Fanfics sobre Xena a Princesa Guerreira

Alguns dias se passam em relativa paz. No exército, não em mim.

Ela não olha ou fala comigo além do necessário. Não compartilho suas noites.

Ela está machucada. Eu sinto. Como se fosse em mim. Mas não posso fazer nada sobre isso. Não sei como.

Ela me ensina tudo, mas ela não tem isso para me ensinar.

Perambulo pela noite, sozinha. Procurando paz. Conheci a paz, e agora necessito dela. Mas ela é tão difícil.

Me afasto o máximo que posso do acampamento. Devo ter caminhado por mais de uma hora.

Então eu grito. Muitas vezes. E tenho, novamente, aquela horrorosa experiência de desintegração. De não entender se sou real.

Talvez eu seja dependente do olhar dela para existir. Ela não me vê mais, então estou morrendo. Como eu vivia antes de ela existir?

Mas ela existia. Como uma fantasia corrosiva em mim, mas ainda assim tão real. Mas agora que ela é de verdade, a fantasia não me basta mais. Eu preciso que ela me veja.

Tento respirar, reconhecer as partes de meu corpo. Consigo, por um tempo, depois lembro que não talvez eu não possa mais tocá-la e tudo ameaça desabar novamente.

Me perco em ciclos de existir e morrer incontáveis vezes. Ali, sozinha.

Um galho quebrado atrás de mim.

Ela, de espada na mão.

Como não sei se sou real, também não sei se ela é.

Respiro.

Ela é real e eu também.

Sei o que ela quer. Saco minha espada.

Ela luta comigo. De um jeito elaborado, consciente, elegante. Aquela perfeita coreografia. Exceto por duas lágrimas em seu rosto. Mas elas não atrapalham a precisão de seus golpes. Nem me distraem da precisão dos meus.

Só paramos quando os músculos não aguentam mais.

Ela me abraça.

Engraçado.

Esse toque costumava me destruir. Agora ele me estabiliza. A ausência dele que me quebra. Meu corpo volta para mim.

Ela me beija. Devagar. Dolorosamente devagar. Parece aquele dia em que ela me ensinou, mas não é. Porque estou beijando-a de volta, participando desse roçar indolente.

Não inflama, não se torna cheio de fúria e possessão. É apenas um beijo. Que se prolonga por um tempo que não consigo e não quero contar. E assim, sou apresentada a mais um tipo de desejo.

Eu já conhecia a suavidade dela, mas ela sempre vinha junto com ela dose de violência e dor. Agora, ela me beija e me toca como se eu fosse algo delicado que ela não quisesse quebrar.

Desejei não estar tão longe do acampamento. Desejei não estar agora deitada em um duro e irregular chão de barro, enquanto ela me toca daquele jeito.

Aquele toque manso tem sobre mim o mesmo poder que as perversas devassidões. Me aferro a ela, enquanto nossos corpos misturam-se naquele movimento brando.

Eu quero uma eternidade disso.

Mesmo quando já está acabado, ela continua me beijando. Meus lábios, meu corpo.

Eu estremeço.

Acho que aquilo é…. carinho.

Como sempre que acontece quando me deparo com algo que desconheço, me vejo diante da ameaça de completa devastação. Escondo o rosto nas mãos. Tento respirar.

– Olha para mim – a voz dela.

Eu, que estava desejando o olhar dela a pouco tempo atrás, agora não sei se posso suportá-lo. Mas como sempre, faço o que ela diz.

– Por que está chorando? – ela pergunta.

Eu estou?

Não sabia.

– Não sei – é a coisa mais honesta que posso falar.

Ela enxuga minhas lágrimas.

– Não chore – ela me beija novamente.

Aquilo arranca um soluço de mim.

– Não chore – ela repete, roçando o rosto no meu.

Seguro o rosto dela entre minhas mãos e direciono os olhos dela aos meus.

– Xena… eu realmente sinto muito. Por Theodorus.

Ela sorri, triste.

– Eu sei.

– Sabe?

– Sei.

Ela deita a cabeça em meu ombro, relaxa o corpo sobre mim e eu esqueço que estou num chão duro no meio do nada.

Até a voz dela me trazer de volta.

– Porque veio tão longe? – ela pergunta – estava indo embora?

Engulo em seco.

– Eu queria gritar – falei – muito alto… de um jeito que machuca a garganta. E não queria ser ouvida por ninguém. Não estava indo embora.

– Por que queria gritar?

Porra. Ela está me pedindo para falar sobre coisas que não sei falar.

– Você não estava me vendo. Falando comigo. Isso estava me machucando – falo, encarando as estrelas – precisava de um espaço para enlouquecer.

Os dedos dela correm pelo meu antebraço. Ele parece pensativa.

– Sei que soa egoísta – continuo – porque era você que estava sofrendo. E sei porque não estava falando comigo… ainda assim, não consegui fazer com que parasse de machucar. Racionalizar não adiantou. Só me restava… perder o controle.

Ela sai de cima de mim e deita ao meu lado.

– Suponho que eu devia ter dito algo – ela fala, hesitante – dito que precisava de uns dias, talvez. Mas… não sou muito boa nisso.

