14 – Xena IV: PoV
por Panda_BardRespirei fundo e me dei conta de que o que estava acontecendo era fruto da minha própria mente. As batalhas do passado que afluíam descontroladamente. Mas sobretudo, minha última batalha, que foi praticamente um massacre. Eu fiz escolhas terríveis ali. Usei a pior armadura, me afastei de Gabrielle tentando protegê-la. Eu tomei todas as piores decisões e por falta de pensar melhor a respeito. Não respeitei a minha vida, nem a vida de Gabrielle. Não respeitei meu passado como guerreira. E agora estava aqui, cremada, pensando que fiz a pior coisa que poderia fazer e pensando se conseguiria voltar.
Gabrielle, por favor, por favor, procure por informações que me ajudem a voltar. Veja se consegue encontrar algum templo que honrem Kanon. Kanon é pura misericórdia e compaixão. Talvez nos ajude.
Será que Gabrielle ia receber o eco da prece de uma alma? Não sei. Esperava que sim. A minha cabeça lembrava de uma frase de Lao Ma que eu não sei se conseguiria aplicar aqui, mas ela falava sobre “Não ser” e eu nunca entendi por completo.
No quarto verde em que eu via com a mente duas coisas se misturavam agora. Os guerreiros que tentavam me assombrar e me batiam, meu corpo inerte sem conseguir mover-se e a dança de Lao Ma. Aquela dança era mesmo uma dança? O que eu estava perdendo ali? Algo me dizia no meu íntimo que era isso que eu precisava entender.
Passei horas ali. Horas que me pareceram intermináveis. Eu não tinha paciência e meditar nunca foi pra mim. Eu quase enlouqueci com essa palhaçada perto da Índia e se eu não tivesse quase enlouquecido, teríamos morrido antes de Eve acontecer. Antes de Callisto acontecer… quando comecei a ver no quarto não mais Lao Ma, mas Gabrielle dançando a dança de Lao Ma.
A figura de Gabrielle dançava com uma graça que ia além da simples elegância. Seus movimentos eram fluidos e sensuais, cada gesto parecia carregar uma promessa, uma provocação. Ela se movia com uma confiança silenciosa, uma dançarina que conhecia o poder de sua própria presença.
Os pés de Gabrielle deslizavam suavemente pelo chão, cada passo um convite, uma sedução. Suas mãos, delicadas e expressivas, se moviam no ar, desenhando formas que capturavam a imaginação. Ela aproximava as mãos do corpo em um gesto íntimo, como se estivesse acariciando um amante invisível, protegendo um segredo precioso entre seus dedos.
Seu rosto mantinha uma expressão de serenidade, mas havia uma chama ardente em seus olhos, uma intensidade que dava vida à dança. Gabrielle não era apenas um dia calmo cultivando um furacão; ela era o próprio furacão, uma tempestade de desejo e paixão, capturando a essência da vida em cada movimento.
Ao observá-la, senti uma mistura de admiração e desejo. A sensualidade de sua dança falava diretamente ao meu coração, despertando sentimentos que há muito estavam adormecidos. Comecei a imitar seus movimentos, tentando capturar a essência dessa dança que era tanto sedutora quanto pacífica.
Conforme eu dançava, a sensualidade inicial deu lugar a um estado mais meditativo. A dança se transformou, tornando-se uma expressão de equilíbrio e paz interior. Eu me movia agora não apenas com desejo, mas com uma compreensão profunda do fluxo da vida. Cada passo, cada giro, era um ato de aceitação e entrega ao universo.
Naquele momento, eu era tanto o furacão quanto o dia calmo; eu era a tempestade e a serenidade. A dança havia se tornado uma meditação, um caminho para a compreensão do meu verdadeiro ser. No ritmo da dança, eu encontrava força e sabedoria, um equilíbrio que fortalecia minha vontade de alma. Eu era a força da natureza, dançando com o universo, em uma jornada de descoberta e renovação.
Enquanto eu dançava no quarto verde, senti uma transformação acontecendo dentro de mim. A dança, que antes parecia apenas uma série de movimentos elegantes, agora se tornava uma linguagem, uma maneira de me comunicar com o universo. Cada movimento era um ato de aceitação e entrega, um passo rumo à compreensão do “Não Ser” de que Lao Ma falava.
Era como se eu estivesse aprendendo a falar uma nova língua, a língua da alma, onde cada gesto e cada suspiro se transformavam em palavras não ditas. Eu me movia com mais confiança, cada passo ressoando com o ritmo do meu ser interior. Eu estava aprendendo a ser um com o universo, a deixar de resistir e simplesmente ser.
À medida que eu continuava a dançar, comecei a perceber que essa era a chave para o meu próximo passo. Eu precisava não apenas entender o “Não Ser”, mas incorporá-lo em cada fibra do meu ser espiritual. Somente então eu poderia realmente entender a natureza do meu próprio destino e, talvez, encontrar um caminho de volta para o mundo físico.
Eu parei de dançar e sentei, fechando os olhos e respirando profundamente. Na quietude, comecei a sentir uma conexão mais profunda com o mundo ao meu redor. Podia sentir a energia do templo, o fluxo e refluxo das almas, e algo mais profundo, um chamado silencioso que parecia emanar do próprio coração do universo.
Abri os olhos e olhei ao redor. O quarto verde havia desaparecido, substituído por uma visão do templo em uma luz diferente. As cores eram mais vivas, os sons mais claros, e eu podia sentir a presença de algo poderoso e antigo. Era como se eu tivesse sido transportada para um plano diferente de existência, um lugar onde o tempo e o espaço se moviam de acordo com leis desconhecidas.
Neste novo espaço, eu percebi que não estava mais sozinha. À minha frente, havia uma figura etérea, envolta em uma luz suave. Não era um deus ou deusa, mas algo mais antigo, uma presença que parecia estar além da compreensão humana. Esta figura olhou para mim com olhos cheios de sabedoria infinita e disse, em uma voz que parecia vir de todos os lugares e de lugar nenhum: “Você está pronta para aprender a verdadeira natureza do seu ser?”
Eu engoli em seco, sabendo que estava prestes a embarcar em uma jornada que poderia mudar tudo o que eu sabia sobre mim mesma. “Sim, estou pronta,” respondi, minha voz firme apesar do nervosismo que sentia.
A figura acenou com a cabeça e estendeu a mão. “Então venha. Vamos começar.” Segurei a mão oferecida e, no momento em que nossas mãos se tocaram, senti uma onda de energia me preencher, uma sensação de estar conectada a tudo e a todos. Eu estava prestes a descobrir os segredos do universo e, talvez, encontrar a chave para o meu próprio renascimento.