Fanfics sobre Xena a Princesa Guerreira

    Ao ver-se sozinha em seu quarto, Gabrielle correu para seus pergaminhos e pôs-se a escrever. Dentre tudo que acontecia, não tinha encontrado um momento sossegado o suficiente para a escrita. Aquela era sua oportunidade. Concentrou-se e voltou a redigir sua história sobre as amazonas. Adormeceu na mesa, em cima dos pergaminhos. 

     

    ***

     

    Acordou com fortes batidas na porta.

    – Acorde, loirinha – disse a voz de Xena.

    Gabrielle ergueu-se, sonolenta. Tinha dormido tarde da noite. Guardou seus pergaminhos e abriu a porta. Xena lhe lançou um olhar questionador.

    – Que diabos é isso em seu rosto?

    Gabrielle passou a mão no rosto e olhou as manchas pretas que ficaram em seus dedos. Ruborizou um pouco ao perceber que tinha a cara suja de tinta.

    – Espere um pouco – disse, tentando fechar a porta, mas Xena a impediu.

    – Esquece. Não importa. Veja isso – e lhe estendeu dois pergaminhos.

    Gabrielle os pegou e abriu. Soltou uma exclamação.

    O Rei dos Ladrões lhes deve um favor. Sejam gratas por isso. Deixo um mapa com a localização exata da adaga. Adeus! PS: Xena, foi um prazer ver que você ainda é você. Gabrielle, quando eu conseguir um par de peitos, entro em contato.

    A amazona deixou cair os braços, frustrada.

    – Por isso ele queria ficar numa estalagem. Queria se livrar de nós – Gabrielle se sentiu chateada. Gostava de Autolycus e tinha desfrutado de sua companhia.

    Xena deu de ombros, indiferente.

    – Bem, eu meio que esperava. Ele é um lobo solitário. Enfim, temos o que precisamos. Melhor nos adiantarmos. E limpe esse rosto. 

     

    *** 

     

    Pararam para acampar perto do escurecer. A noite ficava bonita e agradável. Ferviam um ensopado de vegetais quando Gabrielle comentou:

    – Entendo que o Autolycus queria uma boa noite numa estalagem. Mas, sinceramente, prefiro aqui. Esse ar, esse céu. Não tem nada que se compare.

    Xena olhou para o infinito estrelado, depois para o rosto da outra mulher. Era um daqueles raros momentos em que Gabrielle parecia esquecer quem ela era e falava com naturalidade. Esses momentos duravam pouco, e Xena receava falar algo que o quebrasse.

    – Concordo com você, loirinha – disse Xena.

    Gabrielle a olhou e Xena desviou o olhar. A loira ficou surpresa com o gesto atípico. A morena passara o dia séria e taciturna, sem fazer provocações e piadas estúpidas, e Gabrielle não conseguia imaginar o motivo. Talvez a partida de Autolycus?

    – No que está pensando, Xena? – perguntou Gabrielle.

    Xena não respondeu.

    Xena, foi um prazer ver que você ainda é você.

    – Está sentindo dor? – perguntou Gabrielle.

    Sim, loirinha, mas não a dor que você pensa.

    – Não – respondeu Xena. Pigarreou ao perceber o som titubeante de sua voz – não – falou mais firme – apenas lembrava de algumas coisas.

    – O que? – insistiu Gabrielle, esperando a costumeira resposta zombeteira da mulher, que não veio. A morena parecia desconcertada.

    – Hum. Hoje de manhã, quando a vi com o rosto sujo – Xena pigarreou de novo – me lembrou…

    Xena se interrompeu. Maldito Autolycus. Eu não quero ser eu.

    – Do que está falando Xena? – questionou Gabrielle, confusa.

    – Meu irmão mais novo, Lyceus. O cabelo dele parecia um pouco o seu. E eu tinha que limpar o rosto dele o tempo todo. Quando a vi, lembrei dele, e passei o dia pensando nele. E já não pensava nele há muito tempo.

    Era a última coisa que Gabrielle esperava ouvir. Por um momento, não soube o que responder.

    – Me disse uma vez que toda sua família morreu – comentou Gabrielle.

    – Sim. Quando eu tinha dez anos. Minha mãe e meus dois irmãos. Minha vila inteira.

    – E seu pai?

    – Nunca o conheci.

    – E o que fez depois que sua família morreu?

    – Sobrevivi. Me vinguei. Já lhe disse.

    Gabrielle a observou com atenção. Xena parecia abatida.

