crer, que as tatuagens, também aprendeu por si mesma?

-Não, a técnica me ensinou um amigo. Eu o ensinei a desenhar desenhos mais solicitados, e em troca ele me ensinou como tatuar. Depois de um tempo ele foi para o estrangeiro e me deixou seu local de trabalho. É para sua casa onde penso ir quando for embora para o Canadá, pensamos em trabalhar juntos por lá. –Xênia se sentiu estranha ao recordar de seus planos, faz dias que não pensava nisso.

-Ah. – Gabriela sentiu uma pequena dor crescendo em seu coração. –Então o que realmente gosta é de desenhar?

-Na realidade não encontrei algo que ame de verdade, assim como você.

Isso soou perigoso…

-Logo encontrará.

-E você? Como é que aos seus dezenove anos sabe estas coisas de tarot e tudo isso?

-Vem de família. Bem exceto minha mãe. Ela não gosta dessas coisas, e tampouco queria que eu me relacionasse com esses temas, mas não houve jeito, sempre gostei e minha tia me ensinou desde pequena, agora trabalho com ela em uma loja esotérica que ela tem, eu quero ter a minha, talvez algum dia.

-Sempre é melhor trabalhar independente.

-Bem então nisso ficamos? Não mude de assunto, você diminui o consumo de cigarros, era um a menos todo o dia, eu lhe ajudo como puder, se quiser lhe meto um pedaço de pão na boca, ou lhe mordo a mão quando você for acender um cigarro, ou lhe agarro e lhe dou um beijo, assim o impacto lhe tirará à vontade de fumar.

Xênia teve um acesso de tosse ao ouvir essa última fórmula anticigarros.

-Você está bem, Xênia? – Gabriela dava palmadinhas em suas costas olhando-a com preocupação.

-Sim, estou bem.

Essa última fórmula eu gostei, me pergunto se seria capaz de utilizá-la em caso de emergência. Um pequeno sorriso cruzou o rosto de Xênia.

-Gabby darling, ainda está aborrecida pelo empurrão que lhe dei no outro dia? – A voz da ruiva soava mais uma provocação do que a um sinal de paz.

-Sabe, Carla? Tenho esperança que as pessoas não estejam tão podres para querer fazer mal a alguém deliberadamente, assim não tenho porque estar aborrecida com você, como você disse, “não sabia”. – Gabriela tinha um olhar fixo na pequena bolinha branca.

-Que empurrãozinho? – Perguntou Isabel sem levantar o olhar de sua oponente.

-Ai, queridinha, será que você nunca sabe nada? Não me diga, sei, estava ocupada memorizando o apocalipse, verdade? – A ruiva observava a partida seguindo o movimento da bola com os olhos. Isabel a olhou com fastidio e seu tiro foi parar no meio da piscina.

-Olha Carla em vez de estar olhando isso vem e me faz companhia. – Andrés estava bebendo uma cerveja jogado na grama com um braço atrás da cabeça.

-Em um segundo darling, isto está interessante, viu como se marcam os músculos do estômago desta menina? Olha essa bundinha durinha e paradinha. – Gabriela estava se sentindo incômoda ao ser alvo do olhar de Carla.

-Perdão? – Isabel olhou a ruiva com cara de pergunta.

-Dedique-se as suas coisas religiosas, eu estou ocupada em outra coisa, captas? A menos que queira que eu me divirta com você. – Carla se aproximou lentamente da jovem magra e percorreu seu corpo dos pés a cabeça com seus olhos castanhos. –Embora duvide muito encontrar algo de interessante em sua pessoa, sem ofender.

-Não muito obrigada.

-Ai, me esqueci o quanto você é dissimulada, e que lhe incomoda uma mulher fazer elogios à outra mulher. É pecado para você? Isso é porque não provou um bom…

-Carla deixe-a, ela não está fazendo nada. – Gabriela disse aborrecida.

-Ui, mas a defende em tudo. Tenha cuidado Gabita, Xênia pode ficar enciumada se a ver defendendo-a assim. – Carla a olhava provocativamente.

-Que quer dizer com isso?

-Ai não se faça de inocente menina, pode enganar o resto com essa carinha de menina boa que tem, mas a não mim.

-Olha Carla, lhe disse para vir, estou ficando aborrecido.

