POV significa “Point of View” ou “Ponto de Vista”. O capítulo todo será escrito sob a ótica de Xena.

Kanon parece a figura mais rápida de ser encontrada, já que a senhora do submundo Izanami precisa me convidar para que eu a encontre, então tenho que chamar sua atenção e presa a esse território pode ser algo bom ou ruim. O que Lao Ma faria?

Enquanto caminhava pelos vastos jardins do templo, meus pensamentos se voltavam incessantemente para Lao Ma e os ensinamentos que ela me havia passado. O templo era um lugar de beleza etérea, onde cada pedra, cada árvore parecia existir em perfeita harmonia. O ambiente era um reflexo das lições de Lao Ma – equilíbrio, tranquilidade, a arte de influenciar sem impor. Era como se o templo acabasse por me lembrar das coisas que aprendi e vivi com ela. E eu sabia que para chamar a atenção de Izanami, deveria me mover com essa mesma serenidade e propósito. Eu sabia que precisava abordar a situação com a mesma sabedoria e sutileza que Lao Ma sempre exibia. Eu precisava entender o fluxo natural das coisas, o caminho do menor esforço e encontrar a harmonia com o universo.

Passei minha vida toda buscando essa harmonia, quem sabe adequando o que aprendi com ela e o amor que encontrei em Gabrielle eu consiga encontrar essa rota de equilíbrio entre a escuridão e a luz.

Decidi que não iria procurar Izanami de maneira direta e agressiva. Em vez disso, eu iria influenciar sutilmente o mundo ao meu redor, ajudando as almas perdidas ou perturbadas que encontrasse no templo. Ao restabelecer a harmonia e a ordem, eu esperava chamar a atenção da deusa do submundo. Cada ação minha deveria refletir equilíbrio e paz, como um rio tranquilo que molda a paisagem sem alarde. Eu estava trabalhando para encontrar Izanami, mas não podia fazer isso de maneira… egoísta… ou interesseira… eu realmente precisava parar de buscar. Buscar o Não Ser.

O templo era um santuário de paz, cercado por bambuzais que sussurravam com o vento e lagos de águas cristalinas que refletiam o céu azul acima. Eu me movia entre eles, sentindo a energia do lugar, permitindo que ela me guiasse. Cada passo era medido, cada gesto, uma expressão de respeito e entendimento.

Enquanto percorria os jardins, encontrava almas errantes, cada uma presa em seu próprio tormento ou confusão. Eu as abordava com gentileza, oferecendo palavras de consolo ou um simples gesto de compreensão. Era uma maneira de espalhar paz, de trazer um pouco de luz à escuridão que as cercava. Eu pensava como Lao Ma pensaria, eu assumia a gentileza de Gabrielle. E comecei a entender que isso fazia de mim quem eu poderia realmente ser, uma guerreira que honra a vida e leva a morte para aqueles que não conseguem enxergar a vida com o respeito que lhe é devido.

A vida e a morte são amantes. A morte passa seus dias em companhia da vida, mas é a vida quem aceita o toque da morte porque entende que é inevitável escapar de seu toque. Eu passaria a entregar o toque da morte para o inevitável, pelo Bem Maior. Era difícil pensar assim, porque eu geralmente precisava pensar rápido, de maneira ágil, aprender a gentileza nem sempre leva a finais felizes e eu realmente me lembro do frio e da dor dos Idos de Março.

Só de pensar sobre isso um arrepio me percorreu a espinha. Apesar de ser só um espírito, uma das coisas que não perdemos são as memórias dos nossos sentidos, mesmo espírito eu seguia sendo eu. Sentindo as coisas que eu sempre senti. Enquanto eu fazia isso, eu deixava de ser uma alma sem rumo… eu comecei a entender um pouco sobre o templo. Comecei a entender que o templo era uma rota convergente dentro do mundo espiritual.

Na minha terra eu chamaria de curva de rio. Um lugar onde todas as almas inevitavelmente acabam chegando e encontrando uma jornada. Por isso que haviam tantos monges ali. E não só monges, outras pessoas que caminhavam fazendo o mesmo que eu, ajudando. E quanto mais eu interagia, mais compreendia a natureza magnífica da alma de Gabrielle e Eve. Eu compreendia que à maneira delas e dentro do que elas aprenderam, a gentileza era uma jornada de encontro consigo. Elas honravam a vida, e eu, bem, eu honrava a morte. Era isso que nos fazia tão complementares.

Lao Ma sempre enfatizou a importância da conexão com o Qi, a força vital. Decidi dedicar um tempo para meditar, buscando alcançar um estado de compreensão profunda e conexão com o mundo espiritual. Acreditava que, ao fortalecer meu espírito, eu poderia criar uma ressonância energética que chamasse a atenção dos deuses.

Eu sabia que precisava respeitar e me harmonizar com o ambiente do templo. Em vez de perturbar ou desafiar as energias presentes, eu procuraria entender e fluir com elas. Meu respeito e sabedoria seriam uma oferta silenciosa, uma forma de comunicação com as forças maiores que regem o mundo espiritual.

Lao Ma acreditava que o verdadeiro entendimento vinha de olhar além das aparências superficiais. Comecei a usar meu tempo no templo para buscar uma compreensão mais profunda das forças em jogo, tanto no plano espiritual quanto no físico. Eu precisava entender como essas forças poderiam estar interligadas ao meu próprio destino.

Cada passo que eu dava, cada respiração que eu tomava, era uma prática desses ensinamentos. Eu me movia com uma intenção clara, mas sem pressa, permitindo que o universo me guiasse em meu caminho. Eu esperava que, ao honrar a memória e os ensinamentos de Lao Ma, estaria trilhando um caminho que me levaria naturalmente ao encontro com Izanami.

No entanto, eu também mantinha em mente a possibilidade de buscar a ajuda de Kannon. Eu estava aberta às oportunidades e pronta para responder ao fluxo do universo com a sabedoria e o equilíbrio que haviam sido a base dos meus aprendizados com Lao Ma. Eu sabia que o caminho à frente poderia ser incerto, mas eu estava pronta para enfrentá-lo com a mesma força e resiliência que sempre me definiram.

O que eu não esperava era que harmonizar o Qi no mundo espiritual seria uma jornada tão… diferente do que eu esperei.