Capítulo 39 – UM BANQUETE DE ESTADO
por MNSPouco depois do banquete começar, Xena convoca Ephiny para a mesa principal como uma Embaixadora de Melosa era adequado que ficasse mais próxima do centro do poder imperial.
– Embaixadora.
– Conquistadora.
Ephiny estava totalmente desconfortável naquela toga, pois era um traje que somente os nobres usavam, numa moda que Roma expandiu para o Império e embora ainda feliz por ter sido permitido que mantivesse sua espada, mesmo sabendo que era algo raro entre os convidados daquela ou qualquer outra noite.
Ela preferia mil vezes estar nas portas do quarto de Gabrielle ou ao menos junto de suas irmãs preparando-se para exercer suas funções para o dia seguinte do que ali ouvindo aquelas conversas sem fim dos convidados da Imperatriz, no entanto não teve escolha pois a Imperatriz fora taxativa quanto a necessidade da Embaixadora das amazonas estar presente no banquete e além do mais Gabrielle havia determinado que fizesse como fosse dito.
Xena estava deslumbrante em seu modo mais terrível, utilizando um himation em linho egípcio, com um cinto de ouro e prata onde pendia seu chakram e certamente algum punhal oculto, que combinava perfeitamente com os intrigados desenhos feitos em ouro na trama do próprio tecido. Em sua mesa analisava os grupos que conversavam, considerando avaliar até que ponto cada um estaria envolvido com o complô contra sua vida e em última análise contra seu Império.
O banquete transcorreu sem muitos incidentes, quando um jovem nobre alterou a voz com seus companheiros afirmando que mulheres não eram feitas pra guerra.
– A Conquistadora e as Falcões são exceções . Não é natural as fêmeas lutarem, pois devem carregar as crias e no Império as guerreiras eram bem vistas e conseguiam desempenhar apenas por viverem e treinarem entre homens e feito guerra em meio a guerreiros.
– E as amazonas homem?
– Uma tribo de mulheres não passa de lenda como os centauros das histórias que se contam para criança. As amazonas não passam de um golpe de algum prostíbulo que não queria concorrência, pois um lugar somente com mulheres era onde elas deviam lutar deitadas e os centauros deveriam ser escravos de cavalariças que passavam o dia sobre os animais e acabavam a cheirar como um!
O Jovem começou a falar cada vez mais alto a medida que levantava sua taça e olhava ao redor dando risadas, os convidados ao seu redor e mais além silenciaram de súbito vendo uma movimentação dos Falcões em direção ao desavisado convidado, parando atrás dele apenas alguns passos, que mesmo assim não deu sinal de perceber nada diferente até que o chakram voou rebotando por toda a sala, derrubando o cálice do orador.
Os emissários das terras do norte tinham a nítida impressão de estarem na frente de uma valquíria de Odin da qual falam as lendas, atestam as tapeçarias e as canções, embora de cabelos negros, ao mesmo tempo em que os nobres de Corinto recordavam a terrível guerreira que há muito tempo atrás vencera os muros
inexpugnáveis da cidade.
Os emissários de Lao Ma lembraram com nitidez da recomendação daquela que os governa de serem respeitosos com a Conquistadora , pois ela aliava a sabedoria do dragão com a força do tigre e a velocidade da serpente.
Todos os grupos da corte de Corinto estavam representados e cada elemento presente na sala teve motivos mais que suficientes para recordar o motivo pelo qual lhe chamam Conquistadora e já fora chamada de Destruidora de Nações. Todos os olhares se voltaram para a Senhora do Mundo que recebia seu chakram colocando-o novamente em sua cintura.
– Vamos ouvir o jovem orador com atenção!!! Continue senhor, nos esclareça sobre nosso engano quanto as amazonas e centauros. Quem é você?
– Eu sou Shumedes de Roma majestade e o que eu dizia senhora é a pura verdade, pois ninguém vivo viu uma destas mulheres guerreiras de perto, isso é o que eu dizia senhora. Pode acontecer de uma mulher com o devido treino vir a ser uma lutadora razoável ou boa, mas muitas mulheres juntas em uma Nação sem homens seria impossível, só num bordel!!!
– Não é prudente ofender convidados em meu palácio e menos ainda aqueles que partilham de minha mesa. Sugiro que se retrate de ambas as afirmações caso pretenda continuar em nosso meio por muito tempo.
– Perdão majestade, não quis ofender e certamente, jamais ofenderia a senhora ou sua bela acompanhante e nenhum dano foi feito uma vez que é visto não termos centauros entre nós ou qualquer destas guerreiras lendárias.
Xena achava que a situação de Ephiny não poderia ser mais engraçada, uma vez que acabava de ser publicamente elogiada ao passo que sua Nação foi insultada exigindo da capitã da guarda real um pedido de reparação imediato e a ordem recente de Gabrielle de acatar literalmente suas recomendações a prendia aos seus caprichos de imediato e resolveu assumir a diplomacia ao invés de simplesmente mandar encarcerar o descuidado convidado, pensando em buscar informações sobre o que acontece nesta parte do Império
– Você tem um modo muito peculiar de se expressar Shumedes, venha juntar-se a nós em minha mesa e nos dizer mais sobre este pensamento tão próprio.