-Cale-se! Vai a merda, você e sua raça me aborrecem, estou farta, captas? – A ruiva começou a gritar enfurecida para o jovem.

-Cadela louca. – Andrés encolheu os ombros e tomou um gole de sua cerveja.

-Assim que…- Fez uma pausa e se concentrou nas jovens com um sorrisinho no rosto. – Onde eu estava? Ah sim, olhando a partida deste par de dissimuladas.

-Carla por que saco não se perde um pouco por ai?

-Sabe loirinha, me perderia…- Baixou o olhar pelo corpo de Gabriela. – Mas entre suas pernas. – Carla observava a reação de Gabriela com um sorriso no rosto.- Claro, se você fosse meu tipo.

-Acaba de dizer o que acho que disse? – As cores subiram ao seu rosto.

-Acho que vou para meu quarto, outro dia seguimos brincando Gabby. – Isabel saiu o mais rápido que pôde daquele lugar.

-Ui que delicada, em vez de ir rezar vinte ave marias, aproveita o tempo pegando o imbecil de seu namorado, que lhe faz bastante falta, frígida. – A ruiva ria zombando ao ver a reação de Isabel.

-Sabe Carla, uma coisa é ser dissimulada e outra diferente é não agüentar que uma fulana venha insultar ou dizer o que quer simplesmente porque quer amolar a outra. Tenha um pouco de respeito. – Gabriela a olhava severamente.

-Aposto que essas coisinhas não reclama a sua adorada Xênia, verdade?

-Que quer dizer com isso? Xênia não anda por ai irritando as pessoas.

-Não falo das pessoas, falo de você, de você e dela.

-Será que a única coisa que sabe fazer é irritar os outros Carla? – Xênia apareceu no jardim.

-Sim, se pode dizer que sim.- Disse a ruiva logo ao pensar na resposta observando descaradamente o corpo de Xênia. – Como lhe disse minha queridíssima Xênia, desfruto incomodar as pessoas, se vêem tão cômicas quando se enrubescem, isso me excita. – Demorou na última palavra enquanto dedicava um luxurioso olhar a jovem alta.

-Pobre de você, deve ser triste ter como única razão na vida: fazer maldades às pessoas. Você é patética Carla.

-Para você ver que não é tanto, não tanto como você que sua razão de vida seja uma “pessoazinha”. Pelo menos eu consigo a reação que quero, mas você darling? – Apontou com o dedo para Xênia – Está conseguindo algo? – O sorriso no rosto de Carla se ampliou até sobressair à crueldade. – Veja? Há várias maneiras de ser patética. – A ruiva piscou um olho para Xênia e foi deitar-se ao lado de Andrés.

Xênia sentiu o olhar de Gabriela em seu rosto. Conseguiu permanecer impassível, embora por dentro ardia de vontade de agarrar Carla pelo pescoço e calar sua maldita boca.

-E o computador? – Gabriela começou a buscar ao redor sem resultados.

-Más noticias Gabby, alguém veio esta manhã e o levou, creio que eles não têm muito interesse que saibamos o que acontecesse lá fora com o programa. – Sebastián estava sentado ao redor da mesa junto com José.

-Quê? E agora como vou chatear com meus amigos? – Gabriela dizia amargamente. – Primeiro nos bloqueiam quase todos os canais de tv, as emissoras do rádio e agora a Internet…

-O tempo que gastava em chatear com seus amigos pode ocupar falando comigo. – José dizia com ilusão.

-Obrigada meu amigo, é que estou tão acostumada a falar com meus amigos virtuais, que sinto falta em não poder. Você já chateou alguma vez? É genial. – Gabriela explicava ao jovem sorridentemente.

-Sim, mas nunca me chamou tanta atenção, quando começava a falar com alguém aos cinco minutos ela se despedia e ia embora, e às vezes nem se quer se despedia, sempre acontecia o mesmo. – José movia a cabeça em negação.

-Bem, e alguém sabe como está o programa? Como está o rating? – Gabriela estava servindo um copo de coca cola.

-Na verdade o pouco que eu entendi quando minha família fala comigo, vai muito bem, já estão no episódio n° 04, mas não sei mais nada e se começamos a falar sobre isso a comunicação é interrompida, lhe proíbem que digam qualquer coisa sobre isso. – Sebastián encolheu os ombros.

