Fanfics sobre Xena a Princesa Guerreira

    No dia seguinte, Gabrielle foi surpreendida pela visita de uma garota que não devia ter mais de doze anos carregando a chave de sua cela. A menina abriu a porta, sorriu, e estendeu a mão.

    – Por favor me acompanhe, senhora Gabrielle – a menina arregalou os olhos, deu um gritinho e cobriu a própria boca – quero dizer, Gabrielle.

    Atordoada, Gabrielle segurou a pequena mão na sua. A garota apertou seus dedos e começou a puxá-la.

    – Meu nome é Jana, sou escrava da senhora conquistadora – a menina falava enquanto a guiava pelos corredores do castelo – vou lhe mostrar onde comemos, dormimos e tudo o mais. Você vai dormir e comer com a gente, mas vai cuidar da senhora conquistadora. Acho que Eris não vai gostar nada disso. Anteia está chateada, diz que você é uma selvagem sem modos e não tem treino para o cargo. Anteia não dorme com a gente, ela tem um quarto no castelo.

    A cabeça de Gabrielle girava com a enxurrada de informações. Saíram do castelo em direção ao pátio externo e Gabrielle suspirou quando o sol acariciou sua pele. Alfinetadas de dor atravessaram seus olhos desacostumados. A menina a levou até uma grande casa de madeira.

    – Aqui é o refeitório. Está bem ao lado da cozinha – a menina apontou para o castelo – todo mundo come a mesma comida. Pode vir toda vez que tiver fome. Sempre tem alguma coisa.

    A menina deu mais um puxão forte em sua mão e continuaram a caminhar, dessa vez em direção a uma casa maior e mais afastada. Jana abriu a porta e entraram. Era um galpão gigantesco, repleto de camas duplas. Estava deserto.

    – Todo mundo já foi trabalhar – continuou Jana – lá atrás estão os banheiros. A gente reveza para limpar. Tem que limpar todo dia. A conquistadora odeia sujeira. Já a vi deixar um rapaz pendurado o dia todo pelo tornozelo numa árvore porque ele deixou o banheiro sujo. Alguma pergunta?

    A menina a olhava com expectativa.

    – Na verdade, sim – Gabrielle pigarreou – o que exatamente devo fazer?

    – Ah – Jana ergueu as duas mãos espalmadas e foi baixando os dedos – Primeiro, você come. Segundo, você prepara o banho da conquistadora. Terceiro, leva a refeição matinal dela. Ela acorda bem cedo. É pra entrar no quarto sem bater, ela não usa chave. Quarto, quando ela sair, você limpa os aposentos. Quinto, vai buscar o almoço – começou a baixar os dedos da outra mão – sexto, você almoça e volta pra esperar ela lhe dar ordens. Sétimo – Jana mordeu os lábios e começou a bater um pé – sétimo… sétimo… depois que fizer tudo está livre para comer e voltar pra cá. Pronto, eram sete.

    – Uau – Gabrielle sentiu seus lábios repuxarem, desacostumados com o sorriso que se estampou neles – parece que você treinou bastante.

    – Sim. Anteia estava muito nervosa. Era pra ela estar aqui lhe explicando. Mas teve uma confusão na cozinha e ela precisou correr para resolver. Me ofereci para vir e ela ameaçou arrancar meus olhos se eu não lhe dissesse tudo direitinho.

    – Por que se ofereceu? Essa Anteia parece perigosa.

    Jana ficou vermelha, encarou os próprios pés e começou a balançar no lugar. Gabrielle teve compaixão e ajoelhou-se diante da menina.

    – Jana, pode me dizer qualquer coisa. Sou sua amiga – disse a amazona com o tom mais suave que conseguiu. Depois de todos os dias de isolamento, interagir com a vivaz criança era como um jorro de luz em sua alma. A menina ergueu um pouco os olhos e perguntou baixinho:

    – Como uma rainha pode virar escrava? Achei que nascíamos todos destinados a ser uma coisa só.

    Gabrielle sentiu seu rosto contrair-se. A menina, alarmada, voltou a encarar os pés.

    – Desculpe, Gabrielle, Anteia diz que faço perguntas demais.