Quando Shumedes chegou, Xena levou a conversa para onde lhe convinha.
– Ephiny é uma major entre os falcões Shumedes, mas uma capitã entre seu próprio povo, sua função é a guarda pessoal e a arma de especialidade o bastão de lutas e a espada curta.
– Nunca ouvi falar de alguém que tivesse dois postos militares diferentes majestade, isto é muito incomum.
– Com certeza, porém são escalas militares diferentes entre os povos do Império senhor Shumedes e Ephiny presta serviço em uma Casa Real aliada a nós que tem
se mostrado extremamente leal nestes verões todos, honrando os acordos e buscando a segurança do Império e também nas demais fronteiras quando convocados.
– Só posso parabenizar a senhora major e novamente dizer que jamais encontrei nenhum centauro, a senhora já viu?
– Realmente sim, senhor. Eu já encontrei vários centauros e muitas amazonas. O senhor não está correto na suposição de que estas duas nações não existam e sendo ambas componentes do Império não devem ser levadas com desrespeito em nenhum momento e certamente não em frente aos convidados de sua majestade.
– Ela fez um ponto, Shumedes.
– Sim, minha senhora. Ela fez.
– Mudemos de assunto, Shumedes. O que trás você à Corinto ?
– Vim contratar alguns capatazes para as grandes criações de gado que temos na macedônia e estabelecer alguns escravos para comércio, pois tenho buscado linho, cânhamo e madeira assim como algo de metal em ferro e cobre e em virtude disso recebi uma proposta de conhecer um grupo com relacionamentos por todo o Império e base em Pisatis, que me abordou em Atenas com alegação de terem um caminho mais próprio para pagarem menores impostos. Também tenho pensando em estruturar um pequeno grupo de guarda pessoal para acompanhar as viagens e dar segurança aos membros de minha casa e principais administradores.
– Tenho uma ideia que poderia ser de alguma utilidade para ambos. Você entrega para Yolker uma listagem dos portos e entrepostos em que faz negócios com seus principais atravessadores e para Elthor e o General Terquien outra dos membros deste grupo de Pisatis que providencio que Ephiny e sua equipe treinem pessoalmente os guardas pessoais que você contratar.
– Não acredito que exista um caminho mais curto para diminuir impostos do que atender as solicitações da Imperatriz, senhor Shumedes e certamente eu e minha equipe estamos a sua disposição para instruir na composição de uma guarda pessoal.
– Boa noite, Shumedes.
– Com certeza, majestade. Estarei a disposição de seu General a qualquer momento e aguardo a senhora em meus aposentos amanhã pela manhã, major. Com sua licença.
– Boa noite, majestade. Boa noite, senhora Ephiny .
A medida que Shumedes se afastava para conversar com outras pessoas Ephiny conseguiu controlar melhor seu temperamento, mas não evitou manifestar seu desacordo.
– Conquistadora, isto não teve graça nenhuma!
– Divirjo Ephiny , pois foi extremamente engraçado. Amanhã você vai ajuda-lo a escolher uma guarda pessoal e Elthor indicará alguns Falcões que atuarão disfarçados e estão pelas ruas de Corinto esperando serem contratados para algum trabalho como
mercenários comuns. Convença-o que é de seu interesse ter algumas mulheres na guarda para atender as particularidades de seus familiares do sexo feminino e faça-o saber que elas não atuarão como vagabundas, para isso que ele compre escravas ou visite os bordéis locais, no entanto confio que você fará o que for necessário fazer para ganhar a confiança e informações dele. Acredito que é muito mais profícuo assim do que a abordagem militar de extrair informações que é eficaz, mas somente podemos utilizar uma vez e desta maneira será uma fonte mais constante sobre os acontecimentos à sombra.
– Devo me retirar agora majestade, uma vez que tenho trabalho junto à Gabrielle.
– Não! Eu tenho trabalho junto a Gabrielle, então não há o que discutir. Você o fará e pronto, capitã.
Sabendo que as competências de sanadora da Conquistadora são capazes de manter Gabrielle a salvo e que a Imperatriz poderia deixar Gabrielle morrer apenas por diversão e ainda assim estaria no seu direito, Ephiny baixa os olhos e se dá por vencida.
– Sim, senhora, estaremos prontas para o senhor Shumedes amanhã.
– Bom, agora aproveite o resto da noite e fique até o final do banquete, buscando se integrar aos diferentes grupos. Principalmente aqueles do fundo a direita onde está aquele nobre ateniense conversando com Shumedes e busque saber seus interesses e relacionamentos aqui em Corinto . Boa noite Ephiny .
– Boa noite majestade.
Xena penetra em seus aposentos silenciosamente observando Claudia de costas para a porta e para a cama a beber um copo de água, rapidamente vai ao leito verificar a temperatura de Gabrielle que está ardendo em febre.