-Olha irmão, que tal se jogarmos uma partida de mortal kombat? – José esfregava as mãos com entusiasmo.

-Ok, mas antes quero dar uma palavrinha com Gabby. – Sebastián lhe perguntou com o olhar se ela teria um tempo.

-Vou ficar com ciúmes. – José levou a mão ao coração fingindo dor. – Gabby está pensando em me abandonar por este?

-Não diga besteiras, já sabe que meu coração pertence à outra. – Disse Sebastián sorrindo.

-Sim, e você sabe que é meu favorito. – Gabriela se aproximou do pálido jovem e o abraçou carinhosamente. José lhe devolveu o abraço alegremente.

-Bem crianças, lhes deixo um pouco, me chamem quando terminarem de conversar. – José se perdeu atrás da porta do pequeno ginásio.

-Gabby você sabe o que eu sinto por Isabel, verdade? Ou seja, ela é a pessoa mais importante nesta casa para mim.

-Eu sei, e para ela você também é a mais importante. – Gabriela tinha toda sua atenção voltada para o jovem.

-Isso espero, só que ultimamente a noto diferente, depois que teve uma conversa com seus pais a sinto mais distante, já não passamos tanto tempo juntos como antes, me disse que necessitava de tempo. Sei que você é com ele quem melhor se dá e pensei que talvez tenha dito lhe algo, não sei, na verdade estou preocupado.

-Olha Seba, eu não posso lhe contar às coisas que falo com ela, mas posso lhe aconselhar que não se afaste dela, se ela se afastar de você. Não aceite tão fácil. Entenda-me ela está um pouquinho confusa com tudo isto, estou certa que ela gosta muito de você, porém se sente muito pressionada por certas situações, que nada tem que ver com você. Você demonstrou que é bom para ela, que a quer de verdade, que pode lhe oferecer algo lindo e sincero. E o mais importante é ter paciência, creio que você é um apoio enorme para ela nesta casa e que pode fazer muito por ela.

-Sei que ela se sente bem comigo, é só que às vezes me confunde, parece que estamos bem e de repente se espanta e foge do meu lado. Eu estou realmente interessado que dê certo Gabby. – O jovem olhava para as mãos.

-Não se dê por vencido, quando ela tentar se afastar, não lhe permita tão facilmente, dê-lhe espaço suficiente para que não se sinta sufocada, mas mantenha-se sempre perto dela, me entende? Ela lhe quer, se lhe diz outra coisa é por pressões externas.

-Você se refere à relação com a igreja, verdade? É difícil tentar lhe tirar certas idéias.

-É difícil, mas não impossível, a chave é o amor, através de você ela poderá descobrir muitas coisas novas, sei que entre vocês está nascendo algo forte, posso perceber, arrisque-se Sebastián, isso é tudo que eu posso lhe dizer, a chave é você, o amor que pode lhe dar.

-Obrigada, Gabby. – Sebastián sorriu honestamente para a jovem. – Bem, suponho que agora dedicará algum tempo a seu apaixonado.

-A quê? José é só um amigo.

-Para você ele é um amigo, mas para ele você não é só uma amiga. – Sebastián piscou um olho e se levantou dando um grande grito a José.

Gabriela ficou olhando.

-Espero que esteja brincando.

-Parece incrível que seja tão perceptiva quanto as pessoas que lhe rodeiam e quando se trata de você custa tanto a ver as coisas Gabby. – José apareceu na sala.

-Tem razão nisso. Bem jovens os deixo. – Deu um beijo na bochecha de cada um e deixou a sala.

-Viu como Gabby é linda? É perfeita. – José a observou afastar-se enquanto suspirava.

-Deixe de suspiros e lute. – Ambos jovens se concentraram não videogame enquanto começava o som dos golpes e gritos de luta.

-Que está fazendo? – Gabriela entrou pela porta do quarto de Xênia.

-Tentado me concentrar em algo totalmente diferente dos cigarros, e acredite que não é nada fácil. –Gabriela sorriu diante da resposta da morena.

-Estou orgulhosa de você lhe disse?

-Deixe-me ver. – Xênia fez contas mentais. – Com essa umas dez vezes até agora.

