Fanfics sobre Xena a Princesa Guerreira

Gabrielle e Theodorus chegaram ao espaço aberto em frente aos quartéis, o mesmo onde ela e Joxer tinham visto uma vez os soldados treinando. O espaço estava vazio, exceto por uma dezena de soldados jovens, tanto rapazes quanto moças, que estavam acomodados em um longo banco de madeira.

Xena estava de pé ao lado deles, e todos estavam com semblantes ansiosos, os olhos fixos nela, atentos a cada movimento. A soberana segurava sua espada e a girava com maestria, o som do aço cortando o ar ressoando de forma quase hipnótica. O olhar concentrado de Xena revelava uma expressão impenetrável mas feroz, que para Gabrielle mais parecia uma máscara de predador.

Gabrielle observava em silêncio, os olhos presos na figura da imperatriz, sentindo a garganta apertar. A cada movimento, Gabrielle se encolhia internamente, tentando entender o que aquilo significava e perguntando-se por que exatamente Xena a trouxera até ali.

Enquanto Xena girava a espada uma última vez antes de parar e encarar o grupo de soldados com olhos penetrantes, Gabrielle teve um calafrio. Os olhos da soberana foram dos soldados até ela e a loira engoliu em seco.

Xena não falou nada e desviou os olhos novamente, apontando a espada para uma jovem de cabelos loiros que estava sentada no banco. Gabrielle reconhecia aquele rosto, era a mesma que tinha lutado contra Xena da última vez que estivera ali.

– Glafira – disse a soberana – pegue dois cajados.

A jovem se levantou imediatamente e foi até uma armação de madeira repleta de armas diversas, de onde tirou dois cajados de madeira. Xena olhou novamente para Gabrielle e fez um gesto para que ela se aproximasse.

Gabrielle não resistiu e olhou pressurosa para Theodorus, que tentou lhe transmitir um sorriso de confiança. Tremendo, Gabrielle se adiantou.

– Glafira, entregue um cajado a Gabrielle – ordenou a imperatriz.

Completamente confusa, Gabrielle pegou o longo bastão, e se surpreendeu ao perceber como era leve.

– Agora, Glafira, lembre-se do dia que chegou aqui. Uma menina ranhenta, órfã, e sem nenhum rumo. Um dia em que você não sabia de nada. Gabrielle, que está na sua frente, não sabe nada sobre um cajado. Ensine-a.

Gabrielle arregalou os olhos e encarou a imperatriz. Balançou a cabeça.

– Não quero aprender como lutar.

– Você não está aqui para aprender a lutar – disse a soberana com voz seca – está aqui para que esses insetos – apontou para os soldados – aprendam a ensinar.

– Xena… – Gabrielle tentou argumentar.

– Você virá aqui, pelo menos três vezes por semana, nem que eu tenha que mandar trazê-la à força. Eles lhe ensinarão como se defender usando um cajado e num combate corpo-a-corpo. Se não vier, eu saberei. Quanto a vocês – olhou para os soldados – se fizerem algum mal a ela providenciarei pessoalmente que todos percam a capacidade de ter filhos.

Glafira riu, e os demais soldados engoliram em seco.

– Começem – ordenou a conquistadora.

Gabrielle hesitou, segurando o cajado em suas mãos, e olhou para Glafira, que se aproximava com um sorriso encorajador.

– Não se preocupe, Gabrielle – disse Glafira, movendo-se de forma ágil ao seu lado – vou te mostrar como segurá-lo corretamente primeiro.

A loira observou atentamente enquanto Glafira posicionava suas mãos no cajado, mostrando a pegada firme que estabilizava o equipamento.

– Coloque uma mão em cima e a outra na parte inferior. Assim, você terá mais controle e força.

Gabrielle tentou imitar os movimentos, mas o cajado parecia mais pesado do que realmente era. Glafira sorriu, percebendo a hesitação.

– Isso, bem assim. Agora, tente se mover um pouco – Glafira disse, demonstrando um passo lateral elegante – Mantenha os joelhos levemente flexionados. Isso te ajudará a se equilibrar.

Gabrielle seguiu a instrução, movendo-se um pouco, mas seu corpo ainda estava tenso. A presença de Xena, com seu olhar feroz, a fazia sentir-se exposta e vulnerável.

– Eu não sou uma guerreira – murmurou, sua insegurança evidente.

– E ninguém espera que você seja – Glafira respondeu – mas, ainda assim, conhecer suas capacidades é importante. Veja, pelo menos por agora,  o cajado como uma extensão de você, quase como uma parte do seu corpo. Vamos lá, agora, faça movimentos simples. Como um círculo, para aquecer.

Gabrielle respirou fundo e tentou girar o cajado, mas sentiu-se desajeitada. O movimento não fluiu como ela esperava. Glafira, percebendo a dificuldade, encorajou-a.

– Mais suave. Você não precisa usar força bruta. O controle é a chave.

– Controle – Gabrielle repetiu, pensando nas palavras enquanto tentava se concentrar.

– Sim, controle – confirmou Glafira – agora, tente deslizar o cajado para frente e para trás, como se estivesse empurrando algo. Isso ajudará a entender o peso e o equilíbrio.

