Fanfics sobre Xena a Princesa Guerreira

Capítulo 10

Algumas horas depois, elas fizeram o caminho de volta para a cabana. O fogo da lareira estava baixo e Ayleen acordou num sobressalto quando a porta se abriu. Ela olhou para Gene e a viu com um olhar triste, ainda segurando sua bengala.

-E então? Existe algo que possa ser feito para restaurar a vitalidade de Gene? – indagou com olhos verdes esperançosos

-Minha criança, eu receio que os deuses tenham outros planos. Não está ao nosso alcance.

-O que você quer dizer?  – Ela perguntou, fechando o semblante – Eu… eu… minha mãe me contou histórias da medicina druida levantando pessoas do leito de morte. Imogene está muito viva, como não pode fazer nada por ela?

-Você precisa aceitar que os deu…

-Eu não quero saber dos deuses! Que tipo de deuses são esses que permitem algo assim? Eu estou cansada de ser controlada por tudo, por um rei, por um regente, por conselheiros e pelos malditos deuses. Eu estou cansada de não ter controle sobre nenhum dos eventos da minha vida. Me diga Muirne, o que eu tenho que fazer? O que os deuses querem que eu faça?

Muirne balançou a cabeça e aproximou-se da lareira, jogando mais um pedaço de lenha nas chamas antes que elas definhassem. De uma chávena ainda quente, ela derramou mais uma xícara de chá para Ayleen.

-Você não pode barganhar com os espíritos, criança.

Era tudo que a anciã tinha para dizer.

As rodas duras da carruagem cortavam a estrada pedregosa de volta para o castelo de Drachen, arremessando pequenas pedras estrada a fora entre um solavanco e outro, mas Ayleen sequer sentia o incômodo do assento duro do veículo. Ela estava calada, com um sentimento de revolta dentro de si, descrente dos deuses, dos espíritos e de si mesma. Um sentimento de derrota e de desorientação havia lhe abatido, afinal havia depositado todas as suas esperanças na medicina do povo de sua mãe. Se sentia traída por eles e pelos ensinamentos que recebeu durante grande parte de sua vida. Não falava com Gene, sequer a olhava, com um misto de vergonha e culpa pelo que considerava ser seu fracasso. Havia dado esperanças para a amiga, e agora elas não existiam mais. Apática, apertou a borda da manta que a protegia com os dedos e se encolheu no banco da carruagem. Com o corpo tenso, mas emocionalmente exausta, adormeceu.

O olhar de Imogene estava fixo em algum ponto do vidro da carruagem, mas na realidade ela não prestava atenção em nada em específico dali. Em sua mente, ela rememorava repetidamente uma cena apenas…

Passado…

Imogene segurava a mão do avô no seu leito enquanto ele usava suas últimas forças para falar com ela.

-Eu estou partindo, Imogene. Esse povo agora é seu povo, e você precisa cuidar dele. – a voz de Hedwyn era fraca, quase inaudível de longe – Lembre-se de todas as conversas que tivemos… Use a sabedoria. A sabedoria de um guerreiro não é somente força e estratégias de guerra. Não deixe que o orgulho te cegue.

-Todos estão me deixando – ela refletiu tristemente. – Papai, mamãe, você… em poucas semanas, Ayleen.

-Não seja boba, ela pode partir, mas o coração dela sempre continuará com você.

Imogene lhe olhou surpresa para um sorriso fraco no canto dos lábios do avô.

-Eu sei do que estou falando. – Continuou Hedwyn – durante os três anos que você esteve no oriente, eu tive horas de conversa com aquela jovem…e eu posso te afirmar… ela sempre estará com você de alguma forma. E é por isso que você precisa usar sua sabedoria e sua força. Por todo o seu povo, e por ela.

-Eu vou…fazer você, o papai e a mamãe se orgulharem de mim. Eu prometo.

-Não, minha filha, não se trata e orgulho. Você precisa aprender a desenvolver sua paciência. O que fará quando eu partir?

-Governarei Devonshire.

-Não pode fazer isso sozinha. Você sabe que nem todos os homens aceitarão uma mulher no comando, é uma questão de tempo até que haja uma revolta.

-Que escolha eu tenho vovô?

-Você terá que usar sua inteligência. Você mesma disse que não aprendeu apenas a lutar no oriente. Use a serenidade que lhe foi ensinada, existe uma escolha muito difícil que você terá que fazer. Os homens não respeitarão uma líder mulher a menos que você ganhe a confiança deles. E você não conseguirá isso em um dia, nem mesmo em semanas ou meses. O tempo é impiedoso, e ele não vai pausar para que você consiga isso. Se você não tem um exército em que possa confiar, todos estarão vulneráveis a um ataque externo, ou até mesmo interno. Ou ainda pior, o condado poderia ser alvo de ladrões ou saqueadores, e cair de vez. Eu sei que isso irá contra tudo que você acredita, mas você terá de entregar Devon ao Lord Drachen.

-E isso seria melhor do que ser vítima de roubos ou saques? Ele DESTRUIRIA nossa terra! – Imogene respondeu com as faces vermelhas.

-Ele deve honrar os termos do casamento com Ayleen. E ele não seria tolo em destruir uma terra que passaria a lhe pertencer.

-Ele obrigará nosso povo a lutar na causa contra os romanos! As famílias perderão suas riquezas e civis terão de ir a guerra!