-Exagerada. Que acha de irmos preparar algo bem gostoso para comermos você e eu? – Gabriela a olhou com entusiasmo.

-Pensei que tivesse você me dito que faria coisas gostosas para mim e não que eu teria de cooperar. – A sombracelha de Xênia se levou.

-Sim, mas creio que seria mais divertido se fizemos algo juntas, gosto do trabalho em equipe, você não?

-Na verdade não. Eu gosto de fazer as coisas sozinhas, e quanto mais longe me mantenho do resto melhor para mim.

-Anti-social.

-Olha, não me mostre à língua, porque senão eu a agarro e a corto. – Xênia disse com tom de advertência.

-Ah sim? E como pensa em cortá-la? Com os dentes?

Encanta-me quando se põe assim brincalhona Xênia, seu olhar muda completamente quando está relaxada, e é tão lindo ver a expressão em seus olhos.

-Os dentes me serviriam para cortar, mas logo eu ficaria com a boca cheia de sangue, e corro o risco de pegar alguma doença, assim que nop.

-Está me chamando de infecciosa. – Gabriela agitava um dedo diante do rosto de Xênia.

-Estou me chamando de precavida, como dizem, uma pessoa precavida vale por duas.- Xênia disse orgulhosamente – Hey! Não me empurre.

-Precavida? Não pensei que fosse, o tipo que não se arrisca Xênia, estou começando a pensar que você é puro olhar nada mais, e no fundo é uma covarde.

-Covarde? Quer que eu lhe mostre? – Xênia se levantou em toda sua altura de frente a Gabriela, que estava sentada na cama.

-Uii que medo, olha como estou tremendo diante da poderosa Xênia. –Os olhos de Gabriela brilhavam com a audácia.

-Ah é assim, não tem medo? – Xênia se agachou de frente a Gabriela até ter seu rosto a centímetros do da jovem. Os olhos azuis atravessando os seus.

Oh oh, sabe qual é meu fraco, contra esses olhos não posso Xênia, não me dê golpes baixos.

-Está bem, está bem, aceito, seus olhos são mais do que posso suportar, afaste-os de mim. – Gabriela baixou o olhar envergonhada. – Desarmam-me e você sabe. – Levantou o olhar uma vez que sentiu Xênia afastar-se, e a encontrou sorrindo.

-Os seus são mais poderosos do que imagina, só que ainda você não se deu conta disso.- A voz de Xênia soou suave.

-É sério? Ou só disse para eu me sentir bem?

-Pode acreditar. Ou pensa que sou o tipo de pessoa que diz algo só para alguém se sentir bem?

-Não, não é.

-Então?

-De que forma podem ser poderosos? Agrada-me a cor, mas os seus têm uma força incrível Xênia, lhe atravessam.

-O poder dos seus é a doçura, a bondade que transmitem, se você não se coibisse tanto quando lhe cravo o olhar, teria tempo suficiente para se dar conta que os seus também são desarmantes.

Azuis e verdes ficaram se olhando por vários segundos, as jovens não disseram nada só estudavam os olhares das quais estavam sendo objetos, e sorriram timidamente.

Meus olhos desarmam Xênia? Como é possível? É Xênia, nunca se coíbe diante de nada. Xênia por que lhe sinto tão familiar? É possível que nos conhecêssemos de outra vida? Tive essa sensação no mesmo instante que lhe conheci, me pergunto se você sentiu o mesmo…

-Então? Vamos preparar essas coisas gostosos que você queria? – Xênia a tirou de seus pensamentos.

-Claro!- Gabriela se levantou alegremente e ambas se dirigiram à cozinha.

———————————————————————————————————————————————–

-Olha! Isso não se faz.

-Tecnicamente sim se faz, já que acabo de fazê-lo. – Gabriela sorria brincando enquanto via Xênia limpar o excesso de farinha da cara.

-Vai me pagar, vai ver. – Xênia lhe dedicou uma olhada ameaçadora e logo saiu correndo atrás dela.

-Ai! Xênia não, por favor, foi só uma brincadeira. – Gabriela se escondendo detrás da mesa tentando antecipar o movimento de Xênia.

-Pois deveria ter pensado antes de me jogar toda esta farinha. – O rosto da morena estava branco e apenas se distinguiam seus olhos através da camada de farinha que o cobria.