Com a orientação, Gabrielle começou a sentir o cajado se tornando mais familiar em suas mãos. Ela fez um movimento de empurrão, e, para sua surpresa, o cajado fluiu com mais facilidade. Uma pequena onda de confiança a atravessou.

– Isso. Muito bem – Glafira exclamou, animada – você tem talento. Agora, podemos tentar um pouco mais. Lembre-se, se algo não sair como o esperado, não se preocupe. O treinamento é um aprendizado constante.

Enquanto Gabrielle continuava a praticar, sentia a pressão dos olhos de Xena sobre ela. Cada movimento do cajado, cada correção que Glafira fazia, parecia conectá-la um pouco mais à ideia de lutar, de se defender. Percebeu surgir em seu interior um ardor diferente. Apareceu em sua mente a imagem de Xena atacando-a, e sentiu algo diferente de medo. Sentiu raiva. Suas mãos apertaram o cajado com força.

– Agora, tente um movimento de defesa – Glafira sugeriu, demonstrando um golpe com o cajado que poderia desviar um ataque – Imagine que alguém está vindo em sua direção e você precisa se proteger. O cajado pode te ajudar a manter distância.

Gabrielle focou, visualizando a situação. Ela executou o movimento, um pouco hesitante, mas Glafira a corrigiu rapidamente, ajustando a posição de suas mãos e a angulação do golpe. A cada ajuste, Gabrielle sentia sua confiança crescer.

– Isso, você está indo muito bem! A prática é o que conta – disse Glafira, enquanto os soldados assistiam com expressões de espanto e respeito.

Gabrielle, permeada por aquelas novas emoções, percebeu que estava começando a entender o cajado. Com cada movimento, ela sentia que aprendia não apenas a arte do combate, mas também se conectava com uma parte de si mesma que havia permanecido adormecida.

A parte que acreditava em sua própria força.

 

***

 

O treinamento prosseguiu por uma hora, e Gabrielle aprendeu os movimentos básicos com relativa facilidade. Percebeu, surpresa, que tinha uma destreza natural com o corpo, habilidade que ela jamais desconfiaria existir nela.

Xena ordenou que o treinamento acabasse e fez sinal para os soldados se recolherem. A sensação de confiança que Gabrielle tinha sentido foi dando lugar ao medo ao perceber que ficaria sozinha com Xena. Fez menção de guardar o cajado na armação de madeira, mas Xena balançou a cabeça para ela.

– Esse você leva com você. Mantenha-o perto.

Gabrielle baixou os olhos, o cajado nas mãos, os pensamentos cheios de confusão. Sentia uma raiva difusa arder dentro de si. Ergueu os olhos para encarar os olhos azuis da imperatriz, que tinham adquirido um tom escuro com a noite.

– Por que está fazendo isso? – perguntou Gabrielle – porque simplesmente não se livra de mim?

Xena manteve seu olhar fixo em Gabrielle, os olhos parecendo penetrar em sua alma.

– Não quero me livrar de você –  respondeu Xena, sua voz baixa e controlada, mas com uma firmeza que não deixava espaço para contestação – quero que você aprenda a se defender.

– Mas por que, Xena? – insistiu Gabrielle, o cajado ainda em suas mãos. Ela balançou a cabeça – eu fui tola. Eu achei que tinha desvendado você. Mas você…

– Eu o que, Gabrielle?

Gabrielle engoliu em seco e baixou os olhos.

– Nada. Nada. Eu treinei, como você ordenou. Posso retornar aos meus aposentos, senhora?

A frieza e formalidade no tom de Gabrielle, assim como o perceptível medo, feriram Xena mais do que se ela tivesse lhe golpeado com o cajado.

– Sim, você pode. Virá depois de amanhã, novamente, certo?

– Sim, virei – Gabrielle respondeu, ainda de olhos baixos.

Xena sentia vontade de socar a própria cara.

– Certo, então. Está dispensada.

Gabrielle fez uma mesura e começou a se afastar em passos apressados. Xena observou a jovem se distanciar, sentindo como se uma espada tivesse entrado em seu coração.

 

***

 

Gabrielle entrou em seu quarto, fechando a porta suavemente atrás de si. Encostou-se nela, os olhos percorrendo o aposento silencioso e mal iluminado. Com o cajado ainda firme em suas mãos, permitiu que seus pensamentos se libertassem da tensão do treinamento. A lembrança dos olhos de Xena sobre ela, penetrantes e intensos, a fez sentir um arrepio.

Caminhou até a cama e sentou-se, o cajado repousando em seu colo. Não sabia o que pensar daquilo. O objeto, símbolo de luta e defesa, parecia tão estranho e desajeitado em suas mãos. Gabrielle nunca havia desejado aprender a lutar; sua vida sempre fora regida por palavras, não por armas.

Ela suspirou, fechando os olhos por um instante e tentando organizar seus sentimentos. Com um toque hesitante, passou os dedos ao longo do cajado, sentindo a textura da madeira áspera contra sua pele. Por mais desconfortável que fosse aquele treinamento, algo nele despertava uma faísca desconhecida.

– Eu sei o que você está fazendo, Xena – murmurou – eu disse que não te entendia… mas a verdade é que consigo ler sua alma quase como se fosse um pergaminho.

Nota