    – Sinto muito, Xena.

    Xena deu um sorriso incrédulo.

    – Sente muito? Por mim, Gabrielle?

    – Sim – respondeu a mulher.

    – Por favor, poupe-me.

    Gabrielle deu de ombros e contemplou a fogueira.

    – Bem, eu sinto. Vivi toda minha infância num lar caloroso e feliz. Quando penso que poderia tê-los perdido tão cedo, me parece devastador. De modo que imagino que tenha sido devastador para você.

    – Faz tempo demais – disse Xena – já não importa.

    – Diz que não importa, mas, ao mesmo tempo, parece que definiu toda sua vida.

    Xena já se arrependia de ter se exposto.

    – Já chega dessa conversa estúpida. Passado é passado.

    – Claro. Toda vez que começa a se tornar um pouco humana quer mudar de conversa.

    – De que lhe interessa minha humanidade?

    – Me interessa – Gabrielle baixou a cabeça, pensativa – me interessa porque preciso encontrar uma forma de perdoá-la. Preciso, para poder seguir em frente.

    – O que espera de mim, Gabrielle? Eu sou quem eu sou, e eu fiz o que fiz.

    – Eu sei – suspirou Gabrielle.

    Xena olhou as labaredas. O rosto de Lyceus rondava sua memória. Sequer sabia se ele era realmente como imaginava. Provavelmente não. Mas o pequeno rosto infantil de cabelos dourados, olhos claros e sorridentes não saia de sua mente.

    – Não tinha como nada acontecer diferente – Xena não ergueu os olhos, falando tão baixinho que Gabrielle mal ouviu – eu faria tudo igual.

    Gabrielle deixou os ombros caírem. Inclinou-se e remexeu na lenha da fogueira, atiçando as chamas.

    – Conte-me mais sobre seu irmão – pediu.

    – Se eu for te contar histórias tristes sobre mim, vou querer algumas em troca. Isso não pode ser uma via de mão única.

    – Você sabe a maior parte das minhas histórias tristes. Causou a maioria delas.

    Xena atirou uma pedrinha na fogueira, enraivecida.

    – Então sua vida era feita de filhotes de cordeirinho e arco-íris antes de eu chegar?

    – Não exatamente. A vida no campo tinha suas durezas. Ser rainha das amazonas era muito complicado, e eu, de fato, tive que fazer coisas questionáveis. Mas era feliz – olhou para a outra mulher – você já foi feliz, Xena?

    Xena se remexia, inquieta, mal conseguindo controlar a perturbação que a conversa lhe causava.

    – Sim – respondeu entredentes – quando era criança. E muito depois, quando vadiava com meus homens, pilhando e saqueando sem muitas pretensões. Depois disso não era bem felicidade. Era outra coisa.

    – O que?

    – O que se sente quando conquista algo. Uma vila, um exército, uma nação. Uma pessoa – olhou para Gabrielle – não é felicidade. É mais como uma fúria eufórica. É desse sentimento que me alimentava. É o que me moveu por anos. Mas mesmo isso já desapareceu há tempos.

    A guerreira passou os dedos pelos cabelos e continuou:

    – As vezes, aqui, sinto algo próximo de felicidade. Quando você não está me enchendo a paciência com perguntas idiotas e eu estou por aí, quando caço, pesco, nado, cavalgo. É o mais próximo que estive da felicidade em muitos anos.

    – Então por que quer matar Ares e recuperar o trono? Não faz muito sentido. Fala como se não fosse feliz como rainha.

    – Não me interessa felicidade. Me interessa poder. Me interessa ter o mundo inteiro. Entende, loirinha? – disse Xena rispidamente.

    – Acho que sim – disse Gabrielle – você quer controlar tudo para nunca mais se machucar novamente.

    Xena soltou uma alta gargalhada.

    – Soa como um maldito filósofo barato de taverna, loirinha. Quanta bobagem. Poder é poder. Não tem justificativa.

    – Se você diz – respondeu Gabrielle – e seu irmão?

    – Um pirralho idiota – disse Xena – me torrava a paciência. Vivia pendurado no meu pescoço.

    – Sente falta dele?

    Xena sentiu sua respiração travar na garganta.

    – Mais que qualquer coisa nessa vida.

    Gabrielle abriu a boca para falar, mas Xena se levantou e começou a andar em direção à floresta.

    – Vou pegar lenha – disse a morena antes de desaparecer entre as árvores.

    Gabrielle apenas baixou os olhos para as altas chamas da fogueira.

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