-Me rendo, me rendo. – Gabriela tentava safar-se do forte agarro de Xênia que a olhava com uma expressão maliciosa no rosto.

-Assim, então se rende eh?

Meu Deus Xênia lhe estão vendo milhões de pessoas brincar com esta menina, que merda estou fazendo? Que está acontecendo?

Xênia soltou a jovem e seu sorriso diminuiu notavelmente.

-Que aconteceu?

-Estou um pouco cansada, acho que vou dormir um pouco, nos vemos depois.

-Mas…-Gabriela agarrou o braço de Xênia.

-Já terminamos o queque (uma iguaria chilena), logo venho prová-lo, sim? – Xênia olhou a jovem simulando todo o controle que podia em sua conduta.

-Ficou com vergonha, não é? – Gabriela estava a olhando com uma espécie de dor e censura em seu rosto.

Não por favor, não me dê esse olhar, não. Que merda, o que está acontecendo? Esta não sou eu.

-Não é isso…

-Sim é isso, Xênia. Conheço-lhe apesar de você tentar ocultar seu mundo interior. – Gabriela soltou o agarre e girou impedindo que Xênia visse sua cara.

-Não, é que na realidade estou cansada, você está imaginando coisas que não são.

-Não são? – Gabriela lhe deu uma fugaz olhada, que dou em Xênia mais que seu próprio orgulho.

-Sinto muito, não estou acostumada a tudo isto, a me comportar dessa maneira, a…

-A se fazer de boba? – Gabriela terminou a frase. – Se trata de agir simplesmente, sem pensar tanto nas coisas Xênia. Por que se freia tanto?

-Porque essa não sou eu. – Xênia baixou o olhar.

-E como pode estar tão segura? Quando brincamos ou falamos qualquer bobeira, vejo em seus olhos Xênia, você não viu a doçura que eles projetam quando você ri, quando deixa a tensão de lado. Isso não lhe faz mais fraca, lhe faz ainda mais linda do que você é quando mantém a todo custo sua compostura…

Gabriela deu uma olhada para Xênia e saiu da cozinha cabisbaixa.

Meu Deus isto é pior do que pensei. Estou me apaixonando? Estou me apaixonando, merda. Gabriela…Disse-me que sou linda? Gabby…Ela me acha linda…

-Xênia querida, que faz tão sozinha aqui?

-Antes que você chegasse, desfrutava de uma agradável noite de verão. – Xênia fez uma expressão de fastidio enquanto Carla entrava na piscina com um de seus minúsculos biquínis, desta vez de cor azul.

Xênia havia estado pensando nos dias que passou nesta casa, em todas as coisas que havia compartilhado com Gabriela, como a jovem havia pouco a pouco sido capaz de tirar essa parte sua que ninguém mais havia conseguido conhecer, a fazia se sentir feliz sem dúvida, mas sua maldita mania de moderar cada reação não a deixava sentir-se livre para ser como era simplesmente, como a jovem loira havia dito. Desde o dia anterior Gabriela não havia se aproximado, sabia que suas atitudes a confundiam, mas o que não imaginava Gabriela era a confusão que ela estava causando em Xênia, o que estava fazendo esta sentir. Xênia nunca teve a intenção de sentir nada por nenhuma das pessoas que estavam vivendo ali com ela, e assim era, não tinha carinho por nenhum deles, com ninguém havia mantido uma conversa real que chegasse a termos pessoais, mas com Gabriela tudo era diferente, sentia que a queria. Estava se apaixonando por ela? Era a pergunta que ultimamente passava uma e outra vez pela mente de Xênia, ou por acaso, já estava apaixonada?

-Sabe Xênia? Você está muito tensa. O que está acontecendo? Brigou com sua preciosa Gabby? – Recebeu um olhar de fúria de Xênia.

-Para começar ela não é minha, e o que acontece entre nós não é da sua conta, meta-se com seus próprios assuntos. – A morena começou a nadar ao longo da piscina.

-Você está metida em um reality show aonde o que você faz milhões de pessoas vêem, e me diz que não me meta? Você é realmente incrível Xênia. – Carla se aproximou da morena.

-Deixe-me em paz, maldição. Que merda quer de mim?