– Nisso o que?

– Conversar… falar… sobre emoções e essas coisas.

– Não é minha especialidade, também.

– É, eu sei. Somos duas idiotas nesse campo, hein?

– Suponho.

Está ficando realmente frio e estremeço.

– É uma longa caminhada de volta – ela fala – você quer voltar?

– Sim – me levanto, e ela também.

Nos vestimos, em silêncio. Ainda me sinto frágil. Ainda não sinto que todas as minhas partes estão conectadas.

Às vezes, desejo não ser uma pessoa tão quebrada por dentro. Mas não sei como me consertar.

– Algumas pessoas estão começando a ficar inquietas – ela fala, enquanto andamos – sobre Theodorus. Estou pensando em falar que ele foi capturado e morto por romanos. Uma morte de herói. Para manter a lealdade dos soldados e elevar o nome dele.

Ela fala isso de um jeito amargo.

– Parece estratégico – comento.

– É, e não é a primeira vez que faço isso. E eles vão acreditar. Então se prepare – ela fala – amanhã farei uma grande performance. Vou transformar o homem que tentou te matar numa lenda vida, num herói de guerra.

Dou de ombros. Não poderia me importar menos. Só me importo com Theodorus na medida que ela se importa.

– Por mim, sem problemas.

– Você vai tentar parecer consternada? – ela pergunta.

– Se eu fizer isso, será suspeito. Eles esperam de mim indiferença e quem sabe um pouco de alegria. Eles sabem que sou maluca.

Ela ri. Para e me abraça. Sou pega de surpresa. Ela logo me larga e continua a andar.

Não tenho ideia do que está acontecendo. Mas estou um pouco tonta, um pouco feliz e continuo andando.

A caminhada é longa e silenciosa. Graças aos deuses, Xena também não é alguém que desperdiça palavras. Que desespero seria se ela tentasse trocar o maravilhoso silêncio por conversas sem sentido.

Eu provavelmente não aguentaria ficar perto dela.

Quando chegamos ao acampamento, ela novamente faz algo para me assombrar.

Segura minha mão.

Certo, foi demais para mim. Estanco e olho para nossas mãos entrelaçadas.

– O que é isso? – pergunto.

– O que é o que?

– Isso – aponto com a outra mão para nossos dedos cruzados.

– Ah, isso – ela parece risonha – apenas senti vontade de fazer.

– Que? – minha voz sai com muito mais raiva do que eu gostaria.

O sorriso dela some e ela solta minha mão. Imediatamente quero que ela segure de novo. Deuses. É cansativo ser eu.

– Se não quer, tudo bem – ela fala, voltando a andar.

– Não… espera, caralho – estou quase rugindo, aperto meus olhos e balanço a cabeça. Ela pára e me olha de novo, uma sobrancelha quase sumindo na franja.

– Você… você sabe – gaguejo enquanto falo, e odeio – eu sequer sabia o que era um beijo. Sexo, essas coisas. Nunca me importei com isso. E agora… eu tenho… você. E essas coisas – é possível soar mais incoerente que eu? – e agora… mãos dadas? Isso me deixa… sem saber de nada, entende? Não sei como se reage a essas coisas. Simplesmente não sei – eu corro e seguro a mão dela – eu quero segurar sua mão. Eu quero.

Odeio o esgar sardônico que curva os lábios dela. Ela sabe que esse é o único ponto em que não empatamos.

– Gostaria de não ter que explicar… mas parece que preciso – ela fala – nesse ponto você nem é uma adolescente… parece uma criança de cinco anos.

Sinto raiva e largo a mão dela de súbito, o que com certeza só me faz parecer ainda mais uma criança de cinco anos.

– Callisto – ela começa – eu e você… estamos em uma espécie de relacionamento. Acho.

Minha cabeça gira.

– Como assim…

– Quero dizer… você bem sabe que minha cama era um lugar bem povoado.

– Sei – o ódio se contorce dentro de mim quando lembro do desfile de moças e rapazes saindo e entrando da tenda dela.

– Mas agora só você a frequenta.

– Aham.

– Suponho que não esteja brincando com outras pessoas por aí também? – o olhar dela é inquisidor.

– Mal aguento lidar com você, imagine outros – respondo.

– Nossa, mas se é dificil assim…

– Porra, não é isso que quero dizer… nossa, as vezes acho que eu não devia falar nada, nunca.

– Eu sei o que você quer dizer, estou só mexendo contigo.

– Tá vendo? É isso que quero dizer – estou fumegando. Ela se diverte.

– Voltando… estou só com você, e você só comigo. E já tem algum tempo. As pessoas chamam isso de um relacionamento.

Odeio o tom condescendente dela. Quero dizer, sou incompetente, mas não tanto assim.

– Você quer dizer, tipo, namoradas – falo, seca.

Ela parece vitoriosa.

– Você disse, não eu – ela fala.

– Odeio você, sabia disso? – cruzo os braços.

– Eu sei. É recíproco – ela fala, enquanto volta a segurar minha mão e continuamos nossa jornada até a tenda dela.

Estou quase explodindo de raiva. E alegria.

Nota