Com um tom de voz próximo ao rosnado ordena que prepare toalhas e pega Gabrielle no colo, levando-a para a piscina onde a mergulha com cobertor e tudo enquanto Claudia troca as roupas de cama e os travesseiros preparando a cama para receber novamente a princesa amazona.
Tendo baixado a febre de Gabrielle sem que ela acordasse por completo, a Conquistadora a levantou, secou e colocou novamente a amazona na cama, fazendo com que bebesse o remédio.
– O que você está fazendo aqui Claudia?
– Fui enviada para cuidar da princesa enquanto ela estivesse sozinha, majestade.
– Ela tomou o remédio antes?
– Não minha senhora. Ela não acordou até agora.
– Você é uma idiota. Não diga mais uma palavra sequer quando sair daqui se quiser conservar a fala, retire-se para o lugar de onde veio e fique lá.
– Sim majestade.
Indo até a porta, completamente molhada, Xena chama um de seus homens
de guarda e a amazona do outro lado do corredor em um tom que não dá espaço para pensamentos divergentes.
– Dietar! Cora!
– Conquistadora .
Cora, vá aos aposentos de Gabrielle e traga aqui a escrava de nome Néia , não dizendo à esta ou demais escravas nada sobre meus aposentos ou eu sendo a Conquistadora . Cuidem para que as novas escravas estacionadas no andar não saibam que eu sou a Conquistadora, pois eu desejo sigilo quanto a isso e nenhum outro nome ou título deve ser mencionado. Elas me conhecem sob disfarce e tenho interesse que continue assim para tranquilidade de Gabrielle, mas Néia é capaz de atender os cuidados necessários para a princesa.
– Ao seu comando.
Xena retorna para seu quarto e estava secando-se quando Néia entrou procurando atender o chamado.
– Senhora.
– Esta jovem está doente e precisa de atenção e você dará a ela toda atenção necessária, devendo atender a amazona que trará você aqui nas vezes que eu tiver de me ausentar. Os remédios para febre estarão no aparador onde eu deixarei as doses prontas e se a febre subir acima da sua capacidade de controle peça para a amazona na porta me chamar imediatamente. Agora volte para os aposentos da princesa e durma, pois pode ser chamada a qualquer momento.
– Sim, senhora.
Xena vai dormir ao lado de Gabrielle e algum tempo depois quando Gabrielle se move Xena percebe que ela estava acordando e rapidamente busca o remédio ajudando-a a beber.
– Gabrielle, vou precisar abrir novamente seu ferimento se esta linha vermelha se expandir e você começar a ter febre de maneira continua e crescente.
– Sim, minha senhora.
– Sua febre agora está controlada, mas pode subir novamente, então em minha ausência Néia ficará com você. Sabe que ela me conhece como a sargento Ohana sem saber que sou a Conquistadora e eu quero que continue assim. Diga a ela que sou sua sanadora.
– Sim, minha senhora. Eu farei isso.
– Bom. Como você está se sentindo??
– Dói principalmente quando me mexo.
– Vai piorar antes de ficar melhor, mas é indicado que você não se mova muito. Agora tente dormir que o remédio já está começando a fazer efeito. Boa noite, Gabrielle.
– Boa noite majestade.
Ao clarear o dia Xena estabelece algumas prioridades e procedimentos.
– Milenti!
– Senhora.
– Diga à amazona de guarda que venha aqui e doravante as amazonas tem trânsito livre à este aposento em minha ausência. Dispensado.
– Senhora .
– Salina, chame Cora e faça ela trazer Néia aqui pois não quero que Gabrielle fique sozinha sem observação qualificada em nenhum momento.
– Ao seu comando.
Algumas contagens depois Eliano entra para dar passagem a uma escrava assustada com tantos guardas, acompanhada de uma amazona atenta e preocupada.
– As suas ordens minha senhora.
– A cada marca de vela ela deve beber um copo desta medicina e não me importa se vai acorda-la para isso ou ministrar enquanto ela dorme.
– Mas ela é uma princesa!
– Ela é alguém doente e se ela piorar a Conquistadora fará um tapete com tua pele e isso não é uma analogia. Eu pessoalmente esfolarei você viva. Fui clara?
– Sim sargento.
– Se você precisar de qualquer coisa, sempre haverá uma amazona na porta. A princesa não deve se preocupar com nada além de beber muito líquido e a comandante Ephiny está proibida de entrar aqui sem que eu pessoalmente autorize. Cora, te faço responsável por garantir que estas ordens sejam cumpridas literalmente.
Dali pra frente, todos os dias Xena almoçou com Gabrielle e de tarde passou para verificar seu progresso, dormindo ao lado da princesa amazona toda a noite.
A guarda na porta de Gabrielle modificava a cada três marcas de vela, mas Ephiny não foi vista no aposento por cinco dias e na sexta manhã, quando Gabrielle estava desperta e sem dores, a capitã foi finalmente autorizada a entrar.