-Quero você inteirinha, e você sabe disso. Já tentei me aproximar de você, mas sempre me repele. Até quando você se fará de difícil darling? – Carla afundou na água para emergir com o cabelo encharcado colado ao crânio.

-Já lhe disse, você não é meu tipo, não vai acontecer nada entre você e eu? Entende? – Os olhos azuis a olharam com fastidio.

-Ai Xênia, estou lhe oferecendo uma diversão, não um compromisso, qualquer imbecil aceitaria com gosto. – Carla cada vez mais falava sedutoramente se aproximando perigosamente de Xênia, enquanto esta a observava apoiada na beira da piscina.

-Você disse, qualquer imbecil. – Xênia começou a sair da piscina, mas em um segundo se viu presa pela cintura e novamente dentro da água com Carla a centímetros de seu rosto.

-Xênia, é sua culpa por ser tão desejável. – Começou-lhe a acariciar o rosto. – Se soube as fantasias que tenho com você, às vezes que me masturbo pensando em você. – Carla se aproximou do ouvido de Xênia e sussurrou nele. – Faça elas se tornarem realidade, você e eu, e até a Gabita pode convidar se você quiser.

Por um momento Xênia se perturbou, era óbvio que Carla sabia sobre sua condição sexual, não porque ela houvesse feito pública, senão porque a ruiva notava simplesmente. Ela não gostava de Carla, não a provocava nada, a jovem era linda fisicamente, mas sua forma de ser era tão detestável que Xênia preferiria ter algo com qualquer outra pessoa antes que com ela. Tinha duas alternativas usar a força física e afastá-la com um empurrão de seu lado, ou lhe dizer algo e sair dali calmamente.

-Se não tirar sua asquerosa mão da minha cara agora mesmo, vou lhe causar tanta dor que  você nunca mais vai ter vontade de dar em cima de ninguém na vida. – Xênia endureceu o olhar cravando seus olhos nos de Carla, sem piscar. –Não me interessa suas fantasias nem suas masturbações. – Lançou com um empurrão a ruiva para longe dela e saiu da piscina.

-Xênia darling, você pode me causar toda dor que quiser, só conseguirá me excitar ainda mais. – Carla ficou dentro da piscina, e lançou um beijo a Xênia e continuou nadando como se nada tivesse acontecido.

-Maldita louca. – A morena fez uma expressão de fastidio e se afastou do lugar.

Gabriela ouviu a porta de seu quarto abrir-se.

-Está acordada?

-Sim estou. – Se sentou na cama e viu a figura de Xênia surgindo timidamente, se levantou e saiu do quarto.

-Está zangada comigo? – A voz da morena soava triste, não lhe olhava no rosto.

-Não, não estou. – Gabriela sentiu uma estranha emoção invadir seu ser ao ver Xênia tão frágil.

-É que desde ontem que não conversamos, e queria lhe dizer algo.

-Só queria lhe dar algum tempo livre, ultimamente passamos quase todo o tempo juntas, e pensei que talvez você quisesse ficar sozinha.

-Não, eu…Sinto muito pelo que aconteceu outro dia, você tinha razão, não sei porque merda tem que ser assim. – Xênia concentrou o olhar no piso, sem se atrever a olhar Gabriela na cara.

-Não tem que me pedir desculpas é assim que lhe conheci, e é assim que comecei a ter carinho por você. – Gabriela sentiu o olhar de Xênia em seu rosto.

-Obrigada por isso…- Sua voz soou hesitada.

-É a verdade.

-Eu sei.

Olharam-se um instante. Gabriela lhe sorriu tão docemente como Xênia já estava acostumada.

-Bem, creio que já vou para que você possa continuar a dormir. Boa noite Gabby.

-Boa noite Xênia, durma bem. – A jovem loira lhe deu um beijo na bochecha de Xênia, a morena deu um leve sorriso e se afastou até a porta de seu quarto.

-Xênia? – Ouviu a voz de Gabriela chamando-a.

-Sim?

-O que Carla quis dizer com isso de que “sua razão de viver é uma pessoazinha?”.

Xênia sentiu uma pontada no estômago ao ouvir a pergunta, tentou se manter o mais serena que pôde.

-São besteiras dela, está meio louca, você sabe. – Percebeu o olhar de Gabriela estudando seu rosto.