-Uma fatia do povo terá de ir a guerra, e alguns morrerão, é verdade. No entanto, se formos pilhados ou uma revolta se instalar, centenas a mais morrerão, incluindo idosos, crianças e mulheres.

Imogene fechou os olhos por alguns minutos tentando reorganizar os pensamentos. Esfregou as mãos no rosto e então fitou o avô que ia perdendo as forças a cada minuto. Não gostaria de passar seus últimos momentos ao lado dele discutindo.

-Eu não vou conseguir salvar a todos, não é? – perguntou triste.

-Às vezes é preciso que as coisas piorem, para então começar a melhorarem, minha filha. Mas você não pode deixar o povo pensar que você entregou Devon a Drachen por sua própria vontade. Lhe tomariam como fraca, e não entenderiam a decisão. Por isso peço que pondere e encontre serenidade para fazer a coisa certa. Eu acredito em você, Gene. Eu e Ayleen te amamos e acreditamos em você.

E apertando forte a mão da neta, Hedwyn fechou os olhos e finalmente descansou.

Ainda no passado…

Baelish balançava os braços no ar exasperado, suas faces vermelhas de raiva.

-Isso é loucura, Gen. Eu não vou fazer isso! – vociferava a ponto que inúmeras gotículas de saliva voavam para frente e refletiam na luz que entrava pela janela fosca do palácio. As portas estavam fechadas e apenas os dois jovens discutiam lá dentro.

– Acredite em mim, eu pensei em todas as outras formas de fazer isso. Não existe outro jeito. Loucura ou não, é o que tenho em mãos no momento e só você pode me ajudar nisso, Bae. A gente cresceu junto. Eu jamais confiaria em outro homem para algo assim. Eu odeio ter que lhe colocar nessa posição, porque sei que você vai sofrer tanto quanto eu, mas se você tem algum amor por esse povo, eu imploro, me ajude.

– As pessoas nunca vão acreditar.

– As pessoas são estúpidas, mal conseguem ver o que está na frente dos olhos delas. Uma história bem contada é o suficiente.

-Eu vou ser odiado. Pelos deuses, EU MESMO me odiarei.

– Não são sempre os heróis os que salvam o dia. Às vezes caminhos não convencionais são necessários.

– Quem liga para essa coisa de herói?! Eu te amo Gen, como você pode pedir pra eu te destruir dessa maneira?

– Ah, pelos deuses, pare com isso. Nós crescemos juntos, Bae. Eu passei minha infância chutando a sua bunda e olhando para sua cara ranhenta.

-Você e Ayleen também cresceram juntas. – Ele disse, deixando fazer perceber-se uma nota ressentida em sua voz.

-O que quer dizer com isso? – Ela virou para ele erguendo uma sobrancelha. Ele suspirou pesado e esfregou o rosto com uma mão antes de responder, hesitante.

-Não é da minha conta. Mas eu vejo o jeito que olha para ela. Eu daria qualquer coisa para que me olhasse da mesma forma. Eu sei que estou sendo inconveniente e peço perdão por isso, mas do jeito que as coisas andam, sei que essa era a minha última chance de… deixar você saber.

-Eu sinto muito.

– Não sinta. Eu sei meu destino, Gen. Sei que morrerei jovem, cumprindo meu dever. Não está no meu caminho ser um pai de família, ter esposa e filhos. Em algum cenário imaginário que eu fantasiei quando garoto, essa pessoa seria você. Mas sei isso jamais acontecerá. No fundo eu sempre soube, e é apenas uma das coisas que me fez te amar.

– Me perdoe. Eu sei que sou uma amiga de merda.

-Sim, você é. E como eu vou conviver com a culpa do que terei que fazer?

-Eu posso quebrar umas duas costelas suas, se isso te fizer se sentir melhor.

Ele a olhou seriamente por alguns minutos retorcendo os lábios. Ambos soltaram uma risada triste.

E foi assim que Imogene convenceu o nobre Baelish a encenar a briga que lhe invalidaria. E foi a caminho da viela onde tudo ocorreu, que ambos se olharam nos olhos pela última vez, sabendo que tudo mudaria a partir dali. Imogene passaria meses, talvez anos, interpretando o papel de uma inválida, e Baelish ganharia o amargo título de traidor de Devonshire. Quando tudo terminou, ele montou seu cavalo e cavalgou sem rumo por muitas léguas, até que nauseado parou perto de um carvalho seco. Desmontou do animal e cambaleou pela relva, levando a mão ao estômago e vomitando. Manteve sua testa pressionada no tronco áspero e gelado da árvore por alguns minutos até conseguir se firmar novamente, e quando o fez, num acesso cego de fúria esmurrou a madeira morta e gelada até que os nós dos dedos ficassem em carne viva. Quando parou, sentindo o sangue quente escorrer pela palma da mão, soltou um grito quase animalesco, um urro cheio de dor, mas essa dor não era física. Por fim, montou novamente em seu cavalo e rumou para a o território Cornualho para fazer a única coisa que lhe restava: Levar a notícia da queda de Imogene para Agur Drachen e entregá-la como um presente para o tirano. Assim, Baelish se tornou a mão direita do Rei, forçado pelo destino a interpretar um papel que o faria odiar a si mesmo pelo resto dos seus dias. Pensando bem, talvez fosse uma coisa boa a sua certeza de que morreria jovem, cumprindo o seu dever, por mais amargo que esse dever fosse.

Nota