    – Tudo bem, Jana. Sua pergunta é muito boa. Mas o destino é uma coisa complicada – Gabrielle suspirou – veja, a conquistadora era uma camponesa, e hoje ela domina toda a terra conhecida.

    A menina arregalou os olhos de espanto.

    – Ela era camponesa?

    – Sim, de Anfípolis. Uma aldeia muito perto da que eu nasci – era a primeira vez que Gabrielle se dava conta desse detalhe – eu também era uma camponesa.

    – E se tornou rainha das amazonas – os olhos de Jana cintilaram.

    Gabrielle sorriu ao ver a emoção da menina.

    – Sim. Eu estava cansada da vida no campo. Queria ver o mundo, conhecer bastante coisa para escrever histórias sobre elas.

    – Você escreve histórias? – a menina parecia cada vez mais fascinada – eu não sei escrever, nem conheço muitas histórias.

    – Escrevo sim. Sei contá-las também.

    – Pode me contar uma? – a menina pediu empolgada, depois cobriu de novo a boca com as mãos – me desculpe, senhora Gabrielle, digo, Gabrielle, não queria pedir isso.

    – Claro que posso – Gabrielle levantou-se, pegou a menina pela mão e sentou-se numa cama. Jana sentou-se ao seu lado – quer que eu conte como me tornei rainha das amazonas?

    – Sim!

    – Pois bem – começou Gabrielle – eu fugi de Potedia a noite, sem avisar ninguém da minha família. Passei vários dias andando a esmo, até quase toda a comida que eu tinha levado acabar. Já estava quase desanimando e desistindo, quando encontrei uma vila onde umas pessoas estavam tentando acordar os Titãs recitando cantos antigos, mas não estavam conseguindo. Acontece que eles estavam lendo as estrofes no ritmo errado. Então eu fui lá, li da forma correta, e acabei acordando os Titãs.

    – Não acredito! – a menina estava boquiaberta.

    – Juro que é verdade – a voz de Gabrielle ia ganhando força – tive que usar todo o meu poder de persuasão para convencer os Titãs que eu era uma deusa. Mas eles acabaram descobrindo que eu era humana e quase acabaram com a vila. Demos sorte que um velho guerreiro chamado Meleagar estava passando por ali e nos ajudou a distrair os Titãs enquanto eu lia o canto que os transformava em pedra novamente.

    – Nossa!

    – Escrevi um pergaminho gigantesco sobre esse dia. Acontece que Meleagar estava só de passagem e perguntei se eu podia acompanhá-lo por uns tempos. No começo ele não quis, mas eu consigo ser bem persuasiva e teimosa quando quero algo – Gabrielle sorriu – então ele acabou deixando e ficamos amigos. No começo foi difícil. Percebi que ele tinha problemas com bebida, pois cada lugar que parávamos ele entrava em um bar. Mas depois de um tempo o convenci a parar com isso. Ele resistiu muito, mas acabou cedendo e depois disso se tornou um amigo bem mais agradável. Eu e Meleagar passamos alguns meses viajando juntos, até que tivemos que passar por território amazona. Fizemos o sinal de paz das amazonas. Veja, é assim – Gabrielle ergueu as mãos e entrelaçou os dedos em cima da cabeça – e elas logo apareceram. Estávamos sendo levados para falar com a rainha Melosa quando fomos atacados. Meleagar foi atingido por uma flecha e não sobreviveu. Também fui atingida tentando defender a princesa Terreis. Infelizmente, ela acabou morrendo também, mas antes me passou seu direito de casta.

    – O que é isso?

    – É o direito à realeza das amazonas – explicou Gabrielle – ela era uma princesa, e quando morreu me passou os direitos e as posses dela. A partir daquele momento eu era a herdeira de Melosa. Quando chegamos à tribo das amazonas, vimos que elas tinham aprisionado um centauro.

    – Um centauro! – Jana exclamou – eu nunca vi um centauro!

    – O que estava lá era suspeito de ser o responsável pelo ataque que tinha levado à morte de Terreis. Fiquei desconfiada, pois pelo que tinha lido dos centauros esse tipo de coisa não era típica deles. Melosa estava prestes a iniciar uma guerra, mas a convenci a investigar melhor a situação. Acabamos descobrindo que o senhor da guerra Krykus tinha forjado o ataque para iniciar uma guerra entre amazonas e centauros, para que ele pudesse ficar com as terras de ambos.