-Eu sei, e também sei que ela gosta muito de você eu suponho. – Gabriela baixou o olhar por um segundo.

-Sim, já notei, mas isso é problema dela, não meu. – Xênia encolheu os ombros.

-É normal. Qualquer um se fixaria em alguém com você. – Gabriela arriscou uma olhada ao rosto de Xênia quem estava estudando o seu desta vez.

-Qualquer um, você disse, não as pessoas especiais.

-Não quis dizer isso, estou de acordo em que Carla não é o sonho de muita gente digamos, mas ela é como é, meio exibicionista, não lhe importa que todos saibam, suponho que o resto das pessoas não demonstraria tão abertamente o gosto por você. – Gabriela afastou o olhar de Xênia novamente, a tênue luz que entrava pela janela mais próxima dava justamente no rosto da loira.

-Fala de alguém em particular?

-Não. – Gabriela manteve o olhar de Xênia o tempo que suportou ver esses olhos diretamente, logo afastou o seu.

-Bem, já vou, nos vemos amanhã.

-Até amanhã.

Gabriela viu como Xênia se perdia detrás da porta e logo ingressou pela sua.

Meu Deus? O que está acontecendo? Que é isso que sinto quando estou com ela?

-Fecha os olhos. – A morena, esperou que ela fizesse o que mandou. – Disse para fechar os olhos.

-Sim, já fechei. Que foi?

-Não está vendo, verdade? – Xênia moveu a mão à altura das fechadas pálpebras de Gabriela.

-Não, não estou vendo, mas, não me deixe em suspense.

-Ok, já pode abrir.

Gabriela enfocou o olhar nos alegres olhos de Xênia, tinha um pequeno sorriso no rosto.

-Quê?

Os olhos azuis lhe indicaram para olhar um pouco mais para baixo.

-Eram isto?

-Xênia! – Gabriela se lançou nos braços da morena, quem ficou estática no momento.

-Calma, senão vai amassá-los.

-Xênia! Como os conseguiu? – A voz de Gabriela era de total alegria.

-Ah não, isso é segredo, você se conforme em tê-los.

-Me encantam. – Gabriela dizia enquanto abraçava seus pinguinhos alegremente. – Toma, prova Xênia você vai se encantar.

Que linda…Se vou obter essa reação cada vez que você come um destes, creio que vou ter que conseguir mais.

-Vejamos se é para tanto escândalo. – Xênia deu uma mordida no doce debaixo do olhar atento de Gabriela.

-E? – Gabriela inquietava-se esperando o veredicto.

-M, não sei, me dê mais um tempo para que o sabor invada minha boca. – Xênia demorava na tarefa de mastigar e engolir, desfrutando com a impaciência da jovem loira.

-Ai, vai Xênia! – Me diga de uma vez por todas se gostou ou não, não me faça sofrer. – Gabriela estava franzindo o cenho.

Eu jamais poderia lhe fazer sofrer…Nunca…

-Bem, logo depois de uma intensa analise, decidi que…Ao meu ver, espera um momento ainda não tenho muito claro.

-Iaaa! Xênia vou lhe estrangular. – Gabriela ameaçou agarrar o pescoço de Xênia.

-E logo sou eu a agressiva, não? – Xênia olhou a jovem loira alçando uma sombracelha.

-Então? – Gabriela a convidou a dar seu veredicto com o olhar.

-Aprovado. – Xênia disse finalmente com um sorriso que foi devolvido por um duplo e amplo sorriso por parte de Gabriela.

-Sabia que você gostaria. – A jovem loira apontava com o dedo índice para morena com um sorriso travesso no rosto. – Agora vai me dizer como conseguiu.

-Já disse que isso não se conta.

-Anda Xênia, me diz.

-Os pedi a produção, embora achasse que eles não iam trazer, e bem, suponho que funcionou. – Xênia olhou Gabriela com um ar de timidez em seus olhos.

-Obrigada. – Gabriela observou o gesto de Xênia e baixou o olhar ainda com um sorriso no rosto. – A verdade é que não pensei que me dava atenção quando lhe conto este tipo de detalhe.

-Agora já sabe que dou.

É que você não sabe Gabby das coisas que me faz sentir…?