    – Que perverso!

    – Depois disso Melosa passou a me respeitar mais, e a maioria das amazonas me aceitou como sendo parte da tribo delas. Veja bem, eu era uma completa estranha que, de repente, tinha o direito à realeza. Muitas não gostaram nem um pouco disso. Algumas até sugeriram que eu estava trabalhando com o Krykus para roubar o direito de casta de Terreis. Mas depois de um tempo elas perceberam que isso não era verdade e acabaram honrando o último desejo de Terreis, que era me fazer princesa.

    – Como você as convenceu?

    – Acho que foi uma questão de convivência. Para ser bem sincera, acho que a maioria pensou que eu era ingênua e burra demais para ter forjado aquilo, e elas estavam certas. Não passava de uma camponesa que tinha vivido algumas pequenas aventuras e não sabia nada de nada. Não levou muito tempo para elas perceberem isso. Então resolveram me ensinar seus costumes e eu fui ficando e gostando. Aprendi a lutar e a conviver com elas.

    – Mas você disse que queria sair e ver o mundo – questionou Jana.

    – É verdade. Depois de um tempo, acabei fugindo da tribo das amazonas também.

    – Não acredito!

    – Acredite! Tinha essa amazona, mais ou menos da minha idade, chamada Igara. Ela também tinha vontade de conhecer o mundo. Acabamos decidindo fugir juntas e passamos um tempo andando por aí e nos metendo em todo tipo de confusão. Foi quando ouvimos falar que o exército de Xena estava se tornando uma força realmente avassaladora e apenas alguns territórios, além das amazonas, estavam resistindo ao seu avanço. Então resolvemos voltar.

    – E o que aconteceu?

    – As amazonas estavam frágeis. Melosa tinha morrido. Uma ala do exército de Xena tinha passado por ali e matado muitas de nós. Quando cheguei, uma moça chamada Velasca tinha assumido o lugar de Melosa, mas como a coroa era minha por direito, ela teve que ceder. Ela ficou muito enraivecida e acabou demandando o desafio.

    – Desafio?

    – Uma amazona pode tomar o trono da rainha desafiando-a para uma luta até a morte – disse Gabrielle – e foi o que ela fez. Igara quis lutar como minha campeã, pois ela sabia que eu não gostava de lutar e nunca tinha matado ninguém. Mas eu não deixei. Precisava conquistar o respeito das amazonas. Então lutei e ganhei – Gabrielle sentiu uma pontada no peito quando a memória apareceu – depois mandei entregar comunicados às muitas tribos amazonas com uma proposta de união. A maioria respondeu. E assim começamos a criar uma nação amazona grande e forte. O exército de Xena ficou longe por muitos anos.

    – Até agora – Jana baixou os olhos.

    – Até agora.

    – Quer dizer que não existem mais amazonas? – questionou a menina.

    – Eu sou uma amazona – disse Gabrielle – posso não ser rainha, mas sou uma amazona. Porque nada do que aconteça comigo vai apagar tudo que elas me ensinaram.

    Jana sorriu.

    – Posso ser uma amazona também?

    Gabrielle sorriu, triste. Era uma ilusão, mas porque não? Aquele sonho infantil a fazia sentir-se menos só.

    – Agora você é – sussurrou para Jana – e eu te passo meu direito de casta. Então você é uma princesa amazona.

    Jana levantou-se e deu pulinhos. De repente, se aquietou.

    – Acho que tenho que continuar fingindo ser uma escrava, ou posso apanhar de Anteia. Ou da conquistadora – sussurrou Jana, olhando para os lados assustada.

    – Deixa eu te contar um segredo. Eu também estou fingindo – piscou para a menina.

    – Então é nosso segredo?

    – Isso.

    – Escrava! – gritou uma voz na porta do alojamento. Era Anteia – a conquistadora demanda seus serviços – Gabrielle finalmente percebeu que o chamado era pra ela. Hesitou em se levantar, mas um pensamento injetou energia em seu corpo.

    Xena estendida no chão, morta pelas suas